Nós escrita por Graciela Pettrov


Capítulo 4
Hora


Notas iniciais do capítulo

OBS: Não responderei aos comentários agora, porque todos os capítulos postados até o 6º já estão programados, pois a fic foi postada anteriormente no FF.net e quero sincronizar as postagens (:



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Por mais que acreditasse que a ciência estava certa quando dizia que um pouco de suor não seria o suficiente para apagar a tinta de uma caneta marcadora da pele, e que mesmo que ele a lavasse a tinta só sumiria em mais ou menos três dias, Sasuke não ousou tocar, esfregar, ou sequer fechar a mão esquerda enquanto estava no ônibus a caminho de casa.

Ao descer próximo à sua residência ensaiou sua expressão de mais puro tédio. Porque era assim que ele se sentia com relação à faculdade e era assim que teria que continuar se não quisesse o irmão pegando em seu pé.

Itachi era apenas quatro anos mais velho que ele. Há seis anos perderam ambos os pais assassinados em um assalto, Itachi estava com dezenove anos e resolveu pedir a guarda do irmão e continuar morando na mesma casa, pois na época o Uchiha mais velho havia acabo de entrar na faculdade de direito e Sasuke ainda estava no colegial e concluíram que uma mudança para a casa dos avós no interior prejudicaria a educação dos dois.

Desde então Itachi era como um pai para Sasuke e apesar de sua relação cotidiana ser comumente igual à de irmãos, havia um respeito sutil por ambas as partes.

A parada de ônibus ficava a cinquenta metros de distância. Atravessou a rua e seguiu pelas calçadas até a sua casa. A residência não era grande nem pequena, apenas comum como todas da vizinhança. A única diferença é que ainda pairava sobre ela a terrível lembrança de como dois de seus habitantes tiveram a vida tirada de forma brutal e, apesar de não demonstrarem, os vizinhos ainda olhavam para Sasuke e Itachi como pobres meninos órfãos.

Quando já estava em sua porta, meteu a mão no bolso da frente para pegar a chave e no momento em que girou a fechadura sentiu um cutucão na costela direita. Sasuke virou-se bruscamente e, para sua total surpresa, deparou-se com a Sra. Mars e sua bengala de ferro pronta para outro ataque.

A Sra. Mars era a mulher mais velha da vizinhança e talvez do mundo todo. A idosa costumava dizer que morava naquela mesma rua desde que nascera, o que era uma tremenda contradição, uma vez que ela tinha o dobro da idade do bairro inteiro e quase a mesma idade da cidade. Era provável que ela até mesmo fosse de outro país.

Todos diziam que a velha mulher perdera a sanidade depois da perda do marido que era soldado e fora morto quando servira em uma guerra. Dizia-se que ela era muito bonita quando jovem, no passado. Sasuke não saberia definir bem o que queriam dizer com "passado" uma vez que ele já conhecera a Sra. Mars idosa e viúva e ele morava naquela mesma casa desde que nascera, há vinte anos...

O Uchiha saiu de seus devaneios para desviar de outra bengalada, ele segurou o objeto firmemente, soltou-o lentamente em direção ao chão e depois fez um sinal com a mão indicando que a mulher parasse.

Ela parou, mas logo começou a falar apressadamente com o rosto contraído em desgosto. Devido a rapidez com que as palavras fluíam de sua boca, tudo o que o Uchiha entendera fora: 'Jovens, atenção, velhos e respeito' Com isso ele constatara que a mulher provavelmente havia falado com ele e não obtivera resposta. Por motivos óbvios, pois Sasuke não a havia notado até ser apunhalado por sua bengala.

Ele aprendeu a entender o que os ouvintes falavam através da leitura dos lábios quando tinha treze anos. Assim como também descobriu uma forma de interpretar o que elas queriam dizer sem precisar entender todas as palavras. Bastava captar algumas palavras-chave. Fora assim que interpretara Sakura na primeira vez que eles se viram. Ela falara as palavras 'Kakashi, sala e ajudar' Ele sabia que ela queria que ele a levasse até Kakashi, mas não vira necessidade disso já que o professor estava a caminho de lá.

Percebendo que a mulher parara diante de seu pedido, Sasuke gesticulou calmamente:

— Eu, Sasuke. Não, Itachi. — Ele sabia que a idosa não o entenderia, mas pelo menos saberia que se tratava dele e não de seu irmão coisa que a Sra. Mars confundia constantemente.

Assim como imaginou, um sorriso doce se abriu na face da mulher, ela se aproximou dele e levantou os pés para poder tocá-lo na bochecha depois se afastou e foi em direção à sua casa.

Esta era outra coisa curiosa a respeito da Sra. Mars, Itachi lhe dissera uma vez que ela o achava o próprio diabo e sempre lhe dizia para que não levasse Sasuke para o mesmo mau caminho pelo qual, supostamente, o Uchiha mais velho estava trilhando.

Ela achava que Itachi era um mafioso traficante de drogas e que só não havia expulsado o irmão de casa ainda porque o pobre coitado não podia falar para ninguém o que acontecia dentro daquelas quatro paredes. E que, sim, ela usara os termos 'pobre e coitado' para descrevê-lo.

Falando em Itachi... Sasuke deu mais uma olhadela em sua mão esquerda onde ainda dava para ver nitidamente o número de Sakura escrita em caneta marcadora preta. Colocou-a no bolso e entrou.

Sasuke não saberia dizer de primeira se Itachi estava em casa ou não, ele trabalhava em um escritório de advocacia no centro da cidade, mas era praticamente um autônomo, pois voltava para casa na hora que desejava e ia trabalhar quando fosse de seu agrado. Sasuke nunca entendera isso, ou Itachi era um advogado excepcional ou muito ruim, não sabia.

Passou pela sala e rumou para a cozinha, o irmão não estava em nenhum dos dois cômodos. Ele já suspirava de alívio ao subir a escada para seu quarto, mas não adiantou, pois topou com o outro na esquina para o corredor do segundo andar.

Ao ver o estado de Itachi, Sasuke ergueu ambas as sobrancelhas. O homem parecia ter sofrido um retrocesso de idade saindo dos vinte e quatro anos bem completos para os meros nove. Usava apenas uma cueca de seda samba-canção preta e chinelos. Na boca trazia um termômetro e na cabeça um saco térmico possivelmente contendo água quente. Também parecia não dormir há dias. A barba estava por fazer, mas aquilo, segundo o mesmo, era seu charme.

— Sasuke. — Itachi gesticulou o sinal que simbolizava seu nome. Fora a mãe que escolhera esse sinal para ele no dia em que conseguira aprender a língua de sinais plenamente. Era bem simples, mas, segundo Mikoto, também se tratava de algo bastante significativo: juntavam-se o dedo indicador e maior da mão direita e levava-os sobre o peito esquerdo e depois sobre os lábios. A Sra. Uchiha dizia que ele não falava com a boca, mas com o coração.

Mas este fora o único sinal que Sasuke não escolhera. No que dizia respeito à todas as pessoas que conhecia fora ele quem escolhera seus sinais: o da mãe eram três batidinhas com o indicador na face esquerda (pois ela sempre lhe dava três beijinhos ali quando o acordava, ou o colocava para dormir, dava banho e etc.), o do pai, Fugaku nada mais era do que o punho direito fechado sobre o coração, quase uma continência (talvez o fato de Sasuke sentir um pouco de medo do pai na época tenha influenciado-o a criar este sinal), o de Itachi era passar os dedos indicadores no rosto, abaixo dos olhos e descendo em diagonal, simbolizava as marcas de nascença que o Uchiha tinha.

Sasuke sabia que todos aqueles sinais eram infantis, pois os escolhera quando ainda criança, mas mesmo depois de mais velho não os mudou, seria como chamar a pessoa por outro nome.

— Qual o problema? — Sasuke gesticulou de sobrancelhas erguidas. Seu irmão parecia ter enlouquecido.

— Dor de cabeça e um possível resfriado. Nada de falar alto perto de mim, ouviu mocinho? — Rindo da própria piada infame saiu empurrando-o de leve no ombro ao passar por ele em direção a escada.

Ignorou prontamente o irmão E praticamente voou para o seu quarto, pois mesmo a visão bizarra de Itachi de cueca samba-canção em plena tarde de sexta-feira não desviou a atenção de sua mão esquerda que ainda estava em seu bolso e parecia formigar.

A primeira coisa que fez foi pegar o celular que deixara sobre a escrivaninha (ele nunca levava o aparelho para as aulas). Sentou na cadeira giratória e começou a virar de um lado para o outro enquanto encarava a mão, sua cabeça cheia de dúvidas.

O que ele deveria fazer? Anotar o número dela em um papel e usá-lo somente para marcar o local da monitoria? Ou salvar na agenda do seu celular e tentar, talvez, uma conversa...? Ela responderia à sua mensagem de texto? Ele deveria mandar uma mensagem de texto hoje, ou esperar para amanhã? Pareceria um idiota ansioso por estudos se mandasse agora?

Eram tantas questões que a sua cabeça parecia girar. Afinal de contas não era todo dia que uma garota corria atrás dele e anotava seu número de telefone na sua mão. Na verdade, isso nunca acontecia com ele e sim com seu irmão. Itachi com certeza saberia o que fazer. Ele sempre sabia.

Sasuke estava a ponto de ir de encontro ao mais velho para tirar suas dúvidas quando parou com a mão na maçaneta da porta de seu quarto. Que droga ele estava pensando? Ela só lhe dera o número por cauda da monitoria! Duvidava que fosse receber sequer um olhar dela se não fosse pela situação em que Kakashi os colocara. E ali estava ele a ponto de ir pedir conselhos ao irmão mais velho como se fosse a um encontro.

Por Deus. Ele era patético.

Afastou-se da porta e deitou de costas na cama alternando o olhar entre o aparelho celular e a mão com os números. Pegou-se se lembrando do dia em que Itachi resolvera que já era hora de ter aquela conversa com seu irmãozinho de quinze anos. Sasuke não ficara nada encabulado enquanto o irmão mais velho gesticulava animadamente como se sempre tivesse esperado por aquele momento. Sasuke sempre fora fissurado em todas as áreas da biologia, sabia claramente como os bebês eram feitos e essas coisas. Parecendo perceber isso, Itachi partiu para os conselhos mais práticos desde como fazer uma garota ficar amarradona nele até fazê-la odiá-lo caso ele não quisesse mais nada com ela. Quase todos esses conselhos passaram despercebidos por Sasuke, mais ele tinha de admitir que prestara atenção em alguns como, por exemplo, nunca ligar para a garota no mesmo dia em que conseguisse o número dela.

'Tecnicamente não estou quebrando as regras' pensou enquanto digitava o número na tela 'Afinal de contas não vou ligar... Só mandar uma mensagem de texto... '

Encarou a tela do celular, as dúvidas borbulhando. O que ele deveria escrever?

Testou:

"Oi, Sasuke aqui."

 Não. Ela com certeza nem saberá que se trata dele.

"Boa tarde, aqui cara da sua monitoria."

Também não. Cara da Monitoria? Que diabos...?

Aquilo estava se mostrando mais difícil do que imaginara. Era apenas uma mensagem!

"Oi, esse número meu. Sasuke."*

Apagou essa também.

Certo, talvez ele não devesse mandar agora, ela com certeza estaria ocupada com os amigos ou coisa do gênero. Bloqueou a tela do celular e colocou-o de lado. Pegou um bloquinho de anotações que estava devidamente posto ao lado do computador e um pincel azul na gaveta, olhou novamente os números na mão e passou-os para o papel, depois destacou a folha autocolante e grudou-a no pequeno mural que mantinha na parede contendo alguns cálculos, fórmulas e fotos. Não intitulou.

Encarou a folhinha amarela por alguns segundos e decidiu que teria que fazer outra coisa para matar o tempo e não cair na tentação de mandar uma mensagem à Sakura. Levantou-se e tirou a camisa, um banho seria muito bem-vindo.

Antes de seguir para o banheiro olhou a hora em seu despertador: 16h37min.

[···]

No fim das contas a mini-arraia-piolho fora mais interessante que seu fim de tarde no Free's e Sakura se viu contando as horas para a noite chegar e ela correr para o teatro e se sentir... livre!

Sim, esta palavra definia exatamente o que ela desejava enquanto estava sentada na sua mesa de sempre na lanchonete entre Gaara e Ino. A Yamanaka praticamente gritara com ela pelo sumiço e sequer afastara-se para que ela sentasse, mesmo sabendo que Sakura sempre ficava ali quando iam para lá. Na verdade, passou por sua cabeça que talvez a loira nem mesmo o fizesse se Naruto não tivesse comentado sobre o fato.

E as horas seguintes só pioraram a situação. Sakura podia sentir a pressão que parecia ter se instalado entre ela e a amiga, era quase palpável. É claro que ela sabia que Ino tinha essa mania de competição e essas coisas, mas nunca levara muito a sério as atitudes quase infantis dela, no entanto, há alguns dias, isso parecia ter se amplificado e multiplicado a implicância da outra para com ela.

Ino passara metade do tempo comentando como fora idiota a atitude de Sakura de enfrentar o professor e com isso acabar possivelmente prejudicando a equipe. Como se a Haruno já não tivesse sabendo disso.

Dado momento Sakura olhou a tela de seu celular, eram apenas 16h37min, e constatou que se Sasuke mandasse uma mensagem naquele momento marcando uma monitoria, ela iria sem hesitar.


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Notas finais do capítulo

* Lembrando novamente que o Sasuke meio que "come" algumas palavras quando escreve. Na verdade, isso também acontece quando se gesticula em Libras, mas se eu colocasse assim os diálogos ficariam muito bagunçados, então optei por não o fazer. Vai ficar só na escrita mesmo.



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