O abismo em todos nós. escrita por Ninguém


Capítulo 15
Capítulo 15


Notas iniciais do capítulo

Perdão por possíveis erros de português.



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" Virtude e hipocrisia andam de mãos dadas." - autor desconhecido. 

 

Vinte horas atrás.

Alexandre não iria esperar pelo sermão do diretor nem por mais explicações infrutíferas sobre do por quê ter arrebentado a cara de alguém. O que Suzane havia dito perturbara sua cabeça, suas lembranças queriam aflorar e isso trazia uma pressão incrível que o deixava com uma dor de cabeça terrível. Assim, o jovem seguiu pelo pátio até a parte detrás de um dos prédios, deu um salto apoiando as duas mãos no muro para fugir dali quando escutou uma voz estridente:

— Você está de brincadeira né?

Catarina estava ali perto, ela ia para a direção a fim de falar com Alexandre quando o viu se esgueirando pelo pátio. O seguiu até finalmente perceber que ele fugiria. O jovem deu um impulso sentando-se no muro.

— Não estou com paciência para nada no momento, vou pra casa.

— Espere! – ela correu até a base da parede – se está com medo do que pode acontecer, eu contarei que Aegon deu o primeiro soco.

Alexandre sorriu em escárnio.

— Não dou a mínima se eu vou ser suspenso, expulso ou preso. Só preciso descansar longe daqui e organizar meus pensamentos.

Catarina imediatamente fez o mesmo movimento pulando sobre o muro numa boa agilidade.

— Vou com você.

Alexandre suspirou.

— Pra quê?

— Por que eu quero e pronto.

O rapaz não tinha força de vontade para argumentar com a birrenta Catarina, por isso ambos desceram para a calçada e foram caminhando tranquilamente pela rua numa manhã de sol. Quando finalmente o silêncio se tornou incômodo – para a garota – Catarina disse.

— Desculpe.

— Por ser um porre na minha vida?

Ela faz uma careta.

— Não. Eu deveria ter sido mais direta com Aegon. Nos conhecemos desde crianças e ele está apaix-

— Obcecado por você – completou Alexandre – por sua natureza ríspida, intelectual e conservadora a respeito de homens, o príncipe da escola a vê como uma joia rara. Ele, que tem a mulher que quiser, almeja a melhor por que você é a única maçã saudável no meio de um pomar podre. Seu trauma deriva de um comportamento lascivo de mulheres quando na infância, acho que a mãe ou alguém próxima de valor materno. Daí surge uma garota virgem, pura, que observa valores éticos além da futilidade esperada da grande massa de adolescentes que só querem um namorado para se sentirem “amadas” e para serem valorizadas como aquelas que têm alguém. Já que ser sozinha ou solteirona tem uma conotação ruim.

Catarina leva a mão ao braço de Alexandre o brecando. Ela ostenta uma expressão séria, quase assustada.

— Como sabia?

— Hã? – ele suspira – é difícil expli-

— Não. Não isso. A frase... como sabia que Aegon me considera uma maçã saudável em meio a um pomar podre? Quando ele se declarou para mim, disse um monte de coisas incluindo essa sentença estranha.

Alexandre se solta da mão de Catarina e arfa olhando para o outro lado da rua em direção a uma família que comprava sorvete italiano de uma máquina em frente a uma lotérica.

— Eu vi.

— O quê?

— A escuridão dele – Alexandre fita Catarina nos olhos – eu vi quem ele é, vi o que vai se tornar se não tiver seus traumas tratados... e que nunca serão tratados por que ele os guarda bem no fundo da alma para que ninguém, nem mesmo você, veja o quão podre, solitário e desiludido ele é.

O garoto volta a andar tendo uma Catarina chocada e exaltada o seguindo no encalço.

— Como você faz isso? – ela perguntou – como consegue ver através das pessoas, como pode entendê-las tão bem apesar de não as conhecer? Eu quero saber! Como você faz isso, como pode ter mudado tanto?

Quando passavam por um beco Alexandre se vira abruptamente, leva a mão direita na junção do maxilar com o pescoço da colega a empurrando num movimento brusco para detrás de uma lojinha longe das vistas da rua. Ele pressiona o corpo da colega contra a parede e a beija. Foi um beijo violento, um choque de seus lábios vindo de uma determinação férrea por parte do homem e uma surpresa da parte da mulher. A princípio Catarina o rejeitou tentando empurrar o corpo de Alexandre para trás, só que parecia ser feito de concreto, era pesado e duro. O rapaz por sua vez não ligava e continuava forçando sua boca contra a dela tentando uma resposta.

E conseguiu. Catarina cedeu ao calor e ao desejo de um ato que chegara a cogitar conforme ficava mais e mais fascinada pela incógnita que era seu colega de classe. Seus hormônios também ajudavam porque o desejo da carne é inevitável, ainda que exista controle, a paixão é almejada e desejada nos cantos mais profundos da mente; e rasos do corpo.

Ela respondeu ao beijo abrindo a boca para que suas línguas se tocassem, como num movimento desordenado, sua mente se desconectou do corpo deixando funcionar no automático, Catarina levou as mãos para trás da cabeça de Alexandre o puxando mais, seu corpo esguio tentava enrolar-se ao dele para diminuir a micro distância em que estavam.

Quente. Ele era quente ou estava quente, quase febril. Só que não era ruim, pelo contrário, o calor parecia passar para o corpo dela fazendo-a derreter em luxúria. Um êxtase nunca antes sentido por um beijo desesperado. Alexandre dizia com todas as palavras em silêncio que a desejava, não por ela ser isto ou aquilo, não pela sua beleza ou inteligência...

Ele a queria ali e agora, exatamente naquele momento efêmero. Não depois, não antes... agora. Sem desgrudar suas bocas o garoto desceu as mãos para a cintura dela penetrando na camiseta do colégio subindo lentamente  até os seios cobertos pelo sutiã. O toque da mão quente de Alexandre em sua barriga depois mais acima foi fazendo Catarina esquecer a razão, esquecer onde estavam ou o que estavam fazendo. Ela levou seu braço para cintura dele o puxando mais e mais contra seu corpo enquanto a mão do garoto fazia sua excursão por dentro de sua blusa, desta vez empurrando o tecido do sutiã para cima para tocar o seio esquerdo diretamente.

A moça não mais pensava. Não havia mais nada em sua cabeça que não fosse ele. Alexandre lentamente foi baixando a mão para puxar a barra da blusa da colega para cima o máximo que podia deixando seu torço quase nu à mostra, então, desconectou sua boca da de Catarina abaixando a cabeça para chupar o seio exposto. Nessa hora Catarina ia gemer e para se controlar mordeu a nuca do rapaz enquanto suas mãos puxavam com força o couro cabeludo dele em um gesto de “contenção” de desejo.

Catarina achou ia “enlouquecer” apenas com os amassos.

E como uma onda de água fria Alexandre se afasta de repente deixando-a desnorteada por alguns segundos com os cabelos bagunçados e a roupas bem desarrumadas.

Ambos se encaram ofegantes por alguns segundos até o rapaz falar:

— Eu só queria que você calasse a boca e... – ele tentava controlar a respiração enquanto tentava inutilmente explicar o que houve – e... eu não sei.

A garota não disse nada enquanto tentava controlar o embaraço ao mesmo tempo que arrumava as peças de sua roupa.

— Acho que – Alexandre engole seco, afinal o que diabos ele poderia dizer? – hã... que tal conversarmos lá em casa, agora já não tenho nenhuma ideia do que dizer.

Catarina só balançou a cabeça na afirmativa porque ela também não sabia o que fazer muito menos o que dizer depois de tamanho ato fogoso, repentino e confuso.  

***

Quando Alexandre abriu a porta para entrar em casa alguém lhe acertou com uma forte pancada na cabeça, ele pôde ouvir o grito de Catarina antes da visão ficar embaçada e depois tudo ficar escuro.

O choque de temperatura foi a primeira coisa que percebeu, parecia que estava mergulhando no oceano ártico, mas assim que abriu os olhos e seus sentidos foram retornando o jovem entendeu que atiravam água fria na sua cara para despertar. E como se fosse um pesadelo em plena realidade, sua visão se focou em uma fera.

Era uma face branca e perfeitamente lisa com dois olhos enormes sem nariz e uma boca retorcida dando sinal que estava triste. A princípio Alexandre achou se tratar de algum monstro só que a água gelada jogada em sua cara o fez despertar completamente para ver uma máscara grande e feia centímetros dele.

— Está acordado? Ótimo.

Imaginem que alguém alto pegou uma cortina preta, fez um manto mal feito e pôs uma máscara de estilo dos demônios orientais. Era quase como o dia das bruxas de um pobre, mas bem feito. Alexandre pôde reconhecer a sala de estar de sua casa, assim como entender que estava algemado em uma cadeira com a bizarra figura a sua frente.

— O... quê?

— Confuso, né? – o lençol de cara branca balança a cabeça – vou me adiantando para que esta conversa seja breve. Sua avó e sua namorada estão dormindo em um dos quartos do andar de cima graças a uma droga bem inofensiva e poderosa, os seguranças que ela contratou por sua vez também estão só dormindo, mas no porta malas do carro deles.

O cérebro de Alexandre tinha dificuldade de raciocinar com a dor da pancada e aos poucos ia entendendo o contexto da enrascada que se meteu, assim como notou um sotaque estranho vindo do lençol.

—  Faz parte do meu código matar somente o alvo. – o estranho se curva aproximando a máscara horrenda do rosto do jovem – e para seu azar menino, você é ele. Enfim, continuando a explicação:

O sujeito fantasiado se endireita.

— Uma pessoa muito rica contratou meus serviços que são muito caros, até aí faz sentido por que eu sou o melhor neste continente. Meu trabalho é rápido e preciso, porque em geral eu recebo um relatório datando os detalhes do alvo e após uma pesquisa minha mesma eu descubro porque meu contratante quer ver o fim da vida do alvo.

A figura medonha começa a dar voltas ao redor da cadeira de Alexandre. 

— É uma questão pessoal, eu sou curioso por natureza. Recebo para matar, mas antes quero saber o porquê a pessoa quer eliminar o alvo. Em geral são os mesmos motivos: dinheiro, influência, vingança, imposição de respeito ou medo.

Do lençol surge um braço coberto por uma camisa negra, a mão que estava sob uma luva de couro preto ergueu o indicador para cima.

— Porém, semanas atrás recebi um pedido desta pessoa notória. O problema é que ele não me disse quem eu deveria matar, disse que ainda iria descobrir. – a face branca encara Alexandre – dá pra imaginar que bizarro?

— Mais do que sua roupa? Não. – respondeu o garoto.

— Ah. Isso? Minha filha desenhou para uma exposição do dia das bruxas na pré-escola, ninguém achou assustador, mas me pareceu perfeito. Medonho né? Enfim, esse trabalho me chamou muito a atenção. Querem que eu mate alguém, mas que ainda não sabem quem é? O empregador disse para eu vir a esta cidade que em breve ele me daria o nome e a localização.

A figura tenebrosa de esquisita voltou a dar voltas na cadeira.

— Quando pedi por mais detalhes soube que se tratava de um serviço único, que o alvo era de extremo perigo e que causara o incêndio na floresta aqui perto. Disseram que queria ter certeza de que ele seria eliminado e por isso recorreram a mim. Duas horas atrás finalmente recebi o seu nome e endereço.

O lençol cruza os braços a frente do manto batendo os dedos no queixo da máscara.

— Não gostei muito, foi tudo às pressas. Descobri bem em cima da hora que sua avó estava planejando sua fuga, tinha contratado seguranças e fretado um voo... aí eu pensei, ok. Agora está me parecendo um serviço comum.

O mascarado coloca as duas mãos nos joelhos de Alexandre aproximando mais a face branca.

— Era... e dou ênfase no “era” um serviço comum porque pensei que meu empregador queria matar um adolescente para atingir a velha juíza que deve tê-lo prejudicado em algum momento... mas não. Pedi pro meu pessoal reunir o máximo de informações nas pouquíssimas horas que tínhamos e descobri que ela e você simplesmente não tem nada a ver com ele. Negócios, lei... nada. Como eu disse, Alexandre, sou curioso por natureza. Por que raios uma pessoa tenebrosa como aquela quer matar um adolescente punheteiro como você?

Alexandre se recordou dos avisos do delegado Mendes. Era disso que estava falando afinal.

— Acho que é por que essa pessoa... “rica” pensa que matei alguém próximo dele.

O mascarado se afasta endireitando o corpo.

— Faz sentido. E matou?

— Não sei.

A cabeça branca vira de um lado para o outro bruscamente em pânico.

— Hã? O quê? Como assim não sabe?

— No incêndio eu acordei do lado de um cadáver... e não me lembro de nada. Nem sei quem é aquela pessoa.

— Droga... estou ficando mais curioso.

Alexandre engoliu seco. Talvez valesse a pena tentar argumentar com esse cara estranho.

— Mas em breve vou saber. Então por que não fazemos um trato? Minha avó pode te dar muito dinheiro e eu posso sanar sua curiosidade... que tal?

A figura medonha suspira e do manto retira uma pistola automática com silenciador na ponta direcionando pro meio da testa do adolescente.

— Não me entenda mal. Você só ganhou esses minutinhos de vida porque eu queria saber o que você fez pra irritar gente poderosa. Eu sou bom no que faço por que em oitenta e dois pedidos eu entreguei oitenta e dois resultados positivos. E minha curiosidade não será maior que minha reputação.  

 O mascarado puxa o gatilho explodindo os miolos de Alexandre.

O corpo caiu para trás com o baque do disparo, uma poça de sangue ia se formando ao redor da cabeça sujando as costas da cadeira e o tapete egípcio da sala. O assassino balança a cabeça, guarda a arma e fita o alvo morto.

— Ainda não faz sentido. Por que você seria de extremo perigo?

Ele dá as costas para ir embora usando a porta dos fundos, já tinha perdido tempo demais em nome de sua curiosidade. Precisava se apressar ou perderia o voo para Jamaica que sairia logo à noite.

A dor veio num lapso tão rápido quanto a luz de um raio, na verdade, o assassino envolto no lençol negro não reparou na dor a princípio, e sim na coisa preta, torta,  alongada e úmida com seu sangue que brotava da barriga. Como uma serpente ou uma lança a coisa recuou para trás e o mascarado perdeu a força nas pernas caindo sobre o piso perto da mesa. Seus nervos estavam começando a deturpar os sentidos do cérebro por causa do dano sério de modo que só o que ele pode fazer foi virar a cabeça para trás e ver Alexandre de pé, sua cabeça baixa ainda pingava sangue e a coisa preta alongada brotava de suas costas como uma cobra sem olhos e boca, não, se olhasse mais precisamente o filamento lembrava  o galho de uma árvore enegrecida pelo fogo.

— Mas que... que... merda é isso?

O corpo do adolescente se mantinha de pé de modo desengonçado quase como se estivesse sendo sustentado por fios invisíveis. De repente o cadáver começa a se contorcer com violência e suas costas explodem em sangue de onde outro galho surge movendo-se lentamente de um lado para o outro. Os filamentos negros vão se esticando e ramificando nas pontas lembrando raízes até que alcançam o teto e aí sim o cenário ficou mais surreal.

As pontas dos galhos começaram a rasgar o ar, rasgar o ambiente como se fosse um tecido revelando de sua abertura uma luz alaranjada misturada com vermelho e amarelo. Conforme os filamentos iam aumentando o rasgo mais quente a sala ia ficando, sim, o assassino sentia que dali brotava calor.

Finalmente as chamas começaram a passar pela fenda feita e logo tudo foi envolto num mar de fogo.

Uma coluna brilhante nas cores de amarelo, vermelho e laranja rompeu da casa de Alexandre erguendo-se por quase cinquenta metros de altura tornando tudo em seu raio de alcance, cinzas. Uma linda torre mortal erguida na área residencial da cidade. Finalmente a torre se desfez em poderosas ondas de fogo que se alastraram por dezenas de km não deixando uma pedra sem brasa, nem qualquer um vivo.  


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