Essências Divinas escrita por Kardio


Capítulo 4
Capitulo 4 - Luz das Estrelas


Notas iniciais do capítulo

Iae pessoal, como foi o natal de vocês? Espero que ótimo. E aqui vai meu presente para vocês, espero que gostem.



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Capitulo 04 – Luz Das estrelas.

— - July - -

O sol lançava seus primeiros raios de luz pelo céu quando começamos a nos aproximar da ilha cinco. Fora uma longa noite desde o momento em que aquele homem que jogava ácido atacou até agora, mas parece ter sido muito mais tempo, afinal, era tanta coisa nova que mal tive tempo de processar, ou mesmo de acreditar, mas se tem algo que me fez crer, esse algo foi a luta do Ukyo. Eu nunca imaginaria que algo assim seria possível se eu não tivesse visto com meus próprios olhos. E tudo que me foi dito depois por Jin só me acreditar ainda mais. Eu não sei se estou ficando louca ou o quê, mas eu realmente gostaria de não estar.

Solto um longo suspiro, me acomodando melhor a poltrona do metrô. Visto que o arquipélago é muito grande, haviam várias formas de se chegar as ilhas, mas a mais rápida delas com certeza era o metrô, ele passava por debaixo das pontes que os carros usavam, não sei realmente como funciona, mas a pessoa que planejou isso é incrível. E criativa. Talvez um aquariano.

Viro-me ao notar um estranho ruído vindo da minha direita, Ukyo recostava sua cabeça sobre o encosto do assento e seus olhos fechados junto de sua boca aberta mostravam-me o quão cansado ele estava. Um baixo ronco era facilmente perceptível. Os cabelos rubros desarrumados caiam por sua testa e os raios de sol iluminava-os sedutoramente. Não posso deixar de abrir um leve sorriso.

Durante todo o ensino médio eu fiquei preocupada com ele. Soube que sua mãe havia morrido, mas nunca soube os detalhes e durante a escola ele parecia alguém totalmente diferente do garoto que conheci, quase como se não me conhecesse. Soube depois que perdera a memória e me senti realmente mal por tudo que pensei a respeito. Achei que ele tinha se tornado algum tipo de babaca, mas quando voltei a falar com ele na faculdade, percebi que estava errada, ele ainda era o mesmo garoto que conheci quando tínhamos seis anos. Mesmo passando por tudo isso, mesmo vendo sua mãe morrer por um incêndio que ele mesmo criou. Ele ainda é o mesmo. Ele está mais velho. Mais maduro. Mais inteligente. Mais bonito. Me pego corando ao perceber no tipo de coisas que estou pensando, sussurrando para mim mesma enquanto o observo.

— Você ainda é o mesmo... – Solto um sorriso caridoso quando vejo sua cabeça deslizar levemente pelo encosto da poltrona, novamente virando minha atenção para a janela. – Eu ainda lembro daquele dia.

Era uma manhã ensolarada. Minha mãe acordara cedo para ir trabalhar, bem cedo. Era 3h da manhã quando o despertador tocou e ela começou a se arrumar. Não tinha muito que ela pudesse fazer. Era mãe solteira, vinda de família pobre, e tinha uma filha de seis anos para criar. Arrumara três empregos e lutara para me dar tudo o que podia. Não eram as melhores roupas. Não eram os melhores calçados. Não eram os melhores materiais escolares. Mas eram os melhores que ela podia comprar. E aquilo era o que fazia deles os melhores para mim. Após se arrumar, ela me acorda e me pede para tomar banho enquanto ela compra algum sanduíche para comermos. Eram três horas da manhã, mas todos no bairro acordavam cedo para o trabalho, então já haviam alguns ambulantes vendendo um café da manhã para quem quisesse. Ela compra um sanduíche e dividimos. Nós tínhamos o suficiente para viver. Mas a situação ainda era ruim, não tínhamos como comprar dois, mas eu nunca me incomodei com isso. O olhar dela era uma das coisas mais bonitas que consigo me lembrar. Ela lutava e se esforçava mais do que qualquer um que eu conheci em toda a minha vida, tanto naquela época como agora, mas seus olhos brilhavam como tochas acesas, ela tinha esperança de que tudo ia melhorar, e ela era feliz com isso, e isso me fazia feliz também. Após comermos, saímos de casa e iniciamos nossa jornada.

Pegamos um metrô lotado para irmos até minha escola, por algum milagre, hoje conseguimos sentar, fui em seu colo durante todo o caminho. Ela me perguntou como ia a escola, secretamente agradeci por estar de costas, eu nunca conseguia mentir para ela. Minha mãe ainda teria que pegar dois metrôs para chegar no primeiro emprego. Após isso pegaria mais um para chegar no segundo, mais dois para o terceiro, e depois fazer todo o caminho de volta para me buscar na escola e irmos para casa. Vendo todo o esforço daquela mulher, eu não tinha coragem de dizer a ela que sua filha não tinha conseguido nem sequer um amigo em quatro meses de aula.

Na verdade, dizer que eu não tinha amigos era algo bem gentil de minha parte. Eu passava o dia todo na escola, na matrícula minha mãe explicara nossa situação para a diretora e a mesma deixara que eu participasse de atividades de manhã e ficasse no colégio à tarde, também garantiu que, todos os dias, algum dos funcionários traria algo para que eu não ficasse faminta o dia inteiro. As coisas pareciam boas, mas não eram. As crianças podem ser realmente más quando querem. Desde que cheguei, nenhuma fez questão de se aproximar de mim, pelo contrário, tudo o que fizeram foi me afastar. Na sala, sempre me sento sozinha, as quatro cadeiras a meu redor sempre vazias, preferem sentar bem longe. Ouço-os fazerem piadas a meu respeito. Dizem que sou estranha. Que prefiro livros a pessoas. Que minha mãe me odeia, e por isso me deixa aqui o dia todo. Que somos pobres. Riem de mim quando erro algo que o professor pergunta e me chamam de burra. Já ouvi até dizerem que minha mãe dorme com um cara para que ele me traga comida. Isso dói. Dói muito. As crianças realmente sabem ser más quando querem. Mas também sabem ser boas.

Um dia eu estava andando até a biblioteca e fui cercada por um grupo de garotos. Eles começam a puxar meu cabelo e jogaram minhas coisas no chão, após isso, me empurraram e disseram algo sobre irem brincar em outro lugar. Lembro-me de chorar muito. Estava cansada. Afinal de contas, o que eu tinha feito para ter que passar por tudo aquilo? Eu me esforçava todos os dias para poder fazer valer todo o esforço da minha mãe. Mas alguns dias eram simplesmente insuportáveis.

Chorava de cabeça baixa, ainda sentada no chão, quando ouço alguém se aproximar e vejo um garoto se sentar ao meu lado, tinha cabelos ruivos e me olhava caridosamente.

— Odeio o jeito que todo mundo te trata aqui. – Diz ele, logo após abrindo um longo sorriso. – Vou ser seu amigo então. – Fito-o, levemente comovida, mas ao mesmo tempo receosa.

— Você não tem medo de eles fazerem isso com você?

— Eu não ligo. – Ele diz simplesmente, ainda lembro da sinceridade em seus olhos enquanto dizia aquelas palavras. – Só não quero mais te ver chorando assim. Não gosto de ver ninguém chorando. – Ele estende sua mão para mim. – Vamos ser amigos?

Eu não disse nada. Não saberia o que dizer. Para ser bem sincera, até hoje não sei o que eu deveria responder. Ele queria ser meu amigo. Meu primeiro amigo. Ele sabia que seria odiado e excluído por todos os outros garotos por isso, mas ele não se importou. Ele foi a primeira pessoa, com exceção da minha mãe, que se importou comigo. E ele não lembrar disso me deixa triste, pois sei que ele nunca vai saber o quanto que aquele gesto significou para mim.

A voz eletrônica que ecoou dentro do metrô me traz de volta a realidade. É sempre bom relembrar o passado. Mas o presente ainda precisa de nossa atenção. Cutuco Ukyo e vejo o jovem ruivo abrir os olhos lentamente, murmurando algo incompreensível no processo. Abro um pequeno sorriso e aviso-o.

— U, estamos chegando. – Ele assente com a cabeça, mas seus olhos pareciam estranhos. – Você vai para o REU dormir, né? – Ele nega com a cabeça.

— Não, tem umas coisas que eu preciso fazer. – Seus olhos mantinham-se fixos no exterior da janela.

— Ah... Posso ir com você? – Não sei o que deu em mim de fazer essa pergunta, eu estou exausta, e ainda não digeri tudo o que aconteceu ontem à noite, mas senti que precisava estar junto dele.

— Não. – Responde secamente. – Eu só... – Ele solta um longo suspiro. – Preciso ficar um pouco sozinho, tá?

— Ah... Tudo bem. – Murmuro sem graça. O resto do caminho foi um silêncio sepulcral até chegarmos na estação.

Ukyo se levantou e murmurou um tchau desinteressado, mas pude ver uma última vez seus olhos. Ele parecia... Chateado?

— - Jin - -

Era uma tarde agradável e sem muitas nuvens, algo bem incomum no inverno frio que temos vivido, a decoração natalina já começara a tomar conta das lojas visto que o feriado se aproxima, talvez as férias das aulas tenham vindo em boa hora, visto que os Kings finalmente começaram a se mover.

A ilha doze estava bem movimentada como sempre, afinal, era a ilha que continha grande parte das lojas do arquipélago. Quando se adentra nessa universidade, todos os jovens ganham uma bolsa de mil dólares mensais, para usar como quiser, e muitos gastam tudo nessa ilha, o que só me faz pensar, afinal de contas, o quão ricos são os Kenway? Eles mantêm todos os alunos, professores e quaisquer necessidades que o arquipélago precise, isso tudo enquanto fazem investimentos em diversas outras áreas, não parece nem ser possível ter tanto dinheiro.

Após uma breve caminhada, chego ao local onde combinei com Seth, um bar relativamente famoso por essas bandas, o Touro Negro. Adentro o estabelecimento e um atendente recolhe meu casaco.

— Eu tenho uma reserva para Jin e Seth. – Informo-lhe e ele checa em um livreto, confirmando a reserva.

— Mesa 21, por favor. – Ele com o braço indica-me o caminho, um longo corredor com várias portas numeradas. Eu gosto desse bar, é bem reservado, não existem espaços comunais, apenas quartos onde você pode se sentar e pedir o que quiser através de um sistema sofisticado dentro dos quartos, há uma espécie de mesa eletrônica onde você pode fazer os pedidos. Sério, onde os Kenway conseguem tanto dinheiro para essas coisas? Talvez eu deva perguntar a ele depois.

Percorro o longo corredor e adentro a porta com a numeração 21, lá dentro Seth já estava sentado, tomando um copo de uísque com gelo, ele tinha cabelos cinzentos e olhos verde-esmeralda, sua pele era branca e usava uma camisa vermelha com calça jeans, ao redor do pescoço parecia trazer uma “dog tag”. Havia uma mesa de madeira com um monitor touch screen acoplado, os bancos na verdade eram sofás extremamente confortáveis localizados em todas as direções da mesa, exceto na frente da porta. A iluminação era sútil e a parede fora revestida com peças de mogno e ébano.

— É muito rude da sua parte me fazer cruzar o oceano para vir aqui e se atrasar, sabia? – Reclama o jovem, apenas aceno com a mão e me sento do outro lado da mesa.

— É bom ver você também, Seth. – Ele abre um sorriso de canto, erguendo o copo em saudação.

— O que quer beber? – Questiona, averiguando a mesa digital com os drinques disponíveis.

— Um Caruso seria ótimo. – Afirmo e ele faz o pedido, o drinque de coloração esverdeada chega em pouco tempo e, após o garçom sair, continuamos nossa conversa.

— E então, o que quer falar comigo? – Inquire o cinzento, tomando um gole de seu uísque.

— Você tem certeza que não sabe? – Questiono e ele abre um sorriso com o canto do lábio.

— Claro que sei, mas vou fingir que não para não tornar essa conversa completamente inútil.

— Os Kings estão começando a se mover. – Pronuncio pesadamente. – Ontem à noite, um dos jovens da universidade foi atacado, ele tinha uma carta. – Bebo um pouco de meu drinque, sentindo o gosto de menta se espalhar por meu paladar. – Suspeito que o ataque tenha sido idealizado pelo King de Paus. – Não acho que a escolha mais correta seja dizer ao Seth que encontrei com o tal King, pelo menos, não agora.

— Entendo, então ele também está se movendo. – Vejo o jovem baixar os olhos, fixando-os sobre a mesa.

— Conte-me o que descobriu. – Ele ergue o olhar, como se estivesse prestes a perguntar o que diabos eu queria dando-lhe ordens, mas ele sabe tudo que está em jogo, não é hora para fazer confusão com seu maior aliado, e posso dizer o mesmo a respeito dele.

— Algumas facções já estão se formando, e buscando forças. – Seu tom era, ao mesmo tempo, sério e sombrio. – Não tenho informações sobre o King de Espadas, mas soube que o King de Paus já está angariando aliados.

— Algo sobre o de Ouros? – Seth faz uma careta.

— Esse é complicado. – Ele faz uma pequena pausa, continuando seu drinque. – Ele não parece se dar bem com outras pessoas, ele entrou em combate nas duas vezes em que encontrou algum portador, naturalmente, saiu vitorioso em ambos e coletou as cartas, mas continua sozinho. – Um silêncio incômodo se instala no local, não sei qual King nos deixaria mais ameaçado. O King de Paus tem adicionado aliados a si, embora continue com a mesma força de antes, não que isso seja pouca coisa. Por outro lado, o de Ouro coleta cartas, ficando mais poderoso do que anteriormente, mas por estar sozinho, talvez isso se torne uma desvantagem em algum momento. Mas o que mais me preocupa é o King de Espadas, afinal, em todos os anos que lutei, só existem três cartas que nunca vi ou ouvi falar a respeito, e essas são as cartas 9, 10 e King, todas do naipe de espadas. Se ele está analisando a situação e esperando o momento certo para tomar seu movimento, eu diria que ele é o mais perigoso de todos. – Mas não é só isso. – Continua Seth, puxando de debaixo da mesa uma bolsa. Abrindo-a, ele pega uma pasta com alguns arquivos e a põe sobre a mesa. – Andei pesquisando e achei alguns portadores. – Prossegue ele. – Alguns estão sem facção, outros não sabem nem ao menos para que servem as cartas, alguns estão usando-as para interesse próprio. Tem até alguns usando-as para conseguir dinheiro no mercado negro. – Abro a pasta, começando a olhar os arquivos.

— Como sempre, suas pesquisas são muito úteis, Seth. – Ele faz uma pequena saudação, terminando seu drinque. – Mas eu também já andei fazendo alguns recrutamentos.

— Diga-me os nomes. – Ergo o olhar, o fitando.

— Ukyo e July, são amigos de sua irmãzinha, creio que ela já deva ter falado a você sobre eles.

— Nem me diga. – Murmura ele.

— A propósito, como está a Laila? – Seth parece ficar emburrado, talvez algo o desagradasse a respeito.

— Ela insiste que irá lutar e que não posso fazer nada para impedi-la disso. – Limito-me a fechar os arquivos, colocando-os sobre o sofá

— E você pode?

— Não se eu quiser deixa-la ilesa, então não. – O cinzento acomoda-se melhor ao sofá. – E o Zaki?

— Está investigando uma pista que achou, disse que me manteria informado. – Seth sorri.

— Ele sempre age meio impulsivamente, mas ele é forte, vai ficar bem. – Comenta ele, talvez ainda não tenha aceitado a derrota que teve quando lutou contra Zaki, mas se esforçou para disfarçar. – Enfim, acho que devo ir.

— Vai voltar para o continente? – Questiono e ele nega com a cabeça.

— Você é muito mole, tenho certeza que não deu nenhum tipo de teste a esses tais Ukyo e July, então eu mesmo o farei. – Vejo o cinzento se erguer, seu olhar frio assume uma certa selvageria, como se estivesse pronto para lutar. – Analise os documentos e planeje o que devemos fazer, deixo isso com você. – Ele pega sua bolsa, botando-a sobre o ombro. – Vou mostrar aqueles garotos um pouco de como é o mundo dos adultos.

— - July - -

Volto ao REU ainda pensando em tudo o que acontecera, mas especialmente sobre o estado de Ukyo quando ele saiu do metrô. O que será que anda o chateando?

Caminhava perdida em meus pensamentos e não noto que havia uma pessoa na porta da frente do REU, me esperando. Tinha cerca de 1,88m, sua pele era escura e seus cabelos estavam presos em um coque samurai, usava roupas de academia e tinha um sorriso no rosto ao me ver.

— July! – Chama ele, sorriso e aceno ao vê-lo.

— Tyler, oi.

— Oi, onde você estava?

— Ah, eu... Fui dar uma volta, nada demais, mas e aí, quais as novidades?

— Ah, hoje é o último jogo da temporada regular de basquete para nós, então estou um pouco aliviado. Após de hoje finalmente vou ter umas folgas do treino. – Ele sorri. – Ei, você viu o Ukyo? Ele disse que estaria no jogo.

— Ah sim, ele me convidou para ir também, estaremos lá. – Ele sorri caridosamente.

— Espero marcar alguns pontos para vocês então. – Após uma rápida olha no relógio, ele continua. – Agora tenho que ir, vai ser um longo dia. – Ele sorri novamente e acena, indo embora. Longo dia. Queria eu que ele estivesse errado.

— - Ukyo - -

O ginásio enchia-se de gritos de empolgação e apoio, afinal, o time de basquete da universidade jogava hoje a última partida antes dos playoffs da liga Universitária e, com classificação já assegurada e enfrentando o lanterna da competição, eles pareciam se divertir em quadra, o que se refletia em uma verdadeira festa nas arquibancadas.

Escoro-me ao corrimão na parte mais alta das arquibancadas, como membro do time e nosso amigo, Tyler sempre deixava dois ingressos na primeira fila para que assistíssemos seus jogos, e Deus, como eu amo assistir jogos de basquete. Mas hoje eu quero ficar sozinho. Muita coisa aconteceu ontem, e ainda estou indeciso e confuso. Mesmo que eu tenha dito que vou, com certeza, ganhar esse “jogo”, não tenho ideia do que irei fazer de verdade.

Uma cesta de três vindo do time adversário arranca vaias calorosas da torcida, fito o placar, estávamos nos últimos quinze segundos do último quarto, o placar era 88 para a Universidade Kenway contra 62 dos visitantes, uma partida bem unilateral. Volto novamente meus olhos para quadra e vejo Tyler com a bola, ele é um dos armadores mais altos da liga, mas ao mesmo tempo um dos mais rápidos e talentosos. Tyler começa a driblar a bola com a mão direita e ergue seu braço bem alto, fazendo o sinal da jogada número 3. Assisti todos os jogos e alguns treinos, sei que essa é a jogada favorita dele.

— Primeiro, crossover da direita para a esquerda. – Murmuro e vejo minha narração acontecer, Tyler inicia sua jogada, driblando a bola por entre as próprias pernas para que chegasse à mão esquerda, dessa maneira, mudando seu centro de apoio e usando seu ombro como uma proteção de corpo. – A seguir, infiltração. – Tyler então inicia sua corrida, tentando infiltrar-se por sua lateral esquerda, o marcador segue-o avidamente, mas é exatamente isso que ele quer, nessa jogada, todos de seu time devem segurar seus marcadores e não os deixar impedir seu mano-a-mano contra a marcação. – E agora, fade away. – Após adentrar a área de dois pontos, Tyler subitamente faz uma parada, seu marcador, ainda no impulso que vinha, acaba por parar só um passo após ele, neste momento, o armador da Kenway realiza um salto para trás, aumentando sua distância e arremessando no ponto mais alto, um fade away impecável e difícil de parar, ele está em ótima forma hoje. Deve ter tomado um fora. Tyler é um cara bem fácil de ler quando se trata de suas performances no basquete. Quanto mais emocionalmente destruído ele está, melhor ele joga. É quase como se ele focasse toda a frustração em seus oponentes e logo depois destruísse eles.

O sinal do fim do último quarto soa, arrancando gritos de felicidade da torcida. Fim de jogo. 90 a 62 e Universidade Kenway classificada como segunda melhor colocada para os playoffs, os times e a torcida começam a se dispersar, mas ainda quero ficar aqui mais um pouco. Lembro de ter virado um grande fã de basquete quando entrei no ensino médio. Não sou uma das pessoas mais altas ou fortes, então naturalmente, nunca era escolhido para jogar, mas eu sempre gostei de assistir, desde basquete de rua até NBA, era simplesmente muito divertido ver como os homens desafiavam os céus para poder superar seus adversários. Acho que sempre vi no basquete uma distração de meus próprios demônios interiores, mas de que isso importa? É simplesmente divertido no fim de tudo.

— Foi um bom jogo. – Uma voz masculina fala a meu lado, vejo um jovem de cabelos cinzentos e olhos verde-esmeralda, ele usava uma camisa vermelha, uma “dog tag” em seu pescoço, e um casaco escuro com pelos em sua gola e ombros. – Eles jogam bem.

— Sim. – Murmuro. – Fizeram uma ótima temporada, agora terão alguns meses para se preparar para os playoffs.

— Você é amigo do tal Tyler, né? – Estreito os olhos, fitando-o atentamente.

— Como você sabe?

— Eu sei de muitas coisas. – Ele dá de ombros, fitando a quadra que já começava a se esvaziar. – Por exemplo, sei que você tem umas cartas bem interessantes no seu bolso. – Sinto um arrepio percorrer meu corpo instantaneamente. Ele sabe sobre as cartas? Droga, não era para essas merdas serem um segredo? Será que todo mundo nessa faculdade já sabe ou falta espalhar para mais alguém?

— Quem é você?

— Meu nome é Seth. – Responde ele profundamente. – Sou um amigo do Jin.

— Então é meu aliado? – Questiono-o e ele volta a me encarar.

— Não exatamente. – Seus olhos eram frios e pareciam ver através de minha alma. – Não é por que temos um aliado em comum que vamos ser amiguinhos lutando pela liberdade com o poder da amizade. Isso não é um conto de fadas. – O tom dele era sério e direto. – Jin tem inimigos que ele quer derrotar, por coincidência, eles são os mesmos, mas diferente de Jin, eu tenho uma motivação para vencer esse jogo.

— Então você também está atrás de todas as cartas, hein? – A situação estava tensa e a temperatura parecia ter caído alguns graus, pois sinto-me quase congelando de nervosismo.

— Pode-se dizer que sim. – Responde o cinzento. – Jin disse que você é um aliado forte, mas eu irei decidir se isso é verdade. – Ele coloca as mãos dentro de seus bolsos e vira-se de costas. – Encontre-me em uma hora na floresta da ilha 22, venha sozinho. – Ok, desde quando isso virou um filme de sequestro onde o malfeitor diz coisas desse jeito?

— E se eu não for? – Ele dá de ombros.

— Aí eu só tenho que destruir o quarto 4 da REU 9. – Ok, só por que eu não vou ao meu quarto desde ontem, não quer dizer que eu não o queira mais. – Até mais, Ukyo. – O jovem se vai, me deixando com a difícil decisão de lutar na floresta ou no meu quarto.

— A cada dia que passa, eu sinto que odeio mais minha vida... – Murmuro, logo após soltando um longo suspiro.

— - Jin - -

As luzes dos postes passavam rapidamente pelo para-brisas do carro à medida que dirijo de volta para meu apartamento. As engrenagens do mundo estão começando a se mover. O King de Paus fez sua aparição e, logo de cara, pude perceber que ainda não sou o suficiente para aquela força esmagadora, o King de Ouros parece antissocial e está começando a causar problemas por aí, já o outro permanece oculto e esperando o momento para dar o bote. Talvez as coisas não estejam indo tão bem quanto pensei.

Preocupado com algo, Jin? – A voz ecoa sonoramente dentro de minha mente.

— Só com o fato de que as coisas vão começar a ficar complicadas.

Esperavas que os outros Kings fossem ficar parados, esperando que você organizasse e treinasse suas tropas? – Questiona e, só depois de ele dizer, percebo que meu plano era realmente ridículo.

— Eu realmente tinha esperanças nisso, Draco. – Solto um longo suspiro. – Alguma sugestão de que o devamos fazer?

Não sei o que vai fazer, mas seja o que for, faça antes. Nossos inimigos ainda não estão no auge de seus poderes, você tem que agir depressa. Pode até ser que nosso poder máximo não supere o poder máximo que eles podem atingir, mas se atingirmos nosso pico antes, talvez tenhamos uma chance.

— Você parece preocupado, Draco. Algo lhe incomoda? – A voz do King de Copas fica em silêncio por algum tempo.

Eu sei de suas intenções, e aceito-as. Concordo de você me entregar aquele garoto quando tiver cumprido seus objetivos, mas temo que você possa perder antes mesmo de conseguir isso.

Não pensei que tivesses tão pouca confiança em nossas capacidades de luta, Draco.

Os inimigos a nossa frente terão mais força, mais experiência ou mais Sincronização Divina que você, Jin. E além do que, estamos juntos faz um tempo, até mesmo para cartas normais, seu corpo já começaria a sentir os efeitos, comigo, que sou uma carta King, você já deve... – Corto-o antes que ele termine de dizer o que realmente o preocupa.

— Eu sei... – Murmuro para ele. – Eu sei.

Apresse-se, Jin. – Aconselha Draco. – Na última guerra, lutei ao lado de um grande guerreiro, é verdade, mas mesmo que ele e seu país tenham vencido a guerra, ele nunca foi capaz de superar os outros Kings.

— Eu não sou como ele, Draco. – Sinto um calor queimar em meu peito. – Eu ainda tenho coisas para proteger.

Ele também tinha. Ele me dizia as mesmas palavras.

O silêncio tomou conta de nós durante todo o resto do caminho, só sendo quebrado quando entramos no elevador que me levaria a meu apartamento, e foi Draco quem o quebrou.

Você já o sentiu, não é mesmo?

A ressonância? – Questiono-o. – Desde que estávamos no carro.

— Quem diria que alguém teria ousadia o suficiente para invadir seu apartamento.

— Ousadia ou tolice. – Murmuro enquanto abro a porta e encontro alguém vasculhando a casa, ao me ver, ele rapidamente se vira para a janela. – Quem é você? – Questiono-o e ele mantém-se em silêncio. – O que está fazendo aqui?

— Onde estão as cartas? – Ele pergunta-me e devo dizer que estou surpreso, as cartas em meu apartamento e a que está comigo estão todas dentro das caixas que isolam a ressonância, não seria possível para ele chegar aqui seguindo-as, como ele sabe que existem cartas aqui?

— A etiqueta diz que, como perguntei primeiro, devo ser o primeiro a ser respondido. – Ele fica alguns segundos em silêncio, subitamente, começa a correr em direção à janela.

— Ele pretende fugir.

— “Pretende”. – Dou ênfase ao que Draco caracteriza como uma tentativa e começo a perseguir.

— Meteoro! – Ouço o homem clamar e, logo após, ser envolto por uma energia dourada, como uma esfera de proteção ao seu redor, logo depois, ele salta pela janela, estilhaçando o vidro completamente e, ao invés de cair, começa a cortar os céus.

— He, quem diria que ele teria uma carta de nível tão elevado. – Aquela é a carta Cosmos, uma carta que dá o poder de moldar e controlar energia vinda do próprio universo, moldando-a a seu bel prazer, um Dez de Paus.

Começo então a recitar o encantamento em Grego antigo e minha aparência começa a mudar rapidamente. Meu corpo cresce exponencialmente, minha pele endurece e se subdivide em várias camadas de escamas, minha mandíbula se projeta á frente e meus dentes crescem e se afiam, asas começam a brotar em minhas costas e minhas unhas dão lugar a poderosas garras. Quando a transformação em Dragão finalmente se completa, salto para fora da janela em perseguição ao jovem.

Ele tivera alguns segundos de vantagem e já alcançara o mar, mas irei ensiná-lo a não subestimar o poder de uma carta King e, com três simples bater de asas, estou a não mais que dez metros de distância dele. Quando me concentro em voar, diria que a carta Dragão pode dar a volta ao mundo em cerca de 12 horas, sendo assim uma das cartas mais rápidas dentre todas.

Ao notar que rapidamente foi alcançado, o jovem vira de cabeça para baixo, ainda avançando para frente, mesmo que olhasse para trás.

— Plêiades! – Convoca o jovem, disparando sete raios luminosos, semelhantes a pequenas estrelas, em minha direção. Ele é bom, conseguir usar uma técnica de locomoção enquanto olha para outro lado e dispara raios de energia. Que Sincronização Divina elevada.

Com um único bater de asas, ergo-me alto no céu, as sete estrelas, a qual ele batizou de Plêiades, erram o alvo, caindo sobre o mar. Ele ergue seu olhar em minha direção, uma energia luminosa localizando-se na palma de sua mão.

— Aldebarã! – Convoca, disparando a esfera de energia em sua mão, era grande e densa, se me atingir, terei problemas, abro as asas e desvio do poderoso golpe, planando para a direita, logo após, bato novamente as asas em direção ao inimigo enquanto Draco clama em minha mente.

— Jin, devo informa-lo que o nome Aldebarã, nas línguas antigas, significa: Aquele que segue.

— E agora que você me diz isso. – Murmuro batendo as asas novamente para frente enquanto viro-me para trás, como pensei, a enorme esfera de energia estava voltando e ameaçava me acertar. Mesmo que eu desvie novamente, ela continuará me seguindo, devo me livrar dela.

Encho os pulmões, sinto uma queimação percorrer minha garganta à medida que expulso as chamas de minha boca com grande força. O choque das chamas com a massa de energia gera uma explosão poderosa que me arremessa para baixo, fazendo-me cair no mar. Como se isso fosse me fazer desistir. Com um poderoso bater de asas, meu corpo se lança a frente como um míssil. Irrompo para fora das águas com grande velocidade, ultrapassando meu jovem adversário. Rotaciono meu corpo, usando minha perna direita para acertar um poderoso chute contra a esfera dourada que o envolvia. Como esperado. A esfera é constituída de uma densa concentração de energia, meu chute consegue parar sua locomoção, o empurrando para trás, mas não destruindo o globo que o protegia.

— Como esperado de você, Rei das Bestas. – Fala o jovem. – Não posso subestimá-lo.

— Você também não é nada mal. – Falo enquanto normalizo minha postura, ficando em pé em meio ao ar, usando as asas para me manter acima das águas. – O que você faz aqui?

— Digamos apenas que os Reis não são os únicos a terem planos. – O homem era dificilmente visto, devido a força da luz dourada que emanava da esfera que o protegia, mas sua voz me alcançava com extrema facilidade. -–Eu sou Joseph, e vou trazer o caos a esse mundo que você tanto ama. – Afirma o homem.

— Vai ter que passar por mim primeiro. – Uma leve e fria brisa sopra pela superfície do mar à medida que sinto minha tensão aumentar, essa será minha primeira luta em um longo tempo, espero não ter ficado enferrujado.

— - Continua - -


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Notas finais do capítulo

Já sabem o procedimento, deixem seus reviews, digam o que gostaram e até o próximo capitulo



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