Amor Feérico [CcL 21] escrita por Lady Lanai Carano


Capítulo 1
Rainha das Fadas - Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Olá pimpolhos e pimpolhas!
Eu juro que tentei escrever só romance, mas eu sou muito viciada em fantasia, e deu nisso.
1. Sim, a ideia da história é baseada no Arco ALO de Sword Art Online, mas todo o desenvolvimento e o desfecho são originais.
2. A aparência da Titania foi baseada na personagem homóloga de Fire Emblem (nunca joguei, mas ela apareceu enquanto eu estava pesquisando no Google e gostei sldjfdfsjv)
3. Como os leitores (vulgo uma leitora, mas tudo bem) gostaram de eu colocar uma música na última one, vou recomendar outra aqui também: Love Song, do Yong Woo Shin (https://youtu.be/0JDAj2lVS_s), ouçam enquanto leem e depois vejam a tradução em inglês que tem no vídeo, eu amei e meio que combina com Amor Feérico, então vai ela mesmo (o Yong Woo Shin é o voice actor do Jumin de Mystic Messenger, por isso a imagem dele no vídeo, mas a música não tem nada a ver).
É isso ^^
Beijos de Mel ^^



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Há muito tempo, as fadas vivem escravizadas pelo povo élfico. Os elfos, belas criaturas de orelhas pontudas e dotadas de uma graça sem igual, porém sem um pingo de poder mágico nas veias, há muito subjulgaram o povo feérico, uma das únicas raças mágicas do mundo.

Fadas escravizadas tinham suas asas arrancadas, o que bloqueava o fluxo de magia e impedia que elas se revoltassem. Até mesmo as pouquíssimas fadas livres do Reino Élfico, que ainda possuíam asas, eram constantemente reprimidas pelo exército dos elfos, e precisavam se submeter a uma infinidade de normas, tão restritivas quanto a escravidão.

No meu caso, eu fui livre por muitos anos, até que o Rei Oberon se encantou pela minha aparência e me forçou a me casar com ele. O rei dos elfos, possessivo e doentio, me manteve trancada em uma prisão por um tempo que parei de contar na primeira semana. Eu ainda tinha minhas asas e minha magia, mas de que importava? Minha magia feérica estava atrofiada pela falta de uso, e eu não conseguiria sair dali e voar para longe.

Minha prisão era uma gaiola gigante, pendurada no alto da maior árvore do reino, que quase tocava os céus. Um dragão vivia nos galhos, e impedia que qualquer um chegasse ali além do rei e seus guardas, que subiam até lá por escadas gigantescas que passavam em torno do grosso tronco da árvore. Por conta da dificuldade em acessar minha prisão, eu não recebia muitas visitas.

O dragão me deixou absolutamente aterrorizada. Dragões são criaturas extremamente raras, e são tão poderosas que se comparam a deuses. Sempre que eu ouvia o bater de suas enormes asas enquanto transitava pela copa da árvore, me encolhia e tremia de medo. Era assustador.

Até que, certa noite, eu vi um homem sentado em cima da minha gaiola, com as pernas passadas por entre as grades, admirando o céu estrelado. Meu primeiro instinto foi gritar, mas a curiosidade superou o medo, e usei minhas asas para voar até lá.

— Quem é você? – perguntei, segurando as barras e olhando para cima. Ele olhou para mim. Seus olhos eram vermelhos e brilhantes como brasas.

— Rainha Aerith! A senhora deveria estar dormindo.

— Não me chame por esse nome élfico horrível. Foi Oberon quem inventou de me chamar assim. “O nome da rainha não deve ser profanado pela suja língua das fadas” – imitei-o e cruzei as pernas no ar, ainda batendo delicadamente minhas asas, oscilando levemente para cima e para baixo. – Eu geralmente não consigo dormir à noite. Mas você não respondeu minha pergunta. Quem é você?

— Sou eu que guardo essa gaiola, rainha Aerith. Nunca percebeu?

— Você é o dragão? – Recuei, assustada. Ele assentiu.

— Perdão por ter nascido assim, senhora. – Sua voz estava calma, mas consegui identificar uma nota de mágoa nela. Instantaneamente senti a culpa apossar do meu coração.

— Desculpa. Eu não devia ter medo de você. Você está me protegendo, não é?

— Não! A senhora deveria ter medo de mim. Aliás, nós não deveríamos estar conversando. O meu senhor não me deixa ficar na forma humana por muito tempo.

— Por senhor você quer dizer Oberon? – Não pude conter o meu ódio puro pelo rei dos elfos em minha voz.

— Desculpe, senhora Aerith – o dragão disse, com pesar.

— Certo. – Suspirei. Minha voz estava rouca. Eu não falava com ninguém há um bom tempo, então mesmo depois de poucos minutos de conversa, minha garganta doía. Mesmo assim, eu não queria que ele fosse. – Apenas me prometa que não me chamará pelo nome que Oberon me deu depois desse casamento maldito.

— Mas eu...

— Eu sou a rainha, esqueceu? – Cruzei os braços. – Prometa.

— Certo, certo, senhora. – Ele suspirou. – E como eu deveria te chamar?

— Eu digo o meu nome só se você disser o seu. – Touché. O dragão piscou, olhando para mim.

— Eu não tenho nome. Ninguém... – Sua voz falhou. – Ninguém precisou me dar um nome. Eu sou apenas uma fera que faz o que me é ordenado.

— Não! Todos precisam de um nome. – Sacudi a cabeça. – Eu vou te chamar de... Jamie.

— Isso não é um nome feérico?

— Exatamente. – Sorri. – Significa “Aquele Que Ajuda” em feérico antigo.

Jamie sorriu e pude vê-lo articular seu novo nome sem deixar sair som. Eu podia ver seus caninos levemente pontiagudos quando sorria, mas não tinha mais medo. Na verdade, seu sorriso era quase... fofo. O dragão olhou para mim novamente.

— E qual é o seu nome feérico, rainha Aerith?

— Titania – murmurei, e o som do meu nome feérico soou estranho, já que não o ouvia há muito tempo. – Por favor... me chame de Titania.

— Titania... – Por algum motivo, senti meu coração acelerar quando ouvi meu nome sair de seus lábios. – Titania, Rainha das Fadas.

— Eu não sou a rainha das fadas, nós sequer temos um reino!

— A senhora não pode ter certeza de que vocês nunca terão – Jamie disse, enigmático. E então levantou, equilibrando-se sobre a grade da gaiola. – Quer dizer, apenas esqueça o que eu disse. A senhora ficaria em perigo se tivesse ideias como essa.

— Certo, certo – resmunguei e cruzei os braços. – Então... você vai voltar?

— Eu sempre estou aqui, senhora – ele disse, confuso, e eu revirei os olhos, impaciente.

— Você vai falar comigo de novo? Assim? Na forma humana? É realmente solitário aqui, sabia?

Jamie ficou em silêncio, apenas encarando o céu. Meu pescoço já estava dolorido de tanto que eu estava olhando para cima, mas eu não queria que aquele pequeno momento acabasse.

— Boa noite, Rainha Aeri- Titania. – Sem responder minha pergunta, Jamie saltou de cima da gaiola transformou-se em um dragão negro com brilhantes olhos de brasas e levantou voo, desaparecendo no céu atrás da frondosa copa da árvore.

►♦◄

Nós dois conversamos algumas vezes depois. Aos poucos, a minha sanidade perdida naquele período de completo isolamento foi lentamente sendo restaurada. Eu contava algumas histórias que conhecia sobre as fadas, mesmo que toda a história feérica tenha sido quase totalmente apagada após a escravidão, e Jamie falava sobre os dragões. Eram conversas banais, que talvez não importassem muito, mas a solidão já não me assolava mais.

Até que, um dia, enquanto Jamie não estava ali, Oberon apareceu na entrada da minha gaiola.

O rei dos elfos não era feio; pelo contrário, todos os elfos tinham uma beleza sobrenatural, e ele não era diferente. O rosto atemporal, os cabelos loiros e compridos, as orelhas sutilmente pontudas, tudo faria uma pessoa normal, de qualquer raça, ficar hipnotizado.

Exceto eu.

— Olá, senhor Oberon. A que devo sua presença na minha humilde prisão? – Enfatizei a última palavra, irritada.

— Perdão por deixá-la enclausurada, Aerith – Oberon disse, e eu torci o nariz ao ouvir aquele nome, mas não disse nada. – Mas eu não posso deixar ninguém se aproximar de você. – Ele sorriu, maliciosamente, e eu recuei até sentir as barras da gaiola nas minhas costas. – Você é apenas minha, Rainha Aerith.

— Apenas diga o que você veio fazer aqui – falei, tentando manter minha voz firme.

— Ah, sim. – Ele cruzou os braços. – Temos um desfile para comparecer amanhã. Como a minha rainha não aparece em público há muito tempo, pensei em levá-la comigo. Então, vim aqui para te avisar de algumas coisinhas.

Oberon levantou e foi até mim. Segurou o meu queixo e me forçou a olhar para ele.

— Você vai ser absolutamente obediente. Você é uma fada imunda, minha rainha, mesmo sendo bela e minha esposa, você não passa de uma fada. Todo o povo verá como você é feliz comigo.

— E por que eu deveria obedecê-lo?

— Você irá me obedecer, ou... – Ele agarrou meus cabelos vermelhos e virou meu corpo, fazendo-me ficar de frente para a grade da gaiola, e pressionou meu rosto contra as barras. Eu não gostava muito de olhar para fora, porque a altura me dava vertigens, então me senti mal ao ver que o galho onde eu estava era tão alto que nuvens passavam debaixo de nossos pés. – Você cairá... Não sem antes de eu, é claro, arrancar essas suas lindas asinhas... – Oberon deslizou o dedo por entre minhas asas, provocando-me arrepios que me deixaram enojada.

— Apenas me deixe em paz – murmurei, segurando as lágrimas. Não, eu não choraria. Não na frente dele.

— Como queira. – Ele me soltou. Recusei-me a virar para encará-lo. – Virei buscá-la amanhã. Espere por mim. – Ouvi o som da porta da gaiola abrindo e depois fechando com um estrondo.

Por fim, me permiti cair no chão, segurei as barras e deixei que as lágrimas caíssem, sem que ninguém viesse para limpá-las.

►♦◄

Jamie não me visitava há quase dois dias, então fiquei me corroendo de preocupação até que Oberon viesse me buscar no dia seguinte. Estar do lado de fora depois de tanto tempo era estranho, e perigosamente tentador. Eu só queria bater minhas asas e sair voando, mas eu seria morta pelo meu desejo de liberdade.

O desfile em si passou como uma história protagonizada por outra pessoa. Minha mente estava admirando o céu, o sol, as nuvens, as árvores, e como tudo ficava mais bonito sem grades para deformá-los. Mas meu coração estava em outro lugar, em um certo dragão de olhos vermelhos. Eu mal podia esperar para contar-lhe a sensação de finalmente estar do lado de fora da minha prisão, mesmo em um momento tão efêmero.

Fui desperta dos meus devaneios por um choro agudo. Vi alguns elfos agarrando uma criança fada que, milagrosamente, ainda tinha suas asas. A menina chorava e gritava. Olhei para Oberon, depois para a criança e, sem hesitar, voei para fora da carruagem em que estávamos e fui até lá.

— Ei, o que estão fazendo? – Puxei a menina pela mão. – Essa garota é uma fada livre, não vê suas asas?

— Rainha Aerith, o que você pensa que está fazendo? – Oberon gritou, e eu virei. A multidão de elfos e fadas nos olhava, temerosos. – Volte para a carruagem e deixe essa fada aí. Ela será escravizada como todas as outras. Você não pode impedir isso.

— Claro que eu posso. Eu sou a rainha! Fadas não deviam ser escravizadas pelos elfos quando sua própria rainha é feérica!

— Peguem-na – Oberon ordenou. Os guardas elfos agarraram meus braços e me impediram de fugir. Tentei resgatar a magia que eu sabia que estava latente em mim, por ser uma fada ainda com asas, mas foi em vão. Talvez ter passado tanto tempo suprimindo-a tenha deixado a minha magia adormecida.

Fui arrastada de volta para a carruagem e levada para o castelo. Lá, me jogaram em um calabouço escuro e úmido.

— Você não cansa de me causar problemas, sua vadia? – Oberon gritou, e agarrou meus cabelos, erguendo-me do chão. Gemi de dor. – Dizendo que as fadas não deviam ser escravizadas? Você quer morrer?

— Eu não teria orgulho se deixasse aquela criança ter suas asas arrancadas na minha frente.

— Seu orgulho vale mais que sua vida? Bom, então cortaremos esse maldito orgulho pela raiz. – Oberon tirou uma adaga do cinto. Sua lâmina reluziu na pouca luz, maligna.

Ferro.

— Você não seria capaz... – murmurei, mas não consegui completar a frase, porque eu sabia que sim, Oberon era capaz. Ferro era mortal e doloroso para fadas. Os elfos mais cruéis prendiam suas fadas escravizadas com grilhões de ferro.

Ele me fez deitar no chão, de bruços, e lentamente deslizou a ponta da adaga nas minhas costas. A dor foi quase como se a lâmina estivesse incandescente. Mas eu só comecei a gritar quando senti o ferro decepar a base da minha asa direita.

Era uma dor tão insuportável que creio que acabei desmaiando algumas vezes, mas só para acordar novamente e sentir as minhas asas lentamente sendo arrancadas das minhas costas. Quando finalmente terminou com seu serviço sádico, Oberon ordenou que eu fosse presa novamente na minha gaiola.

Quando fui arrastada e jogada dentro da minha prisão, só tive tempo de sentir braços gentis me carregarem no colo antes de apagar de vez.

►♦◄

Acordei sentindo uma dor excruciante nas costas. Aos poucos, as memórias anteriores voltaram, e eu abri os olhos. Sentei, resistindo à vontade de me espreguiçar, e senti um peso sobre minhas pernas.

Surpresa, constatei que era Jamie que estava debruçado no meu colo, dormindo. Olhei para baixo e vi curativos em torno do meu tórax, provavelmente cobrindo os ferimentos nas costas.

— Você... cuidou de mim? – sussurei, e senti as lágrimas se acumularem nos meus olhos. Hesitante, estiquei a mão e toquei seus cabelos escuros. Eles eram incrivelmente macios. Mordi o lábio inferior. Ele parecia tão diferente sem a grade da gaiola nos separando...

Lentamente, ele abriu os olhos e piscou. Afastei minha mão, um pouco envergonhada, e sorri.

— Você acordou. Obrigada por... você sabe. – Tentei tocar minhas costas, mas o movimento fez com que a dor se alastrasse, e eu fiz uma careta.

— Ah, por favor, senhora, não faça movimentos bruscos – Jamie disse, desesperado, e segurou meus pulsos. Seu toque era realmente quente, talvez por ser um dragão que cospe fogo, e inesperadamente delicado.

— Certo. – Abaixei os braços lentamente, ruborizada. – Você sabe se aconteceu alguma coisa por causa do que eu fiz?

— Os guardas me contaram o que aconteceu, mas desde aquele dia eu não saí daqui, então não sei de nada.

— Daquele dia? – Tentei ignorar a vergonha que senti ao saber que Jamie não saiu do meu lado em nenhum momento. – Quanto tempo eu fiquei apagada?

— Quatro dias. Eu... – Ele fechou os olhos e segurou minhas mãos. Senti que estava tremendo. – Eu achei que a senhora nunca acordaria. Eu fiquei com tanto medo...

— Eu não vou morrer tão fácil, ouviu? Não antes de me ver completamente livre desse lugar. – “E de levar você comigo”, pensei. Jamie abriu os olhos e sorriu; aquele sorriso fofo que mostrava seus caninos pontiagudos, e que derretia meu coração.

— Obrigado. Quer dizer... obrigado por ficar viva. E por me não ter medo de mim.

— Por que eu teria medo de você? – Eu ainda me sentia culpada por temê-lo quando cheguei ali.

— Eu cresci ouvindo que era um monstro, senhora. E que deveria me isolar de todos. E que minha única chance de provar que minha vida vale a pena é obedecer ao rei. – Odiei Oberon ainda mais. – Mas... depois do que ele fez... – Jamie olhou para trás de mim, para onde minhas asas costumavam ficar. Seus olhos queimavam de raiva e ódio. Senti um arrepio percorrer meu corpo e finalmente entendi por que dragões eram tão temidos em todos os reinos. Eu realmente não queria ser Oberon naquele momento.

— Eu não me importo muito de não ter minhas asas – menti, dando uma risadinha, e fiz uma careta de dor.

— Eu já disse para a senhora não fazer movimentos bruscos! E... – Ele desviou o olhar, envergonhado. – A senhora é linda com ou sem asas, então não se preocupe.

Olhei para o lado, corando. Por que eu parecia uma adolescente na frente dele? Eu tinha coisas mais importantes para me preocupar.

— Quanto tempo você acha que eu vou ficar assim, inválida? – perguntei.

— Eu não sou especialista em fadas, e não sei quanto tempo demora para uma se recuperar após perder as asas. Não sei se elas sequer se recuperam. – Pressionei os lábios em uma linha fina, temerosa. – Mas espero que logo.

Jamie levantou e percebi que ele estivera ajoelhado ao lado da minha cama esse tempo todo.

— Agora a senhora precisa voltar a dormir. Por favor, não se importe comigo aqui.

Obedeci a contragosto. Eu queria continuar conversando, mas a letargia já estava tomando conta do meu corpo. Jamie provavelmente omitiu o quanto de sangue eu realmente perdi, porque estava me sentido fraca como nunca me senti antes.

— Durma bem, Titania – ele sussurrou, e não pude deixar de ficar feliz por ouvi-lo dizer meu nome sem honoríficos; apenas meu nome. Fui tragada para o mundo dos sonhos novamente.

►♦◄

Perdi a conta de quantos dias Jamie cuidou de mim enquanto eu me recuperava e tentava me acostumar a estar sem asas. Antes de permitir que ele ficasse, Oberon se certificou de que nós dois permanecêssemos trancados dentro da gaiola, para que eu não escapasse.

— Bastardo possessivo, desgraçado, filho da... – Eu xinguei Oberon assim que este acabara de sair, enquanto sacudia a porta da gaiola, até que Jamie corresse para me impedir de fazer esforço físico.

Era doloroso para ele não poder sair dali e se transformar em dragão, mas Jamie dizia que não se importava desde que eu estivesse bem. O que era uma pena, porque eu realmente queria vê-lo na sua forma draconiana. E eu também queria que pelo menos ele tivesse a oportunidade de voar livremente pelos céus, algo que eu nunca mais seria capaz de fazer.

Certo dia, quando eu já estava quase totalmente recuperada, nós dois deitamos no centro da gaiola, olhando para as nuvens e adivinhando o formato delas.

Ficamos em silêncio por um instante até que ele ergueu nossas mãos unidas. Eu nem reparei que estávamos de mãos dadas, mas segurá-la simplesmente parecia certo.

— Ontem, enquanto a senhora estava dormindo, um mensageiro élfico apareceu e disse que, como a senhora já está bem, eu tenho que ir embora amanhã.

— Ah... mas podemos continuar conversando, não é? Como fazíamos antes.

— Esse é o problema. O rei percebeu que somos próximos; ele não é estúpido. Amanhã, vão me mandar para algum lugar longe daqui, para que nunca mais nos encontremos.

Meu coração apertou. Não, de todas as torturas que Oberon pudesse aplicar em mim, afastar-me de Jamie seria a pior.

— Eu não quero que você vá. – Lágrimas escorreram pelo meu rosto, e ele se apressou em limpá-las.

— Eu sei. Então precisamos fugir daqui. – Jamie suspirou e virou de lado para me olhar diretamente. – Eu nunca mais vou deixar que o rei faça o que ele quiser com você.

— Por quê? Por que você se importa tanto com o que Oberon faz? Ele não é o seu senhor?

— A senhora sabia que dragões só têm uma criatura que eles amam verdadeiramente a vida inteira? – Ele rebateu. – Dizem que é possível saber só de olhar. Alguns morrem sem nunca ter encontrado a criatura predestinada. E eu... tive a sorte de descobrir a minha.

Eu não sabia o que falar. Sem pensar, abracei sua cintura e escondi meu rosto corado.

— Por favor, não fale coisas tão vergonhosas.

— Desculpa. – Jamie riu, parecendo um pouco nervoso, até que também me abraçou delicadamente. – Mas o que importa é que vamos fugir daqui, não importa o que aconteça. Certo?

— Certo – prometi e o abracei mais forte. E depois de tanto tempo, uma centelha de esperança acendeu no meu coração.

►♦◄

Nosso plano era simples: derrubaríamos os guardas no chão lá em baixo, que com certeza não sobreviveriam à queda, Jamie se transformaria em dragão e me levaria em suas costas, já que eu não podia mais voar. De resto, contaríamos com a sorte. Parecia um plano realmente péssimo, mas não tínhamos outro.

A primeira parte foi executada com sucesso. Não tive tempo para sentir pena dos elfos que caíram lá em baixo; eu ainda podia sentir o impacto do chão no meu corpo quando aqueles mesmos guardas me jogaram no calabouço onde minhas asas foram arrancadas.

Mas assim que Jamie se transformou em dragão, para a nossa surpresa, o próprio Oberon já estava nos esperando em um dos galhos da árvore, com mais um grupo gigantesco de guardas junto com ele.

— Eu já devia esperar – ele disse, cínico. – Minha própria esposa e meu fiel servo me traindo pelas minhas costas. Assim que eu soube que essa besta quis cuidar pessoalmente de você, Aerith, eu tive certeza sobre vocês dois.

— Não o chame assim – gritei. Infelizmente, a distância entre a entrada da gaiola onde estava e a árvore era relativamente grande, então eu não podia simplesmente pular e esganá-lo como eu tinha vontade de fazer.

— Que seja. Matem o dragão e prendam a rainha novamente – Oberon ordenou aos seus soldados, que armaram seus arcos e atiraram.

Abaixei-me, evitando os projéteis, mas muitos deles atingiram Jamie. Felizmente, na forma de dragão suas escamas eram resistentes o suficiente para fazerem as flechas ricochetearem e quebrarem. Ele bateu as enormes asas, cuspiu fogo na direção dos elfos e avançou para matá-los.

Se eu não conhecesse a sua personalidade gentil, eu fugiria de medo. Eu cresci ouvindo histórias míticas sobre dragões, mas nenhum deles fazia jus à realidade. Um dragão enfurecido era muito, muito pior do que as lendas contavam.

Fiquei na beirada da gaiola, tentando não sentir vertigem por causa da altura. E se os soldados élficos derrotassem Jamie? Eu morreria. Não fisicamente, mas por dentro.

Tentei usar magia para ajudá-lo, mas lembrei que sem minhas asas, não adiantaria em nada. Observei Oberon pegar uma lança de um dos soldados e pensei que ele lutaria também mas, para a minha surpresa, ele mirou em mim. Oberon não tinha acabado de dizer que não me mataria?

Algo estava terrivelmente errado.

Eu só percebi seu plano quando a lança já estava voando pelo ar. A ponta da arma era dourada e reluzia com um brilho vermelho, e penetrou facilmente pelas escamas da Jamie, que entrou na minha frente antes que eu fosse atingida.

Acho que gritei, mas não conseguia ouvir minha própria voz no turbilhão que era minha mente. Assisti, impotente, enquanto o dragão se transformava na forma humana, com uma lança atravessando seu tronco até metade do cabo.

Sem pensar, pulei da gaiola e tentei segurar sua mão. Quando consegui alcançá-lo, o puxei para mim e ficamos nós dois, de mãos dadas, em plena queda livre.

— Não! A senhora... – Jamie tossiu sangue e segurou o cabo da lança com a outra mão. – A senhora precisa sobreviver!

— Eu não vou sobreviver sem você! – Agarrei a lança e tentei arrancá-la de seu corpo. – Como ele conseguiu te acertar?

— Isso é ouro... – Ele tossiu de novo. – Ouro vermelho, é mortal para dragões. Mas eu preferi morrer do que ver ele te matar.

— Idiota! – Comecei a chorar, desesperada. O chão estava cada vez mais perto. Jamie segurou meus pulsos e sorriu.

— Eu te... – O estrondo do vento abafou o que ele disse. Pisquei, atordoada.

— O que disse?

Ele abriu a boca para falar de novo, mas tudo o que saiu foi uma tosse descontrolada. Então seus olhos fecharam.

— Não! Não, não, não! – O puxei para perto e o beijei. Mas nada aconteceu. Continuamos caindo para a morte. O abracei e fechei os olhos, não me importando que o sangue sujasse minhas roupas. Pelo menos eu morreria com ele.

Quando estava a alguns metros do chão, seu corpo desapareceu dos meus braços em uma luz vermelha. Abri os olhos, assustada, e percebi que estava flutuando, com apenas a lança ensanguentada nas mãos.

Senti uma queimação percorrer todo o meu corpo, como se fogo líquido corresse nas minhas veias. Mas não era doloroso. Era quente e confortável como abraçar Jamie.

Palavras apareceram no cabo da lança, escritas em feérico antigo: “Governe com justiça, Rainha-Dragão”.

Subitamente, eu entendi. Eu nunca precisei da magia das fadas. Eu tinha o amor de uma das raças mágicas mais poderosas do mundo correndo pelo meu corpo.

Segurei a lança com as duas mãos e voei até o topo da árvore gigante, sentindo a magia draconiana me preencher. Logo alcancei os elfos na copa da árvore.

— A-Aerith? – Oberon gaguejou, parecendo assustado. Eu não sabia como estava a minha aparência, mas sentia que nunca parecera tão perigosa para ele. E isso me deixou com um deleite inimaginável. – M-Matem-na!

Antes que os guardas sequer pensassem em armar seus arcos, eu ergui a lança, mirei e lancei. Ela girou no ar e atravessou o peito de cada um dos elfos de uma só vez, e fincou-se no tronco da árvore. Tranquilamente, flutuei até a lança, puxei-a e fui até Oberon, sem pressa.

— P-Pare! – Ele recuou até chegar na ponta do galho. – Você se tornou uma besta como ele, Aerith! Você só poderá se tornar normal se me obedecer!

— Não ouse chamá-lo de besta. O único monstro aqui é você, Rei Oberon. – Parei a alguns centímetros dele e ergui a cabeça para encará-lo. Pude ver o medo em seus olhos. – Aliás... Você não é mais o soberano dos elfos e das fadas. Nós seremos livres.

Fiz a lança esquentar com magia e finquei-a no seu abdômen, queimando o interior do seu corpo. Oberon gritou.

— E meu nome não é Aerith. Eu sou Titania. – Puxei a lança e empurrei seu corpo sem vida da árvore. – A Rainha das Fadas.


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Notas finais do capítulo

E então? Gostaram?
Acho que pegar emprestado personagens de Shakespeare me deixaram muito inclinada a escrever um final dramático...
Beijos de Mel ^^



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