The White Rose escrita por Senhora Darcy


Capítulo 6
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

Boa Leitura!



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Ja era fim de tarde quando uma batida me despertou do sono em que eu estava. Era Gregory à minha porta, trazendo uma tigela de sopa. Ele entrou com um meio sorriso e veio até a cama onde eu estava.

— Estão todos bem? – quebrei o silêncio. – Precisam de ajuda?

— ah, bem, o Capitão e o Marreta estão com uns ferimentos mais serios, mas já tomaram os cuidados. De resto estão todos bem.

— Roger?

— Já fizemos o funeral e uma homenagem a ele. Não quis te acordar.

— Tudo bem. – eu disse, tristonha.

— Ei, não se preocupe. Roger era novo na tripulação e ninguém tinha muitos laços com ele. Vamos ficar bem. – ele disse e eu achei o comentário um tanto quanto maldoso – além disso, isso é mais comum do que você imagina. Estamos acostumados.

— Ah, sim. – disse vagamente, sem encara-lo.

— Olha....me desculpe. Pelo que eu disse. Não quis assusta-la. Apenas fiquei irritado porque você poderia ter morrido. E eu não sabia o que você tinha feito. Foi muito corajoso. Aliás, você foi muito corajosa hoje. Ao voltar para nos ajudar e depois se jogando no mar. Apesar de que eu não sei o que você pretendia com aquilo. Acho que foi isso que me atiçou, ver você se jogando para a morte certa.

— Obrigada por pular também, aliás. Salvou minha vida. – eu disse e ele sorriu.

— O que você fez lá em baixo...não direi a ninguém, mas saiba que não foi errado. Ele teria matado ou a você ou a mim.

— Eu sei.

— Sei como é difícil matar alguém pela primeira vez, Ainda que tenha sido um porco como ele... E admito que terá alguns pesadelos em breve, mas irão passar. Sempre passam. E, bem, pode conversar comigo se quiser.

— Obrigada, Gregory, de verdade.

Fez-se um silêncio, e eu sentia que ele estava tentando decidir se dizia algo ou não.

— Katherine.... Aquele homem... a machucou? – ele perguntou, envergonhado.

— Não. – eu disse após um tempo – ele tentou mas não conseguiu.

Gregory sorriu amargamente.

— Você é mais forte do que eu achava. Sabe se virar muito bem sozinha. Me desculpe por não te proteger. Era a minha função.

— achei que sua função era não me deixar escapar.

— Você precisa estar viva para fazer isso.

Eu ri e concordei. Fiz algum movimento que lhe chamou atenção, e ele arregalou os olhos para mim. Tocou meu pescoço com cuidado, onde eu percebei depois que havia um talho não muito profundo, mas extenso, que ia até minha clavícula.

— Eu estou bem, não se preocupe.

Eu disse, em vão, pois Gregory me ajeitou a sua frente para me examinar. Observou o corte, meus braços, meu rosto... Abriu meu vestido num movimento só e eu me exaltei.

— Desculpe... eu só queria ver se suas costas estão feridas...não quis assusta-la.

— Tudo bem. – tranquilizei-o e arrumei meu vestido, deixando minhas costas expostas mas cobrindo todo o resto.

Gregory passou as mãos de leve por toda a superfície de minha pele, me fazendo arrepiar. Ele percebeu e riu, me provocando mais ainda. Me contorci com a sensação.

Olhei meu reflexo no espelho e dei uma risada irônica.

— Sabe, eu passei minha vida me preocupando em estar sempre bonita e impecável. E agora, ganhei uma baita cicatriz bem na clavícula. É como se arruinasse toda a beleza que eu trabalhei a minha vida toda para manter.

— Não acho que esteja arruinada. – Gregory afirmou, se aproximando.

Ele encostou os lábios no começo do corte, e seguiu toda sua extensão com o dedo, tocando apenas a pele ao lado da ferida. – Acho até que fica melhor assim. Te dá um ar mais...selvagem e perigoso.

— Acredite, depois de tudo que eu vi hoje, estou bastante selvagem e perigosa! – brinquei ao que ele riu. – o que foi isso? – perguntei me referindo ao beijo.

— Ah, apenas uma coisa minha. – ergui uma sobrancelha – minha mãe costumava fazer isso. Ela dizia que quando há alguém cuidando de nos, as feridas saram mais rápido.

— Ela deve ter sido uma moça muito inteligente. – ele concordou. – Você nunca me disse como veio parar aqui.

— Claro que disse! Meu tio me...

— Sim, mas eu digo, como veio parar nessa vida? Você é diferente dos outros. Não posso acreditar que nasceu na pirataria.

— É verdade, não nasci. Mas isso é uma história dramática que fica para amanhã. Você já teve muito drama por hoje. Descanse um pouco.

— Se eu descansar mais um pouco, vou entrar em coma! Dormi a tarde toda. Preciso sair um pouco. Criar vergonha na cara e ajudar os outros. – Declarei me levantando, o que quase fez com que o vestido caísse revelando tudo que Deus me deu.

Gregory desviou o olhar e ficou vermelho, mas se levantou e esperou que eu me aprontasse. Encontrei-o ali fora e fomos juntos para a cozinha.

Chovia forte e todos os homens se amontoavam na mesa de madeira, quietos como nunca. Eu entrei e senti, pela primeira vez, um clima mais leve quando eu entrava na sala, e Pinsley e Rupert até sorriram pra mim.

— como esta princesa? – o primeiro perguntou.

— Vou ficar bem.

— É claro que vai! Essa dai é dura de matar! Caiu até no mar com o inimigo e está aqui pra contar a história! – Rupert comentou e todos riram um pouco.

— Não mais do que você, Rupert! – brinquei e o clima se suavizou mais um pouco, apesar de todos ainda estarem um pouco triste.

Comemos tranquilamente, sem o silêncio total mas sem a barulheira de antes. Ao final do jantar, Rupert pegou seu banjo e tocou algumas músicas sem letras. Ninguém reclamou.

O barulho da chuva porém, Ainda era mais forte e todos fitavam o chão. De certa forma, me deu uma tristeza ao ver os rostos antes animados e empolgadas até demais, agora cabisbaixos.

Pensei também no pobre Roger. Apesar de não termos tido muito contato, ele se mostrou bem solicito em me ajudar e parecia ser uma pessoa boa, gentil e de bom coração.

Lembrei-me de uma canção que Anelize cantará para mim quando meu tio faleceu. Era bem curta, como um mantra, e parecia se encaixar ali. Tomando coragem para me expressar, comecei o primeiro verso baixinho. Alguns homens olharam em minha direção, surpresos.

 “A chuva é a vontade do céu de tocar o mar,

 E a gente chora assim também, quando perde alguém.

Quando começa a chorar...começa a desintristecer,

E assim se purifica o ar depois de chover”

 

A música repetia esses quatro versos, e eu cantei umas duas vezes sozinha, para então ser acompanhada por Rupert e Aldo. Alguns outros cantaram também. Assim a música seguiu até que a atmosfera melhorasse um pouco. No meio da música, me lembrei de meu tio involuntariamente. Acabei derrubando uma lágrima, mas logo me recuperei.

— Uma bela voz você tem, princesa. – o capitão comentou.

Outros concordaram.

— Obrigada. Minha...amiga me ensinou. Quando eu perdi meu tio. – disse, sem saber exatamente o por que de contar aquilo.

Pinsley, que estava ao meu lado, colocou uma mão sobre meu ombro, como conforto. Logo Rupert lembrou-se de outra canção e pôs-se a cantar novamente com seu banjo desafinado. Não demorou para o sono me alcançar e eu desmaiar nos ombros de Gregory.

No meio da noite, acordei com pesadelos. Todos eles envolviam o homem que eu matara. Fui até a cozinha Tomar algo na esperança de ter um sono melhor. Lá encontrei Betrus. Ele sorriu para mim, e me ofereceu uma caneca do chá que estava tomando.

— Não consegue dormir?

— Não. – respondi – Não sem pesadelos.

— Sim. Bem, o primeiro é sempre o mais difícil. – Temendo que ele soubesse do meu crime, arregalei os olhos – Sim, eu sei. Mas Gregory não me contou. Eu vi nos seus olhos a hora que subiu de volta no navio. Não é algo fácil de esconder, principalmente para garotas puras como você.

— Puras como eu? É essa a imagem que tem de mim? Uma princesinha tola, angelical, inocente e pura? – Ele assentiu, rindo com a minha revolta – Bem, a vida no palácio está longe de ser perfeita, e eu, longe de ser inocente e pura. Aqui pode ter muita violência, mas lá os segredos assolavam a vida de todo mundo. Ninguém é inocente, ou bondoso. Todos são culpados e interesseiros.

— Bem, certamente não é a imagem que passam. Minha irmã mais velha mora na vila em frente ao palácio e só me conta sobre as mil maravilhas que acontecem por lá.

— Sua...Irma? Você tem...

— Família? Sim, todos temos. – ele riu – Mas e bem verdade que poucos têm contato como eu. Não fui sempre um pirata, sabia?

— Jura?

— Sim. Éramos em nove irmãos e vivíamos com meu pai numa fazenda no  interior de Sussex. Mas aí meu pai bateu as botas, e nós vendemos a fazenda, dividindo o dinheiro. Minha irmã se ajeitou na vila, um outro irmão se alistou ao exército. Se não me engano, minha irmã mais nova casou-se com outro fazendeiro é uma outra foi trabalhar numa casa da nobreza. O resto eu duvido que esteja vivo. A vida não é nada fácil fora do Castelo também.

— Mas...e voce? O que fez? – perguntei ao que ele riu sarcasticamente.

— eu? Depois de ser largado pela minha mulher, na época, me afundei de bar em bar até que conheci um outro capitão em Hastings, uma cidadezinha não muito diferente daqui de Brighton. Fiquei com ele até que o Capitão Tatcher atacou nosso navio e matou o Capitão. Então me juntei a tripulação daqui.

— Se juntou com o homem que matou seu Capitão?

— Sim, bem. Não era nada pessoal. Se eles não nos tivessem atacado antes, nós teríamos invadido o navio deles. Foi uma questão de inteligência e sagacidade, coisas que eu aprecio muito num homem. – ele contou e depois acrescentou:- ou numa garota como você.

Eu ri e ele beliscou meu nariz, com um estranho jeito paternal.

 - Sim, Garota, pensa que não reparamos no que você fez? Vi quando voltou para nos ajudar e depois quando se jogou do navio. Foi estupido e não entendemos direito o porque. Mas foi corajoso, e duvido que você tenha feito aquilo por adrenalina.

— Bem, eu tinha um plano. Mas o homem que me segurava não cooperou. Veja bem, eu não tinha muitas opções. Se eu me mexesse, ele me degolava, se eu não fizesse nada, ia sofrer muito nas mãos daquele canalha. Pensei que na água, talvez eu tivesse uma chance de nadar para longe e me soltar. Aprendi a nadar desde pequena.

— Realmente, faz sentido. Agora. – Ele riu. – De qualquer forma, mudou a forma com que pensávamos sobre você.

— Gregory me ajudou um pouco nisso.

— Ah, mas o crédito é seu. Você impressionou o rapaz, e acredite quando eu digo, que isso é para poucos. Acho que ele confia em você mais do que em certas pessoas daqui. Ele já contou do pai dele?

— Pai? Ele não disse nada sobre o pai.

— Bom, ira dizer. É um assunto delicado para ele, mas sempre acaba contando, eventualmente. Mas não diga para ele que eu te contei isso, esses seus olhinhos verdes estão me fazendo ficar molenga como um maricas!

Ele mesmo riu e eu o acompanhei. Terminamos o chá em silêncio.

— Hm, Betrus...

— Sim. – ele respondeu sem olhar para mim, os olhos perdidos em algum lugar próximo ao pé da mesa.

— Você gosta dessa vida? – perguntei, pegando-o de surpresa.

— Não me falta nada importante. – ele respondeu -  mas também não tenho nada com o que me importar.

— Hum.

— Vamos dizer que você nos abriria muitas portas.

— Portas para a riqueza?

— portas para fora daqui. – ele respondeu e fez-se um silêncio. – Eu gostava de lá, sabe?

— Da fazenda? – ele assentiu.

— Tive uma infância da qual poucos puderam gozar. A casa não tinha muitos andares, nem móveis luxuosos. Mas tínhamos muitos quartos e uma mobília que meu pai e meu avô haviam feito. Plantávamos trigo, milho e algodão. Na época de colheita, o sol batia de manhã e à tarde, deixando tudo dourado. Havia um lago onde eu e meus irmãos pescávamos, um estábulo é um celeiro. Minhas irmãs cuidavam dos animais, e nos cuidávamos delas. A mais velha de nos tinha 10 anos de diferença para a mais nova. Éramos todos muito próximos, onde estava um, estavam todos. De manhã, o cheiro de pão sovado era sentido de toda a propriedade e a tarde nos juntávamos todos para comer brioches. Um professor da cidade vinha aos domingos para ensinar meus irmãos mais velhos a ler. Eu não alcancei a idade suficiente para ter aulas também, antes de meu pai falecer.

— Sente falta? Dos seus irmãos?

— Sim, sim. Mas não sinto vontade de vê-los agora. A vida pode ter sido dura demais com alguns deles. E não seria a mesma coisa. Prefiro ter à memória a imagem de todos nós correndo no milharal numa tarde de sábado. Com as vacas mugindo ao fundo e o cheiro de brioches ao forno.


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Notas finais do capítulo

(;

P.S.: esse cap´tulo tem a participação especial da música de MArcelo Janeci "A Chuva"



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