Capítulo  XXIV                               

Os escritores

 O  casal de idosos percorria as ruelas do pequeno vilarejo durante o dia, batiam em algumas portas e geralmente eram bem recebidos, as pessoas se mostravam receptivas e queriam colaborar. Grande parte dessa acolhida cordial se devia ao fato de que Martha Donatterius, dona da hospedaria, ter dividido com o pessoal as notícias sobre os forasteiros.  Alice havia se encarregado de passar exatamente as informações que poderiam ajudar na missão. Quando os olhinhos miúdos e astutos de Martha caíram sobre o rosto de Alice ela pressentiu o que viria.

—Então você e seu marido estão em viagem de lazer? Conhecendo lugares esquecidos como o nosso, ou tem algum  outro interesse? – a mulher tinha um ar desconfiado que procurava ocultar.

— Na verdade somos escritores, estamos procurando histórias  dignas de serem contadas, soubemos que este lugar é muito antigo, deve haver muitas histórias interessantes...

Os olhos da mulher se enchem de um brilho repentino, a desconfiança  dissipando-se totalmente, uma grande torrente de palavras irrompendo sem freios.

— Há sim, eu sei de muitas, talvez possa lhe contar, temos encontros de senhoras e sempre temos muitos assuntos para conversar. – o assunto pareceu despertar o interesse da mulher. - Eu poderia organizar um sarau. Você e seu marido, é claro que ele pode participar, como escritor, é claro! Eu posso indicar pessoas para as entrevistas, e quem sabe meu nome possa constar nos créditos! Ou agradecimentos, sei lá!

Os olhos  tinham um brilho meio maluco, parecia que a celebridade era um dos sonhos dela, não parava de fazer  sugestões e de dizer o quanto suas amigas ficariam com inveja de ela ter ajudado a escrever um livro, que seria conhecida, e com certeza seria chamada para o lançamento, onde seria mesmo? Talvez em Londres, ela sempre sonhara em ir a Londres.

E como Alice já desconfiara a tagarelice de Martha não tinha fim, foram horas a tomar chá, algumas poucas anotações, que talvez viessem a ajudar nas entrevistas e muito falatório entre as respeitáveis senhoras da redondeza. Elas entremeavam histórias antigas com fofocas atuais e muitas  perguntas sobre o casal de escritores. Alice se mantinha atenta para não dar respostas que levantassem suspeitas das mulheres. Balançou a cabeça tantas vezes, em sinal de entendimento que já começava a sentir dores na nuca.

Com mais barulho do que o necessário Frank adentrou, bateu fortemente os pés no capacho da entrada, tossiu alto e chamou por Alice.

— Boas noites senhoras, posso roubar minha esposa agora? E talvez um pouco desse chá que está com um aroma adorável? 

— Claro que sim, nós já estávamos encerrando a reunião mesmo, vou aquecer o chá e levo ao seu quarto em minutos. A conversa estava tão agradável que não nos damos conta do adiantado da hora. - Martha está decepcionada com o fim do encontro.

Frank não deixou de notar o ar de alívio da esposa, é claro que os outros não percebem, ela lastima muito por ter que  deixar o grupo, suspira longamente e se retira com Frank.

Na manhã seguinte os escritores foram conferir algumas indicações da dona da pansão. Visitaram uma das  moradoras mais antigas do lugar, Lara Desmond, a senhora quase centenária possuía uma memória admirável, quando pronunciaram o sobrenome Dearbon ela imediatamente expressou um semblante de dor. Lembrava muito do desaparecimento de pai e filho, ambos muito queridos pelo povo, sempre juntos, nunca conhecera uma família tão unida. A esposa Lucrecia ficara transtornada com o sumiço dos dois, passara a ser vista  perambulando pela cidade a procura deles, a família viera resgatá-la quando soube, depois disso nunca mais souberam deles. A casa da família estava fechada a anos, era evitada, conhecida como a “Casa Maldita”, ninguém ia lá, acreditavam que poderiam pegar a tal maldição. Alice tomava notas enquanto ela falava. A probabilidade da casa ter sido saqueada diminuía bastante, não poderiam perder tempo, resolveram que mais tarde, nesta noite fariam uma incursão. Deram por encerradas as entrevistas, estava na hora da ação.

 A noite já ia alta quando duas sombras furtivas se aproximaram do antigo casarão. A porta gemeu longamente quando entraram, decidiram se separar para cobrir melhor o lugar, a escuridão obrigou-os a ter mais cuidado, com a luz que emanava das varinhas eles percorreram cada cômodo da velha casa. Alice encontrou o quarto do garoto, chamou por Frank, havia um problema. Logo que entrou no aposento ele percebeuo que era, havia muitas coleções, de bonecos de times, de álbuns de figurinhas, revistas, pedras, troféus de pescaria, retratos, camisas de quadribol, posters de times, moedas antigas e mais uma parafernália de bugigangas sem fim. Eles estavam atordoados, como iriam levar tudo aquilo até o garoto, levariam dias para retirar e transportar todo aquele material sem levantar suspeitas ou serem vistos.

— Pelas barbas de Merlin, como vamos saber qual é o certo? Frank estava com um olhar desanimador, foi quando Alice puxou das vestes a famosa bolsinha de contas de Hermione e abanou sob o olhar atônito dele.

— Vamos lá Frank, me ajude a colocar tudo aqui dentro. Essa Hermione pensa em tudo mesmo!

A princípio Frank não entendeu, mas depois que começaram a encher a bolsa e ela parecer  quase vazia ele se animou e passou a encher com tudo que conseguia colocar nos braços. Após duas horas de trabalho pesado os dois se sentaram por um momento, olhando ao redor para ver se haviam pegado tudo. Ficaram satisfeitos com a “limpeza” e foram saindo da antiga casa com o cuidado de quem faz algo ilegal.Entraram furtivamente na hospedaria silenciosa, subiram ao quarto e se jogaram, literalmente, sobre a cama, estavam exaustos. Logo ao amanhecer eles rumaram para o Instituto.