O que não me disse escrita por Alice Alamo


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Meu Deus, que orgulho de mim que FINALMENTE consegui escrever uma fic do meu OTP. Nossa, que alívio!
Eu amo o casal, já li tudo deles e nunca tinha conseguido escrever nada sobre esses dois! Tenho acho que mais de cinco fics iniciadas no computador e travadas porque nunca conseguia terminar...



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/749546/chapter/1

Estávamos alinhados, como soldados de brinquedo na prateleira de uma garota mimada. Aliás, não haveria melhor definição para Saori do que essa, não é? De toda forma, todos os cavaleiros, bronze, prata e as amazonas estavam reunidos na entrada do santuário, divididos em dois lados, deixando uma fina passagem para a deusa que descia cerimonialmente os degraus das doze casas.

Ridículo.

Bufei. Shun, ao meu lado, tentou sorrir de forma encorajadora, como se se desculpasse por eu já estar entediado. Revirei os olhos e tentei parecer um pouco melhor, afinal, meu irmão não tinha culpa de eu odiar estar ali novamente.

A guerra santa havia acabado há menos de vinte dias, e o que menos queria era ter que ser obrigado a pisar no santuário, a encarar Saori como se o meu irmão não tivesse corrido um risco absurdo, como se meus amigos não tivessem quase morrido, como se nós não tivéssemos sofrido a morte dos cavaleiros de ouro, cada um deles, mesmo que Zeus os tivesse trazido de volta à vida depois.

— Não vai durar muito, Ikki — Shun tentou me tranquilizar. — Sabe que Saori precisa fazer isso para dar segurança aos demais.

Não respondi. De fato, eu entendia a lógica de Saori; como Athena, ela precisava daquele pequeno desfile idiota com os cavaleiros de ouro para mostrar que o santuário estava seguro, que tudo voltara ao normal, mas esse era o problema! Não importava quantas vezes ela dissesse que estava tudo bem, eu ainda teria pesadelos durante a noite, ainda abraçaria Shun como se Pandora fosse aparecer a qualquer momento para levá-lo de mim, minhas mãos ainda tremeriam quando eu me sentasse para meditar como Shaka havia tentado uma vez me ensinar, e meu coração ainda queimaria de raiva e desespero cada vez que me lembrasse da dor que senti quando soube da morte dele.

Transtorno pós traumático. Mu já havia feito o favor de me diagnosticar. Ainda assim, era difícil não querer fugir dali, correr até que o santuário não passasse de uma sombra no horizonte!

Fechei os olhos, respirei fundo e apertei minhas mãos com força assim que as vozes começaram a se manifestar. Cochichos e murmurinhos se tornaram gritos e exclamações calorosas quando Athena enfim chegou ao final das doze casas onde estávamos. Meu coração acelerou ao reconhecer os quatorze cosmos, Saori estava parada em frente de seus treze cavaleiros de ouro, até mesmo Kanon estava presente! Minha armadura pareceu mais pesada, como se o sangue de Shaka reconhecesse a proximidade de seu cavaleiro.

Firme, Ikki, firme!

Engoli em seco e ergui a cabeça, orgulhoso. Saori falava com delicadeza, a voz mansa e acolhedora, com a sabedoria da deusa. Bobagem para os que precisavam, não ouvi uma palavra. Em vez disso, preferi olhar os cavaleiros atrás dela.

Um ao lado do outro, na ordem de suas casas, com suas armaduras, deixavam um impacto forte, reforçavam a ideia de que estávamos seguros e protegidos. Mas não foram eles a morrer? Não foram justamente eles a ter que se sacrificar?!

Cada rosto ali dizia algo, era fácil identificar e ler seus sentimentos. Havia culpa e vergonha em Afrodite e Máscara da Morte, orgulho em Milo, Kanon, Aioria, serenidade em Mu, Saga, Aioros, frieza em Camus e Shura, alegria em Aldebaram e Dohko e... bem... Shaka? Não dava para dizer.

Shaka estava como eu me lembrava, e isso me trazia novamente as lembranças do sexto templo vazio, do quanto gritei contra aquelas malditas árvores, de como estraguei e queimei seu jardim quando a realidade de sua morte se abateu em mim. Ele estava com a armadura completa, incluindo o elmo. Seus olhos fechados me fizeram sorrir sem que eu percebesse, daria tudo para calar a boca de Saori, cruzar aquela curta distância e pedir que ele os abrisse, que me olhasse por alguns míseros segundos... As mãos estavam ao lado do corpo, segurando o rosário, contudo, havia certa tensão no modo como o fazia, um leve enrugar da testa que somente quem o encarasse por muito tempo poderia notar. Ele não concordava com o que Saori dizia ou também não desejava estar aqui.

De qualquer forma, odiava admitir que o ver, vivo, fazia aquela cerimônia valer a pena. Quando começaram novamente a andar, prendi o fôlego. Eles passariam por nós, e meu coração acelerava a cada passo, a cada metro que se esvaia entre nós.

Se Shaka tivesse o poder de desacelerar o tempo, eu diria que esse maldito arrogante o havia feito porque, para mim, tudo pareceu um filme lentamente rodado em frente aos meus olhos. Enquanto caminhava, o cosmo sereno oscilou por um momento, e ele ergueu a cabeça e a virou na minha direção. Ainda distante, percebi seus ombros relaxarem, o terço escorregou por seus dedos, mas ele o segurou no último momento. Não houve hesitação na marcha, ele continuava a andar, entretanto, os lábios finos se curvaram num leve e discreto sorriso, algo que eu nem mesmo sei dizer se foi parte ou não da minha imaginação. O cabelo loiro ainda comprido balançava um pouco com o andar e o vento, e senti a essência dos incensos que ele tanto acendia quando não mais de cinco passos nos separavam.

Se eu dissesse que a luz de todo o mundo sumiu, ninguém acreditaria, mas, na minha visão, era como se novamente eu estivesse cego, privado da visão, e somente a imagem de Shaka fosse visível. Ainda com a cabeça voltada para mim, vi quando os olhos se abriram minimamente, a poeira do chão se levantou pelo poder liberado, e o vento se expandiu e trouxe até mim mais do cosmo dele. Todos notariam que ele me olhava, afinal, os famosos olhos azuis celestiais e mortais do cavaleiro de Virgem estavam enfim abertos, mas... não importava.

Encarei-o de volta, como se pudéssemos nos comunicar com aquilo. Olhar para Shaka era como mergulhar em sua alma e se permitir se afogar sem medo da morte, era sentir o cosmo dele me tragando e envolvendo, era ter paz de espírito, era etéreo! Ser olhado por ele era ainda pior... Era pior porque era o oposto, me lembrava o terrestre, o modo faminto como nos beijávamos, o desespero das mãos em tocar a apertar cada parte do corpo, o suor que escorria pela pele alva dele que eu fazia questão de marcar! Era sentir o calor da minha constelação e querer que ele queimasse comigo! E... o mais triste, era lembrar a paixão e o desejo que compartilhamos um dia antes de sua morte, recordar que eu não tinha percebido todos os sinais de que algo estava errado. A forma desesperada e afoita com que me beijou e puxou para o interior do templo, a possessividade em me tocar, a intensidade nos gestos e nas palavras sussurradas que atravessavam seu habitual orgulho, o modo carente e tranquilo com que se deixou permanecer e adormecer nos meus braços até a manhã seguinte... tudo sem me contar que sabia sobre sua morte.

Havia culpa nos olhos azuis agora, assim como devia ter raiva e dor nos meus. Ele me negou a verdade! Será que tinha noção do quanto eu sofri encarando a maldita armadura de virgem no meio de um templo vazio? Será que sabia que meus pesadelos eram metade imaginando como teria sido sua morte?

Ele me olhou, ainda seguindo a marcha, e continuou a me olhar até que fosse obrigado a desviar voltar a cabeça para frente e fechar os olhos. E, quando ele o fez, voltei a enxergar, o mundo acelerou até a velocidade normal, tudo perdeu a graça.

Fechei os olhos e respirei fundo, obrigando-me a relaxar as mãos e a fingir que estava tudo bem. Shaka havia partido o meu coração e, ainda assim, eu estava ali, desejando-o como antes, como se meu coração fosse como a fênix e renascesse das cinzas, como se meu orgulho fosse nada e estivesse disposto a perdoá-lo por tudo!

Maldito arrogante filho da puta! Como eu podia ser tão tolo a ponto de amá-lo dessa forma?

— Ikki.

A voz dele fez meu corpo despertar. A cerimônia ainda tinha durado mais uma hora, mas eu não havia aguentado, abandonei-a logo após Shaka ter passado por mim. O campo de treino devastado pela batalha que tinha acontecido ali era vazio, e era também o último lugar que imaginei que alguém pudesse ir me buscar, ainda mais alguém como ele.

Não respondi, continuei deitado a olhar para o céu. Sua armadura fazia barulho enquanto se aproximava e se apoiava no que havia sobrado de uma pilastra.

— Não foi apropriado deixar Athena daquela forma — ele me repreendeu, severo.

— É disso mesmo que veio falar? — respondi, amargo, e ouvi o leve suspirar.

— Não me arrependo de minhas escolhas. — Ele abriu os olhos e me encarou, e eu vi cada sinal de dor que ele tentava esconder.

— Mentiu para mim. — Levantei, irritado, falando entredentes.

— Te poupei, não queria que sofresse por algo que ainda não tinha acontecido — ele se justificou, mas a confiança não existia como sempre em suas palavras.

— E que não aconteceria se eu estivesse lá! Se eu estivesse com você na hora! — gritei ao me aproximar, e ele não recuou, não baixou a cabeça, não fez nada a não ser me encarar como se me dissesse que eu sabia que aquilo não era verdade.

— Ikki...

— Você morreu. — Ri, amargo, e falar aquilo para ela era tão... estranho, trazia uma angústia, uma vontade de apertá-lo contra mim e me certificar de que nunca mais ele me escaparia! E o fiz, segurei seus braços com força, orgulhoso demais para abraçá-lo, saudoso demais para conseguir me manter longe. — Por Athena e todos os deuses, Shaka, você morreu! Escolheu morrer sem me falar!

— Não havia outra forma... — ele sussurrou, e eu soquei a pilastra atrás dele, mas ele já esperava isso, não chegou nem mesmo a piscar ou a se mover pelo susto. — Não havia outra forma — sussurrou, e a cada vez que a frase se repetia em minha mente eu socava a pedra fria.

Ele esperou, paciente como sempre, irritante como sempre, longos silenciosos minutos marcados somente pelo som oco da minha mão se cochando contra o mármore. Minha testa já estava apoiada em seu ombro antes que eu me desse conta enquanto que minha mão direita sangrava dos inúmeros golpes inúteis que havia disparado contra a pilastra.

Era como desabar diante de alguém superior, era como se despir de cada máscara, de cada armadura, e eu o odiava por isso.

— Você morreu, e doeu, Shaka... — sussurrei, o desespero criando garras afiadas para rasgar minha garganta e trazer lágrimas aos meus olhos. — Doeu muito.

Ele segurou minha mão machucada e a levou ao rosto; acariciar-lhe a face foi automático, e isso o fez soltar o ar, aliviado, enquanto que a outra mão apertava minhas costas e eliminava a distância entre nós que eu tanto tentava impor.

Dessa vez, diferente de todas as outras, foi ele que me abraçou, seus braços me rodearam com firmeza, como se o todo poderoso Shaka temesse que eu fosse rejeitá-lo, como eu deveria fazer! Mas não... eu o amava demais, como não entendia que podia, e sabia que ele também me amava! Por isso, mantive-me ali, o rosto na curva de seu pescoço, escondendo as lágrimas que o peito não conseguia mais conter e sentindo, com a mão em seu rosto, que não era o único a chorar em silêncio.

Maldito...

— Me perdoe, Ikki...

 

Deslizei minha mão do rosto à nuca dele e devolvi o abraço. Ele relaxou, as lágrimas ainda escorriam, eu conseguia sentir o coração dele bater forte contra a armadura, e era bem capaz de ele sentir o meu. Nada mais foi dito, o silêncio interrompido apenas por essas batidas já dizia tudo o que precisávamos por enquanto, e, para mim, não havia nada melhor do que ter a certeza, a cada novo pulsar, de que ele estava mesmo vivo...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado ;)
Beijoss