Um conto da casa Sonserina escrita por Lucas Stumpf


Capítulo 2
Os aurores




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Margot acabara de lavar as roupas do marido quando ouvira a porta da frente se abrir. Ela encolheu os ombros automaticamente, e olhou de soslaio para o portal do cômodo onde estava, esperando que a qualquer momento, Bennedict entrasse e gritasse com ela por vê-la lavando suas roupas nas mãos.

   “NÃO ME IMPORTO SE VOCÊ LAVAR AS SUAS ASSIM! MAS AS MINHAS NÃO SÃO DIGNAS DESSE ATO DE TROUXAS!”, ele berrara a primeira vez que a vira fazendo isso.

   Mas como ela poderia lavar de outro jeito? Não tinha poderes mágicos como ele... Ela tentara, e tentara muito, mas não conseguira fazer sequer uma xícara de chá balançar. Seus pais eram bruxos. Seus irmãos também. Mas ela não. A vergonha da família desde que nascera. Por isso eles a abandonaram na ponte fria sobre o rio que serpeava pelas montanhas. Deixaram-na lá para morrer de frio, ou aquecer os mendigos bêbados e pervertidos que a encontrassem.

   Mas Bennedict a encontrara. A levara para seu casebre imundo e pobre, e a adotara como esposa. Mesmo que tivesse nojo de sua natureza aborto, ele não a deixava. Margot sempre se perguntava o porquê, mas nada de especial lhe ocorria, e a única vez em que perguntara isso ao marido, passou cinco dias sob a ponte, como castigo; passando fome e frio. Por inúmeras vezes já pensou em deixa-lo, mas morreria lá fora, uma vez que não tinha para onde ir, e caso voltasse, não se espantaria se Bennedict resolvesse mata-la, embora achasse que ele não seria assim tão benevolente; fazia mais o tipo dele, desmembrá-la e mantê-la viva para que sofresse.

   Quando a madeira rangeu anunciando a aproximação do marido, Margot largou as roupas no tanque, e imediatamente correu para a parede, onde ficou imóvel, mirando o portal cabisbaixa. Assim que o gigante adentrou o cômodo, lançou um olhar investigativo às roupas molhadas, e depois voltou-se nada feliz para a esposa, que tremia de cima a baixo, quase desabando nos próprios sapatos.  

   - O que é isso? – perguntou Bennedict, apontando a mão trêmula que entregava a quantidade de álcool que havia bebido logo antes, para o tanque molhado.

   Margot apenas balançou a cabeça negativamente muito rápido, procurando as palavras certas para atenuar um pouco a raiva do marido.

   - Eu achei que o senhor ia demorar a voltar, então... Eu comecei a lavar suas roupas.

   O homem golpeou o tanque com muita força, fazendo-o dar um salto, e o som, assustar ainda mais Margot, que estava quase resvalando para o chão sujo.

   - Quantas vezes eu já disse para não praticar esses hábitos trouxa em minha casa? – exclamou ele, massageando a têmpora. - Você devia ter mais respeito pelo sangue do seu marido! Seu marido, que é herdeiro do tão famoso Salazar Slytherin! Já não bastara sua cena hoje com o medalhão?!

   O gigante puxou a comprida e lascada varinha do bolso, e apontou-a para Margot, como se fosse uma arma de fogo.

   - Eu acabei de matar um trouxa, sabia disso? - disse ele, com o rosto púrpura, e uma dose de crueldade na voz, que Margot nunca havia ouvido. - É, aparentemente ele vira você brincando com o medalhão lá fora, semana passada, e hoje entreouvi uma conversa em que ele citara que temos uma joia muito bonita e cara, mesmo vivendo nessa pobreza. - e riu. 

   "No mesmo instante, eu puxei a varinha e ataquei-o com a Maldição da Morte. O infeliz sequer vira o que o antigiu. Eu consegui obliviar todos os outros. Acho que devia tê-los matado também, mas os trouxas não são dignos de um feitiço desse nível vindo do herdeiro de Salazar Slytherin. O trouxa em questão devia era se considerar com sorte!".

   Margot estava colada na parede, aflita e tremendo. Por mais cruél que Bennedict fosse, ele nunca ameaçara matá-la, mas nessa situação, algo a fazia considerar a possibilidade...

   - Por favor. - foi tudo que ela conseguiu dizer. - Me perdoe! Eu não... Eu só queria servir...

   Bennedict soltou uma gargalhada corrosiva, ainda apontando a varinha para a esposa.

   - Você pede perdão, não é? - e lambeu o descascado labio inferior. - Bem, você tem me causado muitos problemas ultimamente, sabia? Tem ideia do que aconteceria se... ele chegasse a ouvir falar do medalhão? Bem, apesar de tudo... - e, para a surpresa de Margot, Bennedict terminara a frase ali. 

     Porém, antes que ele pudesse entoar qualquer encantamento, a porta se escancarou, e três jatos de luz vermelhos acertaram-no nas costas, fazendo-o derrubar a varinha, cambalear e cair estático no chão, a casa estremeceu com a queda.

   Três homens trajando longas vestes cinza, e empunhando as varinhas contra Bennedict, irromperam no cômodo. Margot desabou no chão, tremendo, enquanto via dois dos homens desvirando um desarmado e fácil Bennedict.

   - Você está bem, garota? – perguntou o terceiro, que se ajoelhava em frente a ela, passando-lhe a mão cálida.

   Margot não sabia se devia responder, tentar correr, ou chorar. Ela viu o corpo do marido levitando para fora do cômodo, e voltou-se em choque para os olhos azuis do homem que lhe fizera a pergunta. Fosse porque a tinha salvo, ou fosse porque aquele olhar decidido transbordava uma sensação estranha de conforto, mas a garota saltou nos braços do homem, e rompeu em lágrimas, enquanto apertava suas vestes com força.

   - Calma. – sussurrou ele no ouvido de Margot, retribuindo o abraço. – Somos aurores. Esse homem acaba de tirar a vida de um trouxa no vilarejo. Bem... Acho que ele já deve ter te contado, pois parecia que ia fazer o mesmo com você.

   Margot se desvencilhou lentamente, estava, agora, a poucos centímetros do rosto do auror. Tinha certeza de que estava imunda e patética.

   Ela nada disse. Apenas ficou olhando naqueles olhos por alguns instantes. Depois de ter vivido tanto tempo com Bennedict, e com as pessoas do vilarejo, que a olhavam com quizília, era extraordinariamente agradável ver alguem, de certo, modo, ou, ao que parecia no momento, se importando com ela. 

   O auror, então, quebrou o silêncio constrangedor.

   - Seu marido... ele... bem... Lamentamos muito, mas teremos de leva-lo para Azkaban. – Ele então esquadrinhou a garota, e soltou um sorriso sem jeito. – Não vivia muito bem aqui, não é?

   Margot fez que não imediatamente.

   O auror levantou-a pelas axilas, e ajudou-a a manter-se em pé, olhou por cima do ombro, para os companheiros, que aparataram levando o marido junto.

   - Vou leva-la ao Ministério. – contou ele. – Há algo que queria levar? Sua varinha?

   Mas a menção da palavra fez Margot murchar.

   - O que foi? – perguntou o auror.

   - Eu não... eu não sou bruxa... – murmurou ela, triste.

   O homem entreabriu a boca. O casebre mergulhara em um silêncio constrangedor, e o auror fitava o chão, mordendo o lábio, claramente pensando, então Margot explicou:

   - Sou abortada.

   Os olhos do homem voltaram-se para ela, e suas sobrancelhas estavam levantadas. Um sorrisinho voltou a seus lábios.

   - Ah... – disse ele. Por alguma razão, Margot sorriu. – Nesse caso posso leva-la sem problemas. Só precisará responder algumas perguntas. Depois iremos providenciar um lar novo para você.

   - Mas há sim algo que quero levar. – disse ela, admirando-se com sua coragem em abrir a boca.

   - Pois muito bem. – concordou ele. – Pode ir.

   Margot ficou alguns segundos olhando para o auror, antes de seguir para o quarto de Bennedict, onde abriu todas as gavetas da cômoda torta, tirou para fora as quinquilharias nojentas e engraxadas do marido, até que encontrou, em meio à escuridão, o medalhão de Salazar Slytherin. Pegou-o e guardou-o no bolso da calça gasta e curta demais para seu tamanho; voltou ao encontro do auror, e, ao pegar na mão dele, o mundo todo a sua volta girou, assobiou, e foi como se seu corpo se esticasse, diminuísse, e passasse rodopiando por cada átomo na Terra, até que sentiu como se despencasse de uma vertiginosa altura; foi quando teve coragem de abrir os olhos, e se viu em um amplo salão, apinhado de pessoas muito bem vestidas, entrando e saído de lareiras, em meio a chamas esmeralda.  


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