Foram duas semanas de aula em que Allison não prestava atenção em nada, nem mesmo nas pessoas que passavam por ela no corredor. Se tivesse ficado atenta às aleatoriedades da vida, teria percebido Lauren seguindo-a com o olhar pelos corredores apinhados de alunos apressados, onde um terço tinha sangue sobrenatural.

   Chloe foi a responsável por abrir os olhos da amiga para sua melancolia. A garota mal podia acreditar que duas semanas passaram tão rápido, e que logo viriam os testes. A professora passava a lista de chamada, e todos assinavam com seus números e sobrenomes.

   Allison leu a lista assim que chegou em suas mãos. Archer, Jacob. Ergueu os olhos, procurando um rosto novo, e viu três. Dois garotos e uma garota. Mordeu o lábio. “Quanto tempo eu dormi?”. Assinou o nome. Stilinski, Allison. A folha foi arrancada de sua mão por Thomas, que deixou um beijinho em sua bochecha antes de assinar e passar para o loiro, novo. Certo. Jacob Archer deveria ser o moreno de olhos azuis, sentado à sua esquerda. Encarou-o por um tempo. Archer.

   Ela tentava lembrar de onde aquele nome lhe era familiar. Olhou para Chloe, à sua direita, e sussurrou algo. Não foi suficiente para tirar a concentração da menina do loiro à sua frente, canhoto, que escrevia seu nome.

   A explicação da professora sobre o mundo pós-guerra continuava, e Allison se martirizava por nunca ter prestado atenção na maneira que Chloe babava pelo garoto novo. Segurou a risada até o fim da aula, e saiu apressada até o corredor, seguida pela amiga e Thomas.

   — Sua... cadela! — Ally empurrou o ombro de Chloe, gargalhando.

   — O quê? — perguntou, segurando o braço, como se tivesse doendo. — O que foi que eu fiz.

   — O menino novo! Você tá a fim dele.

   — Só viu isso agora, Ally? — Tom riu, abraçando a garota por cima dos ombros.

   — Ei! Não tô a fim de ninguém não, eu só gostei do cheiro dele. — murmurou a loira, baixando os olhos. — Só isso. Nem sei a cor dos olhos dele.

   — Eu gosto do cheiro da Allison. — Thomas aproximou o nariz do pescoço da morena, fazendo-a arrepiar e rir quando ele fungou ali.

   — Também não vi a cor dos olhos dele, como são?

   — Ah, são castanhos. — Chloe respondeu.

   — Você acabou de dizer que não sabia. — o garoto começou a gargalhar, andando devagar, puxando Allison, esperando Chloe acompanhá-los.

   — Er... — tentou dar uma desculpa, o que fez os outros dois rirem ainda mais.

   O trio foi empurrado por Benjamin, que começou a correr desesperado e desapareceu no corredor. Os três se encararam e esperaram algum sinal de perigo, mas não receberam nada. Allison ouviu novamente o barulho do vidro quebrando, e temeu desmaiar, mas não aconteceu.

   Ela parou de andar, enquanto uma enxurrada de alunos saía das salas. Ficou parada no mar de gente, enquanto Thomas e Chloe a puxavam para não ser pisoteada. O barulho sempre mais alto, mais alto, e ela nem mesmo entendia o que significava.

   — Ally! O que houve? — a voz de Chloe estava longe na mente de Allison, mas ela ainda conseguia diferenciar o vidro estilhaçando e o sinal escolar. — Ally!

   A morena respirou fundo algumas vezes, mas não conseguia afastar o péssimo pressentimento de algo ruim se aproximando. Olhou para os lados, como se sentisse uma sombra em seus ombros, mas não viu nada. Voltou a olhar para a dupla à sua frente, e o ruído tinha sumido.

   — Fiquei tonta. — mentiu. — Achei que ia desmaiar.

   — Ah. — Thomas ergueu uma sobrancelha.

   Era difícil saber se era mentira ou não, com o coração dela tão acelerado.

   — Você quer uma água? — perguntou a loira.

   — Não. Ela está bem. — respondeu uma garota às costas de Chloe, que fez os outros dois virarem e Allison arregalar os olhos para os o cabelo vermelho.

   Ela era real.

   Lauren estava bem ali, na sua frente, vestida de preto, como sempre, mesmo que Allison não tivesse notado ainda. Uma jaqueta de couro, camiseta do Pink Floyd e calça preta. Botinas escuras completavam a roupa, e ela tinha os braços cruzados.

   — E quem diabos é você? — perguntou Thomas.

   — Lauren. — Allison pareceu aliviada em falar o nome dela, agarrando-se em seus braços. A garota mais velha lhe deu suporte, mas não a deixou se aproximar.

   — Ela só teve um pressentimento. É normal. — respondeu a ruiva. — Ela precisa ocupar a mente com algo, urgente.

   — Lauren, Lauren ou outra Lauren? A que você falou, de cabelo vermelho? É ela mesma?

   — Em carne e osso. — respondeu a ruiva, rindo.

   — Certo, tô por fora, depois alguém pode me explicar? — Tom murmurou, vendo Allison se afastar de Lauren aos poucos.  

...

   Benjamin não apareceu no resto do dia, e, ao final da aula, todos se encaminharam para a saída, de volta para suas casas. Thomas foi andando com as garotas, Allison, Chloe e Lauren, e com o grupo da ruiva, a nova colega deles, a loira que Stilinski reconheceu na sala.

    — Essa é Allison. — apontou. — Chloe. Thomas.

   — Como sabe meu nome? — Thomas perguntou.

   — Que da hora! — Chloe gritou.

   — Victoria. — apontou para a loira, que acenou com a cabeça, dando um sorriso. — Rhodes.

   — Ashton. — Allison continuou. — É o capitão do time de lacrosse.

   — Sou. — respondeu o mais velho, sorrindo, ajeitando o topete para trás, mostrando propositalmente os músculos. — É um prazer conhecer vocês, agora precisamos nos apressar.

   Ninguém discutiu aquilo. Thomas estava intrigado, mas não discutiu. Conseguia sentir um cheiro diferente, mas não sabia discernir. Olhou para Chloe, que parecia ocupada demais encarando os músculos de Rhodes. Victoria olhava a todo momento para um anel no indicador, e Tom percebeu que os três tinham um anel igual, com uma pedra diferente. A de Victoria era vermelha, a de Rhodes era verde e a de Lauren era roxa. Engoliu em seco. Aquilo não podia ser coisa boa.

   O celular de Allison vibrou. Era uma mensagem de Joanne. Olhou para frente, evitando cair na frente dos outros, e abriu a mensagem.

“Papai pediu para te mandar essa mensagem. Tem algo errado com o Stiles”.

   Algo errado? Parou de andar, segurando o celular com força, para evitar que caísse. Uma voz se arrastou por sua mente, e por um segundo, ela a reconheceu.

   — Allison? — a voz de Thomas chamou.

   — Meu pai. — ela começou a correr.

   Nem percebeu que já estava na esquina de sua casa, e apenas escancarou a porta, encontrando uma comitiva de pessoas em volta da poltrona, com o pai de olhos vidrados encarando a parede e sussurrando coisas incompreensíveis. Liam e Hayden estavam ao lado de Scott e Malia. Pareciam ter perdido as esperanças de chamar a atenção de Stiles. Lauren e seu grupo chegaram logo depois dos lobisomens, encarando a garota correr para o pai, esbarrando em Benjamin de propósito.

   — Pai! — gritou.

   — Não adianta, Ally, nós já tentamos. — falou Joanne, segurando a mão de Hayden. — Todos nós tentamos.

   — O que aconteceu?

   — Ninguém sabe. — respondeu Isaac, aparecendo do nada na cozinha, trazendo Claudia no colo, que dormia. — Ela e Max vão lá pra casa. Se quiser vir.

   Ela negou, segurando as mãos do pai, cravadas nos braços da poltrona preta.

   — Vocês o encontraram assim? — perguntou ela, mordendo o lábio.  

   — Eu encontrei. — respondeu Scott. — Chamei o Ben pra ver se resolvíamos, mas nada adiantava. Não queríamos te deixar preocupada.

   — Eu estou preocupada com o vidro. — respondeu Allison, sem pensar, recebendo olhares de todos, principalmente de Lauren.

   — Vidro? — perguntou Chloe.

   — É. Um barulho. Nada demais. — sussurrou, sentando no chão, na frente do pai. — Como se estivesse quebrando.

   — A louca ouve vidro quebrando. — Ben começou a rir, cortado pelo tapa na cabeça, vindo direto do pai.

   — Cala a boca, Benjamin.

   — Foi mal. — ele cruzou os braços. — Já to indo. Não tem mais o que fazer aqui.

   Ele passou por todos, esperando que dissessem que ele podia ficar, mas não ouve pronunciamento sobre. Saiu, emburrado pela porta, enquanto Lauren puxava os outros dois.

   — Também vamos. Ah, Ally? — chamou a ruiva. — Posso conversar com você ali no canto?

   Ambas foram para um canto da sala, atraindo olhares novamente, agora mais de Chloe do que qualquer outro, enciumada.

   — Lembra que eu disse que você podia trazer sua mãe de volta? — sussurrou. — Responde apenas com sim ou não.

   — Sim.

   — Você pode. — a morena ia se pronunciar, mas a ruiva ergueu a mão. — Sim ou não, apenas. Espere. Olha só, existem riscos. Você sabe, qualquer ação contra a lei do universo pode acarretar em qualquer outra coisa ruim. Não sabe?

   — Sim.

   — É melhor atacarmos a raiz de todo problema. Você sabe o que é, não sabe?

   — Sim. — olhou para trás, para a família, que encarava ambas. — Eles estão ouvindo.

   — Só você. Por isso estão com essas caras. Eu sou feiticeira. Eles não conseguem nem me ver mexendo a boca. — riu. — Agora, vou indo. Nos vemos na escola amanhã?

    — Claro. — deixou Lauren ir embora, voltando a sentar de frente para o pai.

   — Acho que você vai ter que explicar pra todo mundo o que foi aquilo.

   Allison encarou Thomas, Chloe, Scott, Malia, Joanne, Liam, Hayden, Isaac com a irmã no colo. Eles precisavam saber. Contou.