Funk-se Telma! escrita por ArnaldoBBMarques


Capítulo 15
Cinderela?




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Na manhã seguinte Telma foi para a escola cantarolando feliz, saboreando as lembranças de sua vitória na noite anterior. Com certeza as fofocas já estavam correndo. Logo na chegada viu Josias como sempre rodeado de meninas, ele estava tão ocupado em falar com elas que nem a viu. Telma não se importou, sabia que sabia esperar a hora certa. Logo em seguida Beto foi ao encontro dela, solícito. Com certeza após o acontecido na noite anterior ele já se considerava seu namorado oficial, Telma pensou divertida. Deixa ele pensar. Telma fez ar de pouco caso, e quando sentiu que Beto começava a ficar apreensivo, agarrou-o de súbito e tacou-lhe um beijo. Gostava daquele jogo de provocar e fugir da raia, fazia ela se sentir poderosa.

Mas um frio entrou pela barriga quando ela leu no celular aquela mensagem anônima.

Toma cuidado piriguete vai ficar sem seus cabelos

Telma sabia que ficar com Josias era brincar com fogo. Tinha muita menina atrás dele, meninas metidas a marginal, Telma conhecia aquele tipo de gente e sabia do que eram capaz. De quem seria aquela mensagem? Elaine? Ela era capaz de fazer uma coisa dessas, mas nem estava no baile, quem estava era Suzana, que tinha fama de santa. Bem, dane-se, sei lidar com esse tipo de gente, disse Telma para si própria, fazendo força para convencer-se de que era verdade.

Quando enfim viu Josias desacompanhado, Telma foi direto em cima. Falou da noite anterior, mas Josias parecia já ter esquecido. Só falava em novos lugares aonde queria ir. Quando notou o vacilo em Telma quando ela pensava se tia Justina ia deixá-la sair, riu na cara dela.

— HAHA mina, você é Cinderela, meia-noite acaba...

— Estou mais para bruxa do que para Cinderela! – Respondeu Telma sem pensar. Em seguida agarrou-o mais forte e sussurrou no seu ouvido:

— Quero transar com você!

Telma esforçou-se para fazer a voz mais sensual que podia, como se estivesse disposta a transar com ele ali mesmo. Mas a sineta quebrou o encanto, chamando todos de volta para a classe. Telma despediu-se, e fez força para apagar o olhar malicioso antes que as colegas vissem. Mas sabia que tinha dado o passo, e agora não podia voltar atrás. Que jeito ia dar? Bem, tinha a semana inteira para pensar...

De volta para casa, Telma sentiu-se mesmo como uma Cinderela ao entregar a roupa da escola, que voltou para o armário de tia Justina, e receber a roupinha de faxina, aqueles vestidinhos curtíssimos com alcinhas que viviam caindo do ombro.

— Depois tem que lavar a cozinha!

— Sim senhor! – Respondeu Telma com irônica reverência à ordem do primo Eduardo, que como de costume ficara encarregado de lhe passar a lista de tarefas quando a mãe saía.

— E depois tem que estudar! Mamãe falou que quando chegar quer ver você no quarto estudando!

Telma achava graça naquilo de estar sendo mandada por um garoto de 12 anos. Voltou-lhe à memória a palavra com que Josias a definira: Cinderela! Já estava ficando com raiva dessa palavra. E o pior era que parecia mesmo uma Cinderela, com aquela obrigação de fazer tarefas na casa da tia, sempre vestida daquele jeito, conforme o castigo combinado no conselho tutelar. Era mesmo uma Cinderela? Não, estava mesmo mais para bruxa do que para princesa, tal como respondera a Josias, que tampouco tinha alguma coisa de príncipe encantado. A tia não era uma madrasta má, nem o primo era como as irmãs invejosas, e o contato de seus pés descalços no chão servia para lembrá-la de que não estava ali sem motivo.

Virou-se mais uma vez para inspecionar a sola do pé impregnada com a poeira do chão que estava varrendo. Também vinha-lhe a vontade de puxar para baixo aquela saia curtinha. Pensou no irônico da situação: no baile funk, adorava exibir seus predicados para aquele bando de garotos safados, e agora ficava com vergonha de exibir-se para o priminho de 12 anos, que acompanhava-a com o olhar guloso percorrendo cada polegada do corpo dela que era deixado à mostra, sob o pretexto de que a mãe mandara-o vigiar seu serviço. No baile sentia-se poderosa, mas ali, ao contrário, sentia-se sem poder. E no entanto o corpo era o mesmo. Pensou maldosa como a bruxinha que queria ser, ela não poderia usar o corpo para adquirir poder sobre Eduardo, da mesma forma como fazia com Josias e Beto? O problema era que não tinha nada para oferecer a Eduardo que ele não pudesse obter por conta própria, já que as ordens da tia determinavam que ela estivesse ali sob os olhos dele. E para outras coisas, ele era novo demais.

À medida em que se aproximava o final de semana, a exasperação de Telma aumentava. Havia de ir com Josias de qualquer maneira, Cinderela o cacete! Trocava mensagens com Francielly combinando como haveriam de fazer. Josias havia-a convidado para ir a um baile funk, mas não queria saber de voltar à meia-noite. Ela tinha que arrumar primeiro um lugar para dizer aonde ia, para a tia deixar, e depois uma desculpa para não voltar no horário. Podia dizer que a carona furara um pneu ou coisa assim. A tia ia colocá-la novamente de castigo sem sair no próximo fim de semana, mas até lá tinha tempo para inventar outra coisa.

— Ah, eu vou arriscar sim! – Disse Telma para a prima, resoluta. Francielly hesitou, mas logo topou. Também gostava de ousadias. Um sorriso maroto selou a tramóia. Dissera à tia que ia a uma festa onde nem conhecia o pessoal, se a tia telefonasse estaria ferrada! Ia voltar no horário? Claro, tia! Desde que a carona não fure um pneu...

A carona deixou as duas na esquina onde pensava ser o destino delas. Josias e o namorado de Francielly já aguardavam em suas motocicletas. Montaram na garupa e foram até um bairro que Telma não conhecia. Não era um clube nem nada, era apenas uma quadra cheia de jovens dançando ao som de dois carros cheios de auto-falantes. Funk pancadão, e Telma já sentiu as cadeiras querendo sacudir. Mas primeiro tinham que trocar de roupa. Foram as duas para o banheiro de um botequim, e Telma entrou em seu uniforme de funkeira saído da valise secreta de Francielly, onde colocaram as roupas comportadas com que tinham vindo. Francielly combinou com o dono de guardar a valise atrás do balcão, e correram para a quadra.

Telma dançou até cansar sem pensar em mais nada, bateu o traseiro no chão, fez quadradinho de quatro, fez quadradinho de oito, sentindo o tesão crescer. Haveria de cumprir o prometido. Josias levou-a até um canto escurinho, debaixo de uma marquise, onde havia mais gente e se ouviam gritos e gemidos. Telma despiu-se e Josias estendeu sua jaqueta de motoqueiro no chão para servir de coberta.

— Vem, bota tudo, bota tudo...

Mas estava difícil, doía e Telma agora percebia como Josias era bruto, além de ter aquele hálito horrível de bebida. Já estava arrependida, mas esforçava-se para fingir que seus gemidos eram de prazer e não de dor. Súbito, o grito.

— Olha a polícia!

Pânico, gritaria, correria. Telma vestiu suas roupas e olhou para os lados, espavorida. Josias puxou-a pelo braço e ambos saltaram um muro, caindo do outro lado da rua. Ali estavam também Francielly e o namorado. Ao redor, vários carros de polícia. Ficaram escondidos atrás de umas pilhas de caixotes de bebida, esperando a situação amainar. Quando escutaram as sirenes dos carros de polícia se retirando, correram até onde estavam as motocicletas.

— Peraí que a gente tem que trocar de roupa!

O coração de Telma quase parou quando viu a persiana de ferro do botequim baixada. Com certeza assustado com a batida policial, o dono resolvera fechar o botequim.


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