The 87 Files escrita por LuneHz


Capítulo 4
File 4: Lisianto




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Na manhã do teste da academia, uma doce flor desabrochou próximo aos parterres do nosso jardim de frente, uma flor meiga como um tipo de rosa desengonçada, ela era como uma princesa acordando pela manhã, ainda com a face alva e descabelada. Eu havia avistado o lisianto pela janela do meu quarto, eu o observava enquanto tomava meu chá, pensando como algo tão delicado podia nascer naquele lugar.

Eu precisava me arrumar rápido uma vez que o teste da academia de música não era algo tão simples. Horário exato. Sem erros. Perfeição. Aptidão. Idealização. Afinar o violino e deixar que a melodia flua como a doce flor no jardim. Ouvi dizer que era um sinal de boa sorte. Um sinal de afeto ou uma proposta de eden.

Vesti minha saia azul rendada e fiquei fitando o guarda roupa pensando o que deveria acompanha-la para que tudo ficasse perfeito, cetim, crepe ou viscose, de forma simples e elegante como a harmonia do meu violino precisava ser junto as trombetas e o piano. O piano, doce seria o som do piano que consolaria a melodia do meu violino que antes cordeava solitário, a trombeta, elegante solfejaria para que o violino não se deixe abater por bemol.

Ao abrir a porta me pus a fitar algo desconhecido que me observava em segredo, provavelmente era algo da minha cabeça, assim pensei, ignorei e segui meu caminho, pois neste momento o teste era mais importante que qualquer sensação estranha que eu poderia ter ou qualquer vulto que me observasse. Meu salto parecia fazer ainda mais barulho agora, meu coração pulsava o sangue frio para o restante de meu corpo que esfriava cada vez mais conforme a insegurança crescia, na própria rua da minha residência era possível avistar a parede de mármore acetinado do polo musical do meu distrito e era como ter o sangue misturado a pedras de gelo, foco. A porta da academia era de madeira cabreúva, provavelmente importada de outro país ao julgar pelo seu tom de brasa, possuía entalhes belos do brasão da instituição e ornamentos pelas suas almofadas.

A porta se abriu lentamente ao apertar a campainha, revelando um piso lustroso de madeira nogueira, paredes com roda-meios em granito verde ubatuba com tapeçarias enormes até o teto em seu superior e uma estranha coleção de quartzos abaixo fazendo do ambiente nada agradável, os lustres estavam tão altos que mal iluminavam a tapeçaria, fazendo a parte inferior ao roda-meio um ambiente perturbador a vista. Eu caminhei um passo por vez, assustada, a cada metro o lustre a frente parecia mais baixo até que tocaria minha cabeça, eles de fato estavam mais baixos, mas não tanto, isso acontecia pelo efeito de espelhos e cristais que acompanhavam os lustres.

Ao termino do corredor havia uma porta branca, sem qualquer ornamento ou mesmo uma maçaneta, ela parecia frágil como isopor me tornando pensativa se deveria empurrá-la, aquele lugar era bem mais perturbador do que qualquer um poderia imaginar, pela primeira vez me vi relutando se deveria ou não seguir essa ideia, se eu realmente estava no lugar certo. Toquei a porta suavemente, ela era mais pesada do que deveria, minhas pernas e braços não me obedeciam, eles desejavam apenas tremer e fugir enquanto eu juntava minha última coragem para aquela porta, empurrei com força para que abrisse e nada aconteceu, mesmo me decidindo a voltar, agora eu ouvia o rangido da grande porta de entrada se fechando, lentamente e de forma bem ruidosa.

O medo aos poucos tomava conta de mim. Tentei manter a calma mas a medida que o tempo passava as coisas ficavam mais estranhas, as luzes foram diminuindo até não ser possível enxergar, aos poucos as tabuas do piso estalavam cada vez mais. Tentei procurar por algo no chão ou nas paredes, um botão, sensor ou alavanca, tudo que consegui foram vários cortes graças as pontas dos quartzos e das tabuas, tentei gritar por socorro mas era inútil, a temperatura já estava tão baixa que minha voz não saia.

Já cansada e a ponto de desistir, procurei pelos acordes deu meu violino, esta com certeza era a cena mais cômica da minha vida, eu poderia morrer ali naquela antecâmara e meu melhor pensamento foi pegar o violino e tocar sem ao menos enxerga-lo, corri os dedos lentamente pela sua caixa até sentir a fivela, pude então sentir os frágeis fio e a madeira maciça. Não ouve melodia ou harmonia de meu corpo com o meu instrumento, ouve um ruído horrível enquanto as cordas aranhavam, se rompiam lentamente até seus adeus.

Ao encerramento de meu drama, pude sentir o ambiente recuperando seu calor, aos poucos meus olhos voltavam a enxergar algo que com certeza não era a ante câmera, um doce som vinha do fundo do lugar, o chão ainda era de nogueira e uma cortina com bordados se fechou a minha frente, algumas luzes vinham pelas laterais e causavam um efeito geométrico a minha visão junto a dores de cabeça. Uma voz parecia me chamar longe e apagar partes de minhas lembranças, onde eu estava?

“Apenas isso?”

Comecei a procurar de onde a voz vinha, me deparei com forro de gesso com afresco, com uma grande sanca invertida, a iluminação parecia me puxar e me empurrar na direção das pinturas, os desenhos me lembravam muito as calçadas de Copacabana no Brasil assim como os entalhes em auto relevo pareciam ser dos grandes casarões da França como o Versailles, era a coisa mais desarmoniosa que já havia visto, principalmente pela sua iluminação, que era reflexo da luz direta em uma peça de quartzo escura quase preta.

“Pode ir, já vimos o bastante. ”

Minha atenção lentamente saiu dos afrescos e se depositou a uma bela mulher a minha frente, com uma saia preta extremamente justa, olhos em camurça escura e cabelos lúbricos se movimentando inquietamente pela cintura dela sobre um cinto verde esmeralda. Eu senti meu corpo desfalecer, minha mente se render a insanidade e minhas vontades serem trancafiadas em cofre que nunca mais poderia ser aberto, a diretora da academia estava a minha frente me dizendo para ir embora, eu nem ao menos havia me dado conta que estava no palco, como isso aconteceu?

Desci os degraus para os fundos, já esperando a antecâmara, mas eu me deparei com uma pequena sala, com piso de madeira, paredes brancas e um lustre de cristal ao alto, olhei então para trás, vi o palco, as paredes escuras, um estranho jogo de luz vinha do chão. Minha mente não conseguia entender o que estava acontecendo, olhei então para a porta, branca e na verdade comum, puxei sua maçaneta e novamente surpreendida com o quanto tudo aquilo era normal.

“O que você ainda fa... você está bem!?”

“Vincent!! Vincent!! Chame uma ambulância...!!”


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Notas finais do capítulo

Pessoal! Como eu acabo não colocando os desenhos ou fotos aqui, se alguém tiver curiosidade, eu estou realizando alguns concepts e estou postando no instagram que criei recentemente :) Não uso muito ainda mas logo terei todos os desenhos lá!
@lunehz #Files87



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