Blindness escrita por srtaoligreys
O tempo é uma entidade sacana. Em um instante você está encharcada de gim e limão e em outro, está encarando seu ex-namorado que parece ter brotado do chão e a fitava sem censura, pálido como um fantasma.
Merda.
Refez em questão de segundos toda a sua noite e chegou a melhor conclusão sensata que tivera nos últimos anos: jamais aceite a oferta tentadora de seu melhor amigo de ir a um encontro às cegas com um magnata atrasado do ramo de automóveis. As chances de acabar em desastre natural são notórias.
P.s.: sempre desconfie quando um táxi estiver aparentemente à sua espera na saída de um restaurante. Como um daquelas festas de despedida de solteiro em que bolos gigantes escondem uma surpresa, Justin Timberlake pode desabrochar de dentro, como o recheio mais filha da puta e gostoso já existente, para variar.
O taxista os encarava pelo retrovisor imóvel, fazendo uma careta engraçada que deixava escapar incredulidade, afinal, todos os jovens dos anos 90 sabem que ambos já foram tampa e panela um do outro, respectivamente. E, neste caso, o homem não aparentava ter mais de 35 anos.
— O senhor também irá para o mesmo endereço? – pigarreando, o taxista quebra o silêncio tenebroso que pairava no ar, aliás, na falta dele.
— Não! – exclamaram juntos, inconformados com tal possibilidade.
E os olhares se encontraram novamente...
Não pode negar. Um arrepio percorreu sua espinha, causando-lhe inquietação. Precisava sair dali o mais rapidamente possível, onde já se viu?! Contudo, ela não conseguia. Suas pernas pareciam ter chumbo no lugar dos ossos e seus braços haviam congelado lado a lado do pequeno corpo. Aqueles olhos azuis cintilantes a cegava sem escrúpulos e lhe prendia como isca, impossibilitando qualquer ação racional. Há quanto tempo não os admirava de tão perto?
Podia sentir sua respiração descompassada, o coração acelerado quase saindo pela boca. Perguntava-se se ele sentia o mesmo que ela, embora o tempo, esse maldito sacana, tivesse passado sem piedade para ambos e agora, resolveu zombá-la, fazendo-a lamentar o quanto daria tudo para não ter a vida que tem hoje, mesmo que não fosse ao seu lado, qualquer coisa lhe faria mais feliz que retornar para casa e ver que os porta-retratos expostos acima da lareira não condiziam com a realidade de família perfeita que outrora tanto idealizou.
Nota mental: nunca chorar na frente de estranhos, Britney.
Por sorte, o som estridente de uma buzina interrompeu seus devaneios, assustando-a. Uma Ferrari vermelha que estava estacionada logo atrás, cujo dono veio tomar satisfação por tal demora.
A rua em que se localizava o Perch era estreita. Por se tratar de um bairro residencial, os moradores deveriam sofrer com a falta de paciência alheia, que levava bêbados como este a agirem assim:
— Qual é? Que tal serem um pouco mais ágeis? – disse com o tom de voz alterado, após o motorista ter aberto a janela. – A bonequinha está com dúvida? – tragou o cigarro que tinha em mãos, soltando toda a fumaça dentro do carro.
Britney estremeceu. O cara tinha o olho esquerdo roxo. Parecia que havia acabado de sair da final do UFC, além disso, tinha todos os trejeitos de um psicopata, o que não era muito convidativo para todos os ocorridos desastrosos da noite. Era só o que lhe faltava, a cereja do bolo.
— Nós já estamos saindo. – o taxista avisou. – Decidam-se. – falou baixinho para o ex-casal.
— Qualquer coisa eu te levo na minha cobertura e te fodo até o amanhecer. – completou, afastando-se em seguida tranquilamente.
— Ah, eu vou matar esse filha da puta... – em questão de milésimos, ela assistia em câmera lenta Justin Timberlake abrir a porta do carro e ir atrás do cara.
Sem perder tempo, ela o seguiu e conseguiu segurá-lo a tempo de fazer uma besteira. Mas não a tempo de salvar seu salto caríssimo da Gucci que acabou de ser quebrado. Bingo, definitivamente, ela não tem sorte no jogo, muito menos no amor.
O sol nem sempre nasce para todos... Eis a prova viva.
— Você ficou maluco? – esbravejou. – Tudo que eu não preciso é parar na delegacia por sua causa, brutamontes.
— Minha causa? – revirou os olhos, soltando um risinho irônico. – Eu estava te defendendo.
— Não preciso da ajuda de ninguém para me defender.
— Percebe-se. – tossiu, em deboche.
— Ah e pode ficar com o táxi, ele é todo seu.
— Claro que é, cheguei primeiro.
— Pelo que me recordo você costumava ser um cavalheiro com as mulheres.
— Pelo que me recordo, você é uma estranha que eu costumava conhecer.
Ual! Essa doeu em seu âmago
Placar: Britney 0 x 1 Justin.
— As pessoas mudam. – desviou o olhar, sem graça. – Você tem razão.
— Pois é... Cuidado! – segurou-a ao vê-la perder o equilíbrio.
— Obrigada! – soltou-se rapidamente. – A droga do salto quebrou...
— Noite ruim?
— Com certeza. – tirou os sapatos e avistou um táxi chegando. – Acho que já vou indo...
— Tudo bem.
— Ei, só mais uma coisa... – chamou-lhe, fazendo-a virar-se uma última vez. – Se eu fosse você, esconderia essa mancha. Os paparazzi terão uma manchete e tanto amanhã. – apontou para seu vestido, olhando-a dos pés a cabeça.
— Sua preocupação me emociona, Justin Timberlake. De verdade. – forçou um sorriso. – Adeus.
— Adeus, Britney.
“Você é uma estranha que eu costumava conhecer.”, a sua voz repetia-se como uma melodia em sua cabeça. Ela estava abalada como há muito não ficara. E o pior: não foi o tal magnata, o gim com limão ou seu salto quebrado que a deixou assim. Fora ele. O modo como ele a conhecia antes mesmo de se dar conta lhe deixava triste e admitir a verdade por trás de tais palavras só reforçava a ideia que a levou aceitar todos os encontros às cegas que seu melhor amigo Cade arranjava: divórcio.
“Eu preciso me divorciar.”, pensou, “Enquanto há tempo.”.
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