O ethos da alma humana escrita por Mantoni Rúbia


Capítulo 3
A revolta dos ponteiros


Notas iniciais do capítulo

Quantas eternidades cabem no primeiro beijo de casal apaixonado?



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— Posso eu te beijar? — ao perguntar, sentiu que a voz necessária à essa pergunta nasceu num lugar mais profundo do que na garganta. Sobressaltou-se ao perceber que tinha funduras para achá-la. Aqui, para os dois ambos, começou a eternidade.

Seus olhos se encontraram e permaneceram no ponto de encontro imitando uma primeira vez, redescobrindo-se com total espanto. Aquela pergunta rompeu-lhes como um raio, dividiu-lhes como um terremoto e uniu-os como um ideal. Uma tempestade amanheceu na distância aberta entre seus corpos, e, decididos, eles estrangularam-na. Com os corpos o mais perto que dois corpos são capazes de estar, deram início ao que nunca teria fim. Ela deu-lhe a permissão não por ter motivo, porque ela não o tinha, mas porque era necessário. O que ela tinha dele era necessidade — que só os apaixonados sabem, verdadeiramente, qual é. Seu coração voltaria a bater apenas quando fosse capaz de senti-lo.

Neste beijo que os eterniza, há carinhosas inconfidências, respeitosas violações, antiquadas revoluções, tangíveis ilusões. Toda estrada percaminhada os guiara a este momento. Em todas suas noites de insônias, os sonhos do rapaz ilustrados foram pelos sorrisos da moça. Sorrisos que eram constelações inteiras. Sem poder ditar regras neste momento em que sentiu o mundo despedaçar-se no próprio miolo, ele sorriu. Sorriu, mesmo que sem querer, sob os lábios dela. Sorriu, verdadeiramente, como nunca antes. Nu, hilário, vibrante. Floresceram ali todos os sorrisos que lhe faltaram no antes.

Não podia deixá-la escapar. Ela deu-lhe os lábios seus para este beijo neste mínimo instante que lhes parecia o eterno. Gargalhavam sóis inteirinhos por dentro, e raiaram verões porque se amavam e podiam se amar e davam a si mesmos a permissão de fazê-lo. O coração da moça socava as paredes do próprio peito, pedia-lhe arrego. Tropeçava na própria ansiedade porque toda fibra do seu ser pedia que aquele beijo inacabasse. Ela, também, sorria. Crua, eufórica, pulsante. Na sua cabeça comicamente tragirromântica, eram eles ponteiros. Ponteiros, sim senhor, mas ponteiros insurgentes. Recusavam-se a seguir as convencionices dos relógios, e sendo assim, inventariam o próprio tempo. Um tempo só deles. Naquele enlace de lábios e destinos, eram sós. Eram verbo. Verbo que partirá deste beijo para o todo sempre.    

Autor: Mantoni Rúbia


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Notas finais do capítulo

Vivamos a tragirromancidade dos primeiros amores em quaisquer oportunidades, porque, apenas através dela, saborearemos o eterno!

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