Histórias Cruzadas escrita por calivillas


Capítulo 29
Um delicado equilíbrio




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/743918/chapter/29

  O tempo frio e nublado do inverno combinava muito bem com o meu humor naquela época, estava triste e solitária. Nem os preparativos das festas de fim de ano ajudaram a me animar. Falava com meu namorado pelo telefone todos os dias, mesmo com a minha mãe reclamando incessantemente que a conta seria exorbitante, mas eu esperava por aquele momento o dia inteiro. Durante o resto do dia, eu ficava sozinha em casa, fumando, desenhando e ouvindo música a maior parte do tempo, já que minha mãe trabalhava em uma grande loja, cujas atividades aumentaram muito nessa época do ano, por isso ela voltava bem tarde para casa.

Aquele seria o primeiro natal que passávamos sem meu pai presente, por isso sentia-me um tanto triste, além disso, a falta de dinheiro e o novo emprego da minha mãe não nos permitiram viajar para a casa dos meus avós no interior, então, seriamos só eu e ela a dividir um pequeno jantar e já estava conformada com isso.

Na véspera de Natal, minha mãe se esmerou para manter uma fingida normalidade, no entanto, sabia que ela estava sofrendo tanto quanto ou até mais do que eu. Jantamos cedo e em silêncio, já que estava sendo muito doloroso para nós o lugar do meu pai vazio. Pretendíamos dormir cedo e ir à igreja, assistir à missa na manhã seguinte, não que fossemos religiosas ferrenhas, porém costumávamos ir à igreja em datas especiais como aquela. Para nossa surpresa, a campainha da porta tocou, não esperávamos por ninguém, não tinha a menor ideia de quem poderia ser. Fui atender e, para o meu total espanto, Jean-Pierre estava parado, bem ali na minha frente, com um pacote de presente prateado nas mãos.

— Oi! – disse, sem disfarçar a minha surpresa e satisfação por vê-lo ali.

— É Natal, tempo de reconciliação – respondeu à pergunta não feita.

Não pude conter o sorriso que se abriu no meu rosto e refletiu-se nele.

— Jean-Pierre, eu estou tão feliz em ver você. Vamos, entre!

— Não posso, estão me esperando para o jantar, eu só vim trazer isso para você. – Entregou-me o pacote, que eu olhei admirada, depois os meus olhos subiram até os olhos deles, sem conter minhas lágrimas, mergulhei sob ele e envolvi seu pescoço, em um abraço apertado, que retribuiu um tanto sem jeito, pego desprevenido.

— Obrigada – murmurei, beijando seu rosto e o soltando. – Eu não comprei nada para você.

— Não precisa. Abra e veja se gosta!

Abri, apressada e desajeitada, o pacote, de onde tirei uma caixa de lápis de desenho, que sabia ser bem cara.

— Então, gostou? – perguntou, cheio de expectativa.

— Adorei! Obrigada! – E o abracei outra vez, mas ele me afastou com delicadeza.

— Preciso ir para o jantar com a minha família. Feliz Natal, Sarah.

— Feliz Natal, Jean-Pierre.

 Fazer as pazes com meu amigo foi o melhor presente que poderia ter recebido. E assim, durante o resto do feriado, a vida quase voltou a normalidade anterior a Olivier, sequer o singelo namorico entre Mariane e Jean-Pierre era um empecilho para nós. Só tinha que aturar o ar de desaprovação do meu amigo toda vez que eu acendia um cigarro. Fazíamos o que sempre fizemos nessas ocasiões, ou seja, ficávamos juntos, saíamos e conversamos, como se nada tivemos mudado entre nós, até o dia 2 de janeiro de 2001, quando Olivier regressou.

Era o primeiro dia de aula depois do feriado e, para o meu espanto, apesar do frio e da chuva fina que caía, Jean-Pierre estava do lado de fora da minha casa, me esperando para irmos juntos para escola.

Ao chegarmos lá, para minha completa felicidade, uma das primeiras pessoas que vi foi Olivier de pé junto a porta, aguardando a minha chegada. Eu voei na sua direção e o envolvi em um abraço apertado, inalei saudosa o seu cheiro cítrico e de couro da sua jaqueta e, sem nenhuma timidez, beijei-lhe a boca com a ânsia dos apaixonados. Quando nossas bocas se separaram, senti seus braços se afrouxarem em torno do meu corpo, olhei para Olivier sem entender, para perceber que ele encarava Jean-Pierre por cima do meu ombro, de modo desafiador, o outro garoto lhe devolvia um olhar feroz.

— Quando chegou? Estava com tantas saudades! – Queria retomar o clima do reencontro, mas ele estava tenso, segurou minha mão e me arrastou dali. – O que foi? – Estava confusa com aquela atitude tão ríspida, Olivier parou e me encarou com seus olhos azuis frios e duro como o aço.

— Por que você veio para a escola com ele?

— Como quem? Jean-Pierre? – Eu ri, achando graça do jeito dele. - Eu venho para a escola com ele desde a sétima série. Estudamos juntos desde o jardim de infância.

— Mas, naquela época, você não era minha namorada – Seu tom era de acusação.

— Não acredito que esteja com ciúmes de Jean Pierre! – Fiquei pasma. – Somos como irmãos!

— Você pode achar isso, mas ele não! Não percebe que ele está a fim de você, Sarah?!

— Não é nada disso – Acariciou, seguindo o contorno no seu rosto com as pontas dos meus dedos, e digo com suavidade. – Somos apenas bons amigos, você entendeu tudo errado, não há nada além de uma grande amizade entre nós dois.

Olivier não pareceu convencido, mas estava mais calmo agora, segurou minha mão com firmeza.

— Vamos, senão chegaremos atrasados na aula. – Ele me puxou em direção a sala de aula.

 A partir daí, tive que me dividir para manter um precário equilíbrio entre minha relação com os dois garotos ariscos, Mariane me ajudava como podia nessa difícil tarefa. Algumas vezes, saímos os quatro juntos para algum lugar, uma lanchonete ou cinema, apesar do clima ficar muito estranho, pois os rapazes mal se falavam, assim desistimos desse convívio, continuávamos a manter um relacionamento amistoso apenas na escola. Também, mesmo a contragosto, pedi, com muito cuidado, a Jean-Pierre que não me buscasse mais em casa para evitar conflito com Olivier, meu amigo ficou bastante chateado comigo e não compreendeu o porquê disso, no entanto, acatou a minha solicitação. Enquanto isso, meu namoro com Olivier se tornava cada vez mais impetuoso, e nossos corpos pediam mais, além dos nossos beijos vorazes e amassos ardentes , deixando-me cada vez mais confusa, pois, apesar de ansiar, não sabia se estava pronta para encarar o próximo passo em nossa relação.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Histórias Cruzadas" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.