Run, Lily, Run escrita por Nymphadora


Capítulo 3
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Notas iniciais do capítulo

Hey
Tenho a sensação que este capítulo é um pouco confuso por acontecerem algumas revelações depressa demais mas era necessário e algumas coisas irão ser explicadas no futuro.
Espero que gostem
Xx
Nymphadora



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As memórias dos últimos acontecimentos estavam um pouco confusas na mente de Lily. Se era devido às noites mal dormidas ou às preocupações Lily não saberia dizer. Talvez fossem as duas. Suspirou, erguendo-se da cadeira de madeira desengonçada enquanto esfregava os olhos. Estava tão cansada. E quanto mais pensava na situação em que estavam mais cansada ficava. Um cansaço que se sentia nos ossos e em cada respiração que se dava. Lily nunca se apercebera que havia mais de uma maneira de se sentir cansada e agora que sabia podia dizer, sem dúvida alguma, que este era o pior tipo de cansaço. Harry dormia tranquilamente na cama. A sua pequena forma quase a desaparecer por baixo dos cobertores. Sirius dormia, ou fingia que dormia, ao lado dele. Um braço atrás da cabeça e uma mão pousada no peito, respirações lentas e pesadas. Ele sabia fingir, Lily pensou, ao contrário dela.

Contornou a cama no centro do quarto e caminhou na direção da porta escura na parede oposta. Precisava de um banho. Qual fora a última vez que se deixara ficar debaixo de um jato de água quente sem pensar em nada? Não se lembrava. Abriu a porta cuidadosamente tentando não acordar Harry e entrou. A pessoa que a encarou não se parecia nada com ela. Aproximou-se do espelho observando a maneira como a não-Lily também se aproximara. Olhos vermelhos e inchados com sombras escuras permanentemente ligadas a eles. E ela estava pálida. Um pálido doente que fazia as sardas que tinha espalhada pela face sobressaírem ainda mais. Merlin, no que é que ela se tornara? Víuva. Fechou os olhos passando as mãos pelos cabelos, desesperada. Mãe solteira.

Sirius estava no quarto ao lado. Harry estava no quarto ao lado. Não podia deixar o pouco controlo que tinha escapar por entre os seus dedos. Ela prometera a James que o choraria quando tudo estivesse acabado. E de momento tudo ainda estava como há 2 dias atrás. Dobrou-se para a frente agarrando cada lado do lavatório com as duas mãos, tão pálidas e marcadas como o resto dela. Inspira. Inspirou tremulamente. Lágrimas a acumularem-se nos olhos. Expira. Ela tentou mas o ar não queria sair. O ar não saía e a Lily que a encarava no espelho estava aterrorizada. Expira, Lily. Expira.  E o ar escapou. Juntamente com um soluço. E quando deu por isso estava a chorar agarrada ao lavatório sem se conseguir encarar nos olhos. Lágrimas banhavam-lhe a face e único pensamento coerente era que ela não podia acordar Harry. Arrastou-se em direção do chuveiro sentando-se debaixo dele deixando a água quente cair-lhe em cima. Em cima dela, das roupas, da confusão que era a vida dela. Em cima de tudo. Oh James. James. James. Abraçou-se e fingiu que as gotas que lhe escorriam pela cara eram apenas as gotas da água que caía do chuveiro. Oh James… Como é que ela acabara aqui?

(...)

Tinha sido somente no dia anterior que saíra do escritório de Dumbledore mas pareceram anos até que trespassou a ombreira da porta de entrada da casa onde iria ficar por uns tempos. Ela poderia um dia admitir que a casa era adorável. Paredes caiadas de amarelo claro e pequenos vasos com flores nas janelas. E apesar disto Lily odiava a casa. Odiava como parecia tão acolhedora e familiar. Odiava a casa porque não era a casa que James e ela escolheram para viver e criar Harry. Odiava a casa porque James não estava aqui com ela. E odiava a casa porque podia ser o sitio onde iriam morar nos próximos tempos mas nunca iria ser realmente casa.

Sirius passou por ela, Harry nos braços dele com a cabeça apoiada no ombro e olhos fechados. Harry com o cabelo negro rebelde e bracinhos gorduchos. Harry com a pele morena e nariz arrebitado. Harry com a sua gargalhada contagiosa e sorriso cheio de dentes. Harry órfão de pai. Sentiu os olhos de Sirius nela e evitando olhar para ele entrou dentro da residência. Oh James.

(...)

Abriu os olhos de repente. A água ainda caía em cima dela fria onde outrora fora quente. Fechou a torneira, atordoada. Esfregou os olhos e apesar de pouca sentiu a energia que ganhara no pouco tempo de sono que tivera expulsar o cansaço dela. Ou pelo menos tentar. Ergueu-se e saiu cuidadosamente da banheira. O vapor juntamente com a luz amarela que a lâmpada pendurada no teto emitia transformava o ambiente em algo mistico, onde algo poderia saltar por detrás do armário das toalhas ou de um dos cantos adornado com um vaso de flores gigante. As roupas colavam-se-lhe ao corpo e ela remexeu-se desconfortável.

Suspirou, pingando água e lágrimas até ao armário das toalhas. Não sabia quanto tempo estivera debaixo do chuveiro mas o suave ressonar de Harry ecoava pelo quarto ao lado quando ela abriu uma frincha da porta. A sombra de Sirius erguera-se da cama aonde estivera deitado e Lily podia observá-lo agora sentado onde ela se sentara. Cadeira voltada para a única janela, ligeiramente aberta, do quarto e a ponta do cigarro laranja a única fonte de luz na escuridão.

Fechou a porta lentamente atrás dela e encostando as costas à madeira fria deixou-se escorregar até as pernas cobertas pelas calças de pijama outrora azul claro onde agora eram azuis escuras ficarem estendidas à sua frente. A Lily do espelho acompanhou-a até desaparecer. A Lily real também por vezes tinha momentos em que lhe apetecia desaparecer mas tal vontade evaporava quando punha os olhos em Harry. Enterrou a cara nas mãos, a respiração visível no gelo da casa de banho. Sentia o fantasma dos braços de James à sua volta aquecendo-a por dentro de tal maneira que todas as dores que alguma vez sentira e todas as dores que alguma vez viria a sentir, mas especialmente as dores do dia 31 de outubro, limitaram-se a desaparecer.

(...)

Lily sabia, como sempre soubera desde o início bem no fundo do seu intimo, que este dia chegaria. Andara a evitar o inevitável, a confirmação do que já suspeitava à meses. Mas ela esperava que quando chegasse ela não estaria sozinha num mundo prestes a cair aos pedaços, memórias de tempos mais pacíficos estilhaçados e lançados ao vento. Mas ela não estava sozinha, pois não? Ela tinha James dentro dela, enrolado à volta da sua espinha mantendo-a de pé. James era os ossos que a sustentavam, o músculo que a revestia, a pele que a cobria. James era as cicatrizes e os sinais. James era as veias e o seu próprio sangue. James era Harry quando ele sorria e James era a pequena criatura que crescia na barriga dela. James era Sirius quando lhe contara a noticia com lágrimas nos olhos e James era Remus e o seu assombro. James era Lily com o teste na mão e olhos vermelhos. James era James. E James estava por toda a parte e se Lily fosse ser honesta tal facto estava a levá-la à loucura.

A gargalhada de Harry fez se ouvir, mais uma vez, pela casa. A casa amarela com vasos de flores à janela que nunca viria a ser casa mas que era onde eles iriam viver durante um longo tempo. Os passos pesados de Sirius ecoavam como trovões enquanto perseguia um  Harry de passos instáveis pelo corredor e Lily parou por momento para avaliar a situação em que estavam. Dois meses depois, que mais pareciam centenas de anos na sua humilde opinião, e eles estavam tal e qual como estavam no início. Sirius ainda dormia ao lado de Harry e Lily ainda se sentava na cadeira de madeira não pregando olho. Remus mal falava e Sirius aperfeiçoara a arte de fingir que dormia. A barriga dela começara a aparecer assim como as perguntas. E, por Merlin, como ela queria que tudo isto não passasse de um sonho.

“Feliz Natal Lils” Sirius dissera naquela manhã, uma sombra do homem que fora. “Feliz Natal, Sirius” ela respondera, uma triste amostra do que sobrara de Lily Evans-Potter.

As luzes da árvore de Natal refletiam na janela atrás dela numa explosão de cores e ela odiava-as. Lily vivia num mundo a preto branco onde as únicas cores eram pintadas pela covinha no queixo de James e pelo sinal na ponta do nariz de Harry.

(...)

Lily apresentava uma orgulhosa barriga de 6 meses quando foram obrigados a fugir. A mão rechonchuda de Harry apertada na mão esquerda dela e a varinha pronta na outra. O ano era 1982 e Voldemort continuava investido na tarefa de matar Harry Potter. Não que ela não estivesse à espera disso. Durante os meses que estivera presa naquela casa guardara tudo que pudera guardar sem levantar suspeitas dentro de uma pequena bolsinha. Roupas, livros, poções. Dinheiro. Lily estava pronta, ou assim ela achava.

Estava deitada na cama com Harry ao seu lado, um livro aberto entre eles. As imagens mexiam-se e Harry tocava-lhes admirado. O seu pequeno anjo surpreso com desenhos coloridos num livro tal e qual como ele costumava ficar quando James lançava pequenos laivos de fumo das cores do arco íris. O bebé remexia-se dentro dela como se também ele pudesse ver a alegria do irmão mais velho e Lily sorriu. Os irmãos Potter iriam ser uma força da natureza, ela sabia como sabia quando Harry precisava dela. Intuição de mãe, Margaret Evans costumava dizer, não falha. Lily podia saber muitas coisas mas Lily não sabia se o pequeno ser humano a crescer dentro dela iria ser uma menina de cabelos cor de cobre e olhos brilhantes ou um rapazinho tão moreno como o irmão mais velho, e como o pai a consciência dela suspirou. E como o pai, ela concordou.

Não havia fotos de James penduradas nas paredes ou sobre a lareira ou em qualquer um dos cômodos da casa. Não pudera trazer nada com ela de Godric’s Hollow mas Lily não precisa de fotos ou retratos para traçar o sorriso ligeiramente torto de James no ar ou para conhecer a forma dos ombros dele. Lily não precisa de nada para a lembrar da cicatriz que dividia a sobrancelha esquerda dele ou do cabelo que nunca assentava corretamente no topo da cabeça.

Lily tinha 22 anos recentemente feitos, um filho de quase dois anos e outro a caminho. E apesar do pouco tempo que passara desde 31 de outubro, 4 meses anjo, Lily sentia que envelhecera no mínimo 10 anos. A gargalhada de Harry acordou-a dos seus pensamentos e se Lily pudesse armazenar aquele som e ouvi-lo para o resto da sua vida ela fá-lo-ia.  Mas misturado com o riso de Harry vinham gritos de desespero que lhe congelaram o sangue. A alegria de Harry ainda ecoava nas paredes do quarto quando ela se levantou desajeitadamente, agarrando a bolsinha da gaveta da mesinha de cabeceira enfiando-a na bota direita e com a mão que não estava ocupada com a varinha prendeu a de Harry na dela.

Sons de luta perseguiram-nos pelo corredor. Podia ouvir Sirius a gritar feitiços e maldições e rezava para que nenhum mal caísse sobre ele. Eles tinham falado disto. Eles sabiam que tardava pouco para os encontrarem e se chegasse a tal Lily deveria pegar em Harry e fugir sem olhar para trás. A casa abanava com a força das explosões e luzes voavam por toda a parte. E, para surpresa dela, Harry não chorava. Olhos verdes inteligentes e pés ligeiros para um bebé de ano e meio. Lily ansiava para lhe pegar ao colo, as mãos inquietas para o agarrar, apertar, contra ela. E foi exatamente o que ela fez. A porta dos fundos um retângulo da cor do pôr do sol a meia dúzia de passos a última esperança deles para saírem daqui, porque para além do Fidelis pelo menos uma centena de outros feitiços protetores tinham sido lançados sobre a propriedade. Feitiços que a impediam de aparatar para fora dali. Feitiços que impediam que aparatassem para ali. Lily ultrapassou a ombreira da porta com Harry a puxar-lhe os cabelos e a balbuciar-lhe algo aos ouvidos. Então de onde é que eles apareceram?

A resposta esperava-a no seu quintal. Dumbledore encarava-a, olhos sem vida, a centímetros do chão. O vento frio de fevereiros a fazer-lhe as barbas brancas voar à sua volta como se de um halo se tratasse. O mundo à volta dela parou. As vozes e ruídos pareciam vir de longe, como se estivessem a milhares de metros dela ou como se ela estivesse debaixo de água. Longe, longe, longe. Perto, Lily, demasiado perto. Uma mão agarrou-lhe o cotovelo e como se fosse a sua deixa o mundo voltou a girar e os sons desmoronaram à sua volta. Remus apareceu no seu campo de visão. Um corte na bochecha e casaco feito em pedaços. Mas tirando isso ele parecia bem e Lily suspirou aliviada.

“Lily”, olhos desvairados e voz rouca. “Lily”, e ele continuava a repetir o nome dela como se de uma prece se tratasse. Como se se repetisse o nome dela as vezes suficiente isto tudo não passaria somente de um pesadelo e não da realidade. Ela arfou. A imagem de Dumbledore ainda desenhada nas suas pálpebras. “Lily” Remus rezava e Lily esperava que algum Deus lhe respondesse em vez dela, porque a sua língua estava presa e a mente em água. Foi então que Harry começara a chorar e com esse som Lily acordou para a realidade. Desviou o olhar de Remus, deixando o lobisomem guiá-la pelo cotovelo para longe do corpo flutuante de Dumbledore. Dos olhos azuis sem vida da última esperança de vencerem esta guerra. Oh James. O que é que eles iriam fazer agora?


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Notas finais do capítulo

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