Só foi reparar na possibilidade quando se encontrou fitando a gilete em cima da pia de seu banheiro.

Era outra crise. Mais uma. O peito queimava, a cabeça doía e o desespero sufocava. As mãos tremiam, implorando-a desesperadamente para agarrar alguma coisa e fazer algo. Sentia aquele desejo incontrolável de se machucar há semanas; junto da ansiedade, era seu mais novo contrabando.

Pensou em usar a lâmina. Poderia lavá-la, só para garantir que não tinha nenhuma doença, mas sabia que não vingaria. Queria uma solução rápida, e se fosse se cortar, teria um sangramento para estancar e uma cicatriz para cobrir por mais sabe-se lá quantos anos.

Olhou para suas próprias mãos, e ela magicamente veio.

Unhas.

Puxou a manga longa de seu casaco e, de imediato, começou a coçar sua própria pele. Coçar com força. Lágrimas vieram aos seus olhos, mas elas não importavam. Aplicou mais força, desejando internamente que a pele rompesse, sangrasse por completo, e aquele sentimento horrível pudesse sair.

Acabou parando. Tinha gente em casa, aula na segunda-feira. As pessoas veriam.

Respirou fundo, se recusando a olhar para a epiderme avermelhada que ardia. Voltou a manga ao seu lugar, lavou o rosto e saiu do banheiro.