It's a Good Life escrita por No one


Capítulo 4
Capítulo 4 - "Merda"


Notas iniciais do capítulo

Yoooo! Vamos que vamos, mais um capítulo para vocês! :)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/746890/chapter/4

Matt me olhou como se algo dentro dele estivesse se despedaçando, sua expressão era difícil de se ler. Virei meu rosto em direção a praça que já estava praticamente vazia, ou seja, era tarde e eu deveria ir logo para casa. Suspirei mais uma vez e percebi que minha noite estava sendo resumida a isso.

            - Claire? – A voz doce dele fez com que eu me virasse e voltasse a encara-lo instintivamente. – Você ainda se sente assim?

            - Esqueça o que eu falei, já faz tempo. Isso foi a muito tempo atrás. Hoje sou outra pessoa, não tem mais importância.

            - Não existe “já faz tempo”. Só existe memórias que tem significado e as que não tem.

            - Isso não tem mais significado algum para mim. Toda essa história. A única coisa que tem significado é que se puder ajudar a alguém a se livrar desse tipo de relaci...coisa, eu vou fazê-lo.

            - Você já saiu com alguém depois do meu irmão? – O olhei confusa e arqueei uma sobrancelha, mas que raio de pergunta era aquela? – Não me entenda mal, só quero saber se você conseguiu dar um fim a tudo isso.

            - Isso é relativo. Eu superei isso, ao meu modo. Sair...não. E você?

            - Estamos falando de você.

            - Estávamos. – O corrigi levantando um dedo em sinal de negação. – Quero saber o que aconteceu com você durante esses anos, além de perder um encontro.

            - Me arrependo profundamente de ter perdido esse encontro. – Desviei meu olhar do seu. – Não aconteceu nada muito diferente de você. Entrei de cabeça em meu trabalho, me tornei o melhor, consegui algumas promoções. Bem, a verdade é que eu me resumo a delegacia, assim como você ao hospital.

            - Ei, eu não me resumo ao hospital, eu tenho uma vida fora daquele lugar também.

            - Ah é? Quando foi a última vez que você saiu?

            - Agora, por exemplo.

            -Hoje não conta. Quando?

            - Hmmm, não lembro agora, talvez semana passada.

            - Admita logo, Claire, você se enfiou no trabalho, assim como eu.

            - Pelo menos você admite que é um viciado em trabalho. – Ele bufou e rolou os olhos. – Okay, okay, eu me enfiei no trabalho, admito. – Falei levantando ambas as mãos. – Em minha defesa, isso fez com que eu fosse promovida a chefe mais rápido.

            - E fez com que você salvasse minha vida também. – Ele se aproximou mais de mim, fazendo com que meu coração voltasse a tentar pular do meu peito. Concordei com um leve aceno de cabeça e voltei meu olhar para a praça, agora vazia.

            - Nossa relação, Ed e eu, sempre foi tóxica. Eu estava me matando aos poucos e nem percebia, achava que precisava daquilo para sobreviver, que se um dia ele não estivesse mais comigo, eu poderia morrer. Hoje eu vejo o quão idiota eu era. - Virei-me em direção a Matt que me observava atentamente. - Desde o primeiro minuto em que nos conhecemos, já não foi bom, ele cantou a atendente, disse que estava ali apenas porque o irmão idiota não poderia ir, me chamou de gostosa, e eu, como a boba que era, apenas me concentrei nos pontos positivos de sua personalidade. Por isso eu mudei, Matt, eu precisava mudar. Quando ele foi para a França e eu descobri todo o resto, me senti horrível, na verdade não sei explicar o que aconteceu comigo naqueles meses, eu parecia um White Walker.- Dei risada juntamente com ele, na tentativa de tornar o ambiente mais leve, deu certo. - Quando eu o encontrei após o acidente, eu não esperava vê-lo, foi um choque em todos os sentidos possíveis da palavra. Acho que quando ele perguntou sobre a esposa dele, o que havia ainda dentro de mim, terminou de quebrar, por isso que quando você me viu sair da emergência, me achou diferente, eu realmente me sentia diferente. Eu havia decidido meio que acabar com ele, com a vida social no caso. Finalmente estava ciente, após anos, do que ele havia feito comigo, dos abusos físicos e psicológicos, ia processá-lo, eu queria acabar com Ed de uma forma que ele nunca mais esqueceria, mas como sempre, ele foi mais esperto, e morreu, se livrando de tudo que eu poderia tentar. Fiquei sem poder fazer nada, apenas com uma vingança planejada. Mudei de área dentro do hospital e decidi ajudar mulheres vítimas de abuso e agressão, era o que eu poderia e conseguia fazer. Afastei-me de todos que me conheceram na época em que estávamos juntos, era o meu jeito de proteger-me do passado e um modo de nunca mais voltar a falar no assunto. Sei que não foi a melhor das ideias fechar-me e incorporar a médica carrancuda, fria, calculista e racional, mas deu certo e sinceramente eu gosto dela na maioria dos momentos. Eu estava quebrada, Matt, mas eu consegui me reerguer e concertar aquela merda que eu chamava de vida. Minha vida agora não é perfeita nem boa, é um fato, eu vivo apenas para hospital, mas foi eficaz até este momento. - Fiquei o encarando enquanto ele, gradativamente, ia assimilando meu desabafo.

            - E eu achando que a minha vida tinha sido uma merda durante estes anos, achando que poderia ter perdido você, talvez para sempre, achando que você realmente havia se casado com aquele embuste, ainda bem que não. Também sei que a minha vida não é perfeita, eu vivo na delegacia, passo mais tempo lá do que na minha própria casa. - Ele riu novamente e eu notei como ele ficava bem sorrindo, combinava com seu rosto, até que a minha ficha caiu sobre o que ele havia acabado de falar.

            - Como assim me perdido para sempre? - Perguntei levantando-me do banco da praça. Poderia até ser uma reação exagerada, mas eu o conhecia bem, ele não falaria aquilo por impulso, ele era pior do que eu. Ele havia pensado muito bem naquela frase.

            - Eu realmente preciso te explicar, Claire? Tudo o que eu te falei naquela vez, na saída do pub, não mudou nenhuma vírgula até hoje. - Matt colocou-se de pé em frente a mim, arregalei meus olhos e tentei lembrar de todas as suas palavras, nem precisei fazer muito esforço, eu sempre lembraria delas. Foi especial demais pra esquecer, e por isso lembrei-me do que poderia acontecer caso eu levasse isso adiante. Matt estava machucado e eu também, aí você deve estar se perguntando: “porque não dar uma chance ao coração? Deixar o amor curar dois corações partidos”. Bem, por que isso aqui é a vida real, e isso só funciona em contos de fadas, ou seja, melhor fugir enquanto é tempo.

            - Matt… - Levantei minhas mãos em sinal de defesa quando ele ameaçou aproximar-se. - Eu preciso ir, já está tarde. Olha, você estava certo, precisávamos conversar, foi bom, sinto-me bem melhor, talvez eu pare de ser um tanto carrancuda no hospital. - Falei sorrindo e dando dois passos atrás.

            - Realmente seria bom, os residentes morrem de medo de você. - Ele colocou uma mão no bolso e a outra foi para os cabelos, estava nervoso, mas porquê?

            - Morrem de medo porque certamente fizeram algo errado. Eu realmente preciso ir, me desculpe e obrigada, realmente obrigada, Matt. - Me aproximei dele novamente para abraçá-lo, por mais que eu quisesse sair correndo, não poderia deixar de fazer isso, ele ainda era o Matt.

— Eu que te agradeço, Claire. - Ele sussurrou em meu ouvido enquanto me abraçava fazendo com que eu me arrepiasse da cabeça aos pés.

“Merda!” Pensei.

Agora era questão de sobrevivência, eu precisava sair dali antes que um desastre acontecesse. E enquanto meu cérebro deteve-se em procurar rotas de fugas, meu corpo relaxou e eu nem consegui prever o momento em que seus lábios colaram-se aos meus. Mas principalmente, eu não pude prever como eu além de ter deixado ser beijada, havia passado meus braços em torno de seu pescoço e retribuído aquele beijo como se a minha vida dependesse daquilo. Eu me entreguei a ele de um modo que eu não sabia explicar, e senti que ele fazia o mesmo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "It's a Good Life" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.