Inimigas escrita por Ariel F H


Capítulo 1
inimigas




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/733442/chapter/1

Foi como duas bombas explodindo ao mesmo tempo.

Piranha maldita vagabunda maluca

Filho da puta cretino

Piranha piranha piranha piranha.

Filho da puta filho da puta filho da puta.

Ela — eu não sabia seu nome, foi a primeira vez que a vi — era quem gritava mais alto. Tinha algo em seus gestos com a mão e o modo como sua voz preenchia o ambiente que me fazia criar cada vez mais empatia. Ele — o filho da puta cretino, porque concordo com essa descrição — parecia mais derrotado do que qualquer outra coisa e apenas devolvia os insultos porque era esperado e sua masculinidade precisava ser renovada.

Por alguns minutos — no mínimo três, acredito, minha passibilidade habitual afetou até mesmo isso — fiquei parada, de pé, apenas absorvendo as informações. Ela usava a mesma aliança que eu, mas eu sequer sabia seu nome.

Ele usava a mesma aliança que nós duas.

Algo dentro de mim acendeu. Eu a segurei pelo braço assim que ela levantou o dedo do meio para ele. Não resistiu, mas continuou gritando palavrões enquanto andávamos.

Nós paramos numa praça perto daquele restaurante que nos vimos pela primeira vez. Ele não veio atrás, graças a Deus, mas não cheguei nem a pensar que seria homem o suficiente para isso.

Sentou-se em um dos bancos, com os cotovelos apoiados nas coxas e a mão tapando o rosto. Não chorava, mas era como se estivesse. Eu entendia o que estava sentindo. Raiva, ódio, dor e outras centenas de coisas.

Fiquei parada de pé diante dela. Havia um gritante descompasso entre nós. Nada era comum. Suas roupas pretas — calça jeans rasgada, coturnos, regata de alguma banda de rock dos anos 70, jaqueta de couro — não se pareciam em nada com meu vestido branco de cetim. Eu jamais me imaginaria usando aquele delineador preto nos olhos ou aquele corte de cabelo curto. Talvez, se eu a olhasse de costas, poderia confundir com um menino.

— Quanto tempo vocês estão juntos? — perguntei. Precisava perguntar.

— Estavam. — corrigiu. — Quase um ano e meio. E você?

Cretino filho da puta.

Sentei ao seu lado.

— Três meses. — cretino filho da puta. — Eu sou a amante.

Ela me olhou de cima a baixo. Fixou os olhos no colar com pingente de Nossa Senhora Aparecida em meu pescoço. Reparei na tatuagem com o símbolo do anarquismo em sua clavícula.

Eu sou a amante. — ela disse. — Você é pra casar. Eu não.

— Ele estava com você antes de mim.

— Você é do tipo que os caras casam.

— Aparentemente eu sou do tipo que os caras traem.

— Digo o mesmo.

Nós nos encaramos.

Totalmente opostas, mas na mesma situação.

— Ele me disse que odeia tatuagens — comentei.

— Ele me disse que a única coisa que faria com uma cruz seria enfiar no meu rabo.

Ela tirou um maço de cigarro e um isqueiro do bolso. Fiquei ao seu lado enquanto fumava, mesmo que eu odiasse o cheiro e soubesse que aquilo ficaria em mim por horas. Levantou o dedo que estava com a aliança, mostrando para mim.

— É de prata legítima. A sua também. Dá uma nota. Tá afim de beber alguma coisa?

Tirei o anel do meu dedo. Ela fez o mesmo e entregou para mim. Olhei para as duas na palma de minha mão.

Eu não bebo. Talvez tenha bebido um ou dois goles de champanhe em festas de ano novo com a família. Odeio álcool. É fedido e tenho medo de como ficarei se beber demais. Eu provavelmente perderia o controle.

— Sim. — respondi.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!