Senhora da Alcateia escrita por MHFerreiraFDR


Capítulo 2
Nem Sempre São Como Pensamos




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Após a descoberta Aurélia ficou tão surpresa quanto ficaria se dissessem que peixes nadam fora d’água. Seres sobrenaturais não podem existir. Lendas são apenas lendas. Era muito para processar: havia descoberto recentemente que é uma lobisomem e, também, que Fernando, até então sua paixão, era um caçador. Aurélia não sabe exatamente como esse mundo funciona ou, se em algum momento, acordará desse pesadelo, mas, uma coisa ela sabe: se Fernando for mesmo um caçador, haverá um abismo ainda maior entre os dois. A jovem decidiu ir se afastando vagarosamente do casebre, mas no meio do caminho tropeçou em um tronco de árvore quebrado e caiu causando um estrépito. Fernando que, encontrava-se próximo ao local, saiu correndo em disparada com medo de que, algum de seus familiares, houvesse ferido Aurélia, assim como escutou que fariam a mando de Lemos. Quando percebeu a aproximação de Fernando, o instinto da menina foi de se esconder, mas era tarde demais.

— Aurélia! – Sussurrou com tom de alívio próximo a garota.

— Se for me entregar, faça agora! Não finja estar feliz por me ver bem, agora que já sei quem vocês são. – Ela disse de forma arisca.

— Se fosse te entregar, já o teria feito. A senhorita não foi nada silenciosa em sua fuga, diga-se de passagem. – Disse ficando aborrecido.

— Diga logo, o que você quer? – Aurélia disse incisiva.

— Apenas ajudar-te, já os meus tios querem exatamente o contrário. – Sussurrou após escutar um estrondo ali perto.

— Eu te suplico, não diga a ninguém que me viu aqui. – Pediu a menina com um olhar penoso.

— Não te deixarei sozinha nesse estado. Vamos, se apoie em mim. – Ele disse de volta ao seu tom tranquilo.

— Dispenso a ajuda de um caçador. – Aurélia voltou a seu tom ríspido.

— Não te deixarei sozinha mesmo assim, Senhorita Aurélia. Apenas me diga uma coisa, porque meus familiares e Lemos estão te caçando? – Ele disse tentando manter a boa educação e a paciência, embora estivesse nitidamente ficando aborrecido.

— LEMOS? – Ela gritou.

— Fale baixo, a senhorita por acaso é louca? Se nos pegarem, farão o que quiserem com você e eu serei banido antes mesmo de me tornar um caçador. – Ela apressadamente calou-se e decidiu seguir o caminho com Fernando, mas era orgulhosa demais para aceitar a ajuda oferecida.

Os dois já estavam caminhando há muito tempo, sem qualquer tipo de aproximação ou contato, quando a enfurecida Aurélia percebeu que seria estúpido ignorá-lo, principalmente quando ele ficava encarando-a com aqueles olhos lindos.

— Afinal, por que mesmo você quer se tornar um caçador? Digo, com tantas coisas proveitosas, por que caçar pessoas? – Perguntou enfim.

— Aurélia, não caçamos pessoas. Caçamos criaturas monstruosas. – Ele disse de forma impensada.

— Então é isso que você me considera, uma mera criatura monstruosa? – Ela disse magoada, por mais que concordasse.

— Não, Aurélia. Você é apenas uma senhorita perdida, disso eu tenho certeza.

— E como você pode ter tanta certeza? Você nem ao menos viu minhas garras. – Disse mostrando para Fernando as mãos que vinha escondendo desde então, mas ele esboçou reação alguma. 

— C-omo assim? Não é possível...

— Agora você irá me entregar? – Aurélia perguntou prevendo a pior resposta. Fernando ainda confuso, e sem saber se deveria ser fiel à seus tios ou ajudar uma jovem que ele sabia ser do bem, apenas ficou calado. – Fernando, ás vezes o silêncio é suficiente. – Aurélia disse e saiu correndo floresta afora, sem se importar com o pé machucado, e Fernando apenas observou a linda moça partir.  

Algumas horas depois, a jovem menina já não possuía forças para correr ou sequer caminhar, sem qualquer alimento e também sem saber controlar seus instintos de lobisomem, ela nem ao menos conseguiu curar o pé. Segundo todas as lendas que escutou sobre lobisomens, uma das principais características é a de cura. “Sou uma criatura tão fajuta que não posso nem ao menos me curar?” era a indagação que ela se fazia. Aurélia avistou pequenos cogumelos tão lindos que pareciam mágicos, e como a jovem pueril que era, comeu os cogumelos sem pensar duas vezes. Alguns minutos após ingerir os cogumelos tudo que conseguia visualizar era: ela e Fernando em um piquenique matinal, embaixo de uma enorme quaresmeira, sorrindo e dividindo uma maçã.

Aurélia começou a sentir o balançar de seu corpo, mas, mesmo alterada ela sabia que não estava andando. Então quem a estava levando? Fragmentos de seu sonho se misturavam com a realidade e a jovem não sabia distingui-los. Abrindo os olhos lentamente, tudo que foi possível enxergar era o borrão da silhueta de um brutamontes que a carregava. Aurélia tentava gritar, mas nada saía. Era como se tivesse sido desligada, simples assim. Tudo que conseguiu foi cantarolar: “...um pouco tarde demais, você pode me salvar? Para onde vamos quando andamos na luz?”, e então apagou de vez.


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Notas finais do capítulo

O nome da música citada no capítulo é "Don't Let Me Go".



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