A Morte de Eugenie escrita por GabyGraham


Capítulo 1
Lembrança de Morrer


Notas iniciais do capítulo

Oi amores, atenção com os avisos:

— Essa short-fic trata de assuntos pesados, desde necrofilia (sexo com mortos) à alucinações e esquizofrenia. Por favor, tenha consciência que é uma narrativa complicada e talvez perturbadora, leia APENAS se tiver certeza que possui "estômago" pra isso.
— Leia de mente aberta.
— Não é uma obra gore!
— Todos os personagens aqui presentes me pertencem. Criação original, completa minha. PLÁGIO É CRIME! Não plagiem, não copiem. Se eu encontrar alguma fic com formato semelhante à minha, irei denunciar.
— Robbie Kay não é ator nesse conto. Mas só ele me inspira, então o imagino sendo o personagem principal.
— Os capítulos não serão gigantes como minhas outras histórias, porque como disse, é um conto (short-fic)
— Tudo aqui é inspirado nas obras de Alvares de Azevedo.

Boa leitura s2



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/746491/chapter/1

 

 

 

 

Eu fui assassinada numa noite fria de outono, folhas de cor carmim e âmbar se soltavam dos galhos finos e retorcidos das árvores, leves como plumas, enchendo a trilha qual eu passava. Apressada, lembro-me que voltava do trabalho, seguindo por entre os becos de Bibury, pequena aldeia do condado de Gloucestershire, na Inglaterra. Nasci em Bibury, e morri em Bibury.  Me chamo Eugenie e deixei meu filho de quatro anos órfão. 

Desde sempre tive a leve impressão de ser perseguida, era uma presença constante. Nunca diferenciei os ruídos que ouvia. Não sabia se eram ecos de meus passos, ou outros passos que me acompanhavam na surdina. Cansava-me de me preocupar, ou investigar, e a  constante impressão prosseguia  em mim, feito um fantasma que me escoltava por todos os lugares. 

Virava a esquina que dava para a minha casa, quando meu assassino me pegou de surpresa. A princípio, ele arrancou a bolsa de meus ombros, puxando com violência. Olhei-o perplexa, pois pensei tratar-se de um ladrão. Contudo, ele somente queria simular o latrocínio. O propósito dele não era me roubar, o seu propósito era fazer-me dele, apenas dele. Não o reconheci, ele usava uma touca de rosto, daquelas que deixa só os olhos e boca de fora.

E embora estivesse de face coberta, pude vislumbrar seus olhos de intenso verde, que refletiam na luz lunar. Meu coração saltava, e eu sentia as baforadas de folego pesado, que apreciava meus últimos instantes de vida. Era como se ele ouvisse minha corrente sanguínea pulsando ágil pelas veias, naqueles breves instantes de silêncio e tensão. Eu me sentia sendo parcialmente lida e devorada por sua atenção. 

Quando ele ergueu a faca, eu tive certeza que morreria. Quis fugir, é óbvio. Quis correr, mas minhas pernas estagnaram sob o pânico, e não fui capaz de me desesperar a tempo. O mascarado tinha pressa, queria terminar logo.  A lâmina fincou meu peito, e eu pressenti a invasão com a adrenalina irradiando por todo meu ser. Era o meu fim? Eu estava mesmo partindo? Abandonando o que criei em vida, a fibra que enlaçava o espírito ao corpo  se arrebentou, e o punhal frio alcançou o coração que castigava a caixa torácica. 

Minhas pernas antes paralisadas, se soltaram para a gravidade, e meus joelhos tocaram o chão. Perante os olhos verdes de meu assassino, eu vi seu semblante e sobrancelhas expressivas aparecendo rente à máscara de tecido. Ele sorria. Era um sorriso doce, de despedida. E sendo coberta pelas sombras que desfolham a matéria, eu o reconheci. Robbie Kay,  o agente funerário da cidade.

Um grito mudo queimou na garganta, era meu último suspiro. Amoleci ao concreto, e ali permaneci, pra nunca me levantar. Robbie me abandonou, por hora não faria nada. Ele tinha em mente que nosso reencontro seria em breve. Mais hora, menos hora, para sua funerária me levariam, afinal. Na minha poça de sangue, banhada pela Lua, largava a vida como quem deixa um longo pesadelo.

Nos derradeiros relampejares de meu cérebro, recordava-me... Jovem Robbie, meu vizinho. Irônica a vida, e irônica a morte, morar do lado da funerária do vilarejo, com o cemitério como jardins dos fundos. A presença que me perseguia, noite após noite, era ele. 

—-----------

— Eu queria sair com você, Eugenie. - Robbie me dissera, há umas semanas atrás. - Todos os dias te olho, te admiro, me pego pensando em você todas as manhãs. 

— Robbie... Olha pra você, garoto. - eu falava, e não era na crueldade, pois eu ria pra ele, o menino que herdou a funerária do pai tão cedo. - Você ainda é um moleque!

— Não seja cruel comigo, Eugenie. Posso ser mais novo, mas isso não me faz menos homem. É por que sou agente funerário?

— Não tem nada a ver com seu emprego. Não sou hipócrita como os outros moradores do vilarejo. O que acontece é que sou casada, sou mãe. Se meu marido souber de suas tentativas de aproximação, arranca o seu couro. Dá o fora, Robbie! 

— Por favor. Sai comigo hoje, Eugenie? Ele não precisa saber. Podemos guardar segredo. 

— Não vou repetir. Já tenho minha vida, tome a sua vida agora. Não temos chance!

— Ainda te farei minha... Juro. Você vai ser minha. - foram suas finais palavras, antes de eu me desvencilhar pra sair de perto dele. 

—-----------

Meu corpo demorou pra ser liberado do IML. Encontraram-me naquela manhã, jogada à meio fio da rua de paralelepípedos quadrados e antigos.  A frieza da morte chegava como desterro de minha alma errante, que sem saída, se via aprisionada à carne assistindo aos cuidados da autópsia. Me abriram sobre a mesa de alumínio gélido, analisavam a fenda que atravessara meu peito, retiraram meu coração dilacerado e o estudaram, me dissecaram como um rato de laboratório, um resto que precisava ser investigado; pra depois voltar a ser recosturado, suturado e fechado como uma boneca perdida. 

Chegaram a conclusões não muito esclarecedoras, e o mistério ficara na pergunta: "Quem matou Eugenie? Por que roubaram sua bolsa e logo a mataram, se não houve reação da parte da vítima?" E acima das trágicas questões, havia a dor do choro, o definhar do pranto de meu marido e de meu filho. 

As lágrimas inundavam as pálpebras e eu os via sem o poder de consolá-los. Mas o pior estava por vir. Após despacharem o meu cadáver pro velório, tive a chance de reencontrar-me com meu assassino. Sem a máscara de ladrão, ele me recebeu como quem espera saudoso por uma visita. Me colocou na maca da funerária. Era aquela a hora que o agente tanto almejava, a hora de preparar meu velório.  Éramos somente eu e ele, e eu estava nua, inteiramente, pra ele. 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!