Animal Soul escrita por Holden
Seus olhos fixaram-se nas ondas abaixo de seus pés. Era um dia frio e uma fina neblina cobria singelamente aquela imensidão de água cristalina. Mas isso não impedia que ela ouvisse o mar chamando seu nome. O peito apertado dentro de si, pesava-lhe a respiração.
Mas a garota sabia que estava pronta.
Os pés descalços sentiam a terra gelada e singelamente úmida, envolver sua pele, como se de alguma maneira, quisessem acalmar seu coração. A brisa estava leve e brincava com seus cabelos curtos e morenos. Um sorriso torto surgiu rapidamente sobre seus lábios. Sabia o que aquilo significava.
— Você não é quem aparenta ser – a voz despreocupada dele surgiu em sua mente, relembrando a última conversa que tiveram alguns dias atrás, dentro de um galpão perdido perto da estrada que seguiam. A chuva estava forte demais para que pudessem continuar.
Ela o olhou fixamente, com os olhos cinzas e pesados que o garoto tanto admirava.
— O que eu sou então? – questionou-lhe rapidamente. Não havia percebido, mas no fundo de sua voz havia um começo de desespero. Como se a resposta daquela pergunta fosse sancionar todas as suas dúvidas.
Ambos se encararam. Estavam perto demais, mas isso não os incomodava mais.
— Você sabe – o moreno deu de ombros, desviando seu olhar daquela garota misteriosa e charmosamente curiosa que havia conhecido alguns meses atrás. Apesar de gostar de seus olhos, não conseguia encará-los por muito tempo. Eram pesados demais.
— Não – respondeu com convicção. Gostaria de ouvi-lo – eu não sei.
— Uma alma animal – ele sorriu de lado, ao responde-la. – Sei disso quando você, sei lá, encara algum pássaro, uma árvore engraçada ou até mesmo o mar. É como se gritasse para eles, entende? Um grito como se quisesse que eles a levassem pra casa... Como se não pertencesse a esse mundo. Você simplesmente não se encaixa aqui. E isso é bom.
— Você acha isso bom? – sua voz cansada, surgiu como um soluço fundo. Ela não choraria ali. Não na sua frente.
— Claro que sim. Sua alma é anos-luz mais evoluída do que as que habitam nosso mundo hoje. Talvez esteja na dimensão errada. É por isso que sente tanta dor. Você não pertence a esse lugar.
— Eu não pertenço a lugar nenhum. E você também não – não era uma pergunta.
Mais uma vez o moreno deu de ombros, aproximando-se e selando seus lábios gélidos nos dela rapidamente.
— Podemos tentar construir nosso mundo juntos – sussurrou próximo ao seu rosto. Ela assentiu.
Mas sempre soube que no fundo isso jamais aconteceria. Nascera condenada. Encoberta por todas as maldições que o mundo lhe oferecera. A única coisa que a salvaria era sua libertação. Todos foram embora, e agora era sua vez.
Notou que uma mariposa cinza e simpática havia repousado entre seu dedo indicador causando-lhe um pouco de cócegas. Estava tudo bem. A menina que cultivava uma alma animal dentro do coração sorriu.
Era hora de voltar para casa.
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