Fragile - Sizzy escrita por Teddie


Capítulo 2
Simon




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/738872/chapter/2

 

— Monsieur Lightwood, Monsieur Herondale, minha aula está atrapalhando a conversa dos senhores? — Imogen Herondale, a professora de francês com maior fama de dama de ferro, cruel, sem coração e mais irritada também chamou a atenção e os dois meninos pularam de susto.

Eles se encararam e com apenas um olhar, Simon e Jace sabiam o que o outro queria dizer: na verdade sim, Madame Herondale, estávamos tendo uma conversa muito importante sobre a volta do Panic! At The Disco e sua conjugação verbal está atrapalhando.

Mas Simon Lightwood e Jace Herondale sabiam que seria muito ruim dar uma resposta daquelas para Imogen, que não infernizaria os dois apenas na sala de aula, humilhando-os na frente de todos os colegas de classe, mas também em casa, uma vez que ela era avó de Jace e Simon frequentemente estava na casa dos dois.

— Excusez-moi, madame Herondale — Simon disse em voz baixa, tentando tirar a atenção das pessoas dele.

— É, vó, foi mal — Jace, que era provavelmente o oposto de Simon no quesito de chamar atenção, concordou. Simon deu uma cotovelada no loiro, que fingiu sentir dor.

Imogen bufou, revirando os olhos, e voltou a reproduzir os verbos, instruindo que os alunos os repetissem.

A verdade era que Simon já falava francês, sua mãe – Maryse, ele se corrigiu, ela tinha o proibido de chamá-la de mãe – sempre garantiu que ele tivesse a melhor educação de todas. Então Simon sabia também falar espanhol, várias regras de etiqueta e danças de salão, apesar de se considerar péssimo em tudo.

Seus pais também o consideravam, então qual o problema, não é mesmo?

Jace durante a aula ainda fez umas tentativas de retomar a conversa, porém apenas uma olhada de Imogen fazia o clima esfriar uns mil graus e a vontade de conversar acabar completamente. Simon achava até melhor, Imogen era uma pessoa super legal com ele apesar de tudo que tinha acontecido nos últimos seis meses e ele não queria desrespeitá-la.

Quando o sinal tocou alto, anunciando o fim da aula, todos os alunos recolheram suas coisas e saíram, menos os dois melhores amigos, que ficaram esperando até que pudessem falar com a professora mais a vontade. Simon não negou que ficou mais aliviado pelas pessoas terem saído: tudo ainda estava muito fresco e as pessoas ainda não tinham se acostumado com o fato de que Simon era, bem..., Simon.

Seis meses atrás ele tinha cabelos compridos, seis meses atrás ele ainda usava os uniformes femininos do Instituto Alicante contra sua vontade, seis meses atrás ele ainda tinha uma casa e podia ver seu irmão mais novo. Seis meses atrás ele ainda era visto como Esther.

Simon odiava que ainda o chamassem por esse nome, o que era maioria ali em seu colégio. Depois de todo o incidente com os pais, ele tinha ido até o colégio para informar quem ele realmente era e como ele preferia ser chamado, Simon Lightwood. Era parte do seu direito como cidadão ser tratado do jeito que preferia, no entanto, as pessoas ainda tinham dificuldade de enxergar Simon ali, com isso, frequentemente ele ainda tinha que escutar alguém o chamando de Esther.

Imogen era uma santa nesse quesito e merecia tudo de melhor nesse mundo, Simon, se pudesse, daria o mundo para ela, não só porque ela foi a primeira a aceitar os pronomes masculinos e a tratá-lo como homem, mas porque em momento algum ela foi intolerante, preconceituosa, ou impediu Jace de qualquer contato com ele.

— Como estão as coisas, meu menino? — ela perguntou, passando a mão no rosto de Simon. Sua mão era fria e os dedos tinham calos, mas era estranhamente reconfortante.

— Vão bem, vó Imogen — Simon respondeu. Ele a conhecia desde que se lembrava e não sabia se já tinha a chamado de outra coisa além de avó — George agora lava as cuecas sem ajuda e Jordan parou de cultivar suas plantas na janela de seu quarto. Ele jura que não era maconha, mas vai saber, não é mesmo?

Imogen fez uma cara de repulsa e Jace caiu na risada. Claro que Imogen, como uma boa mulher da alta classe jamais aprovaria que ele andasse com o tipo de pessoa que Simon andava.

— Você sabe que pode voltar para minha casa a hora que bem entender, não é? Pensando bem, você não tem escolha, você volta para casa ainda essa semana. Jace vai adorar dividir o quarto com você de novo.

— Não é bem assim, vovó — Jace comentou — Eu até gosto do Simon, mas eu preciso da minha privacidade. Essa cara não fica linda assim rápido, eu tenho meus rituais.

— Chorar até dormir não é ritual de beleza, seu gótico loiro de farmácia.

— Ei, eu sou loiro natural, seu magrice...

— Meninos — Imogen interrompeu a briga dos dois. — Vocês parecem crianças, francamente.

Simon fez uma careta para Jace, que revirou os olhos, abraçando a avó de lado. Imogen era uma mulher imponente, mas mesmo assim parecia pequena perto de Jace.

— Vó Imogen, muito obrigada, sua hospitalidade foi muito importante para mim, porém eu estou bem agora. Eu tenho um emprego, consigo pagar o aluguel e George e Jordan são ótimas pessoas, de verdade. Não precisa se preocupar comigo.

— Como não me preocupar? Esse mundo não está preparado para pessoas maravilhosas como você, Simon — ela suspirou. — Agora saiam da minha sala, vocês já estão atrasados para a próxima aula. Se me atrapalharem de novo eu mato vocês dois.

Simon e Jace bateram continência e se retiraram da sala. Jace teria aula de Física, enquanto Simon teria Biologia. Naquele ano eles tinham tido poucas aulas juntos, talvez por pedido de todos os professores possíveis. Eles se conheciam desde crianças, já que seus pais eram amigos antes mesmo de os dois nascerem e sempre estudaram juntos, sempre fizeram tudo juntos e não viam um mundo onde ficassem separados.

As pessoas costumavam dizer que Jace e Simon seriam um casal, contudo aquela história caiu por terra quando Jace começou a namorar uma outra menina e Simon se assumiu como transgênero para as pessoas. Era tudo muito engraçado na verdade, porque eles sempre se viram como irmãos, Simon, inclusive, foi a pessoa que convenceu Jace a mandar uma mensagem para a menina ruiva bonitinha que ele tinha conhecido no shopping.

Hoje, Jace e Clary estavam namorando há oito meses. Obrigado, Simon, ele esperava ouvir de Jace, mas sabia que nada além de besteira sairia daquela boca ingrata e apaixonada.

— Você sabe que eu falei brincando, não é? — Jace falou do nada quando eles estavam para virarem em corredores opostos — Você sabe que pode ir para minha casa a hora que quiser, não é?

— Eu sei — Simon sorriu — Mas vamos combinar, eu até que estou me virando bem sozinho, não acha?

— Você sempre se virou. — Jace bagunçou os cabelos do amigo. Um hábito que Jace adquiriu por ser mais alto do que Simon e que ele cultivou por todos esses anos. — Não fuja da sala de aula.

(...)

Simon estava irritado. Mais que irritado, na verdade. Ele estava furioso. Em um ataque de fúria, ele pegou um vaso de plantas que ele tinha comprado para decorar o apartamento e o jogou contra a parede, mas como tanto o vaso quanto as flores eram de plástico, apenas bateu e caiu com um baque surdo, sem danos.

Ótimo, nem seus ataques de raiva davam certo.

Nunca pensou que chegaria ao ponto de sua vida onde diria que tinha ódio dos pais. O relacionamento deles nunca foi fácil, primeiro porque achavam que ele era uma menina lésbica e depois por causa da disforia dele, mas o que seus pais estavam fazendo agora eram maldade pura.

Seu rabino diria algo como “Simon, Deus manda provações de acordo com o que as pessoas conseguem aguentar. É um desafio para seu crescimento”. Simon queria dizer o que ele queria fazer com o crescimento e com as vontades de Deus, e não era nada muito agradável. Deus tinha criado uma provação quase impossível, ter que pertencer àquela família de crápulas manipuladores e insanos.

Ele pegou o papel que seus pais tinham mandado para ele e amassou de qualquer jeito, desejando que aquele fosse o pescoço de Robert e Maryse e jogou perto de George, um de seus companheiros de quarto.

— Isso é muito errado — George disse quando ele desamassou o papel e olhou o conteúdo.

— Isso é mais que errado — Simon bufou, querendo puxar os cabelos curtos — Isso é tortura. Por que esses dois não me deixam em paz? Eles não tem mais gasto nenhum comigo, nem nada. Vó Imogen conseguiu uma bolsa de estudos para mim, eu pago meu aluguel trabalhando como um condenado. Eles já me proibiram de ver Max, eles já me expulsaram de casa, eles já me deram uma surra, George. Por que eles ainda querem me humilhar desse jeito?

Ele se sentou no sofá, derrotado. Simon colocou o rosto entre as mãos, sentindo os olhos queimarem comas lágrimas de ódio. Quando ele fechava os olhos, ele ainda conseguia ver a cara de desgosto e ódio, podia ouvir os gritos de seu pai e de sua mãe, indignados por ele não ser a filha que eles sempre quiseram.

Se você é um homem, vai apanhar como um.

 

— Simon — George tocou em seu joelho cautelosamente e Simon levantou o olhar, encarando-o — Não tem como você falar com Alec? Ele com certeza colocaria um fim nisso.

— Não — Simon fungou — Alec está com Magnus em Los Angeles e não vou atrapalhar meu irmão com essas coisas. Ele com certeza já têm que aturar seus próprios problemas com nossos pais. Duvido que eles permitam que Magnus venha também.

Nesse momento Jordan, o outro companheiro de apartamento de Simon, chegou, jogando-se no sofá. Ele trabalhava como entregador de jornais e entregador de pizza e sempre chegava exausto pela noite.

— Eu estou sentindo uma vibe muito negativa nesse apartamento, George, você foi rejeitado de novo? — Jordan comentou de olhos fechados — Alguma hora você tem que aceitar que nem todo mundo nasceu para achar o amor.

Quando ninguém riu da piada ele abriu um dos olhos e mirou Simon, que ainda tinha os olhos cheios de lágrimas. Ele sentou-se ereto e fechou a cara na mesma hora.

— O que aconteceu? — ele perguntou. George apenas passou o papel amassado para ele — Convidamos Esther Lightwood para a comemoração dos dez anos de Maxwell Lightwood... Que porcaria é essa, Simon?

— Continua lendo, tem mais na parte de trás.

Querida Esther, Max adorará sua presença em sua festa de aniversário, mas como parte do traje esporte fino, é necessário que esteja de vestido. Caso contrário, não será permitida sua entrada na festa. — Jordan se levantou em um pulo — É isso, eu vou matar os dois agora.

— Mas não é você que acredita que a paz é a melhor maneira de resolver tudo? — George passou as mãos nos cachos castanho-claros.

— A paz acabou quando esses dois imbecis começaram a fazer a vida do Simon um inferno. — ele já estava na porta — Você vem ou não, George?

George se levantou para segui-lo, mas Simon parou o amigo no meio do caminho.

— Ninguém vai matar ninguém, é isso que eles querem. Me afetar. Eles sabem que eu faria qualquer coisa para poder ver o Max, inclusive colocar um vestido e me humilhar para o divertimento deles. — Simon suspirou — Vou pensar em alguma coisa.

Jordan estalou os dedos, mas voltou para o sofá, sendo seguido de George. Os dois junto com Jace eram os melhores amigos que ele poderia ter. Ele tinha conhecido Jordan em um templo budista, quando ele estava começando a procurar saber mais sobre espiritualidade e Jordan estava lá meditando.

Quando ele se aproximou, Jordan apenas abriu um olho e comentou “você é uma menina muito confusa”. Simon, que estava entrando em termos com seu gênero, respondeu “sou um menino muito confuso”. Jordan apenas respondeu “sente e medite comigo, menino muito confuso”.

E de repente Jordan foi um dos que mais o apoiou no começo de transição, que emprestou o ombro para Simon chorar quando foi expulso de casa, machucado por dentro e fora, foi ele quem disse que o apartamento dele tinha um quarto vago e convidou Simon para morar com ele.

Já George, Simon não tinha muita certeza de como tinha ido parar em sua vida, ele meio que estava em todo lugar, meio o irmão que ele tinha, mas que estava longe. Ele trabalhava na mesma loja de quadrinhos que Simon, e deu um soco no rosto de um cliente que o descriminou. Hoje George trabalhava em outra livraria, mas desde então ele sempre estava por perto, até ocupar o último quarto do apartamento.

Era bom ter amigos tão bons quanto os três, mesmo que Simon fosse definitivamente o mais esperto deles.

— A festa é em um mês, você sabe, não é? — Jordan perguntou e Simon concordou — Você tem um mês para que eu mate seus pais. Max não vai ficar chateado, não é?

— Provavelmente. Ele é o único filho que ainda tratam bem naquela casa — Simon comentou — Eu tenho um mês para pensar em algo. Vou remoer isso até o dia e surtar sobre uma hora antes. Não se preocupe.

Simon, no entanto, estava preocupado. Ele queria ver Max, ele sentia tanta falta do irmãozinho que sentia que iria explodir a qualquer momento. Ele tinha tentado de várias maneiras entrar em contato com Max, mas seus pais sempre o impediam, então depois de dois meses ele tinha desistido.

Ele era capaz de se humilhar para conseguir ver uma das pessoas que mais amava no mundo?

No fundo, a resposta era muito fácil.

(...)

Simon genuinamente acreditava que tudo na vida acontecia por um motivo. Era algo que ele sempre tinha acreditado e que levaria consigo até morrer. Ele caiu de bicicleta quando tinha uns sete anos e foi bom porque sua perna começou a virar em um ângulo muito esquisito que foi muito popular entre as crianças, tão popular que Jace quebrou o braço no mês seguinte para imitá-lo. Não funcionou.

Ele precisou ouvir que Deus o odiava para descobrir o judaísmo, foi expulso de casa e ganhou amigos e um emprego bom. Ainda não conseguia viver de música, como queria, mas passava um bom tempo com quadrinhos e mangás, que eram suas outras paixões.

Simon bateu os dedos contra a bancada da loja de quadrinhos em que trabalhava, Metrópolis, sentindo o vidro frio contra os dedos. A verdade era que ele estava entediado: a internet era um avanço que fazia com que as pessoas parassem de comprar na loja e passassem a comprar online. Ele sempre tinha gostado de ir à loja de quadrinhos e poder ver as coisas novas, poder conversar e conhecer pessoas. Inclusive ele deu seu primeiro beijo aos quatorze com Julie McClain, uma menina que ele conheceu naquela mesma loja.

Julie McClain deu um pé nele quando Genevieve Kogane deu para ela um boneco do Naruto. Não que Simon não pudesse ter comprado o amor de Julie, mas ele mesmo queria um boneco do Naruto, ele não ia dar um para ninguém.

De qualquer maneira, ele estava entediado porque a loja estava vazia, então ele se distraia mandando mensagens para Jace.

Olá, seu pedaço de lixo.

 

Espero que esteja usando proteção.

 

Clary merece alguém melhor que você.

 

Se um astronauta caga no espaço, o cocô flutua?

 

Simon achava seus comentários muito importantes e relevantes, mesmo que Jace não compartilhasse da mesma opinião. Depois que Jace tinha começado a namorar Clary ele tinha ficado meio idiota. Menos egocêntrico, o que era sempre muito bem vindo, porém tinha meio que se tornado Clarycêntrico, se é que aquilo era possível e uma coisa de verdade. Ele amava o fato de seu melhor amigo estar amando e tudo mais, mas Jace falava sobre Clary como se ela fosse a garota que ele se casaria.

Do jeito que Jace era, Simon não duvidaria que de fato eles se casassem. Jace era a pessoa mais intensa e honesta nos sentimentos que Simon conhecia, ele amava a menina com todo seu coração.

Justamente por isso, Simon se sentia muito mal por nunca ter a conhecido. Antes, ela insistia bastante, mas por Simon ainda não ter se assumido para todas as pessoas – apenas Jace, Jordan e Alec sabiam – ele desconversava e desmarcava. Quando ele finalmente tomou coragem para se apresentar como Simon para ela, ele também tinha tido a brilhante ideia de se assumir para os pais, seis meses atrás e aquilo não tinha terminado bem. Por fim, Clary tinha parado de insistir para conhecê-lo e Jace, que respeitava demais a individualidade de Simon, não tocara mais no assunto.

O telefone dele apitou e o nome de Jace piscou na tela. Simon franziu o cenho quando leu o conteúdo.

Não surte, mas as coisas vão ficar muito esquisitas, cara.

Antes que ele pudesse questionar o que diabos Jace estava falando, outra mensagem veio:

Não, eles têm um compartimento especial, seu idiota.

 

Quando ele estava digitando uma resposta – não para as fezes dos astronautas, e sim para a mensagem esquisita de Jace (ele tinha usado cogumelos de novo? Da ultima vez ele tinha terminado pelado correndo pelas ruas de Nova York), uma ligação o interrompeu. Como ele não falava com ninguém ao telefone há mais ou menos um mês, ele ficou um pouco nervoso e se atrapalhou até conseguir vem quem era. Número desconhecido.

— Alô — ele disse.

Hã, oi. — a voz era doce e meio receosa — Você não me conhece, mas Jace me passou seu número. Sou Isabelle, Isabelle Lewis.

— Olá, Isabelle Lewis — ele brincou, ainda sem saber por que Jace tinha dado o seu número para uma garota. Se fosse mais uma tentativa do loiro para que ele arrumasse uma namorada, ele ficaria muito irritado — Como posso te ajudar?

Isso vai soar muito esquisito, mas temos muito em comum — ela pausou por um instante. Tempo suficiente para Simon pensar que era mesmo tudo uma piada de mau gosto de Jace. — Acha que podemos marcar um encontro? Precisamos mesmo conversar.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

O que acharam?



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Fragile - Sizzy" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.