Cher Maître escrita por Mila Karenina


Capítulo 14
Nada mais do que já somos


Notas iniciais do capítulo

Oi, meus amores! Tudo bem com vocês? Espero que sim! O capítulo demorou? Sim, muito, para caraca! A culpa foi minha, me enrolei muito e tive uma enorme dificuldade de escrever este capítulo. Escrevi e reescrevi várias vezes, até que apaguei tudo e saiu isso que vocês vão ler agora.
O capítulo é dedicado às maravilhosas que recomendaram a história, Beatriz Xavier e Sílvia Costa! Espero que o capítulo valha a espera!
Amo vocês, chuchus.



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Dizem que lidar com a rejeição tem alguns estágios. O primeiro é a aceitação, isto é, você aceita que não conseguiu e lida com as consequências da rejeição. Não estava só chateada com Vicente, tinha decidido fingir que ele morreu. Era isso. Ele tinha sido desonesto, um perfeito babaca. Sua decisão era compreensível? Sim, totalmente. Porém, encorajar algo e depois mudar de ideia não parecia algo exatamente legal.

Estava sentada em minha carteira, lendo um desses livros best-sellers que todo mundo lê, quando minhas amigas chegaram. Já tinha uma semana desde o acontecimento maravilhoso de minha existência. Minhas amigas sabiam de tudo, havia compartilhado e elas sofreram comigo. Faltei as aulas de Vicente propositalmente, não queria vê-lo, não depois de tudo.

— Rebeca, queria ter esse amor próprio que você tem! — Clarice afirmou. — Supostamente era para você estar na fossa.

Tinha conversado sobre meu caso romântico com Ricardo. Ele ficou chocado, mas tentou entender. Prometeu que não diria nada aos meus pais, estava confiando nele. Por mais que soasse estranho, sabia que ele não diria nada, ambos estávamos afundados na merda até a cabeça. Meu irmão sugeriu que eu fosse madura e não demonstrasse derrota, afinal, estava chegando a minha vez de prestar vestibular e eu não poderia me dar ao luxo de ficar para baixo.

— Treine que você consegue, meu anjo — Fui irônica. — Você acha que eu cheguei a esse estágio como? Com bastante prática!

— A gente sabe que você tá mal, só tá fingindo bem… — Luíza suspirou. — Além de tudo, o babaca do Matheus tá com a Catarina!

Revirei os olhos.

— Me sinto ofendida por vocês acharem que estou ligando para isso!

— Ei! — Monalisa se manifestou. — Eu sei que você não dá a mínima.

— Acho ótimo, Lisa.

O relacionamento de Lisa e Ricardo estava melhorando. Ricardo havia introduzido o assunto do término com Bruna, mas como esperado, ela não tinha aceitado a ideia. Disse a ele para dar um valor de dinheiro a ela, mas ele apenas riu. Tenho certeza que minha ideia traria resultados.

Como em uma verdadeira tragédia shakespeariana, meu coração estava despedaçado. Estava muito longe de ser Julieta, Vicente muito longe de ser Romeu, mesmo assim, sofria tanto ou mais do que os personagens da mais icônica história de amor. Eu ainda não havia superado a rejeição, tampouco achava que um dia isso fosse acontecer de fato.

Minhas amigas — assim como Ricardo — estavam tentando colar com cola algo que não tinha jeito. Pessoas são como vasos, uma vez quebradas, nunca mais são as mesmas. Remendos não são capazes de substituir a originalidade de uma peça. Felizmente, estava ocupando minha mente com outras coisas. Havia faltado as aulas de Vicente da última semana, mas precisava encará-lo, não podia me acovardar.

— Ele está entrando — Luíza sussurrou. — Força, amiga.

O loiro entrou. Cabelos dourados reluzentes, blusa de abotoar branca, calças escuras. Socorro, seria impossível esquecer. Meu amor platônico havia começado pela beleza física do professor metido a filósofo, mas eu sabia que tinha ultrapassado isso. Eu gostava dele pela pessoa que era, pelo jeito que falava. Gostava dele simplesmente por ele ser ele mesmo.

— Bom dia, turma — Ele disse, com o olhar baixo.

Com certeza ele não queria fazer contato visual. Eu também não desejava isso, na verdade. A situação que nos coloquei era extremamente constrangedora, não havia nada que eu pudesse fazer para contorná-la. O jeito era torcer para o ano acabar rápido, passar no vestibular da Universidade de São Paulo e simplesmente desaparecer. Nunca mais precisaria lidar com a beleza estonteante do loiro, tampouco com seu jeito sereno de falar.

Pensar no seu jeito de falar lembrou-me de seus lábios. Seus lábios lembraram-me de nosso beijo. Aquele tinha sido o melhor beijo da minha vida, o melhor momento até. Nunca poderia esquecer, seria impossível. Infelizmente, como em um conto de fadas moderno, um balde de água fria caiu em minha cabeça e voltei à nossa realidade. Nosso romance não podia acontecer e por mais que eu soubesse exatamente os motivos, isso não me impedia de desejar que fôssemos outras pessoas em outro planeta, talvez.

— Já estou com o resultado do bimestre, sentem-se, por favor — Ele anunciou.
    Não me interessava saber de minha nota. Não queria mais uma dor de cabeça. A verdade é que todos romantizam essa coisa de se apaixonar, de amar e afins, mas ninguém quer ter que lidar com os caquinhos que sobram do atrito entre duas almas. Sim, eu estava filosofando e nem eu mesma estava entendendo. Talvez o beijo de Vicente tenha me transformado em uma discípula de Sócrates como ele. Lembrar de minhas piadinhas sobre isso fez-me rir por alguns minutos.

Um movimento chamou minha atenção.

Catarina levantou de seu lugar e caminhou até a mesa de Vicente, que roboticamente entregou-lhe sua prova. Sua expressão foi interessante, parecia um misto de contentamento com desapontamento. Era impossível que ela tivesse ido mal.
        Mais nomes foram sendo chamados, até que chegou o meu.
        Pedi que Luíza pegasse minha prova e assim ela o fez. Minha média tinha sido muito maior do que esperava. Tinha tirado 8,8, quase um 9. Um sorriso brincou em meus lábios, sem entender, olhei para a mesa do professor e recebi um olhar de meu loiro favorito. Não adiantou evitar o contato visual, ele aconteceu. No entanto, ele deu de ombros, enquanto eu fiquei boquiaberta por uma fração de segundos. Fração de segundos grande o suficiente para ser notada por Clarice.

— Tá na cara que ele também é apaixonado por você — Minha amiga comentou. — Ele está derretido.

— Se ele gostasse de mim, não teria feito aquilo — Disse. As palavras doíam para sair.

— Você sabe melhor que ninguém que esse romance é inadequado — Monalisa disse. — Tente entendê-lo. Não é sempre que ambas as partes querem se arriscar em uma aventura sem final feliz garantido.

Em outra ocasião, eu chamaria Lisa de hipócrita, mas não ali e agora. Ela estava certa. Ela e Ricardo quiseram tentar, diferente de mim e Vicente. Vicente não queria arriscar, meu amor não valia tudo isso.

A aula acabou para minha total felicidade.

Saía animadamente com minhas amigas quando Vicente me chamou.

— Rebeca! — Sua voz pareceu música em meus ouvidos. — Pode ficar uns minutos?

Encarei minhas amigas. Todas assentiram com a cabeça, mantive meu silêncio e caminhei até a mesa dele. Minhas amigas saíram, mas não sem lançarem-me olhares diversos. Monalisa um olhar de compreensão, Luíza de raiva e Clarice de diversão.

— Diga.

O loiro abaixou a cabeça. Sabia que estava nervoso.

— Rebeca, eu queria me desculpar…

A simples menção de se desculpar fez com que minha barriga se mexesse. Lembrei novamente do nosso momento. Estávamos tão próximos, seria tão fácil se eu só beijasse ele de novo. Não, eu não podia. Ele iria se desculpar por algo, afinal. Não que achasse que ele deveria, mas era o ético a se fazer.

— Por que? Por me beijar ou por despedaçar o coraçãozinho da adolescente aqui? — Debochei. — Olha, pensando bem, você tem muito que se desculpar mesmo.
       A expressão de Vicente não era divertida. Ele estava sério, mais sério do que nunca. Parecia realmente chateado com algo, mas não quis indagar o que seria realmente. Quem deveria estar chateada ali era eu, não ele, e bem, eu estava mais do que chateada com ele. Infelizmente ou felizmente, minha chateação não tinha transformado-se em ódio. Seria tudo mais fácil se eu o odiasse.

— Quero me desculpar por ter alimentado esperanças de que poderíamos ter algo quando já sabia que isso nunca poderia acontecer. Eu não deveria ter deixado você se aproximar tanto, adolescentes são suscetíveis a essas coisas e…

Não deixei ele terminar, a raiva havia me tomado.

— Quem se aproximou de mim foi você! E pare de agir como se você não tivesse sido afetado, ficou muito claro que estamos no mesmo barco! — Minha voz saiu alta.

— Fale baixo, Rebeca — Ele pediu. — Eu não me aproximei de você com a intenção de despertar um amor em você, eu não sou nenhum pervertido! Me aproximei porque queria que você gostasse mais de filosofia, o professor conta muito para que gostemos da matéria…

— Não me faça perder o pouco respeito que ainda lhe tenho, Vicente — Suspirei. — Você fez o que fez e agora quer colocar a culpa em mim? Você me abraçou como um professor abraça uma aluna? Você falou comigo de forma tão imparcial assim? Pense nisso.

Comecei a caminhar para fora da sala, mas algo me parou. Sim, ele mesmo. Vicente colocou-me em minha frente. Tentei empurrá-lo, queria sair dali de qualquer jeito, mas ele era muito mais forte, muito maior. Concordei em ficar, mas sabia que acabaria batendo nele.

— Você está certa, Rebeca! — Ele finalmente admitiu. — Eu nunca te tratei como uma aluna porque você sempre foi muito mais do que isso.

Tudo bem, eu não esperava por aquilo. Não mesmo.

— Desde que pus os olhos em você, não sei o que aconteceu ao certo, mas eu sabia que precisava estar perto de você. Comecei a me importar com você mais do que deveria, comecei a querer que você se tornasse a melhor aluna sala, queria que você superasse seu problema com filosofia, mas não queria pelos motivos certos. Eu achava que se você gostasse de filosofia, bem, talvez você gostasse de mim.

Choque me definia. Eu estava chocada com aquilo tudo. Como ele podia ter mudado tanto assim sua abordagem?

— E não foi surpresa notar que você se encantou rapidamente. O papel que eu exerço na sua vida, a pessoa que eu sou, o que eu represento… Eu fui um patife com você, eu nunca deveria ter começado isso tudo, mas eu comecei. Peço desculpas sinceras por ter feito você acreditar que poderíamos ser algo quando não podemos ser nada. Nada mais do que já somos. Rebeca e Vicente. Aluna e professor.

Não houve momento nenhum da minha vida que eu deveria chorar mais do que aquele. Eu entendia perfeitamente o que ele estava querendo dizer, mas no fundo, bem no fundo, eu esperava que ele me dissesse que em algum lugar poderíamos ficar juntos. As lágrimas não brotaram em meus olhos. Nunca tinha sentido uma dor tão aguda no peito, nunca mesmo. Sabia que um abraço talvez curaria, mas sabia que não podia fazer isso.

Olhei para os olhos verdes de Vicente, que estavam vermelhos. Ele estava chorando? Não era possível que um homem daqueles estivesse chorando por causa daquilo. Senti meu peito encher-se de algum sentimento que foi desconhecido por mim. Precisava sair dali antes que surtasse de vez. Vicente disse-me uma vez que eu costumava ser um terremoto, causando abalos por aí, mas na verdade, era ele quem era um. Ele havia tumultuado a minha vida, destruído meu sossego, alagado meus olhos várias vezes… Mesmo assim, eu não deixava de ser dele e ele, continuava meu.
      Sem dizer mais nada, corri para fora da sala. Era possível estar mais triste do aquilo? Acho que não. Impossível.


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Notas finais do capítulo

O que você acha que vai rolar?



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