O Apócrifo dos Demônios escrita por Kentaro Miyazaki


Capítulo 1
O Estopim da Revolução




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—Veja só onde você chegou, Rothhgad, pretende realmente seguir em frente? -Disse uma figura feminina.

—Sim, se eu sobreviver hoje, eu farei assim que a batalha acabar.

—Tome cuidado, se o Satã descobrir, ele te crucificará.

—Não se preocupe, Zana, eu não fracassarei, mas preciso da sua ajuda pra reunir meus homens no final do confronto.

A figura feminina se curvou educadamente e se retirou da sala. Eis que logo após sua saída, outro alguém bateu na porta.

—Sir Rothhgad.

—Entre.

Pela porta, surgiu um ser esquisito, parecia um lagarto, porém bípede, vestido com mantos vermelhos, carregava um livro consigo e também podia falar.

—Uma reunião real foi convocada para os quatro cavaleiros do apocalipse, vim lhe informar para se apressar, Satã o está esperando.

—Já irei.

—Com licença. -Após dizer isso, o lagarto se retirou dos aposentos.

Rothhgad permaneceu sentado por um momento, refletiu consigo mesmo todas as dificuldades que enfrentaria após aquele que seria o dia mais fatídico de sua vida até então. Sentiu o pesar de suas futuras decisões e também sentiu calafrios percorrerem pelo seu corpo, mas logo acertou suas ideias com convicção e terminou de calçar sua bota.

Ao adentrar silenciosamente pelos portões da sala do trono, quatro demônios já estavam lá. Um estava sentado num trono escuro decorado de hematitas e três se curvavam em sua direção. Ao som do fechar dos portões, os três disfarçadamente inclinaram sua cabeça para a direção de Roth.

—Está atrasado. -Disse o que estava sentado no trono.

—Perdão, vossa alteza. -Disse Rothhgad fazia uma reverência.

—Talvez hoje será o combate decisivo para a Guerra Céu-Inferno, depois de tanto tempo. Preciso que vocês quatro liderem com extrema força os seus homens, fracassos não serão tolerados.

—Sim, vossa alteza. -Responderam.

Satã então olhou para o cavaleiro à extrema esquerda, um ser alto, com um semblante feroz no rosto, era bípede porém não se assemelhava nem um pouco a um humano, se assemelhava mais a uma árvore seca com dois enormes chifres no topo de sua cabeça, sua pele roxo-escura parecia ser composta por longos espinhos, trajava uma armadura cinza escura com detalhes verdes, e um manto verde-oliva, porém o mais surpreendente era um enorme buraco que havia em seu tórax, era vazio, do ponto de poder se enxergar o manto em suas costas ao olhar pela frente; e então lhe disse.

—Margushangmon, o cavaleiro que representa a fome, leve a dor para nossos inimigos, vingue-se pelo que os anjos fizeram à sua raça.

O ser se curvou e disse com sua voz intensamente grave e rouca.

—Sim, vossa alteza!

Satã então olhou para o próximo cavaleiro, este se assemelhava mais a um humano, tinha cabelos negros de comprimento médio, levantados pra cima e muito bagunçados, usava uma armadura mais leve e menor do que a do primeiro cavaleiro, ela era bem escura com detalhes roxos, mas o detalhe mais peculiar era que seu rosto era coberto por uma máscara escura com um bico longo e olhos vermelhos, sobre sua armadura caía um manto roxo que cobria quase seu corpo todo; devido a toda sua vestimenta, parecia muito com um corvo. Satã então lhe disse:

—Nalhagudgoth, o cavaleiro que representa a peste, leve a miséria para nossos inimigos, faça os implorar pela morte.

Ele se curvou e disse com uma voz fria e solene:

—Sim, vossa alteza.

Satã olhou para o próximo cavaleiro, era Rothhgad, este, pela aparência, poderia facilmente ser confundido com um humano se não fosse pelos seu par de chifres, tinha cabelos brancos, de comprimento curto para médio, caído e levemente bagunçado, chifres vermelhos de destacavam por entre os fios, também tinha uma pequena franja que levemente se mexia devido as frias correntes de ar que passavam pelo salão; seus olhos eram de cor magenta e suas expressões eram frias; sua pele era muito pálida e seu rosto era jovem, muito jovem para se falar a verdade, se fosse um humano poderia se dizer que tivesse 17 anos; em suas mãos, ao invés de mãos humanas, tinha um par de enormes garras espinhosas de cor que ia do roxo-escuro ao preto, trajava uma armadura carmesim com detalhes pretos e uns poucos laranjas e prateado, e também vestia um manto rubro por sua armadura. E então Satã lhe disse:

—Rothhgad, o cavaleiro que representa a guerra, leve a pior guerra para nossos inimigos, mutile-os e sacie-se com seus sangues.

Rothhgad se curvou e disse calmamente.

—Sim, vossa alteza.

O último cavaleiro era o mais misterioso, tinha uma armadura radiante, era branca com vários detalhes de várias cores claras, se assemelhava muito a de um anjo, porém, várias correntes grossas se entrelaçavam sobre ela, também trajava um manto sobre a armadura, era preto, criando um grande contraste de cores, este mesmo manto cobria sua cabeça como um capuz, deixando impossível ver seu rosto; na verdade, era como se não tivesse um. Satã lhe olhou e então lhe disse.

—Lúcifer, o cavaleiro que representa a morte, leve a dor da perda para nossos inimigos, hoje terás a chance de se vingar de seu povo. Caso veja necessidade, lhe permito usar todo o seu poder, porém ordeno que evite ao máximo matar os seus homens.

Ele então se curvou diante de satã, porém não lhe disse nada.

—Agora, quatro Cavaleiros do Apocalipse, reúnam-se com seus homens e guiem-nos à vitória!

Os quatro reverenciaram mais uma vez, e se retiraram da sala do trono. Juntos, saíram do castelo e foram para os portões da cidadela. Cada um subiu em uma montaria. A de Rothhgad era um cavalo escuro muito semelhante aos que os humanos montam, porém possuía uma pele encouraçada; a de Lúcifer era um Pégaso negro; a de Nalhagudgoth se assemelhava a um roedor, grande, fedorento e raivoso; e por fim, a de Margushangmon era um tigre que era quase duas vezes o tamanho do cavalo de Roth.

Após se ajustarem em suas montarias, demônios-servos vieram trazer suas armas, para Margushangmon lhe deram um martelo feito inteiramente a partir de galhos rígidos, também lhe deram um enorme galho em formato de cajado que tinha uma bola de aço espinhenta ligado a ele por uma corrente, ele colocou o cajado em suas costas e empunhou firmemente o martelo com as duas mãos. Para Nalhagudgoth, trouxeram-lhe uma foice escura com uma névoa ao seu redor e três pequenos frascos de algo que exalava muito mal, ele guardou os frascos em suportes nas laterais da armadura, empunhou a foice com a mão esquerda e segurou-se no pelo do rato com a outra mão. Para Lúcifer, lhe trouxeram duas espadas brilhantes acorrentadas por meio de um cadeado, Lúcifer passou suas mãos sobre ele e então ele se abriu, porém, cada espada ainda estava acorrentada individualmente, ele guardou uma sobre a bainha esquerda e usou essa mão para segurar as rédeas do Pégaso, enquanto empunhava uma das espadas com a outra mão. Então, um outro servo se aproximou de Roth.

—Sir Rothhgad, sinto muito, porém não sabemos qual arma é de sua preferência.

—Não se importe, não preciso das armas que vocês têm.

—O-o senhor tem certeza? -Disse o servo gaguejando de espanto.

—Absoluta, já estou preparado.

—Muito bem então, com licença Sir. -O servo se retirou.

Rothhgad e os outros três estavam de prontidão esperando o som das trombetas das torres avisar que o exército já poderia ser visto, prefeririam esperar para atacar do que fazer uma investida precoce e acabar deixando os portões da cidade vulneráveis para possíveis tropas que pudessem ter conseguido se esconder nas florestas próximas à muralha.

—Rothhgad, você está bem? -Disse Nalhagudgoth com sua voz fria e um pouco fanha devido a máscara. -Você parece mais tenso que o de costume.

—Sim, eu estou bem, deve ser por causa que talvez essa seja a batalha definitiva. -Respondeu Rothh, porém tinha total ciência de que esse não era o motivo real de se sentir assim.

—O Cavaleiro da Guerra tem medo de uma? -Zombou Margushangmon com sua voz horrenda e rouca. -Largue mão de ser fraco, moleque.

—Não se sinta superior, Fome, para nós, você é o mais velho, porém para a idade de outros entes da floresta, você não passa de uma criança também. No entanto, Rothhgad é bem velho para a sua raça. Guerra, quantos anos vocês já são considerados adultos mesmo?

—347 anos. -Roth respondeu.

—E você tem 432, se não estou enganado, sim?

—Sim.

—E você, fome, tem mais ou menos 2000 anos, sendo que a idade para ser um ente ancião é 9000 anos, ainda falta muito para você poder se considerar um veterano.

Margushangmon sentiu um ímpeto de raiva subir por seus galhos escuros, porém quando foi levantar seus punhos, percebeu que Nalhagudgoth já empunhava a foice em uma posição para um ataque certeiro, então desistiu de tentar alguma coisa.

O Cavaleiro da Peste relaxou sua postura ao perceber a hesitação e então voltou a falar com Roth.

—Não se preocupe, nós seremos vitoriosos, somos mais fortes do que qualquer escravo celeste.

Logo após isso, o sinal dos guardas da torre ecoou pela cidade, os portões da cidadela se abriram, dando caminho para um corredor que seguiria direto para os portões inferiores da cidade onde as tropas aguardavam os líderes. Os quatro cavaleiros deram impulso as montarias e cavalgaram até encontrar seus soldados.

Chegando aos portões da cidade, os quatro se separaram, cada um reunindo seu próprio exército. Rothhgad se reuniu com seu exército composto por demônios de vários tipos, gárgulas infernais, golens gigantes de pedra, sentinelas rústicas arqueiras, demônios monstruosos enormes e também demônios humanoides com armaduras de cavaleiro de vários tamanhos diferentes.

Rothhgad, quando seu exército já se reunira organizadamente, convocou os chefes de cada raça. Das gárgulas infernais surgiu Urak, ele era uma gárgula vermelha, com um par de chifres para frente e retorcidos, tinha um brilho azul nos olhos exalava um ar azul de sua boca, possuía grandes garras vermelhas e peludas e possuía uma armadura de pele escura. Dos golens de pedra, veio Ahmegrok, e assim como todos os outros golens ele era gigante, composto inteiramente de pedras, tinha uma anatomia humanoide, porém em sua cabeça não havia rosto e sim um buraco enorme, era perceptível que seu interior era oco; ao contrário dos outros golens do exército, em sua cabeça usava uma pequena coroa composta de pedras um pouco diferentes das de seu corpo, também trajava um manto rubro sobre seu enorme corpo rochoso. De um dos vários demônios enormes monstruosos, veio Garldrorn, era enorme seu corpo era totalmente desproporcional, tendo um tórax e braços enormes porém pernas baixas, seu corpo era preto com traços vermelhos, porém algumas partes de seu corpo, como seu ombro, eram compostas de rochas cinzas, como se fosse uma armadura natural como a de Ahmegrok, tinha uma cabeça enorme, parecia uma máscara, era vermelha com olhos grandes e verdes e uma boca com dentes igualmente enormes, seu rosto era a feição da feiura demoníaca, de sua boca saía uma pequena fumaça quando exalava porém de cheiro muito forte, possuía grandes chifres em suas testas e asas marrons com rachaduras onde circulava um vermelho que se assemelhava ao magma, era como se fosse uma mesclagem entre: um demônio, uma gárgula, um golem e um vulcão; em seus ombros também possuía um par de crânios enormes, e também estava empunhando um grande martelo. E por fim, dos demônios que assemelhavam mais a anatomia humana, surgiu Derechal, ele deu um passo adiante, com sua armadura púrpura, removeu-lhe o elmo delicadamente e assim foi observável seus longos cabelos loiros, olhos verdes e seu único chifre que saía do lado esquerdo de sua testa.  A única “raça” que não possuía soldados era a das sentinelas arqueiras, já que eles eram demônios criados artificialmente por alquimia, por isso se assemelhavam muito a robôs, andavam compassadamente, seus braços eram arcos e flechas ligados ao corpo e só se mexiam para mirar e atirar no alvo.

Estes quatro eram os generais de Rothhgad, a organização do exército servia um esquema de pirâmide, chefe de suas respectivas famílias reuniam seus soldados, os generais juntavam todas as famílias de cada raça específica e comandavam seus chefes e seus soldados, os Cavaleiros do Apocalipse escolhiam quem seria seus generais e dava as ordens para eles, que deveriam ser repassadas para os chefes e estes que repassariam para os soldados. Ou seja, os Cavaleiros eram a ordem máxima para o exército, ficando atrás apenas do próprio Satã, entretanto, nenhum soldado tem a obrigação de obedecer a outro Cavaleiro que não seja o seu líder, podendo até ser executado por traição caso o seu Cavaleiro julgue necessário. Então, embora lutassem juntos, o exército composto por diversas raças de Rothhgad não era o mesmo que de Nalhagudgoth, nem de Margushangmon e nem de Lúcifer.

Logo que os quatro generais responderam à convocação, Rothhgad se deu conta de que não percebera que Zana estava já ao seu lado. Ela era um demônio humanoide também, um pouco baixa, linda e de cabelos ruivos de tamanho curto. Ela que havia se encarregado de reunir o exército, como Roth havia-lhe pedido antes da reunião real.

Roth, de cima do cavalo, olhou para Zana, fez um sinal de agradecimento sútil com a cabeça e se virou para os generais.

—Ahmegrok!

—Uhhhh! -Golens não são capazes de falar, conseguem compreender muito bem o que é dito, porém só podem responder com sons estranhos que são emitidos com muito eco devido ao seu interior vazio.

—Leve os outros golens para a linha de frente, vocês farão a primeira investida.

—Ôhh!

—Urak.

—Às suas ordens, mestre. -Respondeu com uma voz grave e polida.

—Você mandará metade de suas tropas para levar todas as sentinelas que conseguirem, ficaram voando ao redor da arena para as sentinelas atirarem. A outra metade ficará conosco, irá depois do meu sinal levando os cavaleiros para atrás da formação deles, assim que chegar lá, podem atacar junto,

—Sim, meu mestre.

—Garldrorn

—Diga! -Este possuía uma voz igualmente monstruosa, talvez mais monstruosa do que a de Margushangmon.

—Você e os monstros serão a retaguarda, caso vejamos sinal de exército inimigo vindo pelas costas, vocês dão meia-volta e tratem de contê-los

—Entendido!

—Derechal, os demais cavaleiros que não forem com as gárgulas, virão comigo, então reúna-os.

—Sim, Sir Rothhgad. -Disse suavemente.

—As sentinelas que não forem, subam para a muralha para nos dar apoio!

As sentinelas se dividiram, metade entrou pelos portões inferiores para subir para os muros da cidade.

—Agora, em suas posições! -Gritou Roth.

Roth observou firmemente a aproximação dos anjos, entre eles haviam golens guardiões, são gigantes de armaduras douradas. Nos anjos, poucos vinham a cavalo, alguns vinham correndo, porém a grande maioria vinha voando proximamente ao chão, alguns com arcos, outros com espadas, lanças, Rothhgad não se preocupou com a ameaça aérea pois no ar seriam alvos mais fáceis para as sentinelas, então sabia que eles desceriam para enfrentar a infantaria demoníaca. Roth esperou mais alguns segundos, respirou fundo, se preparou e então bradou:

—AVANTE HOMENS!

Os golens começaram a correr em passos lentos, porém largos, formavam um alinhamento perfeito que se assemelhava a uma muralha de quatro metros de altura, uma ótima defesa e Rothhgad sabia disso.

As gárgulas ergueram se no ar carregando as sentinelas em suas costas, estas que já tencionaram seus braços e apontaram roboticamente para os inimigos no chão.

Rothhgad viu que agora seria sua vez, e então gritou:

—CAVALEIROS COMIGO!

Os cavaleiros deram um grito de guerra juntos e vieram com Rothhgad. Ele, Derechal e mais treze chefes seguiam a cavalo, enquanto o resto da infantaria seguia a pé mesmo, correndo com suas lanças, escudos e espadas. Era a parte do exército que mais se assemelhava ao dos anjos, tirando que ao invés de armaduras brancas e azuis claras eram roxas escuras com cinza, e ao invés de penas brancas eram asas demoníacas escuras.

Logo após a investida de Rothhgad, Urak guiou a outra metade das gárgulas com um quarto do total dos cavaleiros pelo ar assim como Roth havia ordenado. No decorrer do campo de batalha, a divisão de Rothh se encontrou com a de Nalha, a de Margu e a de Lúcifer.

Quando os exércitos se chocaram, a colisão foi tremenda com os demônios saindo na vantagem, os golens de pedra derrubaram a vanguarda angelical da extrema direita que vinha a cavalo, suas lanças não surtiam efeito na pele dura dos golens, logo que o exército angelical percebeu a tática de Rothh, deram ordens para todos os guardiões se moverem em direção àquela vanguarda. Logo então criou-se um empasse entre os guardiões e os golens, pareciam dois muros empurrando um ao outro. Os anjos atrás da linha de frente puseram-se a voar para atravessar a barreira que havia se construído, porém foram surpreendidos pelas flechas que vinham das sentinelas de cima das gárgulas. Os magos angelicais que estavam mais atrás conjuraram uma espécie de bomba de luz que queimou o corpo das gárgulas ainda vivas, incinerando completamente as que estavam próximas a explosão e criando caos para as que foram atingidas mais atrás.

Então os cavaleiros se aproximaram dos golens, Rothhgad sem desviar o olhar instante algum para a batalha, ergueu sua mão direita e materializou uma lança preta com detalhes vermelhos. Eles, com suas asas rápidas, atravessaram o muro que havia sido construído e fizeram a primeira investida contra os anjos. Os arqueiros angelicais que estavam voando se prepararam para atirar, porém um deles percebeu que há centenas de metros dali uma chuva de flecha se aproximava, ele deu um grito e os anjos desceram rapidamente, porém muitos não conseguiram escapar da tempestade.

Rothhgad junto com os outros cavaleiros travaram um combate direto, Roth não teve dificuldades em matar dezenas de anjos sem fazer com que seu cavalo diminuísse os passos em nenhum instante. Sua lança mutilava os corpos celestes como se fosse um açougueiro. Derechal também demonstrava uma maestria com a espada, porém este assim que teve oportunidade, desceu de seu cavalo e se pôs a andar ceifando todos que se aproximavam.

Os demônios de Roth tomaram a maior parte dos anjos muito facilmente, já estavam chegando na retaguarda inimiga quando de repente ouviram tiros bem altos. Quando Roth olhou para o céu, avistou uma nave dourada e enorme, era um navio voadora, chamada de Arca de Genesis, Roth nunca havia a visto, achava que só fosse uma lenda antiga. De repente enormes explosões de luz amarela brilhante surgiram no chão e milhares de demônios e golens foram mortos, criando assim uma maneira para os guardiões darem meia-volta e cercar os demônios que haviam passado pela barreira.

—Derechal! Me dê cobertura!

Roth virou-se para atrás na cela do cavalo, dando as costas para a guerra enquanto seu cavalo continuava a cavalgar em sua direção, enquanto que Derechal rapidamente voou em sua direção e o protegeu dos anjos que vinham pelas suas costas. Roth rapidamente mirou para uma das gárgulas que vinha com cavaleiro e arremessou a lança sobre ele a uma distância de mais de 500 metros. A lança atravessou diretamente seu coração e o puxou na direção do grupo de Garldrorn que estava nos portões da cidade, Urak e uma parte das gárgulas com os cavaleiros ainda estava lá, ao avistar aquele cavaleiro ferido por aquela lança, conseguiu entender o recado de Roth.

Urak deu a ordem para as gárgulas e partiram para os céus carregando os cavaleiros em direção da Arca, alguns poucos monstros seguiram juntos com suas asas pesadas para formar uma defesa aos tiros de luz que o canhão realizava.

Um dos três canhões principais da Arca virou em direção ao grupo de Urak e efetuou um disparo. Os monstros entraram na frente para proteger as gárgulas, muitos morreram ali e os sobreviventes ficaram com pelo menos metade do corpo destruído, mas mesmo assim insistiram em continuar voando em direção a arca.

Quando chegaram próximo a Arca, perceberam que a arca começou a brilhar num tom intenso de amarelo, Urak ficou tentando entender o que aquilo significava, ao ver que os anjos não estavam nem em posição de ataque ainda embora invasores estivessem bem próximos, ele então entendeu o perigo que estavam correndo.

—RECUAR! -Gritou.

As gárgulas e os monstros deram meia-volta rapidamente, porém devido a forte energia que estava sendo canalizada na arca, as correntes de vento sobravam em sua direção, atrapalhando a fuga.

Após uns cinco segundos, a canalização terminou, e então uma enorme explosão de luz começou a surgir vindo de dentro da arca para fora, muitos monstros e gárgulas foram desintegrados em instantes, menos da metade conseguiu fugir da explosão, e muitos estavam severamente feridos. Quando Urak conseguiu voltar para os portões da cidade, encontrou Zana conversando com Garldrorn.

—O que está fazendo aqui, senhorita?

—Estou tentando convencer Garldrorn de que Rothhgad me mandou.

—O que o mestre deseja?

—Ele quer que todos vocês avancem em direção ao exército angelical.

—Loucura! -Disse Garldrorn. - Portões desprotegidos?! Tem outros dos três cavaleiros para proteger, vamos fazer parte também!

—Zana, é devido aquilo?

—Sim...

—Então, mostre-lhe a prova de que Rothh te mandou.

—Prova? -Zana ficou confusa, mas logo se lembrou. -Verdade, aqui, veja Garldrorn.

Zana apresentou uma adaga que, pelos traços, nitidamente havia sido materializada por Rothhgad.

—Ele não a manteria materializada se não fosse necessário.

Garldrorn cheirou a adaga e percebeu que era magia de Rothh mesmo.

—Razão! Obedeceremos!

Garldrorn deu ordem para seus homens, ao lado de Urak e as gárgulas restantes, e partiram em direção a guerra.

Nalhagudgoth não havia ido para o campo de batalha, mandou metade de seu exército para lá, porém ficou com a outra metade para proteger os portões, ao notar que o exército de Rothh que deveria ficar protegendo a cidade estava partindo, apenas observou silenciosamente.

Rothhgad continuava combatendo os anjos, porém não parava o movimento de seu cavalo em hora alguma, era como se sua vontade mesmo fosse seguir até o final da retaguarda inimiga e continuar cavalgando após ela.

Ao perceber que Garldrorn e Urak se aproximavam, deu um grito:

—Sigam adiante! Não parem em momento algum, venham atrás de mim!

O campo de batalha estava um caos, a Arca a cada três minutos efetuava três disparos que detonavam milhares de demônios, o exército de Margushangmon que não havia passado pela linha de frente dos anjos como o de Rothh, estava lutando bem contra os anjos, porém sofria bastante dos tiros dos canhões pois estava muito reunido. Os monstros ao chegar no muro dos golens com os guardiões que restaram, ajudaram a destruí-los abrindo caminho para os golens seguirem em frente. Urak cogitou soltar os cavaleiros logo atrás dos monstros para aumentar a infantaria, mas quando ouviu o grito de Rothh, viu que o mais necessário era proteger os soldados restantes, então levou quatro mil gárgulas com os cavaleiros diretamente para frente.

Rothh com o apoio de Derechal e dos demais cavaleiros continuaram matando e persistindo incessantemente adiante, os golens e os monstros pegaram os guardiões pelas costas executando os que estavam despreparados mas continuaram correndo em seus passos lentos devido ao tamanho. As gárgulas que carregavam as sentinelas pararam de circular pela arena e passaram a seguir Rothhgad.

Após longas perdas de ambos os lados, Rothhgad conseguiu perfurar a última infantaria angelical da retaguarda, após um momento de alívio, Derechal gritou:

—Sir Rothhgad! Olhe mais a frente!

Quando Rothhgad levantou seu olhar, avisou mais adiante o que seria reforços angelicais, eram milhares vindo voando em sua direção, Rothh sentiu um calafrio forte, então olhou para as laterais, quando então avistou a sua esquerda a enorme floresta que havia ao lado de fora do muro da cidade.

Rothh então apontou com sua lança para lá e ordenou seus homens a segui-lo. Um anjo de cabelos pretos, uma tiara ao invés de um elmo, e uma armadura reluzente que vinha na vanguarda inimiga, observou com estranheza a atitude de Rothhgad.

Todo o exército sobrevivente de Rothhgad entrou pela floresta, os anjos começaram a atirar com flechas, porém como o mais importante era o campo de batalha, continuaram a diante ignorando Rothh.

Rothhgad penetrou a floresta cortando diversos galhos e troncos escuros com folhas negras que estavam no caminho. Após longas horas de cavalgada, e todo o exército com dúvidas, porém nenhum deles se atrevia a perguntar o que significava essa atitude de seu líder, eles finalmente chegaram a um vale de grama seca, a vegetação naquela região do inferno era bem diferente do que costumava a ser há milênios atrás, ela era morta ou se não obscura. Rothhgad interrompeu a cavalgada e deu ordem de descanso para seus soldados.

Eles se interromperam por um momento, e seus líderes tomaram o passo adiante em direção de Rothh, ao lado de Zana que havia cruzado esse caminho em cima de uma das gárgulas de Urak. Derechal, Urak e Zana se aproximaram de Rothhgad e se viraram para Garldrorn e Ahmegrok.

—Significa isso?!? -Perguntou Garldrorn.

—Um motim, Garldrorn. -Respondeu Rothhgad. -Há um bom tempo eu venho planejado uma revolta contra o atual Satã, e hoje será o dia disso acontecer.

—Assim?! Não contou mim! Não sou confiança?!

Garldrorn estava furioso por não ter sido deixado a par da situação, já que aparentemente Urak, Derechal e até mesmo Zana sabia disso.

—Garldrorn, eu realmente sinto muito por não lhe ter contado antes, a sua raça foi uma das primeiras raças a jurar lealdade a realeza. Seria muito arriscado lhe contar isso antecipadamente e algum de seus homens revelar o plano para ele, eu provavelmente seria torturado e executado.

—Acha vou te servir?!?

—Não quero que me sirva, eu sou um rebelde, não um rei, e se eu me tornar, será porque vocês me colocaram lá, eu não obrigarei nem você e nem nenhum de vocês a me seguir, vocês são livres para fazer o que quiserem, se suas famílias ou se sua raça inteira pretende servir a realeza ou quer permanecer neutra nesta guerra, por mim tudo bem, não lhes forçarei a morrer lutando por mim.

—Mestre, se me permite, posso lhe questionar um assunto? -Perguntou Urak.

—Claro, diga.

—Por que se acha digno do trono?

—Eu não sou digno, Urak, você tem mais de dez mil anos de idade, diga-me, quando foi que o solo do inferno se tornou apodrecido como é hoje?

—Creio que há mais de seis mil anos.

—E quando foi que Me'genimgash assumiu o trono?

—Foi por volta de seis mil e seiscentos anos atrás.

—De sua família, já ouviu algum relato desse desastre ocorrendo antigamente.

—Não, eu já ouvi relatos disso em pequenas escalas, porém se tornou em praticamente todo o inferno recentemente para mim. Você suspeita que seja Satã que esteja causando isso?

—Eu não posso afirmar, não tenho provas, mas ele nunca se importou em mudar isso, quantos demônios morrem na miséria da fome e ele não se importou em acolher suas preces, a maioria dos entes se corromperam com o tempo, os druidas foram quase todos extintos, todos os seres da natureza estão dispersos tentando fugir do inferno. E ainda, devido a guerra com o paraíso, ele não permite que ninguém passe a fronteira do purgatório, ele executa quem tenta fugir. Vocês mesmos não são oprimidos? Não importa de qual família nobre você pertença, a violência com que ele está regendo o inferno é tolerável?

Todos os soldados abaixaram suas cabeças.

—Vocês entendem que vocês estão aqui, a maioria por medo? Vocês foram retirados de suas famílias contra a vontade de vocês para lutar uma guerra que não lhes pertence, essa guerra com o paraíso só surgiu porque Satã tomou o território dos seres ancestrais, por causa de uma parcela de terra milhares estão morrendo há anos. Vocês concordam com essa atitude? E a atitude de execução de qualquer um que discordasse dele? Antigamente tínhamos o conselho do rei, os conselheiros nos representavam, lembra o que ele fez? Executou todos por traição e fechou o conselho. Que direitos nós temos agora?

—Ele tem razão. -Disse Derechal. -Vejam vocês, parecem máquinas de matar, qual foi o último momento feliz que tiveram em suas vidas? Vamos lá, eu me divirto matando assim como vários de vocês, mas mesmo assim estamos aqui por nossa escolha? Quando chegarmos no inferno seremos recompensados? Não, mas e se fracassarmos? Satã sorteia soldados para executar para pagar pelo fracasso. Nós não temos mais famílias, só o que fazemos é matar, e os nossos filhos logo terão a mesma vida que a gente, é essa vida que vocês desejam que ele tenha? Uma vida de escravo? Convenhamos que não importa de qual nobreza você seja, aqui somos todos soldados escravos devido ao juramento de lealdade.

—Ele passou dos limites da moral, porém ele é quem faz as leis. -Disse Urak -Se quisermos tempos de paz novamente, precisamos destronar nosso tirano. Se vocês preferirem uma república, um método de governo onde não há rei... sim, parece impossível, porém seria a forma de governo dos anjos. Se quiserem isso, decidiremos em paz o que será melhor para o inferno, porém a minha convicção é que Rothhgad venha ao trono.

—E por que você tem essa convicção? -Perguntou um cavaleiro e todos os outros começaram a conversar entre si.

—Silêncio, por favor. -Pediu forte, porém educadamente. -Porque Rothhgad sempre esteve conosco em todas essas guerras que travamos, no campo de batalha ele já foi nosso rei, e embora sempre diga que vai ficar atrás da linha de frente, quando o confronto se inicia ele é o primeiro a tomar a iniciativa, vejam o que ele fez hoje, embora hoje tenha um motivo maior por trás, é sempre assim que ele combate, ele entrega seu coração em batalha e sempre se põe a frente de seus homens. É isso que queremos? Ou é um rei que está sentado no trono enquanto sua elite guia seus homens para a morte? Mas além disso, eu conheço Rothhgad desde muito pequeno, conhecia antes mesmo de se tornar um dos quatro, e sei que embora possa aparentar uma arrogância e uma rigidez, seu coração é bom, e um rei governa seu povo com suas ambições, mas também com seu coração.

Os soldados permaneceram calados após o discurso e então Rothhgad voltou a falar.

—Como disse, não vou exigir que venham comigo, eu quebrei suas correntes, se quiserem ser livres para viver em outro lugar do inferno, vão! Se sua família tiver ficado na cidade e você quiser viver com ela, vá! Se quiser mudar a situação que temos nos encontrado pelos últimos mil anos, então venham comigo!

Ao dizer isso, todos os soldados, os chefes, os generais (incluindo Garldrorn e Ahmegrok) gritaram em honra a Rothhgad, ali seria onde começava o que seria a maior revolução para o inferno.


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