Death's Whispering escrita por AloeGreen


Capítulo 1
Capítulo Único




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O aljofre embevecia as gramíneas que circundavam o suntuoso Lago Negro. Meus pés estremeciam sobre o cascalho e meus pelos se eriçavam quando breves e pequenas ondas o cobriam.  O tempo era nublado. Aquele vasto território, que um dia fora Hogwarts, hoje parece mais esfíngico ainda. Havia ruínas, os destroços da grande guerra, marcas de uma noite de cólera. Acredito que nem os espíritos tenham se resguardado aqui. Em contrapartida, este parece ser o lugar em que encontro a mais pura harmonia.

Mas o que significa essa harmonia se não uma mínima luz em um meio tão obscuro e tétrico? Possivelmente, apenas um meio para acalentar meus desesperos e agonias. Era por isso que eu vinha para cá, então. Uma tentativa inconsciente de salvação, a personificação de um ser angelical que despejava em mim a ablução.

O contato entre minha pele e aquela água gélida, criou uma espécie de eletricidade. O peito subia e descia. Arfava em soluços do pranto que não descia. Posicionei-me de peito para cima. Estirei-me para receber as mãos das águas em cada esquina de meu corpo. Uma sensação delicada e ao mesmo tempo aterrorizante. O Lago Negro era um mistério que nenhum ser gostaria de desvendar. A adrenalina da expectativa da morte me desenhou um sorriso macabro nos lábios feridos. Por um instante, imaginei o que pessoas que preferiam uma morte lenta pensavam de diferente das que preferiam algo instantâneo. A angústia da espera. A dor pungente do castigo. A infinidade de fins que aquele caminho mais longo traria.

Pena meu arcaico orgulho não permitir uma dúvida tão romântica.

Reparo nas cicatrizes do esfregaço acima do que um dia fora a Marca Negra. O dia em que o meu jurado maior inimigo devolveu-me a benignidade da alma, retirando, em um singelo balançar de varinha, a marca impregnada de trevas e fúria. O espírito exalava condescendência, mas a cabeça vivia a insônia do remorso, da ingratidão e da eterna solidão.

Ainda que livre do parasita, os vestígios da dor me levam aos pensamentos mais noturnos e deprimentes. As pesadas correntes do passado são o chumbo que me prende a esta frívola casa. Uma imensidão vaidosa contaminada de pungentes memórias que teciam um manto nubiloso e negro para a tudo se enganchar. Por muitas noites, afoguei-me em livros sobre as Maldições Imperdoáveis, procurando incessantemente resposta para perguntas, que, pelo visto, nenhum bruxo havia se dado a loucura de perguntar.  Fui capaz até mesmo de teorizar um complexo feitiço para findar minha própria vida, entretanto a coragem permanecia irresoluta.

Mas eis que meus pensamentos me levam àquele homem de luz. Os segundos decisivos que me levaram a tomar essa decisão foram rodeados de intensa esperança, sentimento que nunca achei que poderia algum dia sentir. Novamente, pude sentir algo parecido com uma onda desbravando os escombros carcomidos de meu ser. Era um sentimento insólito e prazeroso. Sua aparência exalava jovialidade, diferente de mim que me tornara moribundo. Os cabelos em um estado lastimável; oleosos e desgrenhados. O louro transmutara-se em um acinzentado opaco. Refletia a cor do meu espírito. Pálpebras avermelhadas e olheiras profundas, um olhar nada galanteador. Ele detinha de todos os aspectos antônimos. Uma aura tão angelical e serena, anos regados de amor e suas companhias.

Por favor”, fora tudo o que meus rijos lábios puderam pronunciar. O estado psicológico tão castigado havia julgado e submetido meu corpo a fatigantes dores crônicas. Eu o vi como um beato naquele momento. Ele trançou minha morbidez com seus braços e me acolheu perante o calor de sua lareira. Aquela casa trazia para dentro de mim um chuvisco de calmaria. Estar sob sua presença, depois de tanto tempo isolado do convívio com qualquer ser humano, sancionava em mim a condescendência por inteiro. Mente, corpo e alma sã. As breves e ínfimas ondas do lago se tornarão avassaladoras o bastante para extinguir as raízes daquele mal. Se ao menos o meu orgulho pudesse ser submisso de minha consciência por apenas alguns instantes para que eu pudesse lhe dizer... obrigado.


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