Lone escrita por Eponine


Capítulo 1
Capítulo Único




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Sirius não suporta a solidão.

Ele era obrigado a aceita-la, mas a negava como o demônio foge da cruz. Preferia sentir sua garganta secar e o riso dolorido em seu rosto ao ficar perto dos familiares do que sozinho, em seu quarto. Insistia na companhia de Regulus, não compreendia como ele conseguia ficar tanto tempo em silêncio, lendo seus quadrinhos, observando a rua movimentada, ou quem sabe, descobrindo disco por disco de Bellatrix, ouvindo pacientemente, em silêncio, por quarenta minutos ou mais.

O garoto sente incomodo, coceira, era como um viciado em abstinência, era ridículo, era a porta se fechar a noite que Sirius sentia um desespero digno do choro. O silêncio era a pior parte... O silêncio vinha, silenciosamente, rastejando-se pelo quarto escuro e passava a mão em sua testa, despertando seus pensamentos.

“Minha família me odeia...”, pensava Sirius observando a Lua. “Eu vou ter que conviver com eles pelo resto da minha vida...”

Fechava os olhos com força, suando frio. Sentava-se na cama e em um pulo já abrira a porta, pronto para atazanar seus pais, suas primas, seu irmão, seja quem fosse, ele precisava ouvir algum barulho. Às vezes descia e simplesmente se sentava no último degrau, com um desespero dolorido em seu peito, tentando acalmar sua respiração ao observar Kreacher arrumar a casa, resmungando, tentando convencer Sirius a voltar para a cama.

Puxava assunto com Narcissa, a ouvia falar sobre produtos de beleza, mesmo não tendo o menor interesse. Escutava a conversa de Bella com seus amigos no topo da escada, encostando seu nariz pontudo no corrimão. Implorava para sua mãe lhe contar toda a história dos Black, pois sabia que ela se empolgaria e ocuparia metade de sua tarde.

Mas a noite ainda assim viria, e o desespero lhe consumiria...

James não tinha problemas com silêncio, pois ele era quase inexistente.

O tempo inteiro ele estava falando, fosse com sua elfa doméstica, Kitty, seus pais, seus tios, seus avós, seus colegas de sua rua, seus amigos no curso de Quadribol, os outros amigos do Acampamento Bruxo de Verão, James nunca calava a boca e aquilo o deixava tão cansado que a noite ele só tinha tempo para fechar os olhos e abrir a boca novamente para roncar.

Quando o silêncio aparecia, James normalmente tinha dúvidas, ou simplesmente repensava coisas que dissera, sentindo-se um pouco mais, pensando em como talvez devesse regrar suas palavras às vezes... Olhava ao seu redor e seu silêncio causava espanto nas pessoas:

Estaria doente? Cansado? James, está tudo bem?

Claro que está, mas às vezes, normalmente quando seus pais iam ao médico, ele precisava de um tempo em silêncio. Refletir sobre a vida, sobre ele, sobre os pais.

O garoto costumava calcular exatamente o que faria após a morte dos pais. O que faria, que documentos deveria procurar, quem ia cuidar dele, seria maior de idade ou menor de idade? Deveria ir à justiça por algum bem de seus pais? O que ele pode fazer para fazer seu pai entender que os remédios não salvariam seu problema cardíaco se ele não colaborasse seguindo uma dieta com exercícios diários?

Continua no telhado de sua casa, observando sua rua familiar, quente, única, tendo explosões em seu próprio cérebro e se auto acalmando. Ninguém pode acalmá-lo melhor que ele mesmo, pois ninguém o conhece tão bem.

Apenas ele mesmo.

Peter, entretanto fugia da solidão sempre que possível.

Em Hogwarts, ele não se surpreendeu quando ficou os primeiros meses dançando de grupo em grupo, quase isolado. Ele não compreendia muito bem como aquelas coisas aconteciam com ele: Quando chegara no Castelo, não sentia necessidade de fazer amizades, era tudo tão novo e brilhante que ele queria adaptar-se primeiro, explorar... Mas quando virou-se para os lados, os grupos estavam feitos e ele estava sozinho.

As aulas mudavam de sala e ele era o último a saber, não tinha nenhum colega para avisá-lo. As provas se alteravam de datas e por vezes ele perdia, sempre o último... Morria de ódio em ter que fazer amizades baseadas em interesse, para não ficar para trás nas aulas, principalmente as de grupo. Até gostava das pessoas, mas ninguém parecia lhe dar passagem, ninguém parecia disposto a conhece-lo e ele odiava a sensação de que talvez estivesse forçando a amizade.

Então fazia sua politica da boa vizinhança e se recolhia, passeando pelos corredores barulhentos em silêncio, ocupando-se na biblioteca, tentando estudar, ou lendo seus quadrinhos na Sala Comunal, ouvindo a barulheira dos outros grupos de amigos. Tinha um punhado de pessoas para acenar, mas nem sempre eles acenavam para ele.

A solidão, um amigo que Peter já conhecia, apesar de não gostar muito dele. Não tinha irmãos, seus pais, super protetores, sua família pequena demais para haver grandes encontros festivos... Ele estava acostumado a se auto entreter, mas seu peito chegava a acelerar com a possibilidade de companhia, seja qual fosse estava bom, ele aceitava, por mais que fosse ruins às vezes... Estava tão acostumado a ser sozinho que qualquer um lhe servia, mas, sem notar, acabava afastando as pessoas que tentavam se aproximar.

Sentia que segurava areia com a mão frouxa.

Remus, ao contrário de Peter, afastava a todos propositalmente ou não.

Era automático, ele sequer pensava, cortava qualquer conversa que talvez pudesse se expandir, acenava para os conhecidos, mas apenas de longe, evitando que eles puxassem assunto, selecionava muito bem aqueles que ele podia se aproximar para conversar sobre algo especifico e nada mais. Ele fora quase que adestrado para a solidão, e a abraçava como parte de si, sentindo tontura a qualquer contato com o mundo.

Ele começava a sentir todos os sintomas ao contato: Ansiedade, pensamentos acelerados, raiva, dúvida, estresse... Não, ele não precisava daquilo. Já tinha amigos o suficiente e às vezes até pensava em se livrar deles, principalmente quando James decidia passar a madrugada inteira falando sem parar. Odiava Sirius com todas as suas forças, o incentivando, jamais reprimindo a voz de James, pelo contrário.

No começo, Remus detestava Sirius. Ele tinha a mania de sempre estar conhecendo gente nova, sempre acenando, sempre em grupos, em bandos. Demorou para ele notar que apesar de estar em grupos, diferente de James, extremamente carismático, Sirius permanecia em silêncio, ou apenas ouvindo.

Era como alguém que ligava a TV a noite, quando ia dormir, apenas para não se sentir sozinho.

Quando ele pulava de relacionamento para relacionamento, completamente apavorado com a ideia de ficar uma semana sozinho, Remus sentia nojo e compadecimento. Não entendi a carência de Sirius, não entendia a lógica dele em precisar se submeter a relacionamentos que provavelmente não o levariam a lugar algum apenas para ter um: mal acabara um namoro e já estava com outra, era sempre assim.

E a um toque, Remus se esquiva brutalmente, sentindo-se frágil e virgem, despreparado. Seus amores ele cultiva apenas de longe, em seus sonhos, no âmbito platônico, intelectual, jamais carnal, jamais real... Ele espera pacientemente o ser iluminado que irá descer do céu, pronto para compreendê-lo e aceita-lo como é e juntos terão um relacionamento perfeito baseado apenas em amor e compatibilidade, mas nunca veio, porque não existe.

Então ele abriu a porta para algumas garotas, e sempre fechava pouco depois, decepcionado: nem mesmo selecionando a dedo, de décadas em décadas, ele obtinha sucesso.

E a solidão dava um passo de cada vez em sua direção. Olha ao seu redor, para seus queridos amigos, rindo de algo que Remus contou sobre seu encontro fracassado.

“Estamos todos sozinhos, mesmo juntos”, pensou.

 

 

Chelsea Wolfe - Lone

 


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Notas finais do capítulo

Sartre disse uma vez que caso você se sinta entediado quando está sozinho, é porque não está em boa companhia. Já a Clarice (Lispector), ama a solidão, como sua igual:

“Faça com que a solidão não me destrua.
Faça com que minha solidão me sirva de companhia.
Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar.
Faça com que eu saiba ficar com o nada
E mesmo assim me sentir
Como se estivesse plena de tudo.”

O Tarkovsky é um diretor que sempre aborda solidão em seus filmes, e ele também acha que é questionável quem não gosta de se sentir só. E veja, até a a Lucy de Charlie Brown diz: O único momento em que não me sinto sozinha, é quando estou comigo mesma.

Eu sempre amei e valorizei minha solidão, entretanto, chega um momento em que sempre que você cede entrada para outras pessoas na sua vida, você não sabe lidar com isso, não sabe realmente ceder e acaba caindo naquele limbo onde você abre todas as passagens ou nenhuma, ficando vulnerável ou completamente fechada, e ambos estados são perigosos... Enfim, eu detesto filosofia porque eu nunca entendo direito, sempre que reflito soa como loucura, mas espero que tenham gostado.



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