Capítulo 1 - O Lenço que eu guardei

Faziam alguns bons meses que Yona viajava com Hak, Yoon e os quatro dragões. Estavam há poucos dias em um dos vilarejos da terra. Um terremoto havia atingido a vila deixando dezenas de feridos e caos.

—"Yona-chan me passe as bandagens!" - Yoon pediu aflito estendendo a mão. Yona que já havia aplicado a mistura de ervas feitas, rapidamente ajudou o amigo a enfaixar o abdomem de um aldeão ferido.

Kija entrou rapidamente na casa em que estavam utilizando de enfermaria, uma das poucas habitações que não haviam sido derrubadas, carregando mais um ferido junto com Shin-ah:

—"Temos mais um! Onde eu o coloco?" - Perguntou o dragão branco. Yona estendeu uma esteira de palha ao lado do soldado que havia recebido tratamento:

—"Aqui Kija, deite-o!" - A princesa disse, congelando ao ver que o homem estava com a perna estraçalhada. Virou o rosto em reflexo contendo o enjoo instantâneo. Ficou pálida, com as mãos tremendo.

Kija e Shin-ah obedeciam as instruções de Yoon que agia contra o tempo. Usaram éter para adormecer o homem que antes gritava de dor. Fizeram um torniquete com um cinto acima do joelho:

—" Vamos ter que amputar ou ele vai morrer. Eu não tenho força o suficiente para fazer o corte. Chame Jae-ha ou Hak rápido!"- Pediu Yoon a Kija que assentiu e saiu correndo pela porta.

"Am-Amputar?"- Yona acordou de seu estado de pânico engolindo em seco. Nunca havia visto tanto sangue. Mentira, apenas uma vez...Naquela noite, quando seu pai…

Hak entrou tampando o nariz quando sentiu o cheiro de sangue. Aquela casa tinha cheiro de morte. Ainda haviam pessoas sendo resgatadas dos destroços, pediu que Kija e Shin-ha continuassem a ajudar Jae-ha e Zeno a achar os desaparecidos.

Seu coração apertou quando viu a face pálida da princesa. Era um ambiente horrível para alguém como ela estar. Estava assustada, suando frio e com as vestes sujas de sangue. Yoon explicou como e onde deveria ser feito o corte. Yona não se mexia, encolhida como uma criança.

"Yona! Não é hora de congelar! Precisamos que você ajude a segurar esse homem, ele vai acordar com a dor e se ele se mexer, podemos fazer um estrago ainda maior. Ainda vamos precisar cauterizar o ferimento e costurá-lo! Acorde, ajude quem precisa!" - Yoon balançou firmemente os ombros da amiga, despertando-a de seu pavor.

Ele tinha razão, não podia deixar de ajudar quem mais precisava por conta de sua covardia. Olhou para Hak que a observava silenciosamente. A jovem com determinação segurou os braços do homem com força. Hak pegou um machado, esterilizou com fogo e álcool conforme as instruções de Yoon. Respirou fundo e apontou a lâmina um palmo acima do joelho:

—"No três. Um, dois...TRÊS!" - Hak cortou a perna do homem que deu um grito ós isso, correu para segurar o homem com Yona enquanto Yoon cauterizava o ferimento com fogo. O cheiro de carne queimada impregnou o lugar. O homem desmaiou de dor. Após terminar o procedimento, Yona levantou bamba e correu pela porta, deixando os dois cuidando do homem. Hak chamou pela princesa preocupado. Yoon suspirou cansado secando o suor da testa com o antebraço:

—"Vá atrás dela, eu vou terminar de enfaixá-lo e limpar tudo por aqui. Ela precisa de você agora."

Hak concordou e foi atrás da jovem. Correu um pouco até ouvir um som característico. Yona estava agachada em um arbusto vomitando. A expressão de Hak era de preocupação. Sabia que a princesa odiava vomitar, desde criança sempre se forçava a aguentar o enjoo e quando precisava botar para fora, sempre chorava no final.

Hak segurou seu cabelo escarlate com cuidado para que não caísse em seu rosto. Já passava um pouco do ombro da jovem. Havia crescido rápido desde que perdeu suas madeixas naquele fatídico dia do penhasco. Quando acabou, Yona tossiu soluçando, tampando o rosto cheio de lágrimas com as mãos.

Hak suspirou pesadamente. Ela tinha motivos o suficiente para estar daquele jeito. A situação por completo já era uma cena de terror. Mas sabia que o sangue a fez lembrar de seu pai. Assassinado por Soo Won..Aquele desgraçado. Acariciou o pescoço de Yona de leve enquanto os soluços iam se acalmando. A princesa reconhecia aquele toque. Quando abriu os olhos viu um lenço pendurado em sua cabeça. Secou a boca e o suor da testa:

—"Não olhe para mim. Estou um caco…" - Yona disse baixo apertando o lenço de Hak.

"Princesa, não é como se eu não tivesse visto sua cara inchada e vomitada antes...Pare de besteira, olhe nos meus olhos." - Hak a segurou pelo ombros virando Yona para si. A princesa encarava o chão envergonhada. Se abaixou até que seus olhos estivessem na mesma altura e segurou seu queixo, olhando em seus olhos:

—"Estou orgulhoso de você. Aguentou a situação da melhor forma possível. Aquele homem vai sobreviver graças à sua coragem, princesa". Hak notou um respingo de sangue no queixo dela, passando o lenço devagar, limpando o local, a deixando envergonhada:

—"V-você nunca é tão legal assim comigo…"

—"Digamos que hoje você está ganhando um desconto…" - Hak sorriu fazendo carinho em sua cabeça e colocando o lenço na palma de sua mão. - " Leve o tempo que quiser, pegue um ar e volte. Ainda precisamos de ajuda na vila."

Hak virou de costas e se afastou devagar indo para a vila. Suspirou frustrado: " Odeio vê-la chorar."

Yona se encostou em uma árvore mais afastada, respirando fundo. Olhou para o lenço manchado de sangue que Hak havia lhe emprestado e notou um pequeno detalhe. Uma letra "H" bordada com uma flor pequena na borda do lenço. Conhecia aquilo muito bem.

Ela havia bordado esse lenço para ele na primeira aula de costura no castelo há muitos anos atrás. Eram dois lenços. Um para Hak e o outro para...So Woon. Hak havia guardado com ele todos esses anos? Sorriu de forma triste apertando o tecido com as duas mãos. Jamais imaginou que guardaria seu bordado torto.

Será que So Woon havia tido essa consideração? Balançou a cabeça negativamente. Ele não merecia sequer existir em sua mente. Levantou determinada, tirando a poeira dos joelhos. Iria voltar para a vila, precisavam de sua ajuda.

[...]

Tomava chá calmamente no jardim do Castelo de Kouka. O sol estava se pondo deixando o céu escarlate. O brilho refletia no líquido em sua xícara. Uma pétala de cerejeira pousou em seu chá, chamando sua atenção.

Ela estava viva..Mais viva e diferente do que nunca. Sempre que chegava a um local com problemas, ela já havia passado por lá e resolvido. De fato Yona morreu naquela noite. A menininha frágil que conhecia havia morrido naquela noite. Ela havia virado uma leoa.

Sua mão tremeu,derramando um pouco de chá em seu kimono branco. Sorriu triste:

" Puxa...Como sou desastrado…" - E tirou do bolso um lenço, limpando o local.

" Vossa Majestade So Woon! Os governantes das quatro terras já chegaram. Estão lhe esperando no salão principal." - Han Joo Doh, seu braço direito, o tirou de seus devaneios.

—"Sim. Já estou indo." - Sorriu calmamente, se levantando. E antes que seguisse seu guarda, observou o pôr do sol magenta se espalhando no céu. Não pôde deixar de pensar que Yona era como aquele sol, que espalhava brilho por onde fosse, contagiando o céu com seus raios.

Olhou mais uma vez para o lenço em suas mãos passou o dedão pela primeira letra de seu nome e uma flor. "Este é o nosso pequeno segredo." - Disse ao sol guardando o lenço em seu bolso, seguindo para o salão.

Continua…