Ensina-me escrita por Dyminix


Capítulo 1
A Question


Notas iniciais do capítulo

Não vou me demorar por aqui, essa é uma One Shot que já está escrita tem algum tempo!
Eu espero mesmo que gostem, tenham uma boa leitura.



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“A melhor e a pior coisa...”

 — Mãe, o que você acha de eu estudar em Sweet Amoris? – Lydia proferiu a frase rapidamente e sem pensar, como um tiro de canhão disparado por acidente. No exato momento em que o fez, arrependeu-se do ato e mordeu o lábio inferior para tentar de certo camuflar o nervosismo.

A progenitora, cuja boca havia acabado de dar uma mordida exagerada no brownie de chocolate feito naquela mesma tarde, arregalou os olhos e afastou a guloseima da face, colocando-a novamente sobre o prato.

 — Sweef Amolis? – disse de boca cheia, fazendo com que a filha desse uma risada baixa. Michelle se apressou em mastigar e serviu-se de uma boa golada de refrigerante para ajudá-la a engolir, dando um suspiro satisfeito e voltando a observar Lydia – não está satisfeita com a sua escola? Quando começou a pensar nisso?

 — Bem, isso não é tão importante, é só uma ideia mesmo... – desconversou, levantando-se da cadeira. Não sabia exatamente o motivo de ter pensado em ir para S.A, aliás, sabia, mas não queria aceitar o que a incentivava; até mesmo pensou em culpar o signo pela indecisão, mas deixou para lá. A verdade é que não conseguiria dialogar abertamente sobre isso com a mãe, não como gostaria. Desde a morte do pai, ambas cultivaram entre si um vasto abismo sentimental e, mesmo que a vontade fosse muita, não conseguiam desabafar ou conversar sobre assuntos significativos juntas.

A mãe observou a filha com certo pesar no olhar, sabendo que aquela foi outra investida falha de aproximação. Assentiu com a cabeça, observando-a dar as costas e dirigir-se pelo corredor até as escadas, perdendo-a de vista e sabendo que esta iria em direção ao quarto.

Lydia respirou fundo enquanto subia os degraus de mármore negro, aturdida por não ter conseguido seguir em frente com o pedido e ao mesmo tempo feliz por não tê-lo feito. Afinal, isso era possível? Ela não sabia. Mordeu novamente o lábio inferior e girou a maçaneta da porta com detalhes florais talhados na madeira clara, adentrando o quarto e fechando-o com certa força, sentindo de imediato o quanto o cômodo estava quente e precisava de ar fresco.

Foi até a janela, amarrando as cortinas e revelando a porta articulada de vidro que dava direto para a sacada. Trajava apenas um shorts jeans e um cropped de alças finas azul; o cabelo preso num rabo de cavalo lateral e, mesmo com a pouca roupa, a massa de ar quente parecia querer esmagá-la e fazer suar até a morte. Abriu a porta de vidro com pressa e sentiu de imediato o vento tocar-lhe a pele numa carícia aprazível, revelando um bom arrepio e proporcionando-lhe alívio para o calor; sentou-se com certa alegria na cadeira da sacada para aproveitar a noite agradável que a natureza a proporcionava, até que outro vento a atingiu e desta vez fechou os olhos para aproveitá-lo como gostava; quando o fez, uma imagem já não tão repentina apoderou-se de sua mente e assim que percebeu o que se passava, abriu os olhos e balançou a cabeça tentando espantar o que a tirava da tão conhecida sanidade:

Kentin.

Naquele mesmo dia, sexta feira, faria exatamente uma semana que se dera conta dos sentimentos que carregava pelo rapaz que praticava natação consigo no clube da cidade. A tragédia com o pai há alguns anos e o medo de se envolver com militares novamente (ou aspirantes) fizeram-na negar o envolvimento com Kentin para si mesma, mas já não podia suportar os sintomas que a afligiam, indícios que foram despertos naquele mesmo clube há uma semana, quando decidira ficar até mais tarde com ele na piscina por insistência do próprio. Ah, a noite estava até mesmo parecida com essa...

O sol estava praticamente posto no ocidente, o céu teve sua tonalidade mudada para um azul violeta que logo seria substituído pelo azul do anoitecer. A lua já podia ser vista e alguns pontos brilhantes como diamantes se destacavam no céu, tornando aquele início de noite algo belíssimo de se apreciar. Talvez isso justificasse a preferência das pessoas de irem até a praia ao invés de ficar no clube, afinal, observar o sol se pôr totalmente no horizonte não é uma visão que se defina como dispensável. Bem, isso para a maioria.

As duas respirações ofegantes eram os únicos sons capazes de serem ouvidos no clube naquela noite prematura de sexta feira. Se ainda houvesse pessoas no local, ocupavam outras piscinas ou praticavam de certo diferentes atividades, já que Lydia e Kentin não enxergavam ninguém além de eles mesmos e da paisagem em seu campo de visão.

 — Heh, você deveria saber que sou invencível na competição de fôlego – a ruiva comentou ainda ofegante, esbanjando um sorriso de canto e vangloriando-se por sair vitoriosa contra o amigo.

 — E você não deveria se gabar por vencer alguém que é menos experiente que você – fingiu reclamar, nadando de costas para Lydia até a beirada da piscina, se apoiando ali e impulsionando o corpo para cima, sentando-se e mantendo apenas os tornozelos submersos na água.

 — Você só está dizendo isso porque perdeu – ele fez uma careta e ela riu, encarando-o com certa admiração.

Apesar da pouca luminosidade proporcionada pelo Sol e pelas lâmpadas internas da piscina, Lydia reparou o quanto Kentin havia mudado desde que começou a praticar natação junto a ela. No lugar do garoto franzino que usava óculos fundo de garrafa e cabelo tigelinha, havia uma pessoa totalmente diferente. O corpo aos poucos adquiriu massa muscular: a natação o ajudara a alargar os ombros, os braços tornaram-se mais fortes, a barriga definida e as pernas torneadas pela corrida e outros exercícios praticados com muito esforço e dedicação; os óculos foram trocados por lentes de contato, revelando os olhos tão verdes e brilhantes quanto duas esmeraldas e a forma de tigelinha foi jogada fora, dando lugar para tesouras que repicaram os fios por completo, dando-lhe uma aparência elegante e despojada. Ainda assim, o que mais espantava a ruiva não era a mudança física, mas a evolução sentimental do rapaz que antes era deveras destrambelhado e fofo, e agora parecia mais discreto e seguro de si.

Contudo, naquele dia, algo em seu olhar esmeraldino aparentava que estava de certa forma atormentado, ansioso. A ruiva nadou em direção a ele, posicionando-se ao seu lado, apoiando os braços na beira da piscina e descansando a cabeça neles, mantendo apenas metade do corpo submerso. Uma brisa tocou-lhe as costas e um arrepio lhe percorreu, arrependendo-se de estar para fora e voltando a submergir o corpo. Somente a cabeça e os braços ficaram sobre a água segurando-se nas bordas, mesmo que não fosse necessário.

Observou uma das lâmpadas da piscina trocar de cor várias vezes na mesma sequência, como se aquilo fosse muito relevante. Azul, verde, rosa, amarelo, branco, vermelho.

 — Lydia – Kentin a chamou, mas ela continuou observando a lâmpada trocar de cor – Semana que vêm eu volto para a Sweet Amoris – Azul. A voz do acastanhado parecia, de certa forma, fria; como se seu pensamento estivesse distante, ela concluiu.

 — Uh? Você deveria estar feliz – disse sem encará-lo, passando a mão direita pelos cabelos molhados, jogando-os para trás – finalmente vai poder reencontrar seus amigos, e a Lynn – Verde.

O que ela disse o fez sorrir. O azul da noite finalmente alcançara o céu e acendera as luzes automáticas do clube, iluminando bem o local. As estrelas se revelaram em grande quantidade e a lua parecia sorrir para eles, sendo refletida na água. Rosa.

 — Eu estou feliz, Iris e Lynn são as pessoas que deixei pra trás, afinal. Mas também estou triste, por que bem... – ele fez uma pausa e suspirou. Lydia o encarou e percebeu as bochechas coradas do rapaz – eu não vou mais frequentar o clube com a mesma frequência – Amarelo.

Ela entendeu o recado. Aquilo significava que praticamente não se veriam mais e, por um momento, seus olhos encheram-se de lágrimas. Ela virou a cabeça na direção contrária para que ele não a visse dessa forma e voltou a encarar a lâmpada, desta vez branca. Era difícil admitir, mas havia se apegado muito ao Kentin nesses meses que treinara com ele na piscina; ela o considerava como melhor amigo e sabia que o sentimento era recíproco, mesmo que nunca tenham dito algo assim um para o outro. Pôde senti-lo se jogar novamente dentro da piscina, formando uma série de pequenas ondas que a molharam, mas não ligou.

  — Eu não quero deixar você pra trás – Vermelho. A ruiva virou novamente a cabeça e o encarou, os olhos acinzentados arregalados e as bochechas rosadas encheram-se com um sorriso, mesmo que estivesse um pouco triste. Kentin ficou surpreso – o que foi?

 — Está me convidando para estudar na S.A? – desta vez o olhar esverdeado do rapaz carregava confusão – foi por isso que pediu para que eu ficasse até mais tarde hoje, né? – brincou como quase sempre brincava com ele, tentando jogar para o alto a insegurança que sentia em relação a amizade de ambos. Sempre temeu que esse dia chegasse e que perderia o melhor amigo quando chegasse, afinal, além do vizinho Logan, Kentin era o único fora de casa com quem podia contar, e se lhe perguntassem francamente, sim, ela queria estudar em Sweet Amoris com ele. Ela não queria ficar para trás, e sentia que pedir transferência seria uma das melhores mudanças que faria na vida.

 — Mas... Ly, essa ideia é Genial! – Kentin exclamou com animação, movendo-se sob a água e formando mais algumas pequenas ondas – eu não havia pensando nisso ainda! Você pode conversar com a sua mãe sobre o assunto e ir para o colégio junto comigo, assim a gente não se afastaria – ele estava realmente tão animado com a situação que ela acabou rindo do quanto ele parecia agitado.

 — Eu não tenho certeza se quero ir estudar lá, Kentin – disse novamente, insegura, mas ao mesmo tempo parecia animada com a ideia de mudar de escola, já que estudou sempre na mesma e nunca vivenciou esta mudança. Lydia sempre apreciou as novas experiências, mas tinha medo do desapego.

 — Apenas pense na ideia! Eu poderia te apresentar a Iris e tenho certeza de que ia gostar de conhecer a Lynn. Aliás... – só de ouvir como ele dissera o nome da última, Lydia soube o que fizera Kentin a convidar para ficar mais tempo consigo na piscina. Sempre fora lerda para muitas coisas, mas já conhecia o rapaz muito bem para saber que ele queria falar sobre a garota com ela – Lydia, eu queria te fazer uma pergunta.

 — Pois bem, faça – disse, apoiando as costas contra a beira da piscina e agora prestando atenção somente no rapaz ao seu lado. Ele desviou o olhar e pigarreou antes de fazer a pergunta que queria.

— Como você acha que, bem, eu deva, sei la – falou com alguns rodeios e isso fez com que a ruiva suspirasse – investir mais na Lynn? Você sabe, os métodos antigos não funcionariam nunca...

Fitou o céu estrelado e depois voltou os olhos para o reflexo da lua na água da piscina. No fundo e nas beiradas, novamente avistou as lâmpadas trocando de cor e então sua mente juntou tudo aquilo numa explicação que servisse de ajuda para o amigo, mesmo que sentisse no fundo de seu âmago que não devia fazê-lo. Mordeu o lábio inferior e, com certo pesar, ilustrou verbalmente a ideia que teve.

—Sabe, Kentin, eu acho que você devia comparar a sua ‘conquista’ com um semáforo.

— O que?

— Isso mesmo! – exclamou e o encarou, sorrindo – no começo ela vai estranhar ou ficar surpresa com a sua mudança, então o sinal vai estar vermelho. Não converse muito com ela e apenas volte a conversar com suas amizades, aliás, faça novas amizades, pra mostrar pra ela que você está mais confiante de si e que não tem mais toda aquela antiga dependência de Lynn. Feito isso, o sinal vai estar amarelo e você vai precisar preparar o terreno: converse mais com ela, observe se ela está mais íntima de algum rapaz e faça algo pra deixar uma boa impressão, tipo ajudá-la a carregar livros, com a lição de casa ou sei lá o que... Você disse que a escola é bem movimentada, então vai ter muitas oportunidades disso – Lydia falava gesticulando com as mãos, enquanto Kentin apenas assentia com o que ela dizia. Sempre confiou nos conselhos dela.

— E no sinal verde? – ele perguntou totalmente curioso e animado com o clímax da explicação.

— Mostre que tem atitude e, quando tiver a oportunidade, dê um beijo nela! – atirou o conselho nele e, assim que o fez, observou as bochechas dele ficarem muito vermelhas como se todo o sangue do corpo do rapaz estivesse acumulado ali. Ele desviou o olhar, envergonhado e então a ruiva pensou que talvez tivesse falado algo de errado – Kentin? O que houve?

O som dos carros passando pela rua e de algo caindo na água de uma piscina ao longe preencheu o ouvido de ambos, mas foi como se nada tivesse acontecido. Kentin não tinha coragem de olhá-la nos olhos e por todos esses longos segundos de silêncio Lydia pensou que realmente tinha falado algo que o tivesse ofendido ou magoado. Cerrou o punho e mordeu o lábio com força, aproximando-se um pouco mais dele com certo receio.

— Kentin, me desculpe se eu te disse algo ofensivo, eu não tive a intenção, eu... – parou de falar quando ele negou com a cabeça. Ele a encarou e ficou ainda mais vermelho.

— T- tá tudo bem – gaguejou e respirou fundo – é que eu... Bem, eu nunca... Você sabe... – ela piscou algumas vezes, seus olhos acinzentados estavam confusos e ela não conseguia entender o que ele estava tentando lhe dizer.

— Você nunca...? – deixou a pergunta morrer no ar.

— Eu nunca beijei uma garota antes – atirou a verdade na face da ruiva, que ficou novamente surpresa pelo que acabara de adentrar seus ouvidos.

Lydia não soube o que dizer de imediato. Seu rosto simplesmente não conseguia refletir o quão estava confusa com a frase proferida pelo melhor amigo e ficou apenas movendo a mão para frente e para trás na água pela superfície, encarando as ondinhas indo e vindo conforme os movimentos que fazia.

— Nunca? – perguntou, olhando-o de soslaio. Sua resposta fora um aceno negativo com a cabeça e isso a fez rir, desconcertada – Não há problema! As garotas acham fofo certa inexperiência e eu tenho certeza de que a Lynn vai gostar de ser a primeira! – falou alto numa tentativa de animá-lo, mas o rapaz manteve seu olhar na água como se tudo aquilo fosse mais interessante do que o incentivo da amiga.

— Eu não quero ser o cara fofo e inexperiente... Quero ser o cara que agarra uma garota e a beija, sabe? Como nos filmes - Ela não soube mais o que dizer, então preferiu manter-se calada.

Cerca de três minutos se passaram com o silêncio de ambos. Nesse período de tempo que poderia ser comparado há três horas, a ruiva apenas manteve seu olhar num grupinho de mosquitos que voavam perto de uma das lâmpadas que iluminavam o local, admitindo a si mesma o quanto Kentin parecia ainda mais incrível depois de declarar que nunca havia beijado. Na percepção dela, o rapaz escolhera nunca beijar apenas por amor à Lynn e não por rejeição de outras garotas; ele nem deve ter considerado a possibilidade de beijar outras bocas, já que, mesmo não tendo um relacionamento concreto com a amada, ele sentia que se o fizesse estaria a traindo. O antigo Kentin, ela concluiu, apesar de aparentemente frágil, era sentimentalmente muito forte e fiel. Se ele ainda existisse e pedisse agora para beijá-la, ela aceitaria sem pensar duas vezes. Tamanha era sua admiração pelo rapaz e agora tinha mais certeza do que nunca: a garota que o namorar futuramente será muito, muito sortuda.

— E você?  – ele perguntou, tirando-a de seus pensamentos e pegando-a de surpresa como uma rajada repentina.

— Eu o que?

— Se você já beijou alguém, oras...  – e desviou o olhar do dela. Agora fora a vez de Lydia corar com a pergunta, ficando embaraçada e um pouco nervosa. Sua inquietação revelou uma risada que assustou um pouco o rapaz.

— Bem, sim, algumas vezes...

O silêncio mais uma vez apoderou-se do local. Tanto Lydia quanto Kentin estavam encabulados demais para pronunciar qualquer coisa sobre o assunto, nem mesmo conseguiam mais se encarar. A ruiva, com medo de pensar demais no rumo que aquilo estava tomando, resolveu desconversar tudo e puxar uma conversa sobre qualquer outra coisa diferente, tipo a... Paisagem!

— Essa é uma bela noite, não? – começou a tagarelar, rindo de constrangimento – nós nunca ficamos até tarde no clube, eu não sabia que a água ficava tão bonita sob a luz do luar; especialmente agradável – e riu mais um pouco, olhando-o de canto e notando que ele parecia um pouco... ansioso – além do mais, sem muitas pessoas aqui e sem o sol, quase não tem cheiro de protetor solar e confesso que o cheiro do cloro me agrada, talvez eu já esteja acostumada já que nado desde pequena, gosto tanto do Sol... Mas abomino suor! Isso só é bom quando se faz exercícios e se tem uma bela piscina pra tirá-lo, é claro, ou um banho gelado. Só que eu...

— Como é? Beijar... – perguntou rapidamente, fitando-a com determinação de seguir com o assunto. Lydia suspirou.

— Esse tipo de coisa não dá pra explicar, Kentin, sei lá, na hora a gente só... sei lá... Tem que beijar pra aprender...

O acastanhado corou, mas não desviou o olhar; tudo o que fez foi se encolher naquele canto da piscina, colocando a boca abaixo d’água e proferindo algo que a ruiva não conseguiu entender muito bem — Mensibe – foi o que ela ouvira.

— O quê? – perguntou alto se aproximando dele, a face carregando uma expressão confusa.

Ele tirou a boca de baixo d’água, seu rosto ficou ainda mais vermelho – o que Lydia julgou um milagre, já que pensara ser impossível – e disse com clareza.

— Me ensine.

— T- te ensinar? – quase gritou, dando um passo rápido para trás, impondo uma distância, e soltando outra risada nervosa. Seu estômago acendeu e precisou respirar fundo para assimilar o que estava acontecendo ali.

— Não ria – ele pediu, dando dois passos na direção dela querendo diminuir a distância entre eles e tentando uma aproximação maior desta vez – Eu realmente falei sério quando disse que quero ser um cara experiente quando chegar a minha hora com a Lynn. Eu não consigo pensar em ninguém melhor que você pra me ensinar! – ela não pôde dizer nada, apenas piscou algumas vezes e andou novamente para trás, sentindo as costas contra a beirada. Ele se aproximou novamente e desta vez ela estava sem saída – Você é minha melhor amiga, eu confio em você e seus lábios são bonitos.

Lydia arregalou os olhos quando percebeu que o rapaz agora estava realmente próximo de si – e podia jurar estar sentindo a água mais quente ali –, seus olhos brilhavam como dois diamantes lapidados cobertos por uma determinação muito conhecida por ela. Engoliu a saliva e fitou-lhe o rosto: a visão percorreu os cabelos úmidos e desgrenhados, mirou os olhos esverdeados e arredondados, apreciou o nariz que parecia ter sido desenhado perfeitamente para o rosto, as bochechas adoravelmente rosadas e posou nos lábios. Levemente avermelhados e aparentemente umedecidos por estar com a boca n’água há pouco tempo, a ruiva sentiu novamente aquele arrepio no pé do estômago, cerrou o punho e ficou extremamente confusa com os seguintes fatos:

1 – Kentin estava realmente pedindo para ela que o ensinasse a beijar.

2 – Ela estava considerando de verdade a ideia e, nunca admitiria isso em voz alta, mas estava realmente com vontade de fazê-lo.

E Lydia quase sempre cedia às próprias vontades, menos quando estava com preguiça.

— Você... Tem certeza? – Kentin afirmou com a cabeça.

— Me ensine, por favor. – disse um pouco alto demais, seu tom de voz aparentando o quanto estava apressado, ansioso, curioso.

 – Tudo bem, ahm, certo – ela fez uma pausa, ponderando as possibilidades. Não é como se ela fosse uma perita em beijos, afinal, além de Logan, havia um ou dois rapazes na escola que já havia beijado, mas, ensinar alguém? Resolveu começar a ‘aula’ pelo mais simples – Kentin, se você fosse me beijar...

— Mas eu vou te beijar...

— Não me interrompa! – Deu bronca e o rapaz ficou vermelho, mas riu da cara que a ruiva fez. A situação já era constrangedora demais para prolongar tudo com conversas paralelas e interrupções – Se fosse tomar a iniciativa de me beijar, em que momento você agiria?

Ele ficou pensativo por alguns segundos, fez uma careta com um sorriso torto que fez a garota rir.

— Quando você me desse o sinal pra isso.

— E quando você sabe que eu dei o sinal?

— Eu não sei, mas estou aqui pra aprender, professora – provocou, dando um sorriso de canto. Lydia revirou os olhos e o deu um tapa leve no ombro.

— Continue brincando e eu vou mandar você treinar beijo numa laranja! Talvez fazer flexão de boca... – foi a vez dela provocar, e então ambos riram – mas sério, esse tipo de coisa você vê na linguagem corporal. Ela vai estar muito sorridente, mexendo no cabelo e até mesmo tocando seu braço ou perna. Quando ela fizer isso, é porque tá rolando um clima e ela com certeza quer te beijar.

— Linguagem corporal... Certo... E o que mais? - ela bufou vendo o quanto ele estava com ‘cara de paisagem’. Ele não se lembraria de nada disso no dia seguinte.

— Tá, é melhor eu pular essa parte, ahm... Umedeça os lábios com a língua... Mas não deixa melecado!!!! – exclamou e segurou a risada, vendo ele passar a mão molhada na boca, tirando o excesso de saliva – certo. A maior dica que eu posso te dar é que você precisa ser corajoso e manter a calma. Agora faça o que eu for dizendo devagar – ele assentiu com a cabeça, assumindo uma postura ereta e determinada.

Lydia fechou os olhos por alguns segundos e respirou fundo, sentindo novamente aquele incômodo. Também umedeceu levemente os lábios com a ponta da língua, abriu os olhos e sentiu as bochechas esquentarem. Não poderia acreditar que estava prestes a beijar o melhor amigo de verdade, e mesmo que fosse para ajudá-lo, seria algo novo. Uma experiência nova que ela estava de certo ansiosa para vivenciar.

Os olhos dele a fitaram deveras curioso, como se quisessem decifrá-la. Kentin sempre achou que os olhos acinzentados da amiga equiparavam-se ao fundo do oceano, carregando profundidade e certo mistério que um dia ele gostaria de desvendar. Talvez o fizesse agora.

— Primeiro se aproxime devagar – a voz de Lydia saiu mais baixa e doce do que normalmente estava. Ele a obedeceu, aproximando-se lentamente, a água que envolvia ambos dançava em seus corpos e logo os braços e pernas se tocaram, fazendo-os sentir certo comichão e arrepio – Você está... muito perto – disse, vermelha, mas por algum motivo ele não se moveu e isso fez com que ela risse nervosa novamente – Certo, tudo bem. Caso ela esteja tímida ou envergonhada, vai começar a encarar o chão ou olhar pros lados, você precisa fazer com que ela te olhe nos olhos pra rolar o clima certo pro beijo. Dá pra fazer isso só... – assim que sentiu dedos molhados tocarem-lhe o queixo, deixou com que a frase morresse. Kentin, delicadamente, fez com que ela movesse a cabeça, inclinando-a e obrigando-a a olhá-lo diretamente nos olhos.

— Assim? – perguntou, pegando-a de surpresa e fazendo o rosto esquentar muito.

 - É – sussurrou, piscando repetidas vezes a fim de voltar a si, sem muito sucesso. Aqueles olhos esverdeados hipnotizaram-na, fazendo-a esquecer tudo a sua volta, focando sua atenção nele e apenas nele. Era estranho pensar dessa forma, mas parecia que Kentin estava muito mais bonito do que da última vez que o olhara, há uns 5 segundos atrás; ele parecia diferente agora – Feche os olhos e aproxime apenas o rosto do meu. Pra um primeiro beijo, seria bom não ter língua no começo. Vá conforme o meu ritmo – Ele assentiu e ela riu baixinho para tentar esvaziar do corpo a ansiedade que a tomava, sem muito sucesso.

— Certo – ele disse, sua voz coberta por uma rouquidão que Lydia julgou extremamente sensual, apesar de denotar um pouco de nervoso. Ainda assim, aquele era um lado do Kentin que ela nunca conheceu e cada célula de seu corpo a avisava que estava gostando muito de conhecer. Gostando até demais, sendo sincera.

Antes de fechar os olhos, a última coisa de que teve visão fora a lâmpada verde da piscina, lembrando-a da explicação do semáforo. Ela os fechou e, quando menos esperou, os lábios dele tocaram os dela muito suavemente, como uma carícia que a arrepiou levemente. Ela sentiu a respiração parar por alguns segundos e esse jogo de carinho perdurou por algum tempo: as cabeças movendo-se lentamente num roçar de lábios agradável, que deu início a selinhos cada vez mais demorados.

Contudo, quando abriu os olhos, deu de cara com olhos verdes esbugalhados e ansiosos encarando-a; afastou-se na hora pelo susto e não pôde segurar a risada, que fez o garoto ficar emburrado.

— Não faça mais isso, Kentin! – disse, respirando fundo para que controlar o próprio riso – Imagine, no fim do beijo a Lynn abre os olhos e dá de cara com esses seus olhões a encarando? Vai quebrar todo o clima! Poxa, eu tomei um baita susto – aconselhou e ele apenas assentiu, ainda bravo. Ela mordeu o lábio inferior, pensando se não tinha exagerado... – mas, esse beijo foi realmente muito bom – comentou e ele levantou o olhar, encarando-a com certo sorriso de agradecimento, afinal, mesmo que ‘tirando um sarro’, a garota cedera ao seu pedido e estava ajudando-o de bom grado. Ele admitiu mentalmente que Lydia é alguém deveras especial e importante para ele.

Quem olhasse a situação de fora conseguiria notar o clima romântico que se apoderou do local depois daquilo. Kentin já não estava mais tão vermelho ou envergonhado, seu rosto e olhar expressavam o quanto ele estava ainda mais animado e confiante para iniciar o próximo passo, maravilhado com as novas experiências que estava vivenciando. Já Lydia sentia-se totalmente envergonhada, apesar de ter gostado e não estar arrependida do que estava fazendo. No fim, entregara-se à vontade longínqua que tinha de beijá-lo, admitindo isso logo no primeiro roçar entre os lábios. Até que ele tomou a iniciativa, pegando-a de surpresa. Uma boa surpresa.

Palavras não foram necessárias. Com confiança de ambos os lados, as mãos dela tocaram-lhe o ombro, fazendo-o sentir o corpo esquentar, e então ele sentiu naquele gesto a permissão para acariciá-la na cintura com incrível facilidade que a água proporcionou, causando-a um arrepio que percorreu por todo o corpo; os lábios mais sutilmente entreabertos encaixaram-se de modo que ambos entenderam que era hora de aprofundar mais as coisas. Com uma timidez que aparentemente surgira no momento, ela moveu a língua e acariciou a dele, mexendo-a vagarosamente esperando com que ele correspondesse, o que aconteceu de imediato. Os movimentos, apesar de desajeitados, eram delicados e tornava todo o momento com Kentin totalmente agradável e... intenso. Em sua percepção, era notável que ele era inexperiente, mas revelara-se um ótimo aluno, do tipo que aprende mais rápido do que deveria. A mão dela alcançou a nuca dele e então sentiu a cintura ser envolvida pelos braços fortes do moreno, cujo beijo ficava cada vez mais profundo.

Quando Lydia se deu conta de que aquilo era real, percebeu que seu corpo estava totalmente... quente. Apesar de já ter beijado o vizinho e melhor amigo Logan por quem já sentiu uma paixonite, nada se comparava ao que estava sentindo agora. Com uma mordida leve no lábio inferior, ela o afastou de si com as palmas das mãos no peitoral do rapaz, empurrando-o sem força.

— O que foi? – perguntou.

Kentin a encarou confuso: os lábios levemente inchados, a respiração um pouco ofegante e as bochechas coradas a deixaram totalmente linda. E aquilo era estranho, já que não se lembrava de enxergar até então a melhor amiga dessa forma, mas decidiu considerar aquilo parte da nova experiência que era beijar, direcionando toda a sua gratidão para Lydia que o ensinara e o preparara para seu momento com Lynn. Ela, diferente dele, agora enxergava tudo com bastante clareza.

Não sabia exatamente quando aconteceu, mas sabia o que aquele beijo e todas as sensações novas significavam: estava totalmente apaixonada por Kentin.

— Nada. Acho que já ensinei o que podia... – mordeu o lábio inferior e desviou o olhar com pesar – Boa sorte com a Lynn.  

Ela foi para casa logo em seguida e, desde então, toda vez que conversava com o rapaz era pelo celular e sobre como estava indo a semana dele em Sweet Amoris; Lydia leu por mensagens sobre o beijo que ele dera em Ambre, o quanto Lynn havia ficado surpresa com sua mudança, sobre as conversas que Armin e Alexy puxavam na troca de professores, sobre o quão animado ele estava com o show da escola, apesar de Lynn não tê-lo convidado para ajudar, e sobre como estava mais confiante.

Apesar de feliz pelo que lia, ela percebera que na realidade dele não havia espaço para os sentimentos dela.

Adentrou o quarto, fechou a porta articulada, deitou-se na cama e, com um suspiro pesaroso, fechou os olhos para forçar o sono e cortar os pensamentos que a entristeciam.

(...)

O dia seguinte se passou no maior tédio que nunca poderia imaginar. Acordou mais tarde do que costumava, o café da manhã já havia sido feito pelo avô; tratou então de lavar a louça, assistir alguns episódios de seus desenhos animados preferidos – As meninas Super Poderosas e A Mansão Foster Para Amigos Imaginários – e quando se deu por cansada, foi até o quarto para refletir sobre Nada.

Porém, assim que se sentou na cadeira da sacada, duas batidas na porta foram ouvidas, e então apenas pediu para que quem estivesse fazendo o barulho entrasse. Era Michelle.

— Filha, tudo bem?

— Estou sim, mãe – respondeu, desanimada. Pegou o celular que havia acabado de vibrar, percebendo ser uma mensagem da loja do Leigh, provavelmente notificando que o vestido que pedira já havia chegado; queria abrir e saber detalhes, mas decidiu ignorar por enquanto para ouvir o que a mãe tinha a dizer – e você?

— Ótima! Sabe, ontem eu estive pensando na sua ideia de ir estudar na S.A e, bem... – a progenitora a encarou com um enorme sorriso no rosto – Eu fui visitar a escola hoje de manhã e a diretora foi tão atenciosa que eu decidi transferi-la. Você provavelmente começa no meio da semana, lá para quarta-feira, ou quando toda a papelada for resolvida.

— S- sério? – perguntou, surpresa. Ela afirmou com a cabeça e sorriu, dirigindo-se até a saída do quarto.

— Tenho certeza que vai gostar de lá! É uma escola dinâmica, sabe... – deixou a frase morrer no ar e saiu, fechando a porta atrás de si.

Não soube bem o motivo, mas assim como se sentiu feliz, uma coisa a perturbou com aquela notícia. Lydia sentiu que muitas coisas mudariam a partir de agora e ela estava completamente certa. Afinal, a primeira coisa que sentira quando estava conversando sobre a possibilidade com ele naquela piscina foi: estudar em Sweet Amoris e conviver com o Kentin seria a melhor coisa da vida dela. Agora que se dera conta dos próprios sentimentos não correspondidos pelo rapaz, pensou que seria agora a pior coisa de sua vida.

Talvez os dois.


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Notas finais do capítulo

Agradeço a leitura e espero de verdade que vocês tenham gostado.
Dêem um alô abaixo, ou por mensagem, se quiserem! :D Toda crítica é bem vinda.
Novamente, espero que tenham gostado e até a próxima fanfic ou OS... Se gostaram desta, que tal dar uma olhada em Os 10 Boatos, que também está sendo postada aqui?
https://fanfiction.com.br/historia/734482/Os_10_Boatos/
De qualquer forma, muito obrigada! Beijos e até a próxima



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