Blind Date escrita por IsabelaThorntonDarcyMellark


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal!

Quem acompanha minha outra fic em andamento (A Redenção do Tordo) já leu minhas desculpas pela demora em atualizar e o mesmo vale para essa aqui.

Realmente, tem sido bem difícil escrever, mas aos pouquinhos (bem aos pouquinhos mesmo!), os capítulos vão ficando prontos.

Mas não é por isso que eu deixo de ter vários planos para essa fic! Posso estar sem tempo para escrever, mas a caixola fica trabalhando dia e noite com ideias mirabolantes.

Agradeço a paciência e também a todos os que me enviam mensagens carinhosas nos comentários e por outros meios!

Quero mandar um beijo especial para a Naty MellarkLi, que recomendou a fic com todo o carinho!

Este capítulo traz uma singela homenagem ao meu marido!
❤❤❤❤❤❤❤❤❤❤

Ao capítulo!



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— Garoto com o pão? Era assim que você se lembrava de mim? – Peeta indaga, divertindo-se.

— Sim – confirmo acanhada.

— Bom saber! – exclama ele e me guia pela beira-mar.

Nós deixamos a praia em direção ao Bar Mockingjay, carregando nossos calçados, com os pés sujos de areia e com sorrisos gigantescos.

Percorro os olhos pela fachada. Finnick deve ter entrado novamente, depois de nos chamar, pois não o vejo em parte alguma.

Eu e Peeta lançamos nossos calçados ao chão para tirarmos o excesso de areia dos pés e, assim, colocá-los novamente, servindo de apoio um para o outro.

Eu me inclino ligeiramente para calçar minhas sandálias, rindo de como eu e Peeta parecemos desajeitados nessa situação inusitada.

Enquanto me concentro na tarefa de sustentar meu peso nele para me equilibrar em um pé só, usando salto alto, sou surpreendida com a figura intimidante de Marvel parada à minha frente.

— Você já esteve em melhores companhias, Mellark! – Ele cruza os braços e torce a boca cinicamente, enquanto me avalia com ar esnobe.

Peeta se põe de pé à minha frente, ficando entre mim e Marvel.

— Eu concordo. Por isso mesmo, vou guardar distância de companhias como a sua – retruca Peeta, com raiva contida. — A propósito, a impressão que tenho é de que você queria estar em meu lugar.

— Ah, sim, estou morrendo de inveja de ter uma aproveitadora no meu pé, muito interessada no que tenho nas minhas calças. E não estou me referindo a nenhuma parte da anatomia masculina, mas a um cartão de crédito sem limites – desdenha Marvel, mais uma vez me analisando da cabeça aos pés.

Observo que os músculos de Peeta ficam imediatamente tensos. Encosto minha mão em seu ombro gentilmente para acalmar seus nervos. Ele olha para o ponto onde eu o toco, depois para o meu rosto, e começa a se recompor.

— Não vale a pena – afirmo e ele assente com a cabeça, virando-se para mim. — Está tudo bem, Peeta.

— Não, não está bem. Você não tinha que passar por isso. – Seus olhos se desviam para onde Marvel está agora, a alguns metros de nós, o som de sua risada sarcástica diminuindo conforme ele se distancia. — Eu queria que essa noite fosse perfeita.

— Ele sempre me tratou assim. Não seria diferente hoje, nessa noite, que continua sendo perfeita.

Ele ouve minhas palavras e seus olhos se acendem, mas sorri fracamente.

— Agora entendo melhor seu receio ao me ver junto dele e de Glimmer. Eu nunca fui alvo dessas hostilidades.

Peeta corre o dedo por meu rosto, com a expressão ainda um pouco triste, e segura minha mão de modo ainda mais firme para me conduzir de volta ao interior do bar.

Nesse momento, Delly e Thom cruzam a porta para irem embora. O olhar de Delly pousa em nossas mãos entrelaçadas e ela sorri.

— Olhem só os vitoriosos! – sussurra ela com sua voz rouca e, em seguida, abraça Peeta com carinho.

— Vocês mereceram vencer. – Thom estende a mão para me cumprimentar e, depois, repete o gesto ao parabenizar Peeta.

— Pelo visto, Peeta tem muito o que comemorar essa noite – diz Delly quando me abraça em seguida. — E não é porque ele é meu amigo, mas pode ter certeza de que você também tem muitos motivos. Cuida bem dele, Katniss.

— Não se preocupe, Delly.

— Agora vocês devem ir, pois estão sendo aguardados para a premiação – avisa Thom.

Eu e Peeta nos entreolhamos e ele ergue os ombros ao questionar:

— O que será que isso significa?

A resposta vem logo a seguir, quando Annie nos avista e nos faz subir no palco. Lá está Cinna, que segura duas coroas de papel na mão. Ele se aproxima e encaixa uma delas em minha cabeça e outra na de Peeta, enquanto Caesar anuncia nossa presença no tablado.

— Eu estava certo sobre apostar em você. – Cinna sorri ao ajeitar o enfeite sobre meus cabelos uma última vez. — O palco estará sempre à sua disposição, em noite de karaokê ou não. Será sempre um prazer ouvi-la cantar, como era um prazer ouvir o seu pai.

Eu agradeço a ele, sentindo minha face se aquecer, e Cinna se dirige a Peeta para fazer a mesma oferta.

— Aliás, vocês poderiam cantar agora – propõe o dono do bar.

— Um dueto? – pergunto e Cinna aprova com um gesto.

— Posso escolher a música? – questiona Peeta.

Tão logo aquiesço, ele pede o violão emprestado mais uma vez e se instala diante do pedestal com o microfone.

— A dupla de vitoriosos vai nos brindar com mais uma apresentação! – Caesar comemora com a multidão. — Com vocês, Katniss Everdeen e Peeta Mellark.

Os aplausos iniciais se intensificam, quando Peeta dedilha a introdução da música "I won't give up", do cantor Jason Mraz.

When I look into your eyes

It's like watching the night sky

Or a beautiful sunrise

There's so much they hold

(Quando olho em seus olhos

É como observar o céu de noite

Ou um belo amanhecer

Eles carregam tanta coisa)

 

Peeta canta os primeiros versos olhando nos meus olhos e seu olhar é tudo em que posso me focar.

Estou em dúvida se vou conseguir lembrar a letra da canção, quando ele ergue as sobrancelhas, sinalizando que é a minha vez de assumir o vocal. A adrenalina percorre minhas veias e me impulsiona a entoar:

And just like them old stars

I see that you've come so far

To be right where you are

How old is your soul?

(E como as estrelas antigas

Vejo que você evoluiu muito

Para estar bem aonde está

Qual a idade da sua alma?)

 

Nossas vozes, então, unem-se de forma harmoniosa, como se tivéssemos ensaiado essa apresentação inúmeras vezes antes.

I won't give up on us

Even if the skies get rough

I'm giving you all my love

I'm still looking up

(Não desistirei de nós

Mesmo que os céus fiquem violentos

Estou lhe dando todo meu amor

Ainda olho para cima)

And when you're needing your space

To do some navigating

I'll be here patiently waiting

To see what you find

(E quando precisar de seu espaço

Para navegar um pouco

Esperarei pacientemente

Para ver o que você descobrirá)

 

Mais uma vez, Peeta permite que eu vocalize a canção sozinha. Ele se concentra nas cordas do violão e dou alguns passos em sua direção, roubando novamente sua atenção.

Cause even the stars, they burn

Some even fall to the earth

We got a lot to learn

God knows we're worth it

No I won't give up

(Porque até as estrelas queimam

Algumas também caem sobre a terra

Temos muito a aprender

Deus sabe que somos dignos

Não, eu não desistirei)

 

Abandono o microfone que seguro, para dividir com ele o que está usando. A partir desse ponto, cantamos juntos o restante da música e poucos centímetros nos separam um do outro.

I don't wanna be someone who walks away so easily

I'm here to stay and make the difference that I can make

Our differences they do a lot to teach us how to use

The tools and gifts we've got yeah we got a lot at stake

And in the end, you're still my friend

At least we didn't intend

For us to work we didn't break, we didn't burn

We had to learn how to bend without the world caving in

I had to learn what I've got, and what I'm not

And who I am

(Não quero ser alguém que vai embora facilmente

Estou aqui para ficar e fazer a diferença que posso fazer

Nossas diferenças, elas fazem muito nos ensinando a usar

As ferramentas e os dons que temos, sim, há muito em jogo

E no fim, você ainda é minha amiga

Pelo menos não tivemos a intenção

Para funcionarmos, não quebramos, não queimamos

Tivemos de aprender a ceder sem ceder à pressão do mundo

Tive que aprender o que tenho e o que não sou

E quem sou)

I won't give up on us

Even if the skies get rough

I'm giving you all my love

I'm still looking up

I'm still looking up

(Não desistirei de nós

Mesmo que os céus fiquem violentos

Estou lhe dando todo meu amor

Ainda olho para cima

Ainda olho para cima)

I won't give up on us

God knows I'm tough, he knows

We got a lot to learn

God knows we're worth it

(Não desistirei de nós

Deus sabe que sou forte, ele sabe

Temos muito a aprender

Deus sabe que somos dignos)

I won't give up on us

Even if the skies get rough

I'm giving you all my love

I'm still looking up

(Não desistirei de nós

Mesmo que os céus fiquem violentos

Estou lhe dando todo meu amor

Ainda olho para cima)

 

Durante os acordes finais, percebo meu sorriso largo e meus olhos lacrimejantes. Não é a primeira vez nesta noite que meu estômago guarda uma revoada de borboletas ou que meu coração parece querer sair do meu peito de tanta excitação.

Eu não fazia ideia de que havia resquícios de uma adolescente romântica dentro de mim. Ninguém nunca me fez sentir assim.

Depois de agradecermos os aplausos com uma ligeira reverência, Peeta beija o topo da minha cabeça.

Quando desço do palco, Annie me recebe com palmas e uma novidade:

— Acredita que eu, a pessoa mais desafinada do mundo, acabei de ser convidada por Plutarch Heavensbee para participar de um reality show musical? Finnick está ali conversando com ele.

Antes que eu possa tecer qualquer comentário a respeito dessa insanidade, Plutarch se materializa à minha frente e me convida para dançar. O som agora está sendo comandado por um DJ.

Olho para trás em busca do socorro de Peeta, porém, nesse instante, Cinna inicia um diálogo animado com ele, elogiando nossa performance juntos.

Plutarch sonda alguns fatos da minha vida pessoal e minhas respostas são todas evasivas. Com o fim da música se aproximando, ele reproduz o convite feito à Annie para o teste em um programa de televisão.

Depois da minha terceira negativa, a música para de tocar e eu faço menção de me afastar. O famoso produtor musical segura minha mão na sua. Tento puxá-la educadamente, mas ele a prende, preparando-se para insistir.

— Eu garanto uma carreira sólida, Katniss, e...

Peeta se aproxima rapidamente e põe a mão em meu ombro. Plutarch acompanha os movimentos dele com um ar intrigado.

— Afinal, vocês são amigos? Namorados?

— Bem... Nós estamos... – hesito em afirmar qualquer coisa, pois não sei mesmo o que dizer.

— Ela é minha namorada – decreta Peeta sem titubear.

Seu tom seguro me surpreende e eu o fito por sobre o ombro, e nossos olhares se cruzam.

Ser anunciada como namorada dele é demais para os níveis de açúcar do meu sangue.

Não posso evitar uma expressão de surpresa e incredulidade, que talvez tenha sido interpretada como algo negativo, pois Peeta não sustenta o meu olhar e parece subitamente arrependido.

— Então, temos dois casais de talento aqui. – Plutarch faz sinal para Annie e Finnick, que estão bem próximos.

Eles literalmente colidem conosco, morrendo de rir, com suas respectivas coroas de papel já quase caindo de suas cabeças. Com certeza, Annie ainda está sob o efeito das cervejas distribuídas por Peter.

— Katniss, vamos ser cantoras profissionais! Vamos fazer uma dupla... Anniss.

— Estão vendo? São muitas possibilidades! – Plutarch se anima diante da proposta insensata de Annie.

— Agradeço a oferta, mas eu não me enquadro em nenhuma dessas possibilidades – recuso imediatamente.

— Ah, Katniss! Vai me dizer que você não quer passar dia e noite escutando Annie cantar no seu ouvido? – debocha Finnick.

— Humm. Não. Mas, considerando o pedido de casamento, você quer, não é, Finn? – revido e ele dá risada, erguendo os ombros.

— E se for alguém especial, que canta divinamente bem... Tão bem que até incentivou você a subir no palco? Duas vezes! – Annie me instiga, repetindo o que eu disse no palco sobre Peeta.

Ela olha de mim para ele, com um sorriso maroto.

— Katniss não precisa assinar nenhum contrato para me ouvir cantar mais vezes. Só pra ela – desconversa Peeta, sussurrando a última frase em meu ouvido.

— Não precisam me responder agora. Amadureçam a ideia e fiquem à vontade para me procurar – propõe Plutarch, que nos entrega seu cartão e se retira em seguida.

Sem pedir licença, Annie me carrega para o banheiro feminino com ela, ziguezagueando por entre mesas e frequentadores do bar.

— Vamos, Katniss! Pode me contar tudo sobre o melhor encontro às cegas de todos os tempos, planejado pela sua amiga favorita no mundo inteiro! – grita ela de dentro da cabine, onde acaba de entrar correndo.

— Ann, aqui não é o lugar — resmungo depois que algumas meninas saem do banheiro, cochichando umas com as outras e me avaliando de soslaio.

Ela ri e cantarola a música que eu e Peeta cantamos no palco, mais fora do tom do que o normal. Não tenho escapatória a não ser rir também.

Ao abrir a porta do compartimento, Annie me encara com um pouco mais de seriedade.

— Você pode não querer me contar nada agora, mas você já parece diferente.

Arrisco uma olhadinha no espelho e, honestamente, não reconheço de imediato a pessoa ali refletida.

Meu cabelo modelado por Prim, os olhos delineados, as bochechas rosadas. E, o que é mais impressionante, um ar confiante e feliz, que não estava ali na última vez que me olhei nesse mesmo espelho.

— E não pense que passou despercebida a frase: "Ela é minha namorada." – Annie encara meus olhos arregalados no espelho.

— Ann, o que eu faço? Eu e ele não conversamos a respeito.

— Katniss, você não tem que ficar complicando nada! Deixa as coisas acontecerem naturalmente.

— É fácil falar, mas você sabe como eu sou, quais são meus planos... E quais não são.

— Ah, já sei! Aquela velha história de que seu futuro não envolve marido ou filhos. – Ela revira os olhos. — Olha pra sua imagem no espelho. O que você vê?

— Alguém que não sou eu...?

— Eu vejo uma amiga linda e interessante, que precisa deixar de ser tão encanada e simplesmente se jogar! E acho que, por enquanto, é isso o que Peeta quer encontrar, não necessariamente uma esposa ou uma mãe para seus filhos.

Reflito sobre suas palavras e é óbvio que ela tem razão, mas sei que é algo difícil de eu colocar em prática.

Ao reencontrarmos os rapazes, eles já haviam pago as despesas. Assim, recolhemos todos os nossos pertences e seguimos até a saída do Bar Mockingjay, fazendo nosso caminho para o calçadão.

— Você quer ir à praia de novo, Katniss? Ou prefere ir a algum restaurante? – pergunta Peeta ansioso. — Ou talvez...

— Calma, Mellark. Uma coisa de cada vez – interrompe Finnick.

— Eu só não quero que essa noite termine – murmura Peeta, encabulado.

— Eu entendo, cara. – Finnick bate algumas vezes no ombro de Peeta. — Já estive em seu lugar.

Annie segura o meu braço e se aproxima para segredar algo em meu ouvido.

— Acho que, se estivéssemos em Las Vegas, Peeta levaria você para uma capela e se casariam hoje mesmo. — Annie pensa que está sendo discreta, mas fala tão alto que os rapazes escutam e riem.

Peeta fica com o rosto corado.

— E eu e você estaríamos na fila atrás deles, baby. – Finnick pega a mão de Annie adornada com a aliança de noivado e a beija. — Não foi à toa que coloquei esse anel aqui.

— Já sei o que podemos fazer! Vamos dar uma volta na roda-gigante do Pacific Park? – Annie sugere.

— Não! – Peeta exclama, com um leve toque de pânico na voz.

Todos olham em sua direção e, então, ele sente que precisa explicar sua reação:

— Nós não temos ingressos. É por isso.

— Aí é que você se engana. Eu tinha um plano B para o pedido de casamento. Então... – Finnick alcança algo em seu bolso e nos mostra. — Entradas para todos!

Eu e Annie vibramos, animadas com a ideia.

— Está certo, então. Vamos para a roda-gigante – concorda Peeta, mais resignado do que entusiasmado.

Agarro-me ao seu braço e ele me dá uma piscadela. Annie e Finnick estão à nossa frente, em um estupor de felicidade. Os dois vão comprar algodão-doce, enquanto eu e Peeta paramos para tomar sorvete.

Eu imediatamente me sinto um pouco culpada por estar aqui sem Prim. Ela adoraria esse tipo de programação.

— Minha irmã gostaria de fazer esse passeio. Eu preciso me lembrar de cada detalhe, para compartilhar com Prim mais tarde, quando ela me encher de perguntas.

— Se quiser, podemos guardar os convites para vocês irem juntas – oferece Peeta.

Suas palavras são sublinhadas por uma inquietação que não sei explicar de onde surgiu, mas não tenho tempo de investigar mais, pois Finnick e Annie se reúnem a nós.

— Ei, Peeta, você já inflou bastante o ego da Katniss, mas ela não é um balão de gás que vai sair flutuando por aí. Pode soltar a mão dela de vez em quando. – Finnick repara.

Peeta não afrouxa o aperto em minha mão. Ao contrário, leva nossas mãos entrelaçadas ao seu peito.

— Não quero correr o risco! – declara ele, sorrindo pra mim.

Em seguida, atravessamos toda a extensão do parque, costurando nosso caminho pela multidão, e nos juntamos à fila da roda-gigante. Enquanto aguardamos, é uma boa oportunidade para conversarmos, bem como para tentar descobrir o motivo de Peeta estar cada vez mais apreensivo.

— Então, Mellark, estou perdoado por não mostrar nenhuma foto da Katniss a você antes de hoje à noite? – indaga Finnick.

— Já vou adiantando, Peeta. Ela é uma ótima companheira na vida real, mas se recusa a ser minha amiga no Facebook – reclama Annie.

— Bem, vocês conhecem meu ponto de vista sobre isso. Até o Peeta já sabe – aviso.

— Quer dizer que você já fez o seu discurso sobre ser uma declarada pária de mídias sociais? – Finnick zomba.

— Sim, ela fez. Quando eu disse que esperava me deparar com alguém como ela no encontro de hoje, Katniss acusou você de postar uma foto dela em suas redes sociopatas – Peeta me entrega, enfatizando as últimas palavras.

Estreito o olhar na direção dele, que ergue os ombros, achando mais graça ainda do comentário impensado que deixei escapar minutos depois de conhecê-lo. Ao menos, Peeta volta a ficar menos tenso.

— Fazendo acusações levianas, Everdeen? Enquanto estou apenas pensando na sua felicidade! – Finnick finge indignação.

— Katniss apenas me confirmou o que eu já suspeitava. Afinal, minhas pesquisas por ela pela Internet não deram muito resultado. – Peeta para por um instante e observa nossos rostos espantados. – E, por favor, não se assustem, imaginando que sou um stalker obcecado. Foram apenas umas 7412 buscas mal sucedidas!

— Ah, sim! Se foram só essas vezes, está tranquilo... Quem nunca? – Annie dispara e esbarra em mim propositadamente com seu ombro.

Um sorriso bobo insiste em permanecer em meu rosto, diante do fato de Peeta não hesitar em confessar que pensava em mim, mesmo estando longe, mesmo depois de tanto tempo.

De repente, Annie e Finnick são os primeiros da fila e caminham até os assentos que ficam disponíveis.

A cabine circular em forma de cesta, coberta com um guarda-sol, comporta mais de duas pessoas. O funcionário espera que eu e Peeta entremos com eles, mas Finnick gesticula em negativa.

— Eles vão na próxima! Um pouco de privacidade, por favor! – graceja ele com o rapaz.

Enquanto eles tomam seus lugares e aguardam o movimento ascendente da roda-gigante, Peeta gentilmente coloca as mãos na minha cintura. Ele está ligeiramente trêmulo e me desloca para que eu fique de pé diretamente na frente dele, nossos corpos muito próximos. Ele se posiciona com o claro intuito de bloquear a visão de seu rosto dos olhares de nossos amigos.

— Preciso perguntar uma coisa – sussurra ele em meu ouvido, enquanto meu coração bate forte e minha pele formiga. — Você não está com medo de andar nisso?

Ufa. Ainda não é a grande pergunta que está me atormentando desde que a palavra "namorada" saiu de sua boca.

— Não. Por quê? Você está? – pergunto também em voz baixa.

— Estou apenas atualizando minha planilha sobre você. – Ele beija minha testa, mudando de assunto.

Falando assim em voz baixa, de alguma forma, surge a confiança para perguntar mais do que eu teria feito normalmente.

— Que dados você já tem na sua planilha sobre mim?

— Eu sei o suficiente para querer estar aqui com você, apesar de... — Peeta interrompe o que está dizendo e tenta sorrir.

Depois, engole em seco e respira fundo, parecendo cada vez mais desconfortável. A frase incompleta dele fica pairando no ar, fazendo meu peito se apertar.

Apesar de quê?

Na sequência, sua testa franzida transforma-se numa expressão de decisão, quando ele se prepara para ingressar na cabine da roda-gigante.

Calado, Peeta entra comigo. Eu me sento no lado oposto, porém ele não se acomoda perto de mim, jogando seu corpo no primeiro espaço disponível que encontra.

Quando começamos a subir, há uma discreta sacudida e Peeta agarra a base do assento com tanta força, que as dobras dos seus dedos ficam brancas.

Depois, a roda-gigante para novamente. Ele olha para algum ponto fixo na direção dos pés, parecendo indisposto a qualquer conversa.

Encolho os ombros e fico quieta, enquanto a cabine se move para cima novamente, chiando em suas engrenagens.

— Eu fiz ou falei algo errado? – Não me contenho depois de um longo silêncio. — Só quero entender o motivo de agir assim. Foi por ter dito que gostaria que Prim estivesse aqui? Quando falei sobre minha irmã, não quis dizer que não queria estar aqui com você.

Nenhuma resposta. Olho para o outro lado. Por minha visão periférica, posso ver que a mandíbula dele está apertada e os dedos estão cada vez mais pálidos de tanto apertar a extremidade do banco.

— Não vomite, por favor, não vomite... Você consegue.

Essas são as palavras murmuradas de Peeta depois do meu desabafo.

— O quê? – indago ao perceber que ele tenta soltar as mãos por um instante, mas desiste. — Você está bem?

Peeta assente, mas logo depois balança a cabeça lateralmente. Fica claro que não está nada bem.

— Eu sempre passo mal nesses brinquedos – explica ele num fio de voz, sobressaltando-se quando outro solavanco inicia o giro de subida de novo. — Só de pensar em olhar a paisagem já tenho vertigens.

— Por que você não disse nada?

Ele aperta os olhos e os mantém fechados, enquanto ainda fazemos o suave movimento para cima. Quando os abre de novo, em mais uma parada para desembarque e embarque de pessoas, Peeta parece nauseado.

— Estou preocupada, Peeta. Você devia ter falado.

— Eu queria ao menos tentar... Aprecie a vista por mim. Eu vou sobreviver – tartamudeia, sacudindo a cabeça. — No final das contas, essa vai se tornar uma história engraçada. Ou bizarra. Depende dos efeitos colaterais... Estou obrigando o conteúdo do meu estômago a permanecer onde está.

— Você sabe mesmo ser romântico.

Ele ri e, mesmo cabisbaixo, seu sorriso ilumina suas feições e me faz sorrir mais amplamente também.

Nesse instante, sou extraída de meus pensamentos quando Finnick assobia ruidosamente acima de nós e grita:

— Annie, você aceita mesmo se casar comigo?

— Sim! Minha resposta sempre será sim! – Annie berra de volta.

Então, ambos começam a cantar novamente a música "Marry you" com toda empolgação. Peeta, ao menos, parece mais relaxado.

— Você não consegue mesmo dar uma espiadinha ao redor? – pergunto, finalmente. — O visual é bem impressionante.

— Eu gostaria, mas é demais pra mim – responde Peeta, encarando as articulações esbranquecidas dos dedos.

— Será que ajuda se eu me aproximar? Ou é melhor ficar aqui onde estou?

— Pode se aproximar, com certeza.

Eu me desloco cautelosamente e, ainda assim, provoco algumas oscilações na cabine antes de chegar ao lado dele.

— Sem mais trepidações, por favor! – Peeta implora, mantendo o bom humor, apesar de tudo.

Nós dois rimos com a minha falta de jeito. Eu coloco a mão sobre a dele e Peeta a agarra com força. Eu me surpreendo com o gesto e em como seus dedos estão frios nesse contato pele a pele. Ele está ofegante.

À medida que nos aproximamos do ponto mais alto, não me conformo com o fato de Peeta não estar vendo a paisagem também.

— Vamos lá, Peeta, já que estamos aqui em cima... Se você se aventurar a olhar em volta, ganha um beijo. – Eu o encorajo. — Confie em mimContamos até três?

Aos poucos, sua respiração vai se estabilizando. Afago seu rosto, esperando um sinal de aprovação para a minha oferta.

— Até três – confirma ele.

Entrelaçamos nossos dedos, apertando a mão um do outro, e começamos a contar em uníssono:

— Um. DoisTrês!

Peeta ergue o rosto e abre seus olhos azuis. Ele me fita de modo intenso, depois percorre os olhos rapidamente pela paisagem, voltando a pousá-los em mim.

Meu estômago revira e Peeta cobra a minha promessa, tomando minha boca com a sua, seus dedos deslizando em minhas costas.

— Estou lisonjeada pelo fato de você arriscar tanto por um beijo.

— Apenas dei continuidade ao meu romantismo, na verdade.

A descida se inicia e ele aperta meus ombros, escondendo seu rosto em meu pescoço.

— Por quanto tempo isso ainda vai rodar? - resmunga ele. —  Por uma eternidade, eu sei.

Nós permanecemos abraçados, agora com nossas testas unidas.

— Katniss, sobre o que eu disse a respeito de você ser minha namorada, minha intenção era livrar você das mãos daquele produtor musical.

— Então, você não queria dizer aquilo – afirmo, fitando o horizonte.

— Não é isso. Eu apenas acho que essa é uma decisão que não cabe a mim tomar sozinho. Então, preciso perguntar... Katniss, você quer ser minha namorada?

Eu foco minha atenção no reflexo da lua nas águas do mar. A imagem está turva em razão da agitação das ondas.

Já me sinto arrependida em relação às palavras que sei que sairão da minha boca, apesar dos conselhos de Annie. Espero somente que elas não arruínem o que quer que esteja se iniciando aqui.

Peeta entorta a cabeça e examina meu rosto.

— Peeta, não sei como dizer isso. Provavelmente, não é o momento certo, mas preciso ser honesta com você. – Eu respiro fundo. — Bem... Apesar de não ser mais uma adolescente, eu nunca vivi nada parecido com um namoro de verdade. Meu único namorado foi o Gale. Um namoro à distância, que não deveria ter durado tanto, mas era sempre um bom argumento para evitar que outros rapazes se aproximassem, pois eu nunca... Nunca pensei em me casar ou em ter filhos.

Ele olha para mim com a testa franzida.

— Puxa... Eu fiz um pedido de namoro e você já está se recusando a casar comigo? Que grande fora que levei agora. – Peeta ri sem humor, coçando a nuca, um gesto que acaba de entrar pra minha lista das coisas adoráveis que ele faz.

— Ai, desculpa! Não sou nada boa com as palavras. Isso não foi um fora. Não mesmo. – Eu balanço a cabeça para dar ênfase ao que estou falando, mas, apesar de ser a verdade, meus olhos não conseguem encontrar os dele. — Apenas quero que, depois de me ouvir, você ponha de um lado da balança o que acabei de confessar e, do outro lado, as suas próprias expectativas num relacionamento.

Não posso evitar ser eu mesma enquanto estou perto de Peeta.

Na verdade, sei que não é somente isso. O fato é que eu quero ser eu mesma com ele.

— Gosto da sua franqueza. Eu realmente não esperava ouvir isso, mas o que disse não me assusta – admite ele com determinação. — Katniss, estou falando sério. Eu gostaria de ver você de novo.

Eu me afasto ligeiramente, evidenciando o desconforto característico das situações em que não sei como agir.

Pela primeira vez na minha vida adulta, anseio não ter tantas responsabilidades, nem tanto receio de minha mãe desmoronar novamente. Ela está melhor agora, mas qual a garantia de que, de uma hora pra outra, não nos abandonará em um outro isolamento?

Daqui a dois dias, teremos uma prova de fogo. O aniversário da morte do meu pai.

Se tudo fosse diferente, talvez eu me abrisse à possibilidade de me comprometer com alguém e talvez formar uma família estivesse nos meus planos.

Por uns instantes, imagino como seria se minha vontade de iniciar esse vínculo com Peeta fosse a única coisa que importasse.

— Preciso de um tempo para pensar sobre isso.

— Está bem. Dois minutos são suficientes?

Tenho que rir de sua persistência.

— Eu quero um tempo também. Um tempo pra conversar com você, aprender tudo sobre você. Vamos marcar um cinema? – Peeta convida esperançosamente.

— Em geral, cinema não é lugar para conversas – brinco.

Peeta ergue as sobrancelhas e eu coro diante da possibilidade de ele ter entendido o que acabei de falar como uma insinuação para outras formas de curtir o escurinho do cinema.

— Não seja por isso. Podemos conversar bastante num jantar em seu restaurante preferido.

— Peeta, eu trabalho muito na escola, também dou aulas particulares. E tenho que cuidar de Prim, da casa e...

— Não vou aceitar um não como resposta. – interrompe ele. — O que devo fazer para convencê-la a passar algum tempo comigo? Contratar suas aulas de reforço em matemática? – Seu tom é brincalhão, mas seu semblante parece sério e expectante.

— Eu não sei, talvez eu aceite um convite acompanhado de uma fornada de pães de queijo.

— Isso não é um não.

— Eu não disse sim! – retruco depois dele.

— Ainda. Pra mim, já é um bom começo.

— Peeta, você acabou de chegar aqui na Califórnia. Como pode saber que quer assumir esse compromisso?

— Você não faz ideia mesmo do efeito que causa. – Ele leva algumas mechas do meu cabelo para trás das minhas orelhas. — Especialmente. Em. Mim. – Suas últimas palavras são pontuadas por beijos.

A roda-gigante começa a dar algumas voltas sem interrupções, depois de renovar todos os seus passageiros. Peeta fecha os olhos quando a velocidade da rotação aumenta.

— Ei, você está bem? O que foi? – indago, preocupada com sua palidez.

— Sim, tudo bem, só um pouco tonto. – Ele abre os olhos, claramente enjoado.

— Você está resistindo bravamente.

— Não sei por quanto tempo... Por isso, vou repetir a pergunta, antes que seja tarde demais. – Peeta segura meu queixo gentilmente e me faz encará-lo. — Katniss, você quer ser minha namorada?

Até mesmo meus sentidos aguçados para as armadilhas das conquistas e minha desconfiança permanente não me fazem ficar com o pé atrás com ele.

— Eu preciso saber o que você quer – digo decidida.

— Com você, eu quero tudo – Peeta afirma, mais decidido ainda.

Seu olhar é tão cheio de sinceridade. Sua voz não vacila para me dizer coisas que, se qualquer outra pessoa me dissesse, eu relutaria em acreditar.

Seus dedos se enveredam por meus cabelos e ele aproxima seu rosto do meu, esperando angustiado por uma resposta minha.

— Eu quero tudo, Katniss.

— Eu também quero.

No segundo seguinte, Peeta cobre meus lábios com os dele. Seu beijo é determinado e repleto de promessas. Sua intensidade incendeia meu corpo.

Corro os dedos pelo contorno do seu rosto e por sua nuca. Ele inicia uma série de carícias suaves, afagando meu pescoço e meus braços. Ele desce as mãos pela curva da minha cintura e seus dedos me apertam com carinho.

Minha reação imediata é colocar a minha mão sobre a sua. Peeta interrompe o beijo e inclina-se para trás.

— Entendi. Tudo, mas com calma. – Para minha surpresa, em vez de ficar zangado, ele ri. — Ok, podemos ir com calma. Então, lembre-se... Sem gracinhas, Srta. Everdeen.

Seus olhos se desviam para minha outra mão, que está apoiada em sua perna, como se estivesse me avisando que também estou passando dos limites, assim como fiz ao segurar sua mão.

Eu abro um sorriso para ele e sei que vai ficar tudo bem. Eu não estraguei tudo com o meu discurso afasta-pretendentes e ele parece me entender como ninguém.

No fim das voltas da roda-gigante, aquela eternidade que Peeta mencionou ainda foi pouco. Espantosamente, colocamos nossos pés no chão de novo, sem maiores incidentes.

Para completar o cenário, uma chuva leve salpica gotículas sobre nós.

— Não posso acreditar que acabei de andar nisso. – Peeta olha para trás, em direção à roda-gigante, e depois vira-se para mim. — Aliás, posso acreditar sim.

Ele gentilmente apoia a mão no meu pescoço e depois se inclina para me beijar levemente nos lábios.

A chuva no parque se intensifica e não encontramos Annie e Finnick em parte alguma. Eles certamente buscaram um local para se abrigar. Nós também não temos nada para nos proteger, a não ser nossos casacos, que vestimos depressa.

— Você fica adorável assim. – Ele puxa meu capuz para cobrir minha cabeça e eu protesto, mas aprecio imensamente as provocações carinhosas.

Tanto que faço o mesmo com ele, protegendo seus cachos loiros da chuva.

Peeta pega o telefone do bolso, limpa as gotas que caem sobre ele com a barra da camisa e liga para Finnick, mas ele não atende.

Pelo visor do celular dele, vejo que já está tarde e me preocupo com o fato de Prim e Rue estarem sozinhas em casa, apesar de elas terem garantido que ficariam bem.

— Já está na hora de voltar pra casa. Hoje é noite de plantão no hospital e minha mãe só retorna amanhã à tarde.

O rosto de Peeta despenca, mas ele disfarça, oferecendo-me o braço.

— Não quer deixar sua irmã sozinha, não é? – questiona ele. — Você deve amá-la muito.

Eu concordo silenciosamente e penso comigo mesma nos sacrifícios que fiz e sempre faria por ela.

— Primrose e eu somos o oposto uma da outra, mas ela é o que tenho de mais precioso no mundo.

— Sua família sempre pareceu ser muito unida. Eu me lembro de seu pai indo à padaria... Com você. Ele estava sempre animado, cantarolando – recorda ele, usando todo o tato para mencionar algo tão delicado.

Eu nunca me senti preparada para me abrir sobre meu pai com ninguém. Várias pessoas já tentaram, mas eu guardo esse sofrimento pungente só pra mim. Ao menos, eu guardei até hoje.

Estamos andando lado a lado e não posso ver o rosto de Peeta. Eu me viro para ele por alguns segundos e seus olhos ternos são como duas janelas até seu coração, ávido por me oferecer carinho e consolo. Isso me incentiva a revelar:

— Sinto tanto a falta dele. É um tipo estranho de saudade, como a sensação de que há um vazio que nunca será preenchido...

Peeta assente, mas não comenta nada, permitindo que eu prossiga:

— Ele é uma parte de mim que sempre estará faltando.

— Eu sinto muito, Katniss.

Ele não acrescenta nada mais, porém repousa sua mão na minha, transmitindo conforto e segurança. 

Fazemos o restante do percurso até o estacionamento coberto em silêncio. Sou eu que o quebro, quando Peeta destranca a porta de um Land Rover branco, novo em folha.

Se esse carro atravessar as fronteiras da Costura, em pouquíssimo tempo, o nome de Peeta e o meu estarão em diversos tópicos de fofoca.

— Eu estava pensando em pegar um táxi, Peeta. Não quero fazer você ir até o outro lado da cidade.

Ele olha pra mim e se esforça para não usar uma expressão de pura indignação.

Tenho a sensação engraçada de que ele está prestes a ralhar comigo.

— Nem pensar. Vou levar minha namorada em casa.

Minhas bochechas ficam quentes com seu comentário. Nós olhamos um para o outro por uma fração de segundos e, então, ele deixa cair seu olhar.

— Você já está arrependida?

— Claro que não. – Entro no carro para provar minha resposta e Peeta corre para assumir seu posto ao volante. — Eu sou sua namorada – anuncio, quando ele se acomoda.

— Sério?

— Sim. Mas vou avisando que sou uma pessoa difícil.

— E eu sou um cara persistente e, acho importante frisar... Paciente.

Meu telefone toca e quem está chamando é Annie.

— Oi, Ann! A chuva nos dispersou!

— Estamos na fila da montanha russa. Por que vocês não vêmJá parou de chover.

— Só um minuto. – Toco a tela do celular para colocá-lo no viva-voz. — Pode repetir, por favor?

A som metálico da voz de Annie se sobressai ao burburinho de pessoas e música eletrônica ao redor dela.

— Vocês dois, na montanha russa, agora! – exige.

Peeta joga a cabeça no encosto do banco, murmurando para si mesmo:

— Tudo menos isso.

— Nós já estamos indo embora, Ann – comunico.

— Ah, não! Está cedo – retruca ela.

— Divirta-se com seu noivo! Apenas tente não vomitar – advirto e olho de esguelha para Peeta, que sufoca uma risada. — Não confio nos efeitos do álcool em seu organismo combinado com as subidas e descidas da montanha russa.

— Ela está em boas mãos, Everdeen. – Agora é a voz de Finnick que ouvimos e ele se defende prontamente. — Até porque ela já colocou tudo para fora quando saímos da roda-gigante.

— Ela está bem? – indago.

— Melhor que nunca. Já está pronta pra outra aventura.

— Então, Annie passando mal vai ficar como uma ótima lembrança do dia do noivado!

— Na alegria e na tristeza, na saúde e na doença – declara Finnick.

— Amiga! – Annie volta a falar ao telefone. – Seja gentil com o Peeta, porque ele ama muuuuuuito você. E você precisa de...

— Annie! – Eu rapidamente a corto e tiro o celular do viva-voz, enquanto Peeta sorri, balançando a cabeça. — Nós nos falamos depois. Beijo!

Guardo o aparelho na bolsa e não ouso erguer meus olhos. Peeta conecta nossas mãos, antes de ligar o carro.

— Ela não tem noção do que está dizendo – murmuro.

— Eu queria saber do que você está precisando – afirma ele, num suspiro. — Sábia Annie.

No trajeto até a Costura, Peeta não perde a oportunidade de colocar sua mão sobre a minha e de entrelaçar nossos dedos. Num momento em que ele precisa soltá-los para segurar o volante, estico o braço para acariciar seus cabelos.

— Carinho bom – agradece ele.

Meus dedos passeiam por seus cachos loiros até que nos aproximamos da Costura.

— Você pode me deixar aqui – indico um ponto da calçada onde ele pode parar.

— Ah! Eu pensei que você morasse mais adiante. – Peeta reduz a velocidade do carro e sinaliza que vai estacionar. — Qual é a casa?

— Moro mesmo em outro quarteirão, mas não precisa me deixar lá... Eu vou ficar bem.

— Você realmente pensou que eu a deixaria aqui?

Pronto. Acabo de magoá-lo de verdade.

Ele estende a mão para ligar o carro novamente, porém eu seguro seu braço.

— Eu realmente posso cuidar de mim mesma.

— Tenho certeza de que pode – balbucia ele sem olhar para mim. — Você já me disse isso mais cedo e deve ter repetido essa frase pra si mesma muitas vezes durante toda a sua vida. Mas não é disso que se trata.

— E do que é que se trata?

— Às vezes, é bom deixar que alguém cuide de você também. – Ele respira fundo e passa os dedos pelos cabelos. — Permitir isso não é sinal de fraqueza.

Tento reverter o jeito contrariado dele com um pouco de humor.

— Peeta, entenda. Se eu chegar lá com você, algumas pessoas da vizinhança já vão investigar quem você é e, quando descobrirem que é o filho do padeiro, automaticamente vão espalhar por aí que estou querendo obter pão de graça.

A expressão dele se suaviza ligeiramente.

— E não é isso mesmo o que você quer, mocinha? Não foi você quem pediu uma fornada de pães de queijo?

— Bem lembrado. O vizinhos não estariam fazendo fofoca, mas apenas falando a verdade, não é?

— Se for para eles deixarem você em paz, eu forneço pão de graça pra todo mundo! – Peeta volta a olhar pra mim, com um ar mais tranquilo em seu rosto.

— Não é que eu me importe com o que as outras pessoas vão pensar. Apenas não quero que surjam comentários maldosos que cheguem aos ouvidos de Prim ou da minha mãe – pontuo defensivamente. — Você presenciou as insinuações que Marvel fez quando saímos da praia.

— Eu nunca desejaria que aquilo acontecesse de novo, mas o erro de pensar assim e de dizer tais coisas é dessas pessoas, não é seu... Posso seguir em frente agora?

— Pensando bem, é uma boa ideia deixar você cuidar de mim.

Peeta sorri de lado e dá partida no veículo mais uma vez.

Continuamos o caminho em silêncio e o carro entra nos limites da rua onde moro. É patente o contraste do aspecto da Costura com todos os lugares bonitos e bem cuidados que visitamos essa noite.

Mesmo com as luzes das residências apagadas, é possível ver alguns vultos atrás dos vidros das janelas, talvez tentando decifrar para onde vai esse carro tão fora dos padrões dos que circulam por aqui.

Nós chegamos à minha casa, o sobrado simples, cercado pelo muro baixo feito de tijolos vermelhos.

— Então, é aqui onde eu moro – aponto, esperando que ele não julgue tão duramente.

— Legal. Eu gosto das prímulas debaixo das janelas – elogia Peeta.

Tento encontrar sarcasmo ou ironia em sua voz, mas não há nada disso.

— Obrigada por vir até aqui.

— Foi um prazer trazê-la em casa – diz Peeta, ao angular o corpo para ficar de frente para mim.

Eu abstraio o fato de que podemos estar sob a mira de olhares curiosos e envolvo meus braços ao redor de seu pescoço. Toco meus lábios nos dele de modo suave, desejando ardentemente que esse beijo fosse eterno e que pudesse nos manter aqui, apenas juntos, entrelaçados um no outro.

Pouco depois, nós nos separamos e nos entreolhamos, sem palavras durante alguns segundos, antes de Peeta sorrir e beijar a ponta do meu nariz.

— Você está pronta para entrar?

Cada partícula do meu ser silenciosamente grita que não.

— Sim.

— Eu realmente não queria que essa noite acabasse – admite ele.

Noto que seu sorriso não alcança seus olhos.

— Foi uma noite incrível e, como disse a Annie, o melhor encontro às cegas de todos os tempos – reconheço.

Abro a porta do carro e saio antes que eu desista de vez de fazer isso. Aceno para ele ao passar em frente ao carro e suspiro, preparando-me para vê-lo partir.

No entanto, assim que destravo o trinco do portão, sinto as mãos de Peeta agarrando meus ombros. Ele me gira e me beija profundamente.

— Beijo roubado no portão de casa... Parece que temos treze anos – graceja ele, enquanto recupero o fôlego, trazendo-o para dentro do quintal. — Katniss, posso ver você amanhã? Posso ver você depois de amanhã? Posso ver você constantemente?

Nesse momento, o terrível gato de Prim chega de volta de suas caçadas noturnas e começa a se esfregar nas pernas de Peeta.

— E quem é esse?

— Buttercup, o gato da minha irmã. Ele não vai muito com a minha cara.

— E por quê? Ele parece bonzinho. — Peeta constata ao passar os dedos pelos fios amarelados do bichano, que ronrona com satisfação.

— Ah! Mas é claro que essa figura também gosta de você! O problema dele é comigo.

— Eu ouvi um também? Você gosta de mim, Katniss? – Peeta envolve os braços em minha cintura.

— Talvez... Um pouquinho – brinco, franzindo o nariz e ele revira os olhos.

Observo as casas ao redor e já temos uma boa plateia de vizinhos.

Peeta percebe minha distração momentânea e dá um passo atrás.

— Ei! – Ele abre os braços, falando em alta voz. — Talvez eu não me importe que todos aqui saibam que Katniss Everdeen é minha namorada!

Ouço as risadas abafadas de Prim e de Rue atrás da porta.

— Peeta!

— Eu preciso fazer um pedido oficial à Sra. Everdeen?

— Não! Não é isso.

Ele segura minhas mãos e sorri amplamente, desta vez com os lábios e com os olhos.

— Tenha uma boa noite, minha linda. Durma bem e sonhe comigo.

Mais uma vez, seus lábios estão colados aos meus. Depois, ele beija meus dedos e somente solta minha mão depois de muito custo.

Acompanho com o olhar seus passos na direção do carro e ele guarda as mãos nos bolsos, virando-se uma última vez.

— Katniss, a respeito da minha planilha sobre você, ainda há muitas lacunas que eu gostaria de preencher. Sem pressa.

Com essas palavras, ele gira os calcanhares e começa a assobiar a música "I won't give up", enquanto se afasta.

Subo as escadas, escalando-as rapidamente para alcançar a porta.

Eu sorrio para mim mesma e abro a fechadura, surpresa e feliz por estar ansiando, pela primeira vez, com muitos outros encontros.

Mal sabe Peeta que já tenho uma planilha imaginária sobre ele também e quero completar cada espaço em branco.


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Notas finais do capítulo

Oi de novo!

Fico feliz por estar de volta e espero não demorar a publicar a continuação!

Aproveito para convidar vocês a conhecer a coletânea "Encontros, Acasos e Amores", no Nyah!, onde publiquei a one-shot que deu origem a esta fic e também uma outra, chamada "Antes que você se case". Links no meu perfil!

Beijos!

Isabela



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