Across The Frontline escrita por overexposedxx


Capítulo 16
Capítulo 16 - O Abrigo




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Com o fardo dos acontecimentos daquele dia tão longo, o restante da noite não poderia ter sido diferente das demais horas até ali.

Depois do funeral, os Cullen haviam se reunido brevemente no local onde estavam os carros em que os oito membros haviam divido-se para chegar até ali, apenas para decidir qual rumo cada um tomaria e com quem, e para Rosalie, aquilo que havia sido questão de dois minutos havia soado como uma eternidade, deixando-a ainda mais impaciente e fatigada do que conseguia demonstrar.

No fim das contas, com Edward e Jasper lembrando que levariam namorada e noiva para as próprias casas antes de voltarem à mansão e o cansaço - próprio e dos demais - visível, ela acabara por escolher ir com Emmett, dizendo às preocupações de Esme que gostaria de poder descansar o quanto antes na própria casa e ficar sozinha um pouco. Ela sabia também que se fosse com os pais teria de relutar contra a persistência maternal para que ficasse com eles aquela noite, e o que havia dito sobre o próprio cansaço era verdadeiro demais para pensar em lidar com isso daquela vez.

Assim, fora realmente um alívio quando Carlisle assentiu primeiro, afagando o ombro da esposa como se soubesse que precisava assegurá-la mais do que à filha, libertando a mesma para sua escolha antes dos outros. As despedidas haviam sido um pouco demoradas, sobretudo pelo abraço dos pais à beira da porta do Jeep de Emmett - embora com certeza não tanto quanto no caminho até ali, com todas as pessoas que haviam parado-na para lamentar por Royce -, mas nada de que realmente pudesse reclamar.

Uma vez que o de olhos azuis abrira a porta do passageiro para ela e esperara até que ela se acomodasse, o caminho até a própria casa - que ele já conhecia sem que ela precisasse interferir - havia sido tranquilo e quieto, até um tanto recompensador pelo tempo que havia ficado de pé e entre tantas pessoas, forjando comportamentos aqui e ali que não eram seus. Depois de passar um bom tempo sentindo o vento morno jogar seus cabelos para longe do rosto, com os olhos nas ruas mal iluminadas e às vezes no céu de um azul estrelado de escuridão quase completa àquela altura, ela até havia comentado banalmente sobre a paisagem e o clima e depois surpreendido Emmett com uma conversa sobre modelos de carros, a começar sobre aquele em que estavam. Surpreso e interessado, ele havia engajado-se tão naturalmente ali que ela sequer havia lembrado-se de que ele certamente não sabia de seu gosto peculiar pelo assunto, e assim a conversa fora duradoura só o suficiente para entreter e aproximar um pouco mais ambos até que o caminho estivesse a alguns minutos do fim.

Depois, quando já havia livrado-se das roupas e tomado um banho demorado debaixo do próprio teto, completamente sozinha dessa vez, Rosalie havia recebido uma ligação de Mercedes, se desculpando por não ter conseguido comparecer ao enterro para estar com ela e afirmando que estaria de volta no dia seguinte, de qualquer forma. A loura havia sorrido genuinamente com os modos da outra e dito a ela que não se preocupasse, que entendia e além do suporte da família ter sido suficiente, não gostaria mesmo que ela tivesse precisado presenciar àquilo, e que estaria esperando por ela quando chegasse, sentindo saudades. O breve diálogo havia sido leve o bastante para fazê-la manter o sorriso nos lábios enquanto tomava o próprio chá e depois quando caminhava para o quarto arrastando os pés nus pelo chão frio, até acomodar-se na cama espaçosa e vazia.

Antes de adormecer, com as pálpebras pesando sobre as íris castanho claras, havia vagado nos pensamentos sobre como era surreal que aquela cama não voltaria jamais a ter o espaço de Royce reservado para ele, mas a extensão dos pensamentos a fez afastar o pensamento e só tentar esticar-se mais à vontade acostumando à ideia, enquanto levava-os de volta até a família, agradecendo mentalmente por tê-los tido até ali sobretudo naquele dia, lembrando-se das despedidas antes que rumasse no carro de Emmett para onde estava agora.

Edward havia sido o primeiro, depois da concordância do pai, a afagar seu ombro e assentir, em meio a um sorriso breve na expressão séria, como se já esperasse e, de alguma forma, soubesse o que estava passando em sua cabeça sem que ela precisasse justificar como havia feito. Aquilo era uma característica dele a que ela já estava acostumada, apesar de nunca deixar de surpreender-se com a naturalidade com que soava sempre. Ela havia sorrido para ele antes que se afastasse.

Depois fora a vez de Bella, que havia lhe dado um beijo nas bochechas e depois recolhera as mãos para si entre um sorriso tímido como usual, ao que Rosalie entendeu como sendo qualquer coisa mais adequada do que um "sinto muito" ou "fique bem", e agradeceu também com um sorriso. Viu-a passar um dos braços pelo de seu irmão mais novo antes que acenassem para os outros e saíssem de sua vista.

Jasper, em seguida, lhe dera um abraço momentânea e magicamente tranquilizador como habitual e um sorriso contido pelo qual, de alguma maneira, - como Edward com a mania de parecer entender o que pensavam - ela sabia que não precisaria agradecer em voz alta para que ele sentisse sua gratidão.

Antes que percebesse, era Alice que havia lhe dado beijo no rosto, apertado com carinho nos braços pequenos e dado-lhe seu olhar num meio sorriso de "estamos com você". Apesar das diferenças normais entre os modos de ser de uma e outra, Rosalie não podia negar que desde que o irmão havia trazido a noiva à família ela havia cativado seu coração - e isso explicava por quê àquela altura sentia como se ela fosse a irmã que não havia tido por laços de sangue.

Por fim, os pais a haviam abraçado forte e dito suas próprias palavras, ambos protetores e reconfortantes como sempre, mas Esme soando veemente em seu tom preocupado maternal e Carlisle no calmo e confiante das palavras sábias que complementavam as da esposa. Ela absorvera tudo tanto quanto podia, até porque eles pareciam realmente saber o que precisava ouvir, mas de fato havia aproveitado mais o contato próximo do que qualquer outra coisa.

E bem, aquela não havia sido a última da noite, na verdade. Se bem lembrava-se agora, ainda houvera Emmett, o mais recente de todos, à entrada de sua casa. Havia sido breve, era verdade, até mesmo porque depois de agradecer a ele pelo apoio e pela carona - o que por algum motivo parecera enroscar sua garganta num nó - só havia percebido que estava em seus braços de novo quando se deu conta das lágrimas quentes escorrendo por suas bochechas. E por algum motivo, isso era o suficiente para que não fosse capaz de deixar escapar a despedida da memória.

Ela havia encarado o chão ao silêncio dele depois de agradecer, com o melhor sorriso que havia sido capaz de colocar no rosto, e de repente ele a havia envolvido num novo abraço, mas tão reconfortante quanto o último há horas atrás. Da mesma forma repentina, pegou a si mesma chorando, dessa vez com as mãos em frente ao rosto enquanto recostada ao corpo dele, deixando-se sentir todas as coisas um pouco mais e, nos intervalos, o afago dele em suas costas e as palavras que o sono agora não permitiria-lhe lembrar, mas que sabia o quão necessárias haviam sido.

Aos poucos as imagens, assim como as palavras, tornaram-se indistintas e Rose enfim adormeceu.

(...)

Só algumas horas depois, no entanto, Rosalie já acordava outra vez. Não havia realmente descansado tanto, apesar de ter apagado completamente depois que se lembrara da última despedida daquela noite, mas também não se sentiu exatamente cansada quando abrira os olhos naturalmente à luz prematura do dia, que adentrava pelas frestas da janela ainda fechada. Talvez só estivesse ainda absorta em algum lugar entre o inconsciente e a realidade.

Mesmo assim, não havia demorado muito até que estivesse colocando uma roupa para passar o dia e depois voltando para fazer a cama, sem muitos pensamentos lhe ocorrendo, até que desse a volta no colchão para reorganizar o lençol. Ali ao lado estava a mesa de cabeceira de Royce, onde jazia um livro desgastado que ele fingia ler, um cinzeiro empoeirado e um copo vazio que cheirava a álcool: coisas que a haviam feito lembrar do evento da noite passada, que pela manhã ainda precoce, por alguns instantes parecia ter esquecido-se.

Uma sensação estranha de levitar no estômago a tomou por um segundo, como num susto, seguida pela enxurrada de pensamentos que lembravam-na da coisa mais óbvia e fundamental de tudo aquilo: Royce não estaria mais ali, nem agora nem mais tarde, para desfrutar daquelas coisas ou acrescentar novas ao pouco espaço do móvel. Ele não abriria a gaveta e procuraria por coisas agressivamente, ou jogaria outras desorganizadamente ali, sem que Rosalie realmente preocupasse-se em checar do que se tratava.

E ainda havia o guarda-roupas em que pouco havia reparado ainda agora, ao lado do seu, onde estavam as tantas roupas que não haviam mais razão de estar ali - a não ser lembrá-la do fardo de que a vida livrara-se por ela -, assim como todas as outras coisas que poderiam estar pelo cômodo e pela casa inteira.

Bem, isso significava, Hale pensou ao sentar-se na cama arrumada, que poderia livrar-se de tudo aquilo quando quisesse - o quanto antes.

Decerto, haviam algumas coisas que teria a "delicadeza" de separar para a família dele - mais a título de cortesia e respeito, de alguma forma, à possível dor da perda em geral, do que por sentir o mesmo -, até porque talvez assim não precisasse justificar à Sra. King o que havia feito com o restante das coisas. Isso porque não tinha certeza de como ela poderia reagir à ideia de doação àquela altura - se defenderia que o bom caratismo de seu filho teria feito o mesmo, ou se prezaria demais pelas lembranças ao ponto de repudiar o pensamento de desfazer-se das coisas dele.

De toda forma, poderia pensar sobre essa parte depois - talvez até mesmo ler a resposta na reação dela quando entregasse-lhe o que havia separado para a família. Por ora, Rosalie deixava a suíte principal de pés descalços, a passos apressados e um sorriso breve de satisfação nos lábios corados, esquecendo-se completamente do café da manhã quando passara pela cozinha para procurar por caixas de papelão vazias em que pudesse separar e organizar todas as coisas de Royce que achasse pela casa.

(...)

Não muito distante dali, Emmett tentava se concentrar no alto do telhado da garagem, onde estava apoiado encarregando-se de desencarrilhar os pequenos lotes de folhas que haviam acumulado-se em algumas partes por ali no outono passado. Os braços fortes davam a ele a maior parte do apoio e estavam à mostra pelo uso da regata branca levemente surrada, enquanto as mãos e os olhos trabalhavam movendo-se daqui pra lá, assim como os pés, que às vezes desciam da escada de madeira pra movê-la pra outro canto. 

Pela inclinação do telhado não havia tanto o que fazer ali, mas ainda assim, sempre que estava em casa aos fins de semana e não tão cansado - mentalmente -quanto de costume, era de seu feitio tentar ocupar-se com alguma coisa que parecesse útil, e que também o fizesse gastar alguma energia física. Sempre gostara de se exercitar, liberar energia do corpo - coisa na qual o exército sempre lhe servira muito bem, aliás -, e portanto, não querendo repetir a corrida que havia feito pelo quarteirão na semana anterior, aquilo parecera-lhe o mais perto do que queria e da utilidade que procurava.

Além de que, aquela havia sido também uma coisa que, apesar do caráter comumente introdutório da primeira sessão de terapia, seu terapeuta havia incentivado-o a fazer quando ele mencionara a recorrência das memórias do trauma nos últimos tempos e a sensação de precisar canalizar aquela agitação para algum lugar, ao mesmo tempo em que admitiu sentir falta do vigor físico da rotina do quartel. Aquela era mais uma coisa agitando seus pensamentos, mas agora positivamente: Emmett estava realmente empolgado com a ideia da terapia e assim, ansioso pela segunda sessão.

O Sol estava razoavelmente forte, mas não o suficiente para sentir que suas costas queimavam: só para que tivesse de puxar o pano em seu ombro para secar o rosto algumas vezes, e erguesse um dos braços em frente aos olhos quando procurava o Sol no céu, tentando checar se havia se passado tempo demais. Às vezes ele tornava a pensar que Esme apareceria na porta pedindo pra que ele descesse, alertando sobre o Sol e dizendo que aquilo não era necessário e já estava há tempo demais ali, enquanto Carlisle se via obrigado a concordar sobre as queimaduras de Sol a que estava vulnerável. 

Mas, Esme havia acompanhado Alice e Jasper na decisão de algumas das últimas coisas sobre o casamento - que Emmett não havia prestado muita atenção - e Carlisle havia ido visitar um paciente, então aqueles provavelmente eram só alternativas que a parte alerta de sua consciência havia encontrado para lembrá-lo dos cuidados que ainda deveria ter ali. Principalmente quando sua mente estava cheia de lembranças e pensamentos que não tinham nada a ver com qualquer uma daquelas coisas. 

De novo, haviam acontecido tantas coisas. Ele não só não havia conseguido falar sobre o beijo com ela, como quando pensara que teria uma chance, tudo acontecera numa noite só. De repente, Royce estava morto e ela estivera chorando em seus braços duas vezes, entre as quais haviam tido uma conversa aparentemente leve em seu carro - mas que assim como o abraço e tantas coisas entre eles, Emmett não entendia o quanto poderia considerar. Afinal, ao menos não enquanto ela estivesse naquele estado - qualquer que fosse ele. 

De qualquer forma, era sempre a mesma lembrança que voltava à sua cabeça - quando esforçava-se para entender as outras coisas e quando desistia delas também. 

Ele lembrava-se de ter estado perto demais dela quando notou, ainda com as mãos nos botões da camisa que vestia, analisando o rosto dela sem perceber. Sua boca perfeitamente avermelhada estava entreaberta, o olhar castanho claro tão fixo no seu quanto o caminho inverso - como se sair daquele alvo fosse fazê-los desmoronar ali mesmo. De repente, tentar esquivar-se ou esconder qualquer coisa parecia ter sido ridiculamente em vão.

A pele macia da mão dela tocando na sua discretamente e depois ambas entrelaçando-se com harmonia. O perfume dela tornando-se cada vez mais inebriante conforme aproximava-se de seu rosto, os detalhes perfeitos mais nítidos, e esquecendo-se do tempo quando os lábios se encontraram, levemente hesitantes primeiro, e depois em sintonia. Era realmente como se todos os fios que faziam seus pensamentos correrem na cabeça tivessem se desconectado, fazendo dele uma escuridão onde os flashes cegos eram as sensações muito mais vivas sendo sentidas. Todo o caos havia ido embora e tudo estava...

—Distraído, Emmett? 

Num estalo, a voz de Rosalie chegou aos seus ouvidos, fazendo-o sobressaltar-se na escada e recuar, descendo um degrau de repente. Ela pareceu rir discretamente.

—Ah, ei, Rose. - ele sorriu, com um leve ar de riso e recompondo-se enquanto descia o restante dos degraus e colocava os pés no chão, remexendo o pano que pendia por seu ombro - Eu não te vi, estava realmente concentrado ali. - mentiu, torcendo o pedaço de tecido nas mãos antes de levá-las à altura do cinto da calça que vestia, fechando-as em punho num apoio. 

—Tudo bem, eu percebi. - ela arriscou um sorriso leve, reassegurando a caixa em seus braços, pela qual ele notou que haviam outras aos seus pés, perto da entrada da casa - Sabe se meu pai está em casa? - continuou soando suavemente alegre, a todo momento reforçando o olhar no rosto dele, sem querer deixar-se desviar para o resto.

Como, por exemplo, a forma como os braços dele estavam à mostra demais e marcando seu abdômen aqui e ali, tudo pela regata branca que usava - e que agora, aliás, tinha certeza de nunca tê-lo visto usando. 

Mas, pensando no rosto, com os olhos ali, ela viu que as íris azuis dele se abrilhantavam um pouco pelo toque do Sol, que os lábios estavam secos e marcados, os cabelos curtos pouco bagunçados e a pele à margem de sua testa e têmporas cintilava um pouco pelo suor do trabalho e do calor consequentes ali.

—Ah, não, ele foi visitar um paciente. - o moreno gesticulou um pouco, girando o tecido entre os dedos e erguendo-o até o rosto em meio ao inspirar profundo, secando a umidade mais uma vez - Oh, é claro, precisa de ajuda com isso? Desculpe, eu... - ele começou a se desculpar pela indelicadeza em tê-la deixando com aquele "esforço", imediatamente tornando o pano para cima do ombro e apressando-se na direção dela para pegar a caixa que segurava. 

—Pare com isso, está tudo bem. - a loira riu, dispensando as desculpas mesmo quando ele já estava levando aquela e outras duas caixas para dentro. Duas empilhadas em um braço, com o apoio do corpo para assegurar e outra encaixada entre as costelas e o outro braço - Na verdade, eu ia colocar essas no carro... - hesitou, fazendo-o parar a meio caminho do hall de entrada da casa - Se Carlisle estivesse aqui, porque são as coisas de Royce, que resolvi doar para um abrigo que ele conhece. 

—Ah, sim. - ele assentiu, voltando para perto dela, mas sem dispensar nenhuma caixa no chão, só fazendo-as saltarem milímetros em seus braços com um movimento que fizera para garantir que não iriam escorregar - Nesse caso, eu posso levar você, ajudar-te se quiser. - ele hesitou um pouco, franzindo o cenho com a incerteza se ela aceitaria ou se teria sido uma péssima ideia.

—Tem certeza? - ela hesitou também, apesar de ter deixado escapar um tom de alívio em sua voz e expressão, quando analisou-o rapidamente e depois olhou para a escada apoiada numa das paredes da garagem - Eu não quero atrapalhar. 

—Pare com isso. - o ex-soldado repetiu a fala anterior dela, sorrindo de um modo divertido que fez suas covinhas aparecerem e os olhos estreitarem, enquanto movia-se para a frente da garagem, onde deixou as caixas antes de voltar até ela, que segurava um sorriso, incerta.

—Olhe, se atrapalhasse eu não estaria oferecendo, está bem? Só preciso de alguns minutos pra tomar um banho e colocar uma roupa decente. - ele gesticulou para si mesmo, passando as mãos pela regata como que para livrá-las do pó.

—Se você diz, obrigada. - ela sorriu de novo, mais suavemente dessa vez, unindo as mãos em frente ao corpo com um quê de ansiedade discreto - Eu vou colocando-as na garagem. 

E com isso, Emmett trouxera todas as cinco caixas para a beira da garagem e tratou de recolher a escada e as outras poucas coisas que havia utilizado naquela tarefa do telhado, colocando-as de volta em seus devidos lugares em pouco menos de quatro minutos. Rosalie, que durante esse tempo, de repente, tinha preferido ir tomar um copo de água, suco, ou qualquer coisa desse tipo na cozinha, voltara para o lado de fora "coincidentemente" no mesmo momento em que ele entrava na casa, a tempo de avisá-la que estaria de volta logo. 

(...)

Apesar das horas dizerem que haviam passado-se só trinta minutos, parecera um tempo considerável até que estivessem finalmente visualizando a fachada simples do abrigo, ainda acomodados no Jeep de Emmett, que estacionava-o em silêncio. As caixas estavam uma sobre as pernas de Rosalie no banco do passageiro e as outras quatro distribuídas entre o banco e o chão traseiros - quatro delas seriam destinadas ao abrigo e uma à família de Royce.

—Eu não sabia que ele ainda vinha aqui. - o de olhos azuis comentou ao sair do carro e mover-se para abrir a porta para ela, que acenou com a cabeça em agradecimento, mas não disse nada sobre seu comentário, em dúvida - Carlisle. - ele enfatizou, inclinando-se para dentro do carro para pegar algumas caixas.

—Ainda? - Hale oscilou de novo, arqueando uma das sobrancelhas enquanto pedia, com os braços estendidos, que ele lhe desse mais uma caixa. No processo, os olhos dele cruzaram os seus e ele ergueu ambas as sobrancelhas antes de dirigir um olhar para a fachada, e ela não soube dizer se ele sorriria ou só estava pensando, quando entendeu - Ah, esse é o mesmo que...? - ela imediatamente piscou muitas vezes, balançando a cabeça da entrada para ele, sugerindo.

Mas, não soube ler a expressão dele tão bem para dizer se deveria começar a repreender a si mesma pela ideia de tê-lo trazido consigo agora ou mais tarde.

—É. - ele assentiu e passou os lábios um pelo outro antes de curvar sutilmente o canto direito dos lábios, sorrindo pouco - Não está tão diferente do que eu me lembrava, pra dizer a verdade. Mas, certamente melhor. - inclinou a cabeça de leve para um dos lados, negando com a cabeça quando ela continuou a estender os dedos para outra caixa.

—Talvez seja só a minha visão. - e simulou um riso baixo - Vamos, eu volto para pegar essas.

—Tudo bem, talvez nem precise. Ouvi dizer que precisamos perguntar primeiro se estão aceitando doações. - a loira comentou, mais a tom de opinião do que de conclusão, olhando de relance para a figura alta ao seu lado.

—Eles sempre aceitam doações, Rose. Esse tipo de lugar vive disso. - ele esboçou um sorriso outra vez, acenando com a cabeça para que ela passasse primeiro às escadas que precediam a porta de entrada. 

E assim, encaminharam-se para o lado de dentro, passando pelas portas duplas - feitas de algum tipo de metal onde se encaixavam frestas de vidro.

Dali, deram de cara com um pequeno hall, com paredes de tijolos pintados de branco à toda volta, algumas plantas sem floreio decorando aqui e ali e um balcão amadeirado simples ao meio, atrás do qual sentava-se um homem de meia-idade usando óculos e trajando um uniforme simplório - calças cargo esverdeadas e uma camisa social não acinturada ao seu corpo, na cor cinza. Por cima do bolso à altura de seu peito esquerdo estava costurada uma placa onde lia-se "Parker", para a qual os dois à sua frente voltaram os olhos.

—Boa tarde. - ele sorriu levemente, erguendo os óculos de aro prateado e olhando de um para o outro - Como posso ajudar?

—Nós viemos fazer algumas doações. - Emmett respondeu, olhando das caixas em seus braços para a que aquela ao seu lado segurava.

—Ah, isso é ótimo! Venham comigo, vou levá-los até uma sala e podemos pegar os nomes de vocês, se quiserem, é claro. - ele falava ansiosamente, gesticulando enquanto saía de trás do balcão para guiá-los por um corredor curto à direita, igualmente branco, por onde encontrava-se só duas portas de madeira clara - Desculpe, você é a Senhorita Cullen, não é? Filha do Doutor Cullen? - ele parou por um momento, virando-se para Rosalie com uma expressão de dúvida - Que era ainda há pouco...

—Sim, sou eu. - ela assentiu depressa, antes que ele mencionasse "Sra. King II", e sorrindo gentilmente para o semblante também sorridente dele.

—Ah, eu sabia! A senhorita se parece muito com seu pai, sabe? - ele sorriu mais, assentindo para si mesmo e depois girando a chave numa porta. Ela e McCarty se entreolharam sorrindo discretamente - É um prazer vê-la aqui, seu pai sempre vem, desde que me lembro. Um homem muito bom aquele, ah sim. E é claro, que indelicadeza a minha, sinto muito pelo seu marido.

Rosalie murmurou um obrigada à título de cortesia enquanto ele balançava o molho de chaves outra vez, e quando finalmente adentraram pela porta agora aberta, havia uma sala bem pequena - era só o suficiente para caber uma escrivaninha com uma cadeira de plástico, um armário de uma porta só ao lado da janela e um vaso ao lado da porta, onde uma bela Avenca coloria o ambiente com seu verde vivo.

Enquanto Sr. Parker remexia nas gavetas, trazendo uma pasta e papéis para um lado em cima da mesa, ele continuava a falar e Rosalie e Emmett permaneciam parados, agora tendo deixado algumas caixas sobre o outro canto da mesa e a cadeira à frente dela.

—Vocês sabem, esse lugar fica cheio durante certas temporadas - acabamos de receber tanta gente no inverno e outono -, mas nunca deixamos realmente de receber pessoas. Todos os dias, por aquela porta à esquerda da recepção que vocês viram, é um espaço enorme e dezenas de camas ficam ocupadas. Todos os tipos de rapazes vêm, até mesmo veteranos de guerra, sabem? Embora eu ache que esses diminuíram conforme passam os anos desde o fim da guerra. - ele inclinou a cabeça para um lado enquanto falava, e a loira conteve o impulso de checar o ex-soldado ao seu lado, que conforme ouvia o senhor tagarelar incansável, lembrava-se como confirmação de todas as coisas que ele estava dizendo.

—Ainda assim, são realmente muitos, sabem. Às vezes fazemos noites de comida comunitária também, só é uma pena que eles tenham que ir embora pela manhã. - ele suspirou com pesar, sentando-se na cadeira de plástico e tirando alguns papéis da pasta, checando-os e ajeitando os óculos para isso - De toda forma, isso vai ajudar bastante, realmente muito. - e sorriu, levantando-se para deslizar os papéis para eles.

Depois de terem assinado uma pequena ficha e Rosalie dito que estava tudo bem que seu nome fosse mencionado naqueles papéis ou à quem quer que perguntasse sobre o remetente da doação, Emmett voltou ao carro no meio tempo para pegar a última caixa e Parker enfim acompanhou-os de volta à recepção, agradecendo diversas vezes e perguntando se gostariam de ver o grande galpão reformado onde ficavam as camas - enquanto já se aproximava da porta e punha a mão na maçaneta, muito sugestivamente.

Sem muitas alternativas, os dois assentiram e deram de cara com o vasto espaço, apresentado pelas palavras do senhor muito dedicado a contar mais sobre a reforma feita há poucas semanas, segundo ele. As paredes também eram brancas, o piso era de um bege riscado e as camas eram beliches muito simples, com sustentação de madeira clara e colchões e travesseiros forrados em azul marinho, todos iguais. Em uma das paredes abria-se uma porta para um banheiro que, por dentro, dividia-se em várias cabines com toiletes separados um do outro pelo drywall, e nas outras haviam alguns ventiladores e avisos que também estavam nos pilares, pintados de bege até o meio.

Enquanto corria os olhos por ali, Emmett concluíra que apesar da reforma, a estrutura das coisas não havia mudado tanto, afinal. Ele ainda se lembrava de pegar sempre uma das camas mais ao canto sul no frio - porque o vento da porta, que abriam algumas vezes durante a noite, nunca chegava ali -, e o contrário no calor. Isso quando, ele se lembrava em silêncio, tudo não ficava lotado demais para ter o privilégio de escolher, e então ele dormia em qualquer uma daquelas, depois de passar horas na fila do lado de fora.

Parker tinha razão: o lugar ficava lotado em grande parte das vezes nas estações mais frias - que Emmett, inclusive, havia aprendido a detestar. Isso porque a sensação dos dedos e depois dos ossos congelando aos poucos, e ao mesmo tempo rápido demais, impedindo-o de se mover e chegando à sua cabeça como se estivesse em algum lugar tênue entre o pensamento vago e a inconsciência, era definitivamente a pior que havia experimentado, talvez o mais perto que estivera de desistir de relutar.

É claro que também havia presenciado cenas não tão acolhedoras ou felizes naquele lugar pelo qual vagava os olhos muito claros, tão diferentemente do que fizera na última vez - que sequer tinha certeza de quando havia sido, na verdade. Mas, estava feliz por ver a melhora que fora feita ali, pelas doações de Rosalie - porque sabia a diferença que fariam - e, apesar de incerto sobre o que significara quando Parker dizia que o número de veteranos aparentemente havia diminuído por ali, contente por estar de volta de uma maneira e por motivos tão diferentes do que um dia já havia imaginado.

Quando enfim voltavam para o carro, acenando e sorrindo de volta aos agradecimentos de Parker na porta da frente, Emmett suspirou e finalmente disse algo, sob o olhar ameno, mas levemente aflito, de Rosalie, que não tinha certeza do que esperava. 

—Está mesmo um pouco diferente. - comentou, assentindo com um sorriso breve enquanto admirava uma última vez as paredes e fachada do lugar, voltando a mente para Parker e as coisas que ele havia dito - Ainda lembro das filas que vinham até ali algumas noites, - ele apontou para a segunda janela à esquerda - e a única ansiedade que me lembro de sentir, pra garantir um lugar, e com sorte, uma manta pra dormir. 

Ele parecia refazer a cena com os olhos vidrados no ponto para o qual havia apontado e depois na fachada - que ainda era a mesma -, e manteve os lábios entreabertos como se fosse dizer mais alguma coisa, mas fechou-os depois. Moveu-se no assento e girou a chave na ignição, deixando algum silêncio entre ele e a loira ao seu lado, que franzia a testa com um ar preocupado, que forçou-se a amenizar no instante seguinte. Virou-se para o lado oposto ao dele, correndo os olhos pela rua, mas voltou a encará-lo diante do silêncio.

—Está tudo bem? - ela perguntou, de repente, recolhendo as mãos para o colo.

Emmett virou o rosto para o dela enquanto maneava a direção, vendo, apesar dos esforços, a leve preocupação no modo como erguia os olhos castanhos para os seus.

—Sim. - ele assentiu com a cabeça e um meio sorriso, como se agradecesse também, e virando a atenção de volta para as ruas - Você?

—Sim, ótima. - ela assentiu também, sabendo do que ele estava falando - Pelo menos agora ele vai fazer algo bom, uma vez, não em vida e indiretamente, mas ainda assim. - deu de ombros, sorrindo ironicamente e Emmett concordou com a cabeça.

—Você fez isso também, mais que ele. - acrescentou, olhando de relance para ela, que pareceu pensar um instante antes de responder, inclinando a cabeça para um dos lados com um esboço de sorriso nos lábios, concordando um momento.

Noutro segundo, Rosalie passou os lábios um pelo outro e virou-se para Emmett. Com um impulso, tocou a mão dele sobre o volante, e disse:

—Obrigada por ter vindo. 


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