Luzes Extraordinárias escrita por Kika EDF


Capítulo 1
Capítulo Único - Primeiro Inverno em Eldarya




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Após abrir o armário de madeira, observo por um momento os riscos na parte interna da porta que haviam se tornado o meu calendário. Se minhas contas e marcações estivessem corretas, era véspera de natal, ainda que não parecesse pela falta de decoração no QG.

— Você riscou a porta do armário? - A voz de Ezarel me dá um bom susto, afinal, não me lembrava de tê-lo convidado a vir até o meu quarto.

— O que está fazendo aqui? - Tento fechar a porta do armário, mas ele a segura com firmeza.

— Essa madeira foi entalhada a mão, levei horas supervisionando tudo, como pode desconsiderar assim todo o esforço do meu trabalho? - Ele parecia ofendido.

— Eu precisava de um calendário. - Dei de ombros, optando por simplesmente dizer a verdade da situação.

— E não pensou em usar um pergaminho? - Solto um longo suspiro.

Não, eu não tinha pensado em usar um pergaminho. Pensar em soluções simples nunca foi bem a minha praia. Mas, é claro, ele não precisava saber disso.

— Eu era uma prisioneira aqui, achei que fazer riscos para demarcar a passagem do tempo faria sentido e riscar a parede me pareceu sei lá, muito bárbaro. - Ele me encarou como se dissesse com o olhar ‘E riscar o armário não?’.

Me mantive séria, firme no meu argumento mal arranjado e decidi desviar a atenção.

— Mas então, é véspera de natal, hein? Não vai ter nenhuma comemoração? - Minha animação forçada ao dizer aquilo devia ser muito evidente, mas eu não me importava. - Nada de peru? Pavê? - Ele devia lutar consigo mesmo para não fazer a piada mais típica de todas, se é que a conhecia.

— Que tal perguntar para a Miiko? - O olhar dele assumiu um ar maligno e ele não me deu chance de refutar a ideia, que só me colocaria em maus lençóis, me arrastando pelo braço para fora do quarto, rumo à sala de cristal.

— É mesmo necessário? Podemos fazer uma ceia de natal surpresa! - A ideia foi ignorada e logo estávamos diante do meu pior pesadelo, da raiva encarnada, daquela que podia ser nomeada de inúmeras formas mal criadas.

— Safira quer fazer uma ceia de natal. - Uma frase simples, dita despretensiosamente por Ezarel, mas que se parecia como uma sentença de morte.

Miiko me encarou como se eu fosse um verme minúsculo desperdiçando o seu precioso tempo com vontades supérfluas.

— Ceia de natal? Considerando a nossa dificuldade em obter alimento e o fato de precisarmos racioná-lo, acha mesmo que isso seria uma ideia viável? - E, é claro, ela não tinha terminado. - O natal é um conceito plenamente humano, não vejo motivos para que nós o celebremos.

Ótimo, seria quase a mesma discussão de quando precisara de itens indispensáveis para o quarto. Pra quê colchão? Durma no chão duro mesmo. Coisas nesse estilo.

— Mas o natal, assim com o ano novo, são períodos que servem para renovar nossas esperanças e sonhos, são momentos para vermos tudo com mais magia. Num lugar afetado por tantos problemas quanto aqui, não seriam datas importantes para melhorar os ânimos de todos? - Ótimos argumentos, realmente merecia uma parabenização interna.

Por sorte, ao menos para mim, foi durante o meu breve discurso que Kero e Alajaé chegaram e minhas palavras instigaram a curiosidade, principalmente desta última.

— Natal? E o que seria o natal? E isso de ano novo? - As perguntas só não eram mais rápidas do que as seguiria. - São tradições humanas não é mesmo? Acho que já li algo a respeito nos livros, li um uma vez com contos tão bonitos sobre árvores grandiosas e florestas com frutas fáceis de pegar… - Ela parecia encantada.

— Seria mesmo um conceito interessante, esse que a Safira propôs. - Kero não poderia pensar diferente.

— Estão falando mesmo sério sobre isso? Não temos provisões suficiente para algo desse nível. - Miiko obviamente não gostava do rumo que a conversa estava tomando.

— Podemos fazer algo mais simples, ou então, mandar uma equipe para buscar suprimentos especialmente para isso, eu com toda certeza… - Erguendo a mão, Miiko me fez parar de falar.

— Você não vai a lugar algum, se quer mesmo fazer uma ceia de natal e qualquer coisa que seja para o ano novo, vai ficar responsável por tudo, assim como todos vocês. - Ninguém discutiria.

E, para o azar deles, Nevra e Valkyon chegam neste exato instante e não escapam do olhar de Miiko.

— E isso vale para vocês dois também, não quero ser incomodada com esse assunto novamente. - Virando as costas sem esperar resposta, ela se afastou rapidamente.

— Do que ela está falando? - Nevra provavelmente não gostaria de todo o trabalho que eu havia conseguido para todos.

— Vamos fazer uma ceia de natal e uma festa de ano novo! - Estando ou não animada, eu precisava parecer estar. - E precisaremos de mais ajuda, Alajaé, junte os outros para começarmos a organizar tudo, não esqueça de chamar a Laizah, Thaina, Isabella, Specttra, Morigan e Miunalee. - Todos me encararam por um segundo. - O que foi? Precisamos de toda a ajuda possível, aliás, se achar mais alguém pelo caminho, pode trazer também. - Alajaé saiu comentando sobre algo a que não me atentei muito e eu fui com os outros para a sala das portas, que era onde tudo acontecia basicamente.

— Vamos nos dividir em grupos, um para a decoração, um para buscar suprimentos para a ceia e um para preparar a comida, eu vou ficar nesse último. - Logo todos se separaram e Nevra estranhamente acabou comigo na cozinha, assim como Valkyon.

— Parecia a tarefa mais fácil e de melhor companhia. - Comentou Nevra com um sorriso sedutor.

— Não entendo como isso possa ser considerado fácil. - Valkyon queria ir na missão de busca a suprimentos e eu não sabia como exatamente ele tinha ido parar ali.

— Talvez seja porquê, agora, sem comida nenhuma para preparar, vamos ficar apenas esperando e separando utensílios… Mas não se preocupem, a mesa precisa ser arrumada também. - Os fatos não poderiam ser negados.

— Mas a mesa é uma parte importante da decoração, então é tarefa desse grupo. - O sorriso matreiro se mantinha.

— Concordo com ele. - Valkion só falava quando convinha a ele, era impressionante.

Mas não ficamos muito tempo sem ter o que fazer, logo os mantimentos chegaram e o trabalho começou realmente. Quando terminamos, a decoração também já estava pronta.

Laizah, Morigan e Specttra tinham organizado tudo muito bem nesse quesito e Miunalee tinha adorado ir na missão de busca de mantimentos junto com Isabella e Thaina, Alajaé de alguma maneira tinha escapado do trabalho e Kero fazia um pouco de tudo, enquanto Ezarel dava uma de supervisor. A fartura de alimentos fez com que outros habitantes do QG aparecessem para a ceia e a noite de natal foi ótima, com direito a algumas músicas natalinas cantadas de improviso.

O dia seguinte foi de arrumação, já que o ano novo estava próximo e eu tratei de organizar tudo, com o auxílio que tinha – no que se excetuava apenas a Miiko – e quando o último dia chegou, todos se recolheram para escolher os trajes com os quais passariam a virada de ano.

Tinha falado um pouco sobre o significado das cores, mas ninguém havia revelado qual traje iria escolher, quanto a mim, coloquei um vestido rosa e dei uma boa ajeitada no cabelo antes de sair para ir encontrar com os outros no refeitório já todo decorado.

— Feliz ano novo! - Pelo menos assim me sentia um pouco mais em casa.

Dei uma olhada pelo lugar e todos já estavam ali, Nevra usava roupas vermelhas num tom vibrante como se gritasse paixão, Valkyon estava de dourado, cor que ficava muito boa nele por causa da pele bronzeada. Que beleza. Miiko estava vestida como sempre e eu nem me atrevi a ir até ela perguntar o motivo de não ter, pelo menos, mudado o visual um pouco – aparentemente ela adorava aquela paleta de cores -, Jamon estava de verde, Alajaé de rosa – como eu, mas, pelo menos, era um tom diferente – Kero estava de branco e Ezarel… Bom, ele não havia chegado ainda.

— Vermelho, cor da paixão. - Nevra surgiu do meu lado sussurrando isso ao meu ouvido, me dando um baita susto. - Espero não te assustar com toda a minha intensidade. - Ele sorriu, achando graça.

— Cuidado você para não se assustar com a minha intensidade, estou de rosa choque, então seria um amor bem vibrante. - Nada como a ousadia de fim de ano.

Nesse momento, Ezarel chega, vestido exatamente como de costume.

— O que foi? Ninguém me disse que eu teria que trocar de roupa. - Na verdade, eu tinha dito três vezes, mas obviamente ele tinha ignorado.

— Com medo de expressar o que sente pela cor da roupa? - Nevra provoca, sorrindo.

— Não preciso demonstrar nada por roupas, posso fazer isso sem elas. - Com certeza ele não tinha querido dizer o que eu achava que tinha, mas, ainda assim, minha mente viajava.

— Então… Querem champanhe? Aliás, alguém conseguiu trazer champanhe? - Mudança nada sutil de assunto.

— Eu consegui o champanhe! - Thaina já trazia a sua taça, vestindo preto.

— Hum… Bebidas alcoólicas com efeitos sugestivos, vou pegar um pouco para você. - Nevra se afastou, lançando um olhar ameaçador para Ezarel.

Consigo notar as cores usadas pelas outras pessoas também, Laizah vinha de vermelho, Specttra usava uma roupa bem reveladora branca, Morigan usava dourado, Miunalee estava de azul-escuro e Isabella trajava uma combinação de lilás com rosa.

— Eu tenho algo para mostrar. - Faltava exatamente um minuto para a meia-noite e Ezarel sai na frente.

Nos entreolhamos por um segundo antes de ir atrás dele, assim como todos os outros.

— Beba sem moderação. - Nevra me entrega uma taça de champanhe e nós paramos do lado de fora do QG. - O que estamos esperando? - Ele pergunta.

— Eu também não sei, Ezarel disse que preparou algo. - Eu comento, olhando ao redor.

E então, ouço um som conhecido, mas que jamais tinha pensado escutar em Eldarya, olho para cima sem acreditar e vejo diversos fogos de artifício explodindo no céu de um jeito esplêndido, ainda mais mágico do que seria na Terra.

— Não acredito! Você fez fogos de artifício! - Comento para Ezarel, que havia se aproximado.

— Que ofensa! Não são fogos de artifício, são muito melhores, não tem como comparar. - Ele faz cara de ofendido.

Eram brilhantes e explodiam no céu, pra mim, dava na mesma. Mas, os de Ezarel assumiam formatos diferentes e animados, coisa que eu não tinha a menor ideia de como ele tinha conseguido fazer, mas que foi realmente impressionante.

— Aceitarei todos os elogios que mereço. - Ele não mudaria nunca.

— Ah claro, você foi sensacional, supergênio da criação, óh grande e poderoso Ezarel elfo dos fogos de artifício com outro nome desconhecido ainda não dado. - Digo com muita afetação.

— Não são fogos de artifício! - Mas ele também não tinha dado um nome novo, aparentemente.

— Ah é? E o que são então? - Nevra perguntou, sem perder a chance.

— Luzes extraordinárias, esse é o nome! - Ezarel parecia satisfeito com o nome.

— Aposto que inventou isso agora. - Comento, sem conseguir me conter.

— Ele inventou o que? - Valkyon questiona, chegando no meio da conversa. - Mas, o que quero saber mesmo é qual de nós você vai escolher. - Todos ficam em silêncio, me encarando.

Ele só fala quando tem interesse. É inacreditável. Estou inconformada.

— Ah… Quem sabe no próximo ano vocês descobrem? - Saio o mais rápido que consigo de perto deles.


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