O nadador e o assistente escrita por phmmoura


Capítulo 12
Capítulo 12




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Pelo segundo dia seguido, Nelson acordou antes do despertador tocar. Ele ficou na cama e virou, encarando o celular no criado mudo, esperando o toque costumeiro.

Enquanto os minutos passavam, um sorriso cruzou seus lábios. Estou curado, pensou, saboreando a ideia. Ele colocou as duas mãos no rosto e riu.

— Estou curado — disse em voz alta, seu sorriso crescendo.

Finalmente posso voltar. Voltar pra as piscinas, pro mundo ao qual pertenço. A ideia parecia muito surreal para o nadador. Toda a dor, todos os dias em que eu mal podia me mover e queria desistir… quando eu só queria pôr um fim nisso tudo… tudo já se foi. Agora só preciso, só tenho que depender do meu próprio esforço, pensou, abrindo e fechando as mãos.

No instante em que o despertador tocou, ele correu para desligar o celular em segundos. Ele se levantou de uma vez, lavou o rosto no banheiro e trocou para as roupas de treino. Não parece diferente de ontem, pensou Nelson enquanto olhava para seu reflexo.

Depois de correr, vou comer algo e então… o quê? Ele parou enquanto colocava os sapatos e encarou o nada. Não tenho mais fisioterapia…

Seu cotidiano foi o mesmo por um tempo após tirar o gesso das pernas. Nelson acordava, fazia exercícios de alongamento que o fisioterapeuta mandara, tomava café da manhã, ia na fisioterapia de manhã, almoçava e então passava a tarde fazendo tratamentos diferentes, dependendo do dia.

Conforme melhorava e começava a se mover sem precisar da bengala, o fisioterapeuta começou a adicionar alguns exercícios. A corrida leve pela manhã, algumas flexões e abdominais, depois meia hora na bicicleta. Tudo de leve, como o médico insistiu em me lembrar. Mas agora que penso bem, tudo isso também era para que meu físico não fosse pro ralo. Eu estava começando a engordar. O que o Cris diria se visse aquelas fotos que tirei de mim? Imaginou Nelson, rindo.

Mas ele logo parou de rir, o sorriso sumindo dos lábios. Hoje é realmente um dia diferente. Não tenho fisioterapia mais… Em vez de feliz, ele sentiu a ansiedade preenchê-lo. O que devo fazer? Falar com meu treinador é óbvio, mas e depois? Que tal o personal trainer? Ele vai precisar montar uma nova rotina para mim, certo? Também preciso conferir as próximas competições. Já que meu rank foi lá pra baixo, provavelmente precisarei começar a competir em um nível estadual de novo. Ou até municipal…

Nelson balançou a cabeça. Não importa… Ainda que eu volte pro nível municipal, enquanto puder nadar, enquanto houver a possibilidade, vou chegar no topo de novo. Só preciso de tempo. Sim, com tempo… Mas tenho esse tempo? Meu contrato expira no ano que vem. Quantas competições terei até lá?

Ele tentou contar nos dedos, mas esquecera. Merda. Ele pegou o celular e começou a procurar. Enquanto sua mente trabalhava cada vez mais, a ansiedade crescia junto. Sua respiração acelerava e o coração também enquanto esperava que o site da federação pernambucana e brasileira de esportes aquáticos carregasse.

Mas, antes que pudesse checar as competições futuras, o celular tocou, mostrando uma chamada. Quem pode ser a essa hora? Apesar do quarto gelado, ele limpou o suor da testa antes de responder.

— Alô? — disse com a voz seca.

— Eu sabia que você estaria acordado. Que voz é essa? Está fingindo ser o Batman logo de manhã? — Uma voz com sono e familiar fez uma piada do outro lado. A pessoa soltou um grande bocejo. — Eu tinha grandes suspeitas, mas agora tenho certeza. Você realmente é um desses esquisitões que consegue e gosta de acordar cedo de verdade.

Nelson abriu a boca, mas, em vez de palavras, soltou um riso. Só com umas piadinhas e ele já fez minha ansiedade ir embora, pensou o nadador, sorrindo.

— Ei, Cris. A que devo o prazer? Talvez esteja ligando pra dizer que vai correr comigo de novo? Pensei que era uma oferta de uma vida, mas vou aceitar sua companhia feliz. — Enquanto dizia, Nelson notou que o que dizia era a verdade. É tudo mais divertido quanto ele está por perto.

— É foi. Não tem como eu acordar tão cedo pra correr duas vezes seguidas. Talvez em uma década — disse com a voz séria. Então seu tom mudou para um brincalhão. — É tipo ganhar na loteria do Cris duas vezes. E você não precisa disso, já que me tem todinho a sua disposição. Porém, não me importo se quiser ser ganancioso.

— Que pena — riu Nelson antes que percebesse. Mesmo sem ver, sei que ele está com aquele sorriso malicioso, pensou o nadador, sem notar seu próprio sorriso. — Então poderia me contar porque está acordando e me ligando a esta hora?

— Deixe-me pensar em uma desculpa. — Apesar de dizer aquilo, Cris usou um tom sério. Ele murmurou alto, como se realmente pensasse naquilo. — Seria gay demais dizer que a primeira coisa que eu queria ouvir hoje de manhã era a sua voz?

— Acho que seria mentira. Mas ficaria honrado e meu ego iria lá pro teto. Nos conhecemos faz dois dias, mas já posso dizer que você nunca acordaria tão cedo só pra isso.

— Hum… Você está mais certo do que errado, portanto, ganha alguns pontos. — Cris riu e bocejou ao mesmo tempo. — Mas antes que acabe dormindo de novo, quero perguntar como tá a sua agenda pra hoje.

Nelson engoliu em seco, todo o humor feliz se foi em um instante.

— Vou correr agora, mas estou… livre depois.

Ele conseguiu se controlar. Por um instante, estava prestes a dizer “não sei o que fazer”, mas mudou no meio da frase. Cris me ajudaria com esses sentimentos, sabia o nadador. Na verdade, ele não só ajudaria como tiraria com a minha cara.

— Resposta errada — disse Cris com o tom brincalhão de novo. — E sua punição por errar é uma agenda apertada pelo resto do dia. Você não é um homem livre mais. Espera, parece ainda mais errado quando eu digo em voz ainda.

Cris murmurou a última parte mais para si do que Nelson. Porém foi alto o bastante para que o nadador escutasse e mostrasse um sorriso do outro lado da linha.

— Agenda apertada? Com o quê?

— Depois de encher seu tanquinho, tem o exame físico. Sabe, pra conferir se ainda está gostoso, digo, em forma. — Cris fingiu tossir e consertou as palavras. — Depois disso, tem hora marcada com um personal trainer e um nutricionista.

— Nutricionista? Pensei que a comida no refeitório já fosse feito pra uma dieta balanceada.

— Sim, mas acho que você precisa de uma dieta específica para voltar a forma. Marquei uma hora com meu tio, só pra prevenir. Tipo, a diretoria deixou passar por causa da situação, mas provavelmente não vão mais deixar você devorar aqueles bolos. Melhor prevenir do que remediar.

— Calma, como eles sabem dos bolos…? — Nelson mostrou um sorriso amarelo. — Acho que tem razão… Melhor prevenir do que remediar.

— Mas, calma, ainda tem mais. Sua manhã lotada ainda vai longe — disse Cris, como se anunciasse algumas grande novidade. — Pra fechar com chave de ouro, você vai conversar com seu treinador.

Aquelas palavras iluminaram o rosto de Nelson.

— Sério? Então eu…

— Antes que aumente suas esperanças, devo dizer que você provavelmente não vai pular na piscina hoje — disse Cris em voz baixa, o tom brincalhão desaparecendo. — O treinador quer falar e conferir como você está. Ele me contou que só vai deixar você entrar depois ver sua condição física. — Ele ficou quieto, aguardando a reação de Nelson.

O nadador pressionou os lábios, deixando as palavras descerem por um tempo antes de falar.

— Mesmo curado, ainda não posso voltar pra água…

— Chocante, né? — O tom brincalhão voltou. — Também acho. Estou esperando pra te ver sem camisa, digo, treinando, desde que me colocaram como seu novo assistente.

Nelson abriu a boca e então riu apesar do que sentia.

— Você nunca me decepciona, sabia? Sempre sabe como tirar uma risada de mim.

— É coisa de bom assistente — disse Cris em voz baixa. — Está até no manual.

— É mesmo? — Nelson tentou mostrar descrença enquanto sorria.

— Tá sim. Acalmar a mente do atleta pra que ele ou ela possa se focar no esporte.

— Então posso dizer que você faz um ótimo serviço. Por favor, continue.

— Oba. Sendo assim, vou pedir um aumento. — Mesmo sem ver, Nelson conseguia imaginar Cris deitado na cama de olhos fechados e com um sorriso.

— Deveria. Se alguém perguntar, vou dizer que começou muito bem — disse Nelson, sendo sincero. Depois decidiu continuar a piada de Cris. — Falando nisso, nunca ouvi falar do manual do assistente. O que mais tem nele?

— Ah, muita coisa. Vai ver com o tempo. Mas… — De repente, Cris abaixou o tom de voz. Um tom que Nelson sabia que acompanhava um sorriso malicioso. — A parte divertida mesmo está no manual secreto.

— Que tipo de diversão?

— Do tipo que ofereci ontem.

— Ontem? — Nelson pensou por um segundo. Quando entendeu, ele sentiu uma reação lá embaixo e ficou vermelho.

— Ficasse duro? — disse Cris com o tom malicioso. — Minha oferta vai ficar sempre de pé. Assim que pedir, vou ficar de joelhos e minha boquinha será sua.

— Eu… Eu… ah… — Nelson engoliu em seco enquanto o membro ficava mais duro. — Tá… falando sério…?

— Totalmente. — De repente, Cris riu. — A oferta é pra valer, mas vou parar de falar dela. Embora eu realmente queria, prometi pra mim mesmo que pararia de tentar você.

— É mesmo? — Nelson não sabia se ficava feliz ou triste com isso.

— Além do mais, já estou ficando duro com a ideia. Se continuar falando, não vou conseguir dormir sem me aliviar.

— É… mesmo…? — Nelson tentou, mas só conseguia pensar em Cris se aliviando. No que diabos estou pensando?

— Mudando de assunto. — Cris fez o favor de tirar a mente do nadador da imagem mental que criara. — Tem mais uma coisa, Nelson.

— Por que você ficou sério do nada? Parece que estou encrencado. — Ele tentou brincar.

— O clube… meu pai quer arrumar uma entrevista pra você.

— Uma entrevista? — Nelson respirou devagar. Parece tão surreal agora… como se fosse coisa de outro mundo. — É meio… Faz tanto tempo desde a última… Acho que foi depois que comecei a fisioterapia… então queria mostrar como a melhora ia bem e tudo mais, só que eles perderam o interesse depois…

— É… — Cris abaixou a voz para um sussurro mais sério. — Provavelmente vão tocar em assuntos sensíveis… que você pode não estar pronto para falar.

— Entendi…

— Se não estiver pronto, vou falar com meu pai. Posso fazer ele recuar — adicionou Cris, rápido.

— Não, eu… — Nelson mordeu os lábios e respirou fundo. — Obrigado por cuidar de mim. Mas vou precisar lidar com isso no futuro. Tipo, já que meu objetivo é chegar no topo e conseguir a medalha de ouro no Rio 2016, preciso superar essas coisas.

— Tem certeza?

— Sim — disse Nelson com a voz firme. — Pode marcar a entrevista.

— Ok, vou enfiar na sua agenda. — Cris soltou outro bocejo. — Acho que é tudo para a agenda da manhã. Te vejo no café da manhã pra passar a agenda da tarde. Depois de dormir um pouco.

— Certo — disse Nelson. Mas, então, quando Cris estava prestes a desligar, as palavras saíram sozinhas. — Obrigado por se preocupar comigo. Sei que é seu trabalho e tudo mais, mas sua ajuda tem sido… obrigado por tudo.

— Não precisa. Já disse que vou ajudá-lo a chegar no topo. Tchau.

Nelson não conseguiu parar de sorrir para o que Cris dissera mesmo após ele desligar.


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