O ethos da alma humana escrita por Mantoni Rúbia


Capítulo 5
A heresia do conselho da lua


Notas iniciais do capítulo

A lua é ouvinte aos loucos e aos apaixonados. Contudo, aos loucos apaixonados, serve-lhes de irmã.



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Há tempos fiz da lua confidente minha — sem pedir-lhe permissão nenhuma para isso. Julguei desnecessário pedido de tal natureza. Valendo-me dos clichês e exageros perdoáveis aos apaixonados roguei em confissão meus pecados. O que fazer senão exageros? Sou um homem apaixonado e apaixonado no sentido mais radical e fidedigno da palavra. Sou doente e minhas patologias vão do leste ao oeste dos sorrisos que te amanhecem a iluminar a face. Sinos estremecem nas mais altas nuvens e abundantes rios cantam em meu corpo quando me deparo com a fartura do teu riso. Sinto-me, na subtaneidade dos instantes, capaz de tocar a impalpável constituição essencial e pura das coisas.

— Eu te amo! — grito fazendo dos pulmões asas para levar essas palavras ao mais alto dos céus onde tocam os sinos. Para tu e a lua.

Eu. Te. Amo. Eficiente, clara, sem exageros. Pronome pessoal da primeira pessoa do singular, pronome pessoal da segunda pessoa do singular, substantivo abstrato. De mim a tu. De mim a tu para sempre ou, pelo menos, garanto-lhe enquanto houver luas. Nas minhas letras, poemas e cordéis estarão não tua juba acastanhada, a quentura e maciez de tua pele ou o desenho de teu corpo dourado e as outras coisas escravas do tempo, e sim, as eternidades que são teus olhos mornos e tristes, teu cheiro de brisa noturna e a inflorescência dos teus lábios de mel. Escreverei, declamarei e pintarei tuas eternidades antes de destronar o meu amor. Sinto em fazê-lo, mas preciso. Jogarei à imundície do mundo — e o faço com a presunção de quem joga pérolas aos porcos — o meu coração que te ama. E, nas entrelinhas do ato, lê-se o desespero de quem ainda crê que os barulhos e exageros dum apaixonado — no sentido mais literal e fidedigno — comova alguma alma distraída. Ouso esperançar porque sei que o amor é definitivo e deveria ser chocante como a morte, é violento e deveria ser temido como o inferno.

Ouso esperançar na subversão dos alfabetos dos meus votos sinceros à eternidade dos nossos afetos. Guardarei no coração sagrado do mundo nossas promessas imperturbadas pela inconveniência da realidade. E na fome e no pranto da terra exulta minha alma em alegria porque a confidente minha desata em seus lábios heresias:

— Meu querido, só sabemos do inaceitável porque há aquele que o faça. Acenas e dás vivas aos transgressores porque é pelas suas graças que és bom moço. Acenas, então, e dá vivas àqueles que transbordam ódio porque só então sabes do que deves fugir e àquilo a que se agarrar. Valoriza-se o amor e o céu apenas porque algum pobre homem já amargou no ódio e no inferno

Justiçado, aceito com candura a sina imposta àqueles que padecem sob o fardo da paixão, afinal, de quais negras raízes alimenta-se um homem a desejar em desespero e as obscurecenças de seu espírito?

Autor: Mantoni Rúbia


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Notas finais do capítulo

E tu? Escolheste amargar no ódio e no inferno ou celebrar a cabalidade e violência do amor?

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