Àqueles que, como eu, são tidos pela Igreja e seus fiéis como reles mortais e pecadores por opção, destinados à anátema e penitência por conta de nossos atos libidinosos e imorais, clamo: mantenham sua essência.

Eu sei que não é uma tarefa simples, afinal, o senso comum exerce uma grande influência sobre as minorias; corrompem a nossa essência e deturpam a nossa percepção acerca das pessoas, do mundo, da vida.

Foi assim comigo na época da escola, com a filha da minha vizinha em seu emprego, é assim com aquela garota que está se isolando na faculdade, será assim com algum parente nosso no esporte que ele praticar… e do jeito que as coisas andam, infelizmente, ainda será assim com muita gente.

Culpando-me por determinadas coisas, tentei mudar interna e externamente. Sabotei o meu verdadeiro eu, conspícuo devido ao meu visual indiscreto e o jeito irreverente, acabei por tornar-me um ser reprimido, arrefecido e solitário. Quase invisível.

Isso é um ciclo maligno que se repete constantemente. Aquela coisa de o mesmo filme, novos atores, sabe?

Perdi longos anos até conseguir encontrar a força para resistir e a liberdade para existir, mas enfim consegui.

Enquanto esperavam a ressurreição de Jesus, quem ressurgiu foi aquela bichinha que a sociedade conseguiu trancafiar num armário repleto de sentimentos ruins, quase palpáveis, que sufocavam-na lenta e tortuosamente.

Dali em diante, eles poderiam caçoar dos meus trejeitos espalhafatosos, do meu tom de voz agudo ou até mesmo da minha estética feminina, porque eu deixei de me importar. Afinal, tudo isso é meu, eu sou assim e sou de mim; vivo pra mim e tenho de agradar somente a mim.

Retoquei-me, deixando para trás aquela fase desfacelada, e retomei o meu brilho; passei a me sentir pleno exatamente do jeitinho que eu sou — e espero que todos, algum dia, sintam isso também.