Take me to church escrita por Andreza Cullen


Capítulo 13
Décimo primeiro capítulo


Notas iniciais do capítulo

***ATENÇÃO***

Por favor gente, leiam esse cap escutando Take me church - Holzier, é realmente importante para o clima da historia

LINK: https://www.youtube.com/watch?v=PVjiKRfKpPI

Nos vemos nas notas finais :)



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O jantar correu bem, exceto pelo clima extremamente tenso entre mim e Alhena. Se alguém percebeu, não comentou.

A única coisa que eu sentia vindo da minha cabeça era um zumbido, incomodo, mas altamente aceitável, e isso era ótimo. Provavelmente os analgésicos estavam fazendo o efeito pretendido.

Tentei intermináveis vezes conversar com Alhena, mas ela parecia muito magoada, por tanto não obtive sucesso algum.

Eu amo meus amigos, eles são meu alicerce e minha base para continuar, mas naquele momento a única coisa em que eu pensava era em Alhena e naquilo.

A decisão estava tomada, eu precisava fazer aquilo.

Custe o que custar.

Os meninos reclamavam de estarem lavando a louça da cozinha enquanto nós estávamos apenas jogando papo fora, encarei o relógio, ele apontava 22:30. Eu não poderia enrolar pelo resto da noite, embora estivesse fazendo exatamente isso. Cada minuto que se passava, eu a sentia mais distante. Isso doía mais do que a surra que eu levei.

Levantei sorrateiramente e fui para o meu quarto, agora eu já estava conseguindo me locomover com facilidade. Mandei uma mensagem para Alhena.

 

Terra –

Precisamos conversar, e você sabe disso. Te espero no meu quarto.

Foram exatos 6 minutos até ela visualizar a mensagem. Meu coração estava na boca, minhas mãos suando e minha cabeça parecia um turbilhão. Eu havia decidido isso, não poderia voltar.

Não escutei batidas na porta, já que Alhena, no seu esplendor composto por um vestido floral com fundo coral, entrou sem bater. Ela me encarou sem dizer nada, e de repente as palavras sumiram da minha boca, correram e se esconderam em algum lugar inacessível dentro de mim na esperança de eu desistir dessa idéia.

— Eu sei que não é justo o que eu estou fazendo, deixando o Guilherme se livrar dessa – seus olhos se encheram de brilho, na esperança de que eu aceitasse denunciá-lo – mas eu não posso fazer isso...

Suas sobrancelhas se arquearam e ela me interrompeu.

— Você não pode fazer isso?! Você me chamou aqui para me dizer que não pode fazer isso?! – seus sussurros eram gritos abafados.

— Eu te chamei aqui por que preciso te explicar o porquê e não posso fazer isso.

Consegui manter minha voz firme, mas algo me dizia que isso não duraria muito. Alhena deve ter percebido que eu não estava bem, pois, mesmo que continuasse séria, se sentou ao meu lado na cama e me instigou a continuar com o olhar.

— Eu nunca contei isso a ninguém, nem ao Marco ou a qualquer outro amigo meu. Eu preciso que você prometa que nunca vai contar também.

Seu olhar vacilou, percebi que ela estava com medo do que eu tinha para dizer e também que ela não prometeu.

— Não posso prometer algo sem saber do que se trata.

— Você vai ter que confiar em mim.

Seu olhar vagou o cômodo, e aquilo me pareceu uma eternidade. Quando ela assentiu com a cabeça, eu soube que não teria mais volta.

Respirei fundo e comecei a dizer, sem rodeios.

— Eu não sou virgem.

Pela surpresa em seu olhar, percebi que não era isso que ela esperava ouvir. Suas testa agora estava franzida.

— Eu nunca esperei que fosse Terra, se era com isso que você estava preocupada, mas o que isso tem...

— Eu preciso explicar o porquê eu não sou virgem – a interrompi, minha voz estava um pouco urgente, tomada pela ansiedade do momento, pelo medo.

Ela me encarou, esperando eu continuar.

— Você se lembra do incidente na escola? Aquilo que virou noticia na cidade inteira? – ela concordou, sem tirar os olhos dos meus – Bom, meso antes daquilo, meus “pais” já haviam descoberto minha orientação – agora sim ela estava surpresa – foi um ano antes disso, para falar a verdade.

— Eles deixaram você continuar morando lá?

Ignorei sua pergunta e continuei, pois se eu parasse agora, não conseguiria continuar.

— Eles encontraram algumas cartas que eu estava trocando com uma garota na época, esconderam o jogo de mim por algumas semanas. Um dia, quando eu estava voltando do colégio com o motorista, ele fez um trajeto diferente, me levando para a igreja.

— Você passou um bom tempo na igreja durante esse ano.

Apenas concordei, um nó estava começando a se formar na minha garganta. Tocar naquele assunto era angustiante, aterrorizante.

— Eu pensei que nossos pais estivessem tramando alguma coisa para algum evento, então só continuei – meu olhar agora se perdeu em qualquer canto da parede branca do quarto - Quando cheguei lá, eles me levaram direto para um quartinho cheio de coisas lá em cima.

— Provavelmente o quarto de vestes.

— Quando entrei, percebi que havia algo de errado. Minhas cartas estavam em cima de uma mesa, e meu pai e o seu estavam me esperando.

Não pude evitar que as lembranças voltassem com tudo.

 

“Você precisa de ajuda terra, nós vamos te ajudar”

Tentei abrir a porta e correr, mas ela estava trancada.

As lagrimas, teimosas, estavam se alojando nos meus olhos. Alhena veio me abraçar, mas eu me afastei. Eu precisava contar, precisava contar a ela.

— Eles disseram que eu “precisava aceitar o que vem de Deus” e que isso iria me curar.

O choque estava estampado no rosto de Alhena, e então percebi que ela entendeu. Dessa vez não a impedi de me abraçar, me aconcheguei junto a ela e, pela primeira vez, me permiti chorar e ser consolada. Ela não disse nada, apenas continuo ali comigo. Aquilo era o mais importante.

Mas não eu não havia acabado.

Depois de alguns minutos me desvencilhei dos braços dela e continuei sem pensar duas vezes.

— Os estupros aconteciam todas as semanas, as quintas-feiras, quando a igreja estava fechada. Toda a vez que eu escutava que estavam me levando para lá, eu sentia vontade de me matar, só para acabar com aquilo. Eu não suportava ouvir essa palavra. Isso durou até março. – não parei para ver sua reação, eu não poderia parar para qualquer coisa, pois não teria coragem de continuar.

— Isso foi um mês antes do escândalo,

Concordei com a cabeça e continuei.

— No começo de março – suspirei fundo e tomei coragem, eu tinha que dizer agora, eu precisava dizer - ...eu descobri que estava grávida.

Aquilo foi o mais difícil de ser dito, era onde mais me machucava. Estava com dificuldades de respirar pelo nó que se formou em minha garganta. Tive que empurrar as silabas para fora.

Por mais que Alhena quisesse falar algo, ela percebeu que eu precisava jogar tudo de uma vez e não disse nada.

Fechei meus olhos com tanta força que chegou a doer, mas não mais do que a angustia que eu estava sentindo.

— Fiz um aborto, viajei até Maringá em uma tarde de domingo e fiz um aborto clandestino.

Não consegui continuar, tive que fazer uma pausa. Eu me lembrava ate hoje de todo o medo que eu estava sentindo, medo de morrer, culpa por matar uma vida. Mas eu não podia, não podia. Eu estava tão assustada, amedrontada, culpada.

— Meus pais descobriram, e pediram para uma garota espalhar a historia sobre o banheiro, pois não queriam que ninguém descobrisse que eu havia engravidado do pastor. Se eu não houvesse abortado, com certeza teria perdido o bebe com a surra que levei do meu pai naquele dia, quando voltei da escola torcendo para ele não ter ficado sabendo sobre o boato. Eu era tão estúpida!

Ela não me deixou continuar e me abraçou, com urgência. Com força. Seus braços estavam em volta de mim como muros, pesados. A abracei também, tudo aquilo estava insuportável, eu havia deixado aquilo embaixo do tapete por tanto tempo, por que eu sabia que doeria, e de fato, era insuportável.

Depois de muitos minutos, eu já estava mais calma. Peguei seu rosto, manchado de rímel, e a fiz olhar para mim.

— Eu não posso denunciar o Guilherme, não posso colocar em risco o que temos agora.

Ela não disse nada, mas eu soube, naquele momento, que ela entendia. Que ela não me forçaria a nada. Agora eu estava completa, estava livre, longe daquele lugar e com as pessoas que eu amava. Não deixaria nada, NADA colocar isso em risco, mesmo que isso significasse ficar quieta.

E passamos nossa primeira noite juntas abraçadas, com ela fazendo questão de me mostrar que sempre estaria ali, comigo. Que nunca me deixaria. Eu estava me sentindo mais leve, embora doesse, tudo dentro de mim doía.  

— Acha que ta tudo bem aí dentro? – eu e ela ouvimos sussurros vindos do outro lado da porta, era a voz de Matheus.

— Com certeza, acho que só estão esperando nós irmos dormir para transar como se não houvesse amanha. Bom, seria o que eu faria – com certeza era Brida.

Soltamos uma gargalhada quando ouvimos as portas dos quartos bater.

— Ela é impossível! – comentou Alhena.

Sim, ela era. Todos eram. Eram minha família, minha única e verdadeira família.

Eu sabia que no dia seguinte Alhena faria de tudo para tentar acabar com seu pai, provavelmente quebraria algumas coisas de tanta raiva, eu via nos seus olhos que ela estava puta. Mas quando ela percebeu que eu precisava dela, ignorou tudo isso e me aconchegou em seus braços.

Me permiti esquecer o amanhã, e me focar naquele momento. Era o meu momento, nada mais importava.

Nada mais importava.


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Notas finais do capítulo

Hello guys, tudo bem?
Bom, esse foi o ultimo cap da fic, e garanto a vocês que foi o mais difícil de ser escrito, foi o qual eu mais quis abraçar a Terra e dizer que estava tudo bem, que agora tudo estava acabado.
Espero que vocês tenham se apaixonado, dado risadas, sofrido e amado a historia tanto quanto eu amei escreve-lá. Era algo que eu precisava escrever, precisava expor e de alguma forma deixar marcado como muitas meninas sofrem, sofrem e sofrem mais ainda só por serem quem são, e isso inclui toda a comunidade LGBT. Eu realmente espero que tenha sido uma leitura que vocês não tenham se sentido com tempo perdido, ou jogado fora.
Embora eu praticamente não tenha comentário, queria realmente agradecer a todo mundo que acompanhou, leu, comentou ou de alguma forma estava aqui, mesmo como fantasminha ♥

Beijusculos *_*



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