Between the Wolvs escrita por Erik SS


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Logo não existirei, mas para sempre viverei, enquanto for Aurora!



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Acordo em mais um dia melancólico. Enraizada na Mãe Terra, sinto ela pulsar, enquanto bombeia o mais puro sangue para dentro de mim, me enchendo com sua inesgotável energia e poder. Suas veias saem do chão aonde estou, e perfuram meus pulsos brancos de veias azuis brilhantes. Estranho dizer que me sinto infeliz, pois estou com o rosto ao chão, e a amargura não me deixa levantar. O que você faria, se todos na cidade aonde nasceu, lhe acorrentassem, no coração da terra, dizendo que você é a escolhida!? Escolhida do que... você ainda não sabe. Mas se passaram tantos anos que não posso contar, não sei se envelheci, pois o único riacho está longe de mim, e mesmo distante ainda lhe escuto me chamar.

Se houvesse uma forma de me matar, eu assim faria. Se bem que, eu vivo sem água e sem comida, com certeza essas grossas veias biológicas me alimentam e de nada sinto falta.

Me ponho de pé, e admiro mais uma vez a cidade distante. A Colônia, creio que assim ainda se chama. Uma das poucas civilizações que restaram, após o dia da devastação. Foi um dia terrível, e eu estava bem aqui. Neste mesmo lugar, tentando lembrar de coisas do passado. Nunca mais alguém veio me visitar, e se viesse, lhe contaria este fatídico dia. Tudo ao meu redor se desfez, como se não passasse de areia, que quando o vento sopra, se desmancha, se espalhando pelo ar.

Uma leve briza sopra meu rosto nu, meus cabelos voam dançando sobre meus ombros, ele traz consigo o cheiro de carvalhos, que do outro lado ficavam, se exibiam para mim, a criança inalcançável.

Busco em vão, alguma coisa nas montanhas áridas. Elas se estendem sobre mim, pontiagudas e imponentes. Me cercando, como se protegessem o coração da Mãe Terra. Já me perguntei milhões de vezes, por quê eu? E juro que procurei uma razão, mas não encontrei. Parece que por algum motivo, estou fadada a viver eternamente, neste lugar sem vida, fitando A Colônia crescer com o passar do tempo, se tornando uma cidade esquisita, que se ergue com restos de edifícios, e neons tecnológicos.

Faço agora minha tortura eterna. Caminho sem rumo os quase sete metros, que as grossas veias me permitem andar. Ando em círculos, sentido anti-horário, e depois sentido horário. Olho por diversas vezes A Colônia, esperando ansiosa algo diferente acontecer.

Certa vez, sonhei que estava livre, e que a Mãe Terra, por algum motivo, havia me libertado. Me lançou fora, como um objeto descartável, soltando de mim suas veias. Parei de sentir seu coração bater, e sua energia não corria mais em mim, pude enfim ir até o riacho. Senti a água cristalina tocar meus pés, e vi meu reflexo nas águas, o brilho do sol estava sobre o riacho, e resplandecia em meu rosto... Por fim, acordei, e ainda estou aqui.

Parei de caminhar, tropeçando nos meus próprios passos. Estou descalça, mas meus pés estão intactos. Pisco meus olhos devagar “Qual era a cor dos meus olhos!? Realmente não lembro” um pássaro distante rouba minha atenção. Ele voa livre, saindo dos carvalhos longínquos, e experiente, faz mergulhos no ar, exibindo seu verde brilhante. Me agacho e suspiro em segredo, algumas lágrimas caem do meu rosto. Não sei como ainda consigo chorar.

Sem pretensão, analiso meus pulsos. Será que consigo arrancar!? E se eu arrancar, será que sobrevivo!? Mas do que vale viver assim!? É preferível estar morta. Em minha mente, um turbilhão de pensamentos. O vento outra vez sopra, tentando em vão acalmar meu coração. O ignoro, mas ele continua. Pisco meu olhos rapidamente, afastando as lágrimas que odeio, e vejo o que nunca havia visto. Uma alcateia.

Não senti medo (nenhum animal atacaria a escolhida da Mãe Terra) me levantei e esperei ansiosa a sua chegada. Eram cinco lobos cinzentos, seus pelos quase cromados brilhavam, mesmo no clima árido. Eles vinham correndo ao meu encontro, ou seria ao riacho atrás de mim!? Escutava claramente, seus passos firmes, tocando o chão com facilidade e rapidez, pareciam estar voando, e sobre as nuvens pisando. Eles mantinham a seriedade no olhar, e eram lindos, acredito que vieram me salvar. Suas massas musculares se moviam com o esforço da corrida, e se aproximando de mim, diminuíram a velocidade, até enfim parar.

— Olhem, vejam a escolhida da nossa mãe! - o primeiro a chegar disse mesmo sem abrir a boca. Era como se eu pudesse entender o que eles pensavam.

— É uma honra para nós vivermos até esse dia! - disse o outro, que tinha o focinho sujo. Eles agora me rodeavam, cheirando meu vestido roxo desbotado. segui com o olhar cada um deles.

Eram imensas feras naturais, que exibiam suas presas enormes.

— Pois para mim não há mais honra. - disse mentalmente.

— Por quê dizes isso? - o último a chegar me perguntou.

— Porque viver assim já me cansou, estou há tantos anos aqui, que não consigo mais contar. - desabafei. - quem dera eu, pudesse ser como vocês, livres e mortais.

Eles se entre olharam, não entendendo minha verdadeira tortura - Então por quê não se solta e vem conosco!?

— Porque tenho medo. Medo de quando me soltar, morra, e se morrer, ninguém de mim se lembrará. - minha voz soou rouca e uma gota de lágrima tornou a rolar.

— Nós, vamos nos lembrar, da escolhida da Mãe Terra!

— Sim, com certeza – disse o menor dos lobos.

— E qual é o seu nome? - o maior me perguntou. Deveria ele ser o líder.

Pensei por um instante. Era como se não pudesse me recordar, olhei para o horizonte, mantendo um silêncio incomodador. Deu tempo até para um deles se sacudir em meio a conversa.

— Acredito ser... Aurora!

— É um belo nome! - ele disse. - com certeza não vamos te esquecer!

— E para onde vão agora!? - perguntei entusiasmada.

— Nem mesmo nós sabemos. Apenas vivemos um dia após o outro – eles voltaram a caminhar na direção do riacho. - venha conosco, e seja a única humana a correr entre os lobos!

Fiquei tentada. Parada, meus olhos tristes, não podiam disfarçar minha vontade de estar entre eles. Eles se distanciavam, seguindo o líder.

— Por quê não me ajudam, a me libertar dessas correntes!? - perguntei quase gritando.

— Não podemos interferir nos planos da Mãe Terra! E você está bem crescidinha para se libertar de suas próprias correntes.

Fiquei sem resposta, vendo eles indo ao riacho livremente. Olhei pensativa para minhas próprias correntes, e pensei se valia a pena “Eu quero muito correr com os lobos, nem que seja a última coisa que faça!” sem pensar na dor, mordi com força as veias que me alimentavam, e que por anos me mantiveram prisioneira. Com um solavanco arranquei, de meus finos pulsos. Não vou mentir, doeu. Mas já passou. A alcateia inteira olhou para mim, e o último da fila uivou e gritou:

— Isso! Venha correr com os lobos! E viva esse momento único!

Todos agora corriam, e como pássaros parecíamos voar, eramos livres, livres de verdade. Meus pulsos sangravam, e eu chorava. Morreria logo, disso eu sei, mas serei lembrada, pelas gerações desses lobos.

— Isso Aurora! Seja eterna! - O líder gritou.

Senti o vento no meu rosto soprar, e seu cheiro, era o cheiro do riacho, senti o ar úmido tocar minha face, e não pude me conter. Gritei o mais alto possível, estava feliz, realmente feliz.

Os lobos seguiram o caminho deles, e me deixaram para trás, eles uivaram várias vezes, se despedindo desta pequena Aurora. Toco meus pés no riacho, e sem perceber caiu. Meu corpo agora, faz parte dele, e a ele pertenço. Logo não existirei, mas para sempre viverei, enquanto for Aurora, Aurora para sempre.


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Notas finais do capítulo

Agradeço por ler, esta curta fic. Tentei expor o que sinto quando escuto esta música. Liberte-se você também de suas correntes.
Escrito por Erik S.S.



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