Quando durante o sono seu celular começou a tocar insistentemente, Sasuke soube que já era meia-noite do dia vinte e três de julho em algum lugar da Europa. Seu aniversário. Uma parte de si se sentia irritada- era meia-noite. A outra, que falava mais alto, sentia-se feliz até demais por saber quem seria a pessoa do outro lado da linha. Pigarreou duas vezes para ter certeza que a voz sairia serena ao atender o telefone.

“Alô.” Sabia que havia falhado em se conter ao ouvir o riso baixo do outro lado da linha.

“Hey, teme, eu te acordei?” O tom sacana era o suficiente para Sasuke saber que o namorado não estava minimamente arrependido. “É que já é meia-noite aí, e eu queria ser o primeiro a te dar parabéns!”

Sasuke suspirou, mas não escondeu o sorriso largo que nascia em seu rosto. “É, já é meia-noite. Eu estava dormindo, sim, dobe. Você sabe que eu durmo cedo.”

Ouviu um muxoxo do outro lado da linha, o que o fez rir seco. “Foi mal. Mas, ei, parabéns, okay? Eu não vou te dizer tudo agora, então eu vou guardar tudo pra quando eu puder te ver, te abraçar e te beijar, okay? E vê se passa o dia com alguém ao invés de ficar se lamentando por eu estar longe!”

“Não seja tão convencido.” Soltou um riso nasalado. A verdade era que, desde que Naruto anunciara tal viagem para o outro lado do mundo (por que diabos a empresa tinha que o escolher para ser arquiteto em uma obra na Alemanha, em julho?) durante a semana de seu aniversário, Sasuke já havia perdido toda a vontade de comemorar a data. “Eu vou sair com o pessoal de sempre. Tente você não sentir tanto a minha falta.”

Naruto riu alto, e mesmo que tão distante, o som ainda fazia seu peito se aquecer. “Claro, claro. Se divirta, viu? Eu amo você.”

“Hm.” Ainda desacostumado com as declarações espontâneas do outro, Sasuke desligou a chamada. “Eu também, idiota.”

—---

Depois de conseguir dormir quase a manhã toda (já que, depois de falar com Naruto, ele desligara seu celular), Sasuke se levantou decidido à fazer o dia render. Não era de seu feitio estar tão animado antes das uma da tarde, já que geralmente nas manhãs de domingo ele ficava deitado com Naruto até que o estômago de um deles protestasse por comida. Mas estava sozinho, era seu aniversário e não queria passar o dia se lamuriando como se dependesse do namorado para ter um dia bom (mesmo que, em partes, isso fosse verdade).

Ligou o celular e percebeu o whatsapp pipocar com várias mensagens. Passou pela lista de conversas desanimado, respondendo um ou outro ‘parabéns’ de algum parente distante, procurando pelo grupo que usava para falar com os amigos mais próximos.

Como o esperado de Suigetsu, a foto do grupo já havia sido mudada para uma das tantas fotos vergonhosas que o albino tinha do Uchiha. O nome cheio de emoticons de bolo e algumas cobrinhas. Tocou no grupo para que pudesse iniciar a conversa, mas logo foi bombardeado por mensagens.

[8:04 AM, 7/23/2017] Suigetsu: OLHA SÓ QUEM TÁ DIGITANDO

[8:04 AM, 7/23/2017] Suigetsu: FINALMENTE O PUTO ACORDOU

[8:05 AM, 7/23/2017] Suigetsu: PARABÉNS CUZÃO

[8:06 AM, 7/23/2017] Karin: Cacete, para de digitar assim, manda tudo em uma mensagem só, boçal. Ah, Sasuke, parabéns! ♥

[8:06 AM, 7/23/2017] Suigetsu: cara mas vc já acorda pra infernizar né

[8:07 AM, 7/23/2017] Suigetsu: MAS E AÍ SASUKE QUAL A BOA DE HOJE

Massageou as têmporas, nunca acostumado com toda a animação que os amigos tinham logo pela manhã. E, como sempre, já irritado com as discussões sem sentido de Suigetsu e Karin (será que nem em um aplicativo de conversas eles podiam deixar de agir feito crianças?

[8:08 AM, 7/23/2017] Uchiha Sasuke: Obrigado. Nada decidido, ainda. A gente podia sair pra almoçar?

[8:08 AM, 7/23/2017] Suigetsu: uhhh almoço pra mim não dá :/

[8:09 AM, 7/23/2017] Karin: Eu vou estar ocupada, também. Mas assim que estiver livre, eu te dou um toque. Juugo provavelmente ainda não acordou, tenta ligar pra ele.

Suspirou. Não contava com o fato de que talvez os amigos estivessem ocupados, e por isso não pensou em marcar nada com adiantamento. Discou o número do ruivo com uma pequena esperança de encontrar ao menos alguém para lhe fazer companhia durante o almoço, mas a ligação não completava. Dormindo, como Karin havia dito. Olhou novamente para a conversa e viu que Suigetsu e Karin já estavam brigando novamente, e desistiu de dizer qualquer coisa.

Tinha duas opções: Almoçar sozinho ou tentar a sorte com um dos amigos de Naruto. Felizmente, não estava tão desesperado à ponto de decidir pelo segundo, então matou o resto da manhã jogado no sofá assistindo um filme qualquer que passava na TV antes de se arrumar para sair.

Estar sozinho não significava passar o dia miserável. Iria ao menos se presentear com um bom almoço.

—---

Quando estava saindo do restaurante, satisfeito, sentiu o celular vibrar no bolso. Pescou o aparelho e viu o nome de Karin na tela.

“Diga.”

“Então, Sasuke...” Ela parecia falar com certa culpa, e Sasuke sabia que isso significava que ele provavelmente não gostaria do que viria à seguir. “Eu vou ter que cobrir uma colega minha no serviço. Eu tinha trocado com ela esse domingo porque é seu aniversário, mas ela não vai poder ir e meu chefe me chamou. Me desculpa!” Soltou tudo em um só fôlego.

Sentia algo estranho naquela desculpa, mas Sasuke não era uma pessoa de ficar questionando. Encerrou a ligação e entrou em seu carro para retornar ao apartamento vazio. Suigetsu já havia dito que só poderia ir pra lá depois do jantar, já que estava ajudando o irmão. Juugo o enviou um sms dizendo que estava fora da cidade. Sair com os amigos de Naruto era totalmente dispensável, visto que nenhum deles sequer lembrara de o enviar mensagens de felicitações- e Sasuke não era um desesperado por atenção.

Retornou ao apartamento com seu desânimo estampado no rosto. Não sabia o que fazer, e ter sido negado por todos os amigos que considerava próximos o fez desistir da ideia de sair. Ainda havia a noite, e podia matar um pouco do tempo conversando com Naruto. Quem sabe até mesmo o provocar pelo telefone para conseguir algo.

Ah, a ideia parecia agradável. Com um sorriso pequeno, Sasuke se jogou no sofá para que pudesse ligar para o loiro. Sentia o coração batendo forte no peito, como se estivesse à ponto de aprontar algo, e levou o aparelho ao ouvido.

—- Mudo. Tentou outra vez, e ouviu os tons da chamada até que novamente a voz irritante da gravação repetisse que o número estava fora de área. Aquilo era estranho, e fez com que algo apitasse na mente de Sasuke.

Abriu o whatsapp, e viu que a última vez que Naruto estivera online havia sido às 4h da manhã (9h da noite, onde ele estava), o que era estranho, já que a primeira coisa que ele fazia pela manhã era pegar o celular. Olhou para o relógio na tela, que já mostrava 15h42. Não, ele com certeza estaria acordado essa hora. Mandou uma mensagem, tentou ligar novamente e não conseguiu contato.

Amaldiçoou o fato de não ter pedido o número do hotel onde o loiro estava hospedado, e sentiu o estômago revirar. Sabia que deveria controlar aquela ansiedade ou então acabaria arruinando o dia. Tentaria contato mais tarde.

E como se ouvindo suas preces, o telefone tocou. O Uchiha quase derrubou o aparelho ao virá-lo para si, mas novamente sentiu os ânimos se esvairem ao ver o nome do irmão na tela.

“Fala.”

“Oras, mas já de mal-humor, otouto?” A ironia na voz do irmão o deixava ainda mais ansioso. “O que foi, não está tendo um dia bom?”

“Não, Itachi, não estou.” Esfregou a mão no rosto em uma tentativa de se acalmar. “Todos meus amigos estão me evitando e o idiota do Naruto está viajando. Você decidiu não vir pra cá esse ano. O dia ‘tá sendo uma grande bosta.” Sabia que podia contar com o irmão, mas isso não evitava que se sentisse como uma criança emburrada ao falar de seus problemas.

“Ah, então é isso. Me desculpe, você sabe que eu teria ido se soubesse que você ia acabar sozinho.” Algo na voz de Itachi o dizia que o irmão não estava falando a verdade. “Mas ainda é seu aniversário, você deveria sair e fazer algo. Quem sabe o dia não melhore?” Havia um certo quê naquela frase que o fazia pensar que havia algo por trás daquilo tudo.

“Perdi a vontade, Itachi. Acho que vou pedir uma pizza e ficar por aqui mesmo. O idiota nem atende minhas ligações.”

“Talvez ele não tenha sinal agora. Você pode tentar mais tarde.” Novamente, os sinais apitando em sua mente. Itachi nunca dizia nada sem querer, tudo tinha um motivo. A ansiedade voltou, e Sasuke quase não conseguia segurar o celular na mão suada. “Tente não ficar muito triste. É só um dia qualquer.”

Aquilo, vindo do irmão, era quase como um soco na boca do estômago. Claro, Sasuke não era o tipo sentimental. Sempre fazia questão de dizer que aniversário era só mais um dia qualquer. Mas, com tudo dando errado daquela maneira, o que menos precisava era do outro fazendo pouco caso. A mão livre puxava um fio solto na camiseta laranja que usava, e Sasuke suspirou desanimado.

“Tá certo... Só um dia qualquer. Eu vou tentar fazer algo e esperar ele ligar. Tchau, Itachi.”

“Tente não pensar muito. Até logo, otouto.” A ligação se encerrou sem um ‘parabéns’ sequer, e Sasuke jogou o celular na mesa mesinha de vidro no centro da sala.

Seu humor havia virado totalmente, e agora só sentia angústia e ansiedade. Não tentaria mais ligar para Naruto, ele provavelmente retornaria as ligações assim que pudesse (o que deveria ser logo para que Sasuke não entrasse em um estado de paranóia).

A cabeça estava à mil, e os sinais pareciam gritar para o moreno. Será que tudo estava acontecendo de propósito? Tentava encontrar alguma conexão entre as palavras do irmão, a rejeita dos amigos e Naruto estar fora de alcance.

Talvez o loiro quisesse lhe fazer uma surpresa? Naruto era cheio de ideias cafonas e previsíveis, então não seria impossível. Isso só fazia com que seu estômago revirasse em ansiedade novamente. Esfregou as mãos frias na calça jeans escura que usava, e tentava controlar a inquietude.

Era difícil. O apartamento estava silencioso, e isso só fazia com que a voz em sua cabeça ficasse mais alta, disparando todos os tipos de situações. Tentava se focar na melhor possível, mas mesmo assim a sensação ruim não passava.

Se aquilo fosse alguma pegadinha, era melhor que Naruto tivesse em mente uma ótima recompensa por fazê-lo passar o aniversário de péssimo humor.

—---

Depois de falar com Itachi, e mesmo contra todos seus princípios, Sasuke decidiu que ia tentar mais uma vez fazer algo com seu dia. Ainda estava no meio da tarde, não iria se render ao sentimento miserável que se alojava em seu peito. Encarava a tela do iPhone pensando em quem poderia ocupar seu tempo (e, consequentemente, sua mente agitada) e o primeiro nome que piscou foi o de Sakura.

Mordeu o lábio inferior, pensativo, enquanto seu interior se remoía em dúvida. Sakura era, com certeza, a amiga mais próxima de Naruto, e uma das primeiras a aceitar os dois como um casal. A Haruno, que antes nutria um sentimento bobo e infantil - que carregava consigo desde o final do ensino médio - por Sasuke acabou se mostrando uma grande companheira, tendo desistido de ter a atenção do Uchiha para si.

E não que Sasuke desgostasse da presença dela, de maneira alguma. Vez ou outra saíam para conversar, comer algo. Mas Sakura não havia lhe enviado nenhuma mensagem, nem mesmo no facebook ( e ele sabia que o maldito aplicativo avisara que era seu aniversário), e ligar para ela iria o fazer parecer um desesperado por atenção.

Sasuke não era um desesperado por atenção.

Porém, o tic-tac do relógio de parede só o enervava cada vez mais, e Sakura era sua última opção. Soltou a respiração que nem percebera prender, resignado, e tocou no botão verde para iniciar a ligação.

Um toque. Dois toques. Três toques.

Ligação encerrada.

Franziu o cenho, quase desacreditado em seu azar, mas insistiu. Dessa vez, no primeiro toque a ligação fora encerrada. Aquilo o incomodou, e com uma útlima tentativa falha, grunhiu a frustração e jogou o aparelho no sofá, o fazendo quicar e cair virado no chão.

“Maldição!” Praguejou, mas sabia que soava como uma criança irritada.

A cabeça voltava a rodar, os pensamentos voando sem nenhuma conexão, e pôde sentir no fundo que logo ficaria com uma dor de cabeça de tanto pensar e não encontrar nenhum motivo para tudo o que estava acontecendo.

Sasuke decidiu, então, que a melhor maneira de calar sua mente era dormindo. Não tinha vontade de fazer mais nada e agora só esperava que o dia terminasse da melhor maneira possível para compensar todos os desgostos, mas acordou para ver que o celular estava na mesma que antes. Nenhuma ligação perdida, nenhuma mensagem, nenhum amigo disponível e Naruto ainda sem aparecer online durante todo o dia.

O relógio já marcava 21h, os barulhos da cidade já se aquietando por ser um fim de domingo. Sasuke trabalharia na segunda de manhã, não poderia se render ao luxo de esperar muito tempo acordado.

Tentou ligar para Naruto mais uma vez, mas o mesmo ainda se encontrava fora de área.

Foi para o banheiro para tentar se acalmar com uma ducha. A água quente o fazia relaxar, mesmo que apenas fisicamente. Mas tudo parecia fazê-lo pensar que havia algo de muito errado naquele dia. Nem mesmo Sakura, que sempre disputava com Naruto (apenas para irritar o loiro, claro) quem daria parabéns à Sasuke primeiro havia enviado uma mísera mensagem ou respondido às suas ligações.

Esfregou os cabelos com mais força que o necessário, sentindo-se frustrado. Não havia nada o que fazer, nem mesmo fome sentia. Só ansiedade, e aquele sentimento de que algo estava para acontecer. Em primeiro momento, pensou que os amigos pudessem estar planejando alguma surpresa, era a resposta mais óbvia. Mas as horas se passavam e nada acontecia, apenas o vazio como resposta, nada daquilo fazia sentido.

Contrário à sua rotina, decidiu ficar acordado até meia-noite. Era estúpido esperar por algo, mas ainda havia essa pequena esperança. Sasuke se enrolou no cobertor (também) alaranjado, brincando com os fios distraidamente enquanto procurava por algum filme ou série para assistir. Achou um canal que exibia uma maratona de Breaking Bad, e decidiu por isso como passatempo.

Seu olhar se dividia entre a tela e o celular. Em todo comercial, inventava uma desculpa para a própria mente para pegar o aparelho e verificar a conversa com Naruto no whatsapp. Nada mudara durante as três horas que passara assistindo seriado, e quando finalmente o calendário virtual mostrou que já era dia vinte e quatro, decidiu que era hora de dormir.

Sasuke se arrastou para a cama e fez um casulo com a coberta do namorado, o cenho franzido e o olhar fixado em algum ponto qualquer na escuridão do quarto. Havia esperado o dia todo por algo, mesmo não sabendo o quê, e agora se sentia decepcionado. Diria até que chateado, por ter passado um aniversário completamente merda. O pior era que não tinha à quem culpar, não racionalmente, então soltava xingamentos para todos os conhecidos na mente. Estava inquieto demais para dormir, e isso influenciaria no seu humor pela manhã.

Quando sentiu o sono chegar, olhou uma última vez para o celular sem esperança alguma. Nada.

Dormiu irritado, com dor de cabeça, já sabendo que o dia seguinte seria também um fiasco.

—---

Acordou de mal-humor, como era previsto, quando o alarme tocou às 6h da manhã. Engoliu o café da manhã forçado, já que havia pulado o jantar da noite anterior, e decidiu pegar um táxi para o prédio onde trabalhava já que sabia que dirigir com sono e irritado não traria bons resultados.

Passou pelos corredores ignorando todos os ‘bom-dia’ animados que recebia. Kakashi veio ao seu encontro com um sorriso largo por baixo da máscara (outro filho da puta que havia esquecido do seu aniversário, Sasuke se lembraria disso), a provocação evidente pela maneira como encarava.

“Se você vai me enxer o saco, péssimo dia. Escolha algum outro infeliz.”

O sorriso deu lugar para uma sobrancelha erguida. “Achei que você estaria de bom humor hoje, já que ontem foi um dia especial.”

“Ah, então você lembrou, filho da puta.” Várias cabeças se viraram em sua direção, e Sasuke percebeu o deslize quando o supervisor o encarou de maneira séria. “Me desculpe. Não, não tive um dia bom, então agradeceria se pudesse ser deixado em paz.”

Já havia começado o dia com o pé esquerdo, ofendendo seu supervisor. Se não fosse um antigo amigo da família que o conhecia bem, Sasuke provavelmente levaria uma advertência por falar daquela maneira. Ao menos Kakashi parecia de bom humor, e o deixou escapar ileso para que pudesse se isolar em sua sala.

Como previsto, o dia correu de maneira miserável. Recebeu mensagens de Karin, também perguntando como havia sido a noite, o que era suspeito demais. Naruto continuava fora de área, Itachi não o respondia... Sasuke queria se enfiar em algum lugar e ressurgir apenas quando toda essa onda de azar passasse.

No fim do dia, estava cansado, sonolento e irritado. Evitou todas as ligações de amigos que recebera, não querendo saber das desculpas por ter sido esquecido- sim, estava sendo dramático, mas em sua cabeça era compreensível. Chamou outro táxi para voltar ao apartamento para que pudesse dormir, mesmo que o estômago protestasse por comida. Era assim que agia quando tinha um problema que não conseguia solucionar. Dormindo, ao menos, não precisava pensar em tudo o que estava acontecendo.

Quando finalmente abriu a porta de casa, a primeira coisa que percebeu foi o cheiro forte de queimado. A segunda, as malas jogadas pelo hall de entrada.

Sentiu o coração acelerar. Sabia que aquilo só podia significar uma coisa, mas depois de tudo dando errado, não conseguia acreditar. Entrou na cozinha para ver um Naruto de camisa social sentado no chão, o rosto afundado entre as mãos e o forno aberto em sua frente, a fumaça que denunciava que algo havia sido provavelmente carbonizado ali dentro tomando conta do ambiente.

Se aproximou devagar, mas o barulho de seu sapato no assoalho fez com que Naruto levantasse a cabeça assustado, como se não esperasse ninguém ali naquele horário. Quando os olhos azuis se encontraram com os seus, Sasuke percebeu que havia algo errado.

“Ah, você chegou...” O loiro choramingou e, como uma criança, se arrastou pelo chão até que estivesse aos pés de Sasuke, envolvendo os braços fortes em sua perna e afundando o rosto em sua coxa. “Eu estraguei tudo, Sasuke!” A voz era carregada de mágoa, e Sasuke tentava entender o que estava acontecendo.

“Estragou o quê, Naruto?” Deu um puxão de leve em uma mecha loira de cabelo, tentando ter a atenção para si. “O que você ‘tá fazendo aqui? Você não tinha que estar na Alemanha?”

“Eu estraguei tudo!” Mais uma vez ele se lamentou, esfregando o rosto contra a calça social do Uchiha. “Eu só queria fazer uma surpresa, tipo, super foda! Mas eu estraguei, eu sou um idiota, eu sempre estrago tudo!”

Sasuke tentava procurar sentido no que estava sendo dito. Naruto estava ali, mas não parava de choramingar e se esconder, e mesmo que ele tentasse se sentir mal pelo namorado, ainda estava irritado, e isso fazia com que não tivesse tanta paciência (a sua já era anormalmente curta).

“Levanta a cabeça, para de choramingar e me fala o que que você fez.” Soltou rude, e Naruto murmurou algo antes de se levantar do chão, ainda que com um bico no rosto.

Quando estava finalmente em pé, Sasuke teve que se segurar para não se enroscar no abraço morno do namorado. Queria explicações, mas era difícil manter o controle quando podia sentir o cheiro da colônia que Naruto usava, ter o corpo tão perto...

Balançou a cabeça, tentando manter o foco. O loiro suspirou chateado, uma mão indo para o ombro do outro para apertar de leve, o que geralmente fazia para tentar acalmar Sasuke antes de contar algo ruim. E, como de praxe, os músculos do moreno relaxaram em resposta ao toque firme.

“Você com certeza ‘tá puto comigo, mas eu tenho uma explicação.” Ele começou, a mão subindo para o pescoço de Sasuke em um carinho que servia como distração. “Eu consegui terminar  o esboço, então eles disseram que eu podia adiantar minha passagem. Então achei que ia ser perfeito pra te fazer uma surpresa, mas...”

“Mas...?” Tentava não ceder à distração, já que sentia que teria motivos de sobra para se irritar com Naruto.

“Eu meio que não esqueci dessa coisa de diferença do fuso horário. Eu achei que ia chegar aqui antes das dez da noite de ontem, então meio que falei pra todo mundo fingir que esqueceu que era seu aniversário, e não te mandar mensagem, e fingir que não ia poder sair com você, pra eu poder chegar de noite e salvar o dia.”

Sasuke sentiu uma veia pulsar em sua testa. Lá no fundo, sentia que Naruto ao menos tentara, de maneira sincera, o fazer uma surpresa. Mas não podia evitar a chateação com o dia que passara por culpa do loiro.

“E por que você não avisou quando percebeu que ia dar errado, idiota?” Com o tom rispido, Naruto recolheu a mão e encolheu os ombros. Sabia que havia feito uma besteira irreparável, mas o que mais odiava era que Sasuke havia tido provavelmente um aniversário horrível por sua causa.

“Tempo ruim. Todo mundo achou que eu já estaria aqui, então nem te ligaram. Eu não carreguei meu celular na pressa de sair do hotel, e o avião teve que fazer um pouso emergencial em Seul para esperar autorização para voar. Como podia sair à qualquer momento, não consegui descer pra comprar um carregador qualquer. O meu tava na mala.” Coçou a cabeça, um pouco constrangido.

“Então quer dizer que eu passei um dia péssimo por conta de uma série de pequenos esquecimentos seus? Foi esse o seu presente?” Estava frustrado. Conseguia ver o arrependimento sincero nos olhos azuis do namorado, mas não podia evitar de mostrar sua chateação. Naruto costumava ser lerdo, sim, e isso sempre acabava criando uma série de pequenos conflitos entre os dois. Mas essa, provavelmente, havia sido a pior de todas.

“Eu sei, eu fui um idiota.” As mãos se uniram em frente ao rosto do Uzumaki, que abaixou a cabeça em claro pedido de desculpas. “Eu ainda cheguei e pensei em fazer um jantar pra te compensar, mas eu acabei deixando queimar, e... Bem, você chegou.”

Várias coisas passaram pela cabeça do Uchiha. Tanto tinha para dizer, já que agora tinha um culpado pelo dia de bosta que tivera. Mas não conseguia. Tudo morria em sua garganta, em um misto de angústia e alívio. Sentia os olhos queimarem, mas não iria se permitir chorar, não. Isso seria demais para si. Mas eram várias coisas fazendo seu peito pesar, e podia ver que Naruto se sentia verdadeiramente mal.

“Eu só estrago tudo, eu sei disso. Você ‘tá sempre me dizendo pra parar de fazer coisas idiotas, mas às vezes eu me empolgo demais em tentar algo e só faço merda. Me desculpa por fazer isso justo no dia do seu aniversário.”

Sasuke mordeu o lábio inferior, virando a cabeça para evitar olhar para Naruto. Não conseguia dizer nada, não conseguia o culpar quando o via se sentindo verdadeiramente mal. Toda aquela situação era patética, e estava tão focado que não percebeu o choro frustrado. Não foram mais do que duas lágrimas, e ao tentar se conter sentiu que os braços de Naruto estavam ao redor de seu corpo, segurando sua cabeça contra o peito firme.

“Pelo amor de Deus, Sasuke, coloca fogo em mim mas não chora, você sabe que eu não sei o que fazer!” Apertou-o ainda mais contra o peito, já desesperado com a confusão toda que criara.

O moreno, por sua vez, engoliu em seco. “Você é um idiota.” Murmurou, o coração finalmente se acalmando no peito. “Eu não ‘tava chorando.” Soltou, em um suspiro, fechando os olhos com força.

“Eu juro que aceito qualquer punição. Eu faço qualquer coisa pra te recompensar, Sasuke, qualquer coisa pra você não me largar!”

Havia medo na voz de Naruto, e então o moreno percebeu que ele realmente temia a proporção que toda aquela mágoa podia tomar.

Sasuke respirou fundo, tentando deixar de lado todos os sentimentos negativos. Teria tempo para brigar com Naruto por agir sem pensar e acabar fazendo besteira mais tarde. Teria outras oportunidades. Mas depois de passar dois dias chateado e com Naruto também chateado com a situação, não queria deixar tudo aquilo crescer e ficar entre os dois, não desse jeito.

O loiro finalmente estava ali, junto dele, ainda tentando, por mais que houvesse falhado. Ninguém no mundo tentaria tanto por si. Só essa ideia já lhe trazia conforto.

“Eu brigo com você mais tarde.” Sasuke disse depois de alguns minutos em silêncio. “E eu não sei o que vou pedir pra compensar toda essa cagada.” Se afastou um pouco, apenas para que pudesse encarar o namorado. O bico e a careta de chateação ainda estavam presentes, e Sasuke deu um beijo rápido em seu queixo. “Mas a gente pode esquecer isso agora, pedir uma pizza e deitar na cama como se nada tivesse acontecido. Mas só dessa vez, okay? E porque não foi só culpa sua.”

Naruto sentiu-se tomado pelo alívio, relaxando os músculos que nem percebera estar tensionando. Apertou o abraço ao redor do corpo do namorado, depositando vários beijos em seu rosto entre pedidos de desculpas. Aquilo era tudo que Sasuke precisasse para deixar de lado toda a irritação. Terminou com um beijo em seus lábios, um beijo demorado. Passou a língua pelos lábios entreabertos de Sasuke e o beijou com carinho, o que fazia o Uchiha também relaxar no abraço. “Eu amo você.”

Pediram pizza, se enrolaram na coberta laranja, com um Naruto mais do que empenhado em o mimar com todo tipo de carinho. Em qualquer outro dia, Sasuke reclamaria do exagero e do grude. Mas não hoje.

Hoje só queria sentir os beijos, os abraços, o corpo maior de Naruto o abraçando por trás e funcionando como uma coberta extra, quase que todo enrolado em si. Queria sentir a respiração calma em sua nuca enquanto era embalado pelo sono. Era confortante e quentinho, e era o lugar certo para estar.

“Eu também amo você.”

“Feliz aniversário atrasado, Sasuke.” Naruto murmurou sonolento, esfregando a ponta do nariz na nuca do outro. “Eu juro que ano que vem não estrago tudo.”

“Você não estragou tudo.” Disse com ternura incaracterística para si, apertando a mão bronzeada que estava em sua cintura. “Você ‘tá aqui agora. É só isso que me importa.”

O peito de Naruto se aqueceu, e ele abraçou o namorado com mais força. Sasuke não era de muitas palavras, então ouvir aquilo vindo dele fazia seu coração bater como louco. “Eu realmente te amo pra caralho, Sasuke.”