Eu me dirigia calmamente em direção ao nosso cantinho especial. Não possuía nenhuma pressa, acho que a paz finamente entrou em meu coração.

Antes de você minha vida não tinha cor. Tudo não se passava de um grande degradê de cinzas. Ninguém nunca imaginaria que alguém pudesse conhecer tantas tonalidades de uma cor considerada por muitos tão sem graça, porém com o tempo eu aprendi a aprecia-las. O cinza era, de fato, uma cor peculiar.

É a mistura de duas cores neutras, o branco e o preto. Porém, ela não é o meio-termo. Para saber adorar, precisa saber dosar a quantidade, tanto do branco quanto do preto. Cada tonalidade era única, pois foi feita com quantidades diferentes de preto e de branco.

Contudo, com o tempo, aquela cor se tornou monótona para mim. Viver, todos os dias, um eterno cinza, era desgastante. Aí você apareceu na minha vida.

Não sei dizer ao certo o que me levou a olha-lo. Se era como o contraste do preto de seus cabelos com a sua pele branca era harmônico, ou se foi o seu sorriso carinhoso, porém alguma coisa em você me chamou a atenção.

Ah, Jungkook. Você em si já chamava a atenção.

Eu consegui me aproximar. Você sempre foi muito reservado, na sua. Tímido até. Mas mesmo assim percebi que valia a pena correr atrás de você, e foi exatamente isso que fiz.

Todos os dias você voltava a pé da escola. Já eu, pegava um ônibus. Assim que vi que caminhava sozinho, abandonei meu meio de transporte para andar ao seu lado até em casa. Eu demorava meia hora para chegar em casa, mas por você valia a pena.

No início, você me ignorava. Eu ia andando ao seu lado, tagarelando sobre vários assuntos um tanto quanto aleatórios, tenho que admitir, mas valia a pena por estar do seu lado.

Passei um ano nessa rotina, escutando ocasionalmente sua risada - dependendo muito da história que eu contava em meus monólogos. Mesmo depois de um ano, você ainda não tinha decorado o meu nome. Ah, foi difícil te conquistar, sabia?

Finalmente você começou a dialogar comigo, e eu consegui adicionar mais uma cor a minha vida: Azul. Sim Jungkook, você me tirou da vastidão de cinzas em que eu vivia e, ironicamente, a primeira cor que você me mostrou foi o azul. Essa cor se tornou a minha favorita.

Nós começamos como bons amigos - por mais que eu sempre tivesse deixado claro a minha intenção. Foi uns bons meses de amizade, mas eu sempre fui muito ambicioso, eu queria mais. E o melhor, eu consegui.

Nós nos tornamos unha e carne. Eu frequentava a sua casa e você frequentava a minha. Nos falávamos toda hora e sabíamos tudo um do outro. Bom, quase tudo.

Naquela época eu já possuía em minha vida outras cores, como o verde, roxo e até o vermelho já havia conseguido. Minha vida já estava como uma piscina de bolinhas: colorida, mas não continha todas as cores.

Certo dia, eu estava em sua casa. Sua mãe tinha saído junto do seu irmão, nos deixando sozinhos. Eu sempre me perguntava aonde estaria o seu pai. Ele trabalhava até tarde? Por que eu nunca havia o visto?

Resolvi sanar minhas dúvidas, porém a sua resposta me chocou. Ele tinha fugido.

Quando você ainda era um menininho, bem novinho, seu pai arrumou as malas. Você não entendeu nada, mas o ajudou a arrumar. Achava que ele ia em uma viagem a trabalho.

Ele parou na porta, olhando para sua mãe, que apenas disse "Se você for, que nunca mais volte". Sem se mostrar nem um pouco abalado com aquelas palavras, seu pai olhou para seu rosto e perguntou "Você vem?".

Que tipo de pergunta era aquela a se fazer para uma criança?

Havia ficado indeciso, e escolheu olhar para a face de sua mãe. Ela continha olhos rígidos, não fraquejando no olhar. Naquele momento, mesmo sem pensar muito, você escolheu ficar.

Desde então, seu objetivo de vida era encontrar seu pai. Você já continha em sua mente locais possíveis da onde seu pai poderia ter ido, e apenas aguardava ter idade o suficiente para juntar dinheiro e seguir esse rumo.

Obstinado como era, enquanto estava em seu primeiro ano de ensino médio, já havia começado a trabalhar, juntando dinheiro para sua futura viagem. Enquanto eu estudava para os vestibulares, você servia cafés.

Certo dia, você me levou para um lugar. Uma cachoeira, para ser mais específico. Aquele local era lindo. Parecia um pequeno paraíso, apenas nosso.

Ninguém sabia da existência daquele local. Ele era deserto, contendo apenas a nossa presença. E ali eu vi que aquele pequeno lugar, tão único, estava destinado a ser nosso.

Sem pensar, eu o pedi em namoro. Nunca irei me esquecer do quão fofo você ficou quando arregalou os olhinhos, surpreso com a minha ação. Não irei te julgar, até eu me surpreendi.

Depois de poucos segundos de tensão, que mais pareceram horas, você aceitou.

Foi ali que eu completei a minha paleta de cores. Graças a você, Jungkook, eu posso dizer que eu conseguir ter todas as cores em minha vida.

O que antes era só cinza, agora era mais colorido até que o arco-íris. Obviamente eu ainda possuía o cinza, mas não era somente ele. Agora ele se unia com outras cores, formando uma belíssima pintura, extremamente única.

Possivelmente os outros não enxergaram beleza nela, porém nós sabíamos aprecia-la, e era isso que importava.

A partir daquele dia, grande parte dos nossos encontros eram naquele mesmo local, no cantinho tão único e tão nosso.

Apenas para eterniza-lo, resolvemos fazer um clichê dos filmes de romance, escrevendo nossos nomes na árvore, dentro de um coração. Bobo, mas nos fazia feliz.

Com o tempo, eu passei para a faculdade e você se focou nos estudos, ainda não deixando de trabalhar. Quase não tínhamos tempo, mas sempre dávamos um jeito para nos encontrar. Paramos um pouco de frequentar a cachoeira, visto que ficava distante demais para nós, porém sempre lembrávamos dos bons tempos que passamos no nosso cantinho.

Foram os melhores dois anos da minha vida. Mesmo atarefado com a faculdade, eu sempre arranjava algum tempo para o ver.

Foram bons tempos. Graças a você minha vida era colorida e alegre, e eu não tenho palavras para descrever o quão agradecido eu fiquei. É bom poder ver que saí daquela vida, tão monótona, em que eu estava preso.

Entretanto as coisas começaram a mudar. Sua formatura se aproximava e nós não podíamos ficar mais ansiosos para aquilo. Eu pensava que você faria a mesma faculdade que eu, que moraríamos juntos e adotaríamos um peixe, já que nenhum de nós seria responsável o suficiente para deixar um cachorro vivo. Mas até nosso peixe acabaria morrendo, e nós choraríamos e lamentaríamos a nossa perda, porém compraríamos um cacto para suprimir o espaço vazio que ficaria em nossos corações.

Acho que já era meio óbvio que seus planos não eram os mesmos que os meus.

Uma semana após sua formatura. Eu já estava de férias da faculdade e tudo que mais queria era ficar do seu lado. Você me chamou para a cachoeira e eu pensei "Por que não?". Fomos para lá, chegando naquele pedaço de terra tão nosso.

Assim que olhei para aquelas águas, senti como se voltasse ao momento em que o pedi em namoro. Sorrindo, virei-me para você e te beijei, matando toda a saudade que possuía daquela doce e delicada boca.

Assim que nos separamos, você me falou que precisava me contar algo. Eu falei que tudo bem, que ele sempre poderia falar tudo para mim. Eu sempre estaria lá para ele.

Me mostrou um pedaço de papel. De primeira, não entendi o que ele era, mas logo acabei compreendendo. Era uma passagem de avião.

"Você vai viajar?" Perguntei, na minha inocência. Vi seus olhos marejarem, podendo ver um fio de dor atravessar seu rosto.

Assim você me explicou. Você iria procurar o seu pai. Não seria uma viajem, você não iria voltar.

Na hora, eu quis berrar. Rasgar aquela passagem em mil pedacinhos, joga-la na água, mas sabia que eu não podia. Eu não tinha o direito de fazer isso contigo, de escolher um futuro para você, de tomar suas decisões. Então apenas resolvi deixar você ir.

A despedida no aeroporto me marcou. Ver você me dar as costas e partir, levando parte do meu ser contigo, uma parte que nunca seria devolvida. Ali, naquele momento, você levou consigo as minhas cores.

No final, foi até justo. Você me trouxe as cores e as tirou. Porém até o cinza você levou. Me deixou com apenas duas cores, o preto e o azul.

Com o azul eu passava - e ainda passo - os dias. As pessoas me olham e vêem uma aparente tristeza, mas nada muito sério. Contudo, a noite vem trazendo o preto, e é nesse momento que eu deixo meus machucados se externarem.

Não tem uma noite em que eu não olhe para o lado da cama e eu não o imagine ali, junto à mim. Uma dor preenche meu peito, uma mistura de uma facada com algo pegando fogo.

A dor me consome, mas eu sei que não é isso que você deseja para mim, então eu tento continuar a viver. Assim, no momento em que amanhece, eu guardo o preto dentro do meu peito e deixo tudo voltar a ser azul.

Agora, eu já estava próximo a cachoeira. Eu podia avistar o caminho de terra que tanto percorremos juntos.

Estacionei o carro e fui a pé ao local, analisando todo o ambiente ao meu redor. Parecia que aquele lugar ficava perdido no tempo, nunca envelhecendo.

Cheguei, enfim, na cachoeira. Aquele barulho, a pequena tromba d'água, as árvores, tudo ali me fazia sentir uma nostalgia avassaladora. Meu peito aquecia-se com as memórias, mas ao mesmo tempo doía. Acho que eu nunca irei superar a sua partida.

Fui em direção a árvore em que gravamos os nossos nomes. Eles ainda estavam lá, mostrando que tudo aquilo aconteceu de verdade, que não foi ilusão da minha mente.

Ah Jungkook, só queria que você estivesse aqui ao meu lado.

Hoje seria nosso aniversário de namoro. Você ainda se lembra? Eu sempre pensei que passaríamos o resto de nossas vidas juntos, mas você nunca concordou quando eu dizia.

Todas as vezes que eu falava sobre casar, ter uma família, um futuro juntos, você apenas sorria. A verdade sempre esteve na minha cara, mas eu apenas preferi a ignorar.

Graças à esses meus deslizes, agora eu vivo eternamente nesse azul, afogado em memórias de um belo passado que nunca voltaria.

Pois Jungkook, você me trouxe as cores, mas também as tirou.