Você nunca está preparado para dizer adeus a pessoas queridas, muito menos para aquela pessoa que você esperava passar o resto da sua vida medíocre junto. Aquela pessoa que sempre estava ao seu lado, a mãe de seus filhos, sua parceira para os bons e os maus momentos.

Eu enterrei Abigail ontem, e eu sentia como se estivesse sendo enterrado junto com ela. E uma parte de mim foi. Eu me senti incompleto, um vácuo de quem eu era quando estava com ela.

As memórias que tinha com ela agora passavam em minha mente, zombavam de mim, acusavam-me de ter sido a desgraça da vida dela. De ter arrastado ela para o inferno e eu, mesmo tentando negar, sabia que isso era culpa minha.

Se ela não tivesse me conhecido, se eu não tivesse ido comprar cigarro no Jackie’s naquela noite. Se nós fossemos dois estranhos, será que ela ainda estaria viva? Casada com um advogado? Moraria em uma casa bonita no centro de Rising Sun? Será que ela ainda estaria nessa cidade, pra começo de conversa?

Era estranho pensar que nossa história de amor durou tão pouco. Foi tudo tão rápido, ficamos menos de cinco anos juntos e, por ironia do destino, mais da metade desse tempo eu estava preso, longe dela.

Fui deitar ontem depois de ter feito Christa e Harley dormir. Rodei na cama, sentindo que estava deitado numa cama de pedregulhos. Os lençóis tinham seu cheiro, o quarto está cheio de lembranças dela. A casa está, o clube... Tudo me lembra ela. O sorriso doce de quando a trouxe para nossa casa depois de nos casarmos e a risada alta quando montou na minha moto vestida de noiva.

Meu pai costumava me dizer que nessa vida o que amamos se tornam nossos pontos fracos; que um homem que ama é um alvo fácil e que não podemos nos dar o luxo de nos casarmos, de trazermos mulheres para dentro do clube, pintando um alvo nas suas costas.

Para ele, não era uma questão de se mas de quando.

E eu ignorei tudo que ele me ensinara quando pousei meus olhos em Abigail. E quando transamos pela primeira vez, nos fundos da Jackie’s e com toda a adrenalina de sermos pegos. Abigail era o melhor dos dois mundos e eu ignorei tudo, tudo que meu pai falou por acreditar que era a minha vez de ser feliz.

E eu fui, Deus, como eu fui feliz. Mas agora aquela felicidade parecia um fantasma, rodeando-me, apontando o dedo na minha cara e dizendo que eu era apenas um reflexo do que eu era.

As noites são carregadas de lágrimas escondidas e apenas as paredes do quarto que eu dividi com a mulher que amo são testemunhas do quanto eu estou destruído. Mas com o nascer do sol, eu me levanto. Agora, mais do que qualquer hora, eu preciso ser um pai para Harley e Christa, preciso estar mais presente e tentar, ao máximo, ser pelo menos metade da mãe extraordinária que Abigail foi.

E seguir em frente, mesmo que meu coração tenha sido enterrado a sete palmos debaixo da terra, junto com a mulher da minha vida.