— O que seria de nós se todos os líquidos que ingeríssemos fossem transparentes? — indagou o homem, observando atentamente a taça de champanhe em sua mão direita.

— Não seríamos. — soou uma voz feminina.

Desviou os curiosos olhos verdes da taça em suas mãos para a companhia, buscando em sua mente a última vez em que alguém se fez presente aos seus devaneios.

— Senhor, olhe bem — disse, mostrando-lhe a taça — diga o que vê.

— Vejo que se equivocou quanto à escolha do líquido... Ou seria o recipiente?

— Por mais que o líquido seja translúcido, não pode saber o gosto se não experimentar.

— Um gosto adquirido... — fitou os olhos castanhos de sua companhia, ela o fazia lembrar-se de alguém que há muito morou em sua vida — E quanto ao recipiente?

— O recipiente não interfere no sabor, porém é capaz de ocultar a verdadeira cor do líquido — sorriu e em seguida, bebericou sua taça.

Durante o diálogo travado, buscou alguma profundidade nos olhos dela, mas nada ali fora capaz que remeter à verdadeira profundidade que existia nos castanhos olhos de sua amada Lizzie. O seu habitual semblante despretensioso tornou-se sério.

— Esconder-se atrás de um líquido. Interessante.

— Sinceramente, gostaria de saber qual tipo de líquido sou pra você.

— Água gaseificada. Não é pura como a água, porém translúcida tal qual — sem deboche, prosseguiu — Beber uísque numa taça de champanhe, você é uma mulher corajosa — completou — A interpretação é livre, senhorita. Um sommelier nunca serviria água com gás para acompanhar uma degustação de vinhos — sorveu o champanhe restante em sua taça — Como solicitou, só disse o que vejo.

Conviver com Elizabeth era como citar Sartre¹. Poderia compará-la com a água e sua pureza, enquanto enxergava a si mesmo como um denso vinho. Se servidos separadamente, o gosto permaneceria inalterado, porém juntos, seriam considerados uma mistura intragável.