Unsteady escrita por Lost Satellite


Capítulo 1
único




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Daniel não era um cara muito sociável, ele não entendia o porquê das pessoas gostarem de se aproximar dele. Era um cara comum, participava do time de futebol do colégio, ia às festas, ficava para recuperação em cálculo, ficava com algumas garotas, e dirigia um carro antigo.

As garotas gostavam dele, talvez fosse um pouco da sua beleza rústica que chamasse a atenção delas, talvez fosse o corpo em forma, ele não saberia dizer. Era um cara de poucas palavras, poucos sorrisos. Certa vez, ele ouviu da boca de uma garota, que todas gostavam de seu jeito fechado e calado, um bad boy. Quase todas para ser mais exato, mas ele sabia que não era assim, ele só era dele, apenas.

Estava em uma festa com os amigos do time, embora a maioria fosse menor de idade a bebida rolava solta, entre outras coisas. Daniel bebia sua cerveja sem se importar com as regras, estava irritado, e quanto mais irritado se sentia mais ele bebia, e quanto mais bebia mais irritado ficava, um ciclo sem fim.

Ele que já não era muito de falar estava especialmente calado. Uma péssima companhia, um amargurado, um coração partido.

Ele olhava pelo vidro da janela as pessoas que estavam próximas da piscina. Alguns pularam, alguns foram jogados, outros assistiam a tudo, não ligavam para o frio que fazia. Ele foi até a mesa de bebidas, outra cerveja, não saberia dizer quantas já havia bebido.

Bebia de seu copo, quando ele a viu. Cabelos soltos que caiam em cascada, olhos verdes e misteriosos, ela era toda sorrisos e simpatia. Alasca era uma mágoa no coração de Daniel, sempre que ele sentia que tinha um.

Ele se lembra da noite em que a conheceu, uma garota recém-chegada no colégio, era diferente das outras garotas, havia algo de diferente no verde de seus olhos e no jeito que ela o tratava. Estavam em uma festa, como outra festa qualquer. Alasca em toda sua beleza e encantos era a novidade da vez. Ele não se interessava por novidades, mas se interessava por Alasca. A garota com nome diferente, toda excêntrica e misteriosa. Na primeira conversa e ele já estava apaixonado. E sentiu-se assim por meses até que ela se foi, ela ainda estava lá, mas não mais com ele.

No presente enquanto ela conversava e era o centro das atenções, ele aguardava. Aguardava sem saber pelo quê. Eles não conversavam mais, ele não a encontrava mais. Não sabia como deveria ser. Ele deveria dizer ‘oi’? Deveria dar um abraço? Deveria apenas ignorar? Enquanto aguardava serviu-se de outra cerveja.

Era melhor não fazer nada que pudesse se arrepender mais tarde, era melhor evitar. Saiu imperceptível da festa, meio cambaleante, meio irritado, caminhou pelo jardim da casa onde a festa estava acontecendo, encarou seu carro estacionado e a rua escura e fria. Ele sabia que legalmente não poderia estar bebendo e muito menos dirigindo, ele não era burro. Deixou o carro na festa e encarou uma caminhada pela rua. Estava chateado por não ter feito nada, estava mais chateado ainda por ela também não ter feito nada.

Já havia algum tempo que andava, já estava arrependido de ter deixado o carro, quando um carro o alcançou na rua, com o vidro baixado o motorista disse em voz alta:

− Está tentando provar alguma coisa? – A voz feminina provocou.

Daniel conhecia aquela voz, estava irritado com aquela voz, queria nunca a ter conhecido.

− Vá embora. – Ele resmungou de volta.

− Para de ser infantil e entra logo, está tarde e bem distante da sua casa.

Por mais que ele quisesse provar algum ponto para ele mesmo ou para ela, resolveu aceitar a carona, já estava cometendo muitas idiotices naquela noite, mais uma não iria matá-lo.

− Vi que tinha saído da festa, e quando sai seu carro ainda estava lá, imaginei que precisasse de uma carona.

− Por que não posso caminhar sem precisar de você? – Ele perguntou rancoroso, ele não queria agir assim, mas as palavras soaram erradas em voz alta.

− Porque bebeu um pouco demais. – Ela disse sem encará-lo.

− Está controlando o que eu bebo?

− Você realmente não está sabendo lidar...

− Eu sei lidar com meus problemas. – Outra vez estava dizendo o que não queria, do jeito que não era pra ser.

− Eu não sou um problema, não para você. – Ela não o encarava, permanecia com o olhar fixo na rua enquanto dirigia.

− Não foi o que eu quis dizer. – Disse baixo enfim encontrando o tom que queria ter usado desde o início.

− As pessoas vivem implorando por sinceridade, e quando você é sincera ninguém aceita. – Ela disse e eles caíram no silêncio.

− Alasca? – Ele chamou depois de alguns minutos.

− Eu sinto muito. – Ela disse o encarando pela primeira vez.

− Eu... – Ele se desconcertou. – Eu não quero voltar, se é o que está pensando. – Ele soltou irritado, o tom errado, cometendo outro erro para sua lista de erros.

− Não estou tentando voltar para você, será que você ainda consegue ser mais grosso?! – Ela estava irritada agora, e voltara a encarar a rua.

− Não estou sendo grosso, você me deixa louco, sabia?

− Agora vai me culpar pelas suas babaquices?

− Há alguns minutos eu nem sabia se deveria te dizer ‘oi’, ou apenas te ignorar.

− Eu fui sincera, estou tentando levar numa boa, e tudo o que você faz é me tratar assim.

− Você é louca. – Ele disse fazendo com que ela freasse o carro bruscamente.

− Repete isso. – Ela pediu furiosa, ele também estava.

− O que? Que você é louca? Louca! – Ele disse lentamente a raiva pulsando em sua têmpora.

− Ah! – Ele se assustou quando ela ainda sentada no banco do motorista o esbofeteou na cara, estava agressiva.

Ele tentou se defender da melhor forma possível dos golpes dela.

− Vo-cê é um cre-ti-no. – Ela gritava com ele, a cada sílaba uma bofetada.

− Hey! Já chega! – Ele disse irritado, tentando segurar os braços dela, mas ela estava descontrolada.

− Droga! – Ela simplesmente se entregou, começara a soluçar enquanto chorava.

− Tá chorando? – Ele perguntou confuso, era em momentos como esse que ele desistia de tentar entender uma mulher, principalmente entender Alasca.

− Você não entende nada.

− Você terminou comigo, essa parte eu entendi muito bem.

− Não, não entendeu. Não terminei com você, a gente nunca começou nada para que eu tivesse que terminar.

− Ótimo, quem tá sendo babaca agora? – Agora ele sentia a mágoa pelas palavras dela.

− Estou sendo sin...

− Sincera? É eu sei, você é tão sincera que chega a ser babaca. Guarda isso para você, eu tô fora. – Ele disse antes de abrir a porta e sair do carro, era melhor ir a pé do que manter seja lá o que era aquilo dentro do carro.

Alasca não lhe deu nenhuma resposta, apenas ligou o carro e arrancou em velocidade.

− Garota maluca... – Ele disse continuando sua caminhada, respirava fundo o ar frio da noite. Estava distraído demais pensando na noite que estava tendo para reparar na chuva que se precipitava. O aguaceiro gelado o atingiu em cheio, ele correu um pouco, mas era inútil já estava completamente encharcado. Foi quando dobrou uma esquina, que se deparou com uma cena que o transtornou. Lá estava o carro de Alasca enfiado contra um dos postes de iluminação. Ele correu até lá, o medo fazia com que seu coração martelasse dentro do peito.

− Alasca! – Ele gritou desesperado. Chegou até a porta do motorista, mas o carro estava vazio. – Alasca? – Ele chamou sem entender.

−Eu perdi o controle. – Ela disse atrás dele, ali parada na chuva.

−Você está bem? –Ele se adiantou até ela, as mãos segurando seu rosto, tentava enxergar através da chuva. – Está ferida?

− Eu perdi o controle! – Ela disse em voz alta.

− Tá tudo bem, esse tipo de coisa acontece...

− Não! Não é isso. – Ela espalmou as mãos no peito dele, seus braços tentavam ampará-la.

− Do que você está falando, Alasca? – Ele estava preocupado.

− Eu precisei me afastar de você porque eu perdi o controle, entende? Eu não podia, não dava...

− Tá tudo bem, eu... Esquece isso, precisamos pedir ajuda. – Ele não a entendia.

− Não! É o meu coração... – Ele enfim entendeu sobre o que ela falava.

− Alasca, você tem metade do meu coração, querendo ou não, você o tem.

− Metade? – Ela ficou curiosa.

− A outra metade deixou de existir no segundo em que você se foi.

Houve um momento de silêncio entre eles, apenas o som da chuva caindo era perceptível.

− Vem, vamos pedir ajuda!

− Eu precisei ir, eu não sabia como ser de alguém, como pertencer a algum lugar ou alguém.

− Você está em choque, acabou de sofrer um acidente, precisa se acalmar, precisamos de ajuda.

− A minha vida inteira tem sido um acidente, não entende? Eu estava sempre procurando por aí, sempre me procurando ao mesmo tempo em que fugia. Você não é só uma pessoa, é um lugar e eu me encontrei nesse lugar, me encontrei em você.

− Então por que fugiu? – Ele perguntou com o coração martelando desesperado em seu peito, a chuva quase os afogando.

− Porque eu não sei pertencer, eu não sei me entregar.

− Eu também não sei. – Ele tentou ser solidário, e com as palavras dela ele deixou que toda raiva se esvaísse, deixou que a mesma chuva que os enxercava também levasse todos os ressentimentos.

− Você não precisa mais fugir. Você já me tem, já tem metade do meu coração, então por onde for eu ainda serei seu lugar, eu ainda serei seu, não percebe? Não existe fuga.

Ela o encarou analisando a ideia por trás de suas palavras, absorvendo suas verdades e seu peso.

− Isso tudo é loucura. – Ela disse exausta.

− Então, vem ser louca comigo. –Ele segurou o rosto dela, antecipando o desejo de seu coração. Aproximou seu rosto do dela, a ansiedade o dominando. Encostou sua testa na dela, os narizes se tocando, respirou fundo quando ela fechou os olhos, estava entregue a ele.

Seus lábios tocaram-se, quentes em meio ao frio e a chuva. O tempo estava suspenso para que eles pudessem se pertencer. Luzes  e sirenes piscavam e apitavam ao redor deles, a chuva ainda caia, mas naquele momento a verdade veio à tona. Daniel não era bad boy, era apenas incompreendido. Alasca não era louca, era apenas perdida. E poderia nesse momento único a incompreensão encontrar aquilo que estava perdido?


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler!

Até mais!



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