Mais que uma escolha escrita por nanacfabreti


Capítulo 7
Juntando os cacos




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—Lia, eu estou começando a ficar realmente preocupada com você —Gabi me recriminou depois de eu contar sobre a revista. —Eu não sabia que você era louca, assim.

Estávamos em seu quarto e eu mais uma vez fora buscar uma dose da sua sinceridade.

—O pior de tudo foi que quando eu voltava do campinho, encontrei o Marcus, e ele praticamente exigiu uma conversa — falei, me ajeitando na beirada de sua cama.

—Você sabe que ele está certo, não é?

Balancei a cabeça positivamente. Ela sentou-se do meu lado.

—Eu odeio estar agindo assim— fechei meus olhos tentando buscar respostas— ,ás

vezes, nem eu mesma me reconheço.

 —É disso que eu estou falando! —Gabi ergueu as mãos como se eu finalmente estivesse entendendo. —Lia, você vai me desculpar, mas a impressão que tenho é que você está deixando Marcus na reserva, enquanto espera por Alex.

Eu nada respondi, continuei de olhos fechados, ainda esperando por respostas, em contraponto, analisei o que acabava de ouvir e não, não era assim que eu estava agindo.

—Não vou mentir pra você Gabi, eu esperei por todos esses dias que Alex viesse me procurar —confessei ,algo que vinha consumindo a mim.

—Certo! —ela sibilou, estava irritada. —E se esse cara, se Alex chegasse agora e a pedisse em casamento... —ela revirou os olhos—não, casamento é muito forte, mas digamos que ele chegasse agora e pedisse pra você ficar com ele. O que você faria Maria Cecília?

Respirei fundo.

—Eu diria sim pra ele —decidi convicta. —Eu sei que minha vida ficaria uma bagunça só, e que essa cidade inteira se voltaria contra mim, mas mesmo assim eu arriscaria.

—Então amiga... —ela deu três tapinhas em minha perna. —Libera o Marcus, não fica cozinhando o cara em banho-maria, isso chega a ser desprezível.

—Eu sei, e não pense que me orgulho disso. —Levantei já pronta para ir. —Amanhã vou colocar um ponto final nessa história.

—Lia, eu sei que não sou a expert dos bons conselhos, mas depois que conversar com Marcus, procure esse Alex, fale pra ele tudo o que vem passando, e se ele gostar mesmo de você, vai entendê-la e vocês vão se acertar —ela aconselhou-me, antes de eu sair do seu quarto.

Sua teoria era perfeita, mas na prática as coisas não eram tão simples. Eu imaginava que Alex estava muito magoado, e pior, se sentindo usado, portanto, ficar com ele deixara de ser uma escolha minha.

Sozinha em meu quarto, eu novamente peguei aquela revista e reli a reportagem umas vinte outras vezes, sem contar no tempo que perdi observando as duas fotos de Alex. Eu não me conformava em como pude ter estragado as coisas entre nós.

 No dia seguinte, assim que cheguei da faculdade, fui direto para a floricultura, era quinta-feira, um dia de bastante movimento por lá.

Lucia e minha mãe estavam tagarelando empolgadas, dava para ouvir a voz das duas antes mesmo de virar a esquina.

—Boa tarde —cumprimentei a todos que estavam ali.

—Lia, tem uma caixa vermelha lá dentro, entregaram para você mais cedo—minha mãe comentou enquanto eu ia para o balcão.

Meu coração reagiu àquelas palavras como quem ouve que acaba de ganhar na loteria.

Corri para os fundos da floricultura sentindo a esperança preencher cada milímetro da minha alma.

A caixa estava sobre uma mesa de vidro, era vermelha envolta por uma fita dourada e formava um laço no topo, laço esse que foi desfeito em meio segundo.

Ergui a tampa e me deparei com um envelope branco, sobre algo que estava coberto por um papel de seda, também vermelho.

Peguei o cartão e reconheci a letra, no mesmo instante tudo o que eu sentia até então se fez maior, só que de um jeito ruim. O gosto amargo da decepção estava ali, presente em minha boca e queimando a minha garganta.

Aquela caixa e aquele cartão eram de Marcus, e não de Alex como eu desejava.

“Lia,

Antes de tomar qualquer decisão, olhe com carinho o conteúdo dessa caixa.

Não sou muito bom com palavras e talvez me atrapalhe ainda mais quando preciso demonstrar como me sinto.

Espero que isso possa ajudar a explicar, que apesar de ter errado, agora, eu só penso em acertar!

Te Amo

Marcus”

Seria justo atender seu pedido naquela hora, com aquele sentimento ruim que me dominava?

Não. Não seria. Devolvi o cartão dentro da caixa e voltei para o balcão.

—Deveria ter me dito que era um presente do Marcus —reclamei ao notar minha mãe lançando-me um olhar cheio de curiosidade.

—E de quem mais seria Maria Cecília? —Ela balançou a cabeça com reprovação.

Lucia encarou-me com um ar de cumplicidade.

 —Contou à Lia sobre a nova parceria da Florista? —Ela emendou outro assunto.

—Verdade! —Minha mãe voltou a se empolgar. —A cerimonial que organizou o casamento de Santo Valle nos ligou hoje pela manhã. Eles gostaram tanto do nosso trabalho que querem criar uma parceria, vão indicar nossa floricultura para todos os clientes que fecharem contrato com eles.

—Nossa! Que legal, isso é ótimo para a empresa —consegui formular uma frase em meio á minha dispersão. Era incrível como o universo fazia questão de tirar a casca da minha ferida á todo momento.

—Por falar nisso, não é melhor montar o vaso e deixá-lo pronto? A tal cerimonial não deixou claro a que horas viria.

—É Lucia, tem razão, eu pensei em frésias, elas estão lindas. O que acha Lia?

—Sobre o quê? Indaguei totalmente alheia ao que se passava ali.

—Roberta, a cerimonial, encomendou um vaso para presentear a noiva, semana que vem eles completam o primeiro mês de casados, mas como ela está se mudando para a Argentina esse final de semana, pediu para fazermos algo ainda hoje. —Lucia, me explicou notando toda a minha desatenção.

—A família toda vai se mudar? —Não pude disfarçar meu interesse.

Minha mãe deu de ombros.

—Não. O noivo dela, ou melhor, o marido, já morava lá, então ela se muda com ele. Ela começou a separar as flores para o tal vaso.

—O moço, o irmão dela parece que vai morar, ou já está morando lá também. Não foi isso o quê ela comentou? — Lucia interveio.

Minha mãe olhou para cima, como se acabasse de se lembrar de algo.

—Verdade! —Ela voltou-se para mim. —O irmão da noiva mudou-se há pouco para lá, foi trabalhar na empresa que eles têm no país vizinho.

“Nossa!” —Pensei. — “ Nada é tão ruim, que não possa piorar.”

Como assim, Alex tinha se mudado para a Argentina? Senti minha cabeça girando e amaldiçoei minha vida antes de sair dali.

Pronto, então estava feito, naquele instante acabei percebendo que para ele, eu era página virada mesmo. Ele seguira em frente, ou talvez, aquela mudança já estava em seus planos antes...Independente do que fosse, de nada adiantaria eu ficar me martirizando com  questões e suposições, elas jamais seriam respondidas.

Olhei á minha volta, senti o quanto estava perdida, então bati os olhos na caixa vermelha sobre a mesa, como um fruto proibido esperando por minha mordida.

Sentei-me no chão com a bendita caixa nas mãos, as emoções à flor da pele e completamente passional.

Puxei o papel de seda, então uma pasta de capa azul se revelou. Comecei a virar as páginas de plástico, e deparei-me com um monte de lembranças, por mim já esquecidas.

Marcus organizara nossas memórias em ordem cronológica. Eram fotos de anos atrás, cartões que eu fizera para ele, bilhetinhos bobos com frases do tipo: “você é tudo pra mim”, ou “te amo mais que brigadeiro”; até o band-aid que coloquei em seu corte estava lá, escuro e manchado pelo sangue seco, um tanto nojento, devo confessar.

De qualquer forma, ele tinha guardadas as mais insignificantes coisas que fizeram parte dos momentos que passamos juntos, uma surpresa e tanto. Eu jamais imaginaria Marcus fazendo uma coisa daquelas.

Sim, aquele presente e tudo o que ela significava, acabou mexendo comigo, afinal eu tinha um coração... Ok, um coração que estava despedaçado, mas ainda assim um coração e talvez, movida por todos os acontecimentos anteriores, fui tomada por um novo sentimento, desconhecido por mim, algo próximo da resiliência.

                                 *****************************

Ainda não era sete da noite, quando Marcus ligou avisando que estava á caminho. Eu nem sabia o quê, e nem como conversaria com ele, já que aquele dia fora no mínimo ruim. Havia também aquela pasta, que acabou por me mostrar o quanto eu tinha mudado, e fez com que eu perguntasse enquanto lia e relia aqueles cartões que eu mesma escrevera, para onde tinha ido todo aquele sentimento?

Como aquilo que parecia ser tão forte, pôde desaparecer de uma hora para outra?

Perguntas, perguntas e mais perguntas. Minha vida vinha se resumindo a isto, e quando Marcus chegasse, ao menos para ele, eu precisaria ter algo além de pontos de interrogação.

Ouvi quando seu carro estacionou, enfiei aquela pasta de baixo do braço e respirei fundo. Quando cheguei à sala ele estava lá, sentado na poltrona ao lado do meu pai. Uma cena tão comum há pouco tempo e que agora parecia fora do contexto.

Assim que me viu, se levantou, estava bem vestido; calça jeans escura e camisa social azul clara. Enquanto eu me aproximava, seus lábios se curvaram formando um sorriso tímido e como eu o conhecia muito bem, sabia o quanto ele estava nervoso.

—Tudo bem irmos pra a minha casa? —ele perguntou sem saber onde colocar as mãos.

Meu pai que sempre foi muito discreto, deu três tapinhas nas costas de Marcus, depois saiu sem dizer nada, deixando que nós dois ficássemos a sós.

—Acho que seus pais não devem estar lá muito contentes comigo, afinal... —dei de ombros, imaginando que eles deveriam estar me culpando por toda a história de sua transferência.

 —Não Lia, eles sabem que voltei por você, mas também sabem que foi porque eu quis. —Ele balançava a cabeça. —Não se preocupe quanto a isso, tudo já está resolvido.

 Arqueei minhas sobrancelhas sem saber se era bom ou ruim.

—Bom, então vamos, eu não posso voltar tarde. —Caminhei para fora de casa.

Marcus abriu a porta do carro para que eu entrasse, àquela altura, todos já deduziam que havíamos reatado. Era incrível o nível de desocupação das pessoas de Monte Real, sete e meia da noite e as calçadas permaneciam repletas de gente.

—Eu queria ter trazido flores, mas não seria original. —Marcus quebrou o silêncio enquanto dirigia.

—É, isso é meio complicado —respondi sem olhar para ele.

Houve mais um longo silêncio.

—O que achou do meu presente?

 Olhei para a pasta em meu colo e depois para ele que parecia atento ao trânsito.

   — Eu adorei... —Fui sincera. —Eu não imaginava que você tinha todas essas coisas guardadas.

 Marcus sorriu e eu tive medo de que ele estivesse entendendo tudo errado.

 Em sua casa, lugar que eu não frequentava há quase três meses, tudo era familiar. O cheiro e cada detalhe, estavam frescos em minha memória, senti-me aconchegada ali.

 Seguimos para  o seu quarto, lá me deparei com um cenário romântico preparado por ele. Na verdade, Marcus tentou reproduzir o local de nossa primeira vez na casa em Santo Valle. O tapete preto, uma mesa de centro com dois pratos e duas taças e o pior, um pequeno arranjo de peônias...Ele tinha se lembrado de cada detalhe.

Senti vontade de sentar e chorar, seu esforço me comoveu na mesma medida que eu começava a me sentir péssima por estar o enganando. Marcus colocara em suas costas toda a culpa pelo nosso fim, enquanto eu sabia muito bem que não era bem assim.

—Pedi para a minha mãe fazer aquela torta de palmito que você gosta. —Ele fez um sinal com mão para que eu entrasse.

A torta que a mãe de Marcus fazia era realmente uma delícia, no entanto, com aquele nó na garganta, nem mesmo minha saliva eu conseguia engolir direito.

—Marcus, —caminhei até sua cama e me sentei —não precisava ter se preocupado com nada disso...

Ele sentou-se ao meu lado, e dava para sentir o calor que vinha do seu corpo.

—Estou tentando me segurar Lia —ele me encarou e sorriu—,estou com tanta, mas tanta saudade de você, de nós...

Baixei meus olhos sem ter uma boa resposta, estava toda quebrada por dentro e mesmo que me esforçasse, eu já não tinha mais nada de bom para oferecer á ele.

—Marcus, nosso namoro foi uma das melhores coisas que eu tive em minha vida. —Comecei a escolher as palavras. —Você é muito especial pra mim...Só que eu mudei, sinceramente, o problema está em como eu me sinto agora.

Ele segurou uma das minhas mãos, a dele estava fria, ainda mais do que a minha.

—Eu sei que machuquei você e só agora entendo o quanto. —Marcus acariciava cada um dos meus dedos como se fossem algo precioso.—Lia, eu juro que jamais farei nada parecido, eu te amo e não me vejo sem você em minha vida. —Ele fungava tentando não chorar.

Como eu queria poder dizer o mesmo para ele. Naquele momento eu desejei com todas as minhas forças poder voltar a amá-lo como antes, só que infelizmente, esse é o tipo de coisa que ninguém consegue controlar.

 —Marcus... —comecei a chorar—eu não posso mais fazer isso. —Olhei para ele e falei com a voz rouca, usando toda a coragem que me restava.

Ele balançou a cabeça, estendeu suas duas mãos e limpou minhas lágrimas com seus polegares.

—Só me deixa te reconquistar? —Ele sorriu com lágrimas nos olhos. —Deixa eu te mostrar que nossa história vale a pena?

 Ele me abraçou e delicadamente beijou o topo da minha cabeça. Ficamos daquele jeito por um quarto de hora ou mais; depois ele encheu uma taça com suco de uva, o nosso preferido.

—Come um pedacinho da torta, você deve estar com fome. —Marcus parecia estar falando com uma criança.

 Na verdade eu estava com o estômago revirado, mesmo assim sentei-me no tapete em torno da mesinha e deixei que Marcus me servisse.

— E a faculdade de Santa Fé? —perguntei tentando quebrar aquele clima estranho que nos cercava.

—É diferente, mas ainda assim é uma boa faculdade — ele comeu um pedaço da torta—,ainda mais agora que decidi em que área da medicina vou me especializar...

—Sério? —interessei-me de verdade.

—Sério. —Ele sorriu. —Vou me especializar em pediatria, e lá eles têm um bom suporte pra essa área.

 Fiquei olhando para ele, Marcus era alto e forte, mas tinha um rosto meigo e agradável, chegava a ser até delicado. Pensar nele cuidando de crianças era mesmo condizente.

—Acho que vai se sair bem. —Toquei sua mão que repousava sobre a mesinha.

Depois disso nossa conversa fluiu como há tempos não acontecia, nem mesmo quando ainda éramos namorados. Falamos sobre tudo; cursos, perspectivas profissionais, sobre as pessoas de nossa cidade; relembramos velhos acontecimentos, mas nada sobre nosso futuro como um casal. Marcus não forçou a barra em momento algum e por algumas vezes me surpreendi rindo.

Passava das onze horas quando chegamos na frente da minha casa.

—Vou direto para a cama, do contrário não vou conseguir levantar cedo. —Comentei enquanto desafivelava o cinto de segurança. —Amanhã temos uma encomenda de mais de trezentos vasinhos de flores.

—Se quiser posso vir ajudar vocês, vou estar livre depois do almoço.

—O mais trabalhoso são os laços e você é péssimo nisso —critiquei-o rindo ao me lembrar de sua dificuldade em amarrar fitas.

—Aí é que você se engana! —Ele tocou minha perna. —Venho treinando a sutura de cortes e isso aperfeiçoou meus trabalhos manuais.

Arqueei as sobrancelhas.

—Uau! Isso é bom para seus futuros pacientes —brinquei —, mas sério, nós damos conta, não se preocupe. —Abri a porta prestes a descer do carro.

— Eu adorei a noite, a conversa , a companhia... — ele segurou minha mão e dessa vez a dele estava tão quente que suava.

—Eu também, Marcus.

 Ele manteve seus olhos castanhos grudados nos meus, e eu tentei, mas não consegui desviar minha atenção. Milhares de coisas começaram a passar pela minha cabeça, inclusive Alex.

Quando ele me puxou nossos rostos se encontraram, ficamos a poucos centímetros de distância, Marcus enfiou as mãos por dentro dos meus cabelos e segurou a minha nuca.

—Eu vou te beijar, Lia... —ele sussurrou como se pedisse a minha permissão.

Respirei fundo, fechei meus olhos e me aproximei mais, dando o aval que ele precisava.

Foi um beijo calmo, delicado e demorado. Cheio de sentimentos, dos mais variados, carregado de histórias, momentos e mesmo tendo beijado Marcus outras milhares de vezes, aquele beijo foi completamente diferente.

Ele não teve pressa, parecia estar querendo me reconhecer, e aquilo foi de certa forma importante para mim, já que eu mesma precisava me reencontrar. Cheguei à conclusão naquela noite, que talvez Marcus fosse o caminho para isso.

—Marcus, eu —comecei a falar ainda recuperando o meu ar.

Ele sorriu.

—Eu sei o que você vai dizer, Lia — ele acariciava meu rosto —,que esse beijo não significa que reatamos.

Fechei meus olhos e confirmei balançando a cabeça.

—Devemos ir com calma. —Sussurrei abrindo meus olhos. Marcus continuava me encarando e seus olhos denunciavam toda a sua paixão por mim.

 —Vou ter toda a paciência do mundo, Lia —firmou antes de partir.

 De volta ao meu quarto e sozinha de novo, travei uma batalha interna comigo mesma. A vontade de abrir aquele guarda-roupas, e de pegar a revista, era quase que incontrolável.

Eu me sentia adicta quanto àquele habito, tal qual um viciado em abstinência, e só consegui me segurar porque forcei-me a pensar em Marcus, em como ele não merecia aquilo, e em como ele estava engajado e determinado em salvar nosso relacionamento.

                                             ************

—Mãe, acabei de contar e ainda faltam noventa vasinhos.... —Coloquei as mãos na cintura, estava preocupada. —Acha que conseguimos terminar em uma hora?

Ela nem me olhou, parecia uma máquina trabalhando.

—Temos que conseguir. —Ela foi firme. —Agora vamos Lia, não perca tempo...Mão na massa!

Lucia riu, estávamos há horas trabalhando em ritmo frenético e o movimento daquela sexta-feira na floricultura fora acima de nossas expectativas.

 Montamos uma espécie de linha de produção para conseguirmos montar as centenas de vasinhos. Minha mãe colocava as flores nos vidros, eu os envolvia nos plásticos decorativos e Lucia fazia os laços e pregava os tags de propaganda; mesmo assim, nosso serviço parecia não render.

—Tem alguém aqui precisando de uma mãozinha? —Marcus apontou a cabeça para dentro da floricultura. —Ou seria melhor, duas?

 —Marcus, você caiu do céu! —Minha mãe ergueu as mãos como se agradecesse a Deus por sua presença ali.

 Ele caminhou até nós e depois distribuiu beijos a nós três, todos no rosto.

—Basta que me digam o que tenho que tenho que fazer—disse estralando os dedos.

 —Coloque-o para ajudar com os laços — olhei para Marcus sem interromper meu trabalho —,ele me contou que tem treinado trabalhos manuais, costurando mortos.

 —Que horror! —Lucia gritou.

Todos nós acabamos rindo.

Marcus passou mesmo o resto da tarde conosco, e realmente sua ajuda fez uma grande diferença. Conseguimos entregar a encomenda no prazo e tirando o cansaço, tudo saíra perfeito.

—Que tal um sorvete? —Marcus sugeriu assim que fui liberada.

—Estou acabada —choraminguei.

—Vai ser rápido... —Ele entrelaçou seus dedos nos meus.— Eu prometo.

—Tudo bem — concordei sem reservas —,mas não vamos demorar.

 A sorveteria ficava bem perto, apenas alguns quarteirões de distância, aliás, como tudo em Monte Real. Caminhamos lado a lado e Marcus esperava o momento certo para segurar em minha mão, enquanto eu, de forma sutil e instintiva, dava um jeito de evitar que aquilo acontecesse.

  Nem era pelo que as pessoas diriam, porque a noticia de que namorávamos de novo já rodava a cidade, mesmo não sendo bem isso. Acontece que eu estava na defensiva, portanto, não conseguia me desarmar.

—O de sempre? —Marcus perguntou-me.

—Pode ser — concordei, enquanto acenava para Marina, ela conversava com outras duas garotas do outro lado da rua.

Fazia tempo que não nos falávamos e com tantos problemas, nosso clube da Luluzinha parecia fadado ao fracasso. Tudo bem que a culpa não era apenas minha, todas estávamos com as vidas cheias de obrigações e não dava mais para matar a tarde assistindo meninas malvadas e comendo brigadeiro na panela.

—Lia...quanto tempo! —Ela veio falar comigo.

Trocamos um abraço demorado.

—Se morássemos numa cidade maior, correríamos o risco de passarmos anos sem nos vermos —brinquei.

Ela olhou para dentro da sorveteria e acenou para o Marcus.

—Fico feliz que tenham se entendido. —Ela sorriu. —São perfeitos juntos, como aqueles casais das séries que assistíamos.

 Embora fôssemos amigas, nunca fomos confidentes, na verdade a única amiga que sabia tudo sobre a minha vida era a Gabi.

—Estamos tentando, eu diria. —Tentei resumir.

—Vai dar tudo certo, — ela me abraçou para se despedir—tenho certeza, e precisamos marcar uma reunião só de meninas. Estou com saudades de todas nós juntas.

 —Eu também —assenti. —Vamos marcar sim.

 Depois que Marina partiu, Marcus e eu sentamos em uma das mesas e dividimos uma taça gigantesca de sorvete com todas as caldas e coberturas existentes naquela sorveteria, exatamente como fazíamos antes. Ele me acompanhou até a minha casa e lá, na rua nos beijamos novamente.

Fazendo isso, eu estava assinando em baixo dos rumores, de qualquer forma, em queda livre como vinha, agarrar-me em Marcus, pareceu-me a única saída.


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