Os dedos dançavam inconscientemente sobre as teclas brancas e pretas do piano e sem perceber uma melodia submersa na angústia e paixão ecoava pela sala fechada. O que estava sentindo? Era difícil de distinguir, mas essa explosão de emoções o guiava na criação dessa nova música. Ele costumava compor músicas quando era pequeno, mas desde que havia conhecido ela, todas as suas músicas agora precisavam dela. Como poderia explicar o que sentia quando tudo o que queria era ouvi-la cantar. Mais que isso, queria ela fosse a sua voz, que ela cantasse todas as suas músicas, que estivesse sempre ao seu lado na In No Hurry e que fosse para sempre a sua Alice. Mas sabia que isso era impossível, já existia um alguém muito mais especial na vida dela chamado Momo. A razão para que ela cantasse era apenas ele, Momo. Tudo que ela fazia era para que sua voz o alcançasse e o trouxesse de volta para perto dela. Era uma espécie de mensagem repleta de saudade e amor apenas para Momo. Seu amado amigo de infância, mesmo assim ele conseguia ser um idiota e fazer a sua Alice sofrer e duvidar de si mesma.

Vê-la chorar era doloroso de mais para Yuzu e para proteger o seu sorriso, ele tentava estar sempre ao seu lado. Havia prometido para si mesmo que seria apenas seu amigo, no entanto por mais que tentasse fingir ou ignorar havia outro sentimento muito mais intenso que nutria por Alice. E seus esforços sempre eram em vão quando o destino lhe dava a ilusão da esperança. Nessas horas ele sempre acabava agindo por instinto e estragando tudo que havia prometido para si mesmo. Eram palavras ou ações que não deveriam ser ditas em horas importantes, sempre acabava fazendo isso, mesmo que se desculpasse ou contornasse a situação, isso nada mais era que um grito silencioso de Yuzu. Um grito que ele desesperadamente queria ela ouvisse, que o notasse. Mas sua Alice estava ocupada de mais cantando cada vez mais alto para outra pessoa. E as tentativas de Yuzu pareciam com sua própria voz enquanto tentava cantar, silenciosa e falha. No final das contas ele não podia mais cantar e por mais que tentasse que seus ruídos descompassados chegassem nela, eles jamais a alcançariam.

Como queria ter coragem de poder contar sobre seus verdadeiros sentimentos... porém depois do incidente do beijo roubado a situação entre os dois só tinha piorado. Yuzu precisou mentir e ignorar seus próprios sentimentos, a rejeição não era nada comparada com a distância, vê-la se afastar e destruir tudo que haviam construindo juntos desde seu reencontro. Não poderia suportar.

Por mais que desejasse lutar por ela, não havia espaço para ele. Isso havia ficado claro depois do festival Inohari, quando tudo que ouviu na música de Alice era um desesperado ”Eu te amo” para Momo. E o pior, era vê-lo com sua Alice, mesmo que ela estivesse dormindo na ocasião ele havia tido a ousadia de beija-la sobre a máscara que ela sempre usava. Yuzu pode ver que Momo ainda era apaixonado por Alice. Era uma questão de tempo, o que ele poderia fazer? Nada, não tinha nada a ser feito. A única coisa que poderia fazer era desistir desse amor, era óbvio que os dois se amavam.

De repente uma lágrima caiu sobre as teclas do piano, fazendo-o parar de tocar. Yuzu tocou a face molhada. Ele estava chorando? Quando isso...? E um sorriso forçado surgiu em seu rosto. Deveria ser assim... era o certo a se fazer. Não poderia ser um verdadeiro amigo se não deixasse esses sentimentos irem embora. Ele precisava proteger o sorriso dela...

As lágrimas inundavam seus olhos, ele queria gritar bem alto, mas sua voz não iria acompanhar a dor e o sofrimento que estava sentindo. Então Yuzu fez a única coisa que poderia fazer, voltou a tocar o piano. Seus dedos apertavam as teclas em tamanha ferocidade repleta de desespero e agonia, um som saturado de tristeza e melancolia, mas bem no fundo das notas se ouvia uma pitada de paixão. Ele poderia não gritar e não cantar, mas essa era sua forma de expor e colocar todos esses sentimentos para fora. Era sua uma despedida.

— YUZU...!!!

A porta da sala se abriu num estrondo, ele se virou assustado, mas reconhecendo aquela voz.

— Alice...? – ele pronunciou surpreso.

Ela estava ali, parada na porta com os olhos marejados, sem a máscara cobrindo o rosto e parecia tão ofegante.

— Yuzu... Yuzu... – ela pronunciou em uma voz um tanto chorosa enquanto se aproximava do compositor. – Eu não quero que Yuzu vá embora!!!

Yuzu arregalou os olhos surpreso, será que ela havia o escutado finalmente? Sua voz tinha chegado até ela? Que coisa mais irônica era o destino, mas algo dentro dele não podia deixar de ficar feliz. 

— Do que está falando, Alice? Eu não vou a lugar nenhum. – ele sorriu gentilmente, parecia que não ia poder desistir dela hoje. Ele ia continuar tentando torna-la a sua Alice.


Fim~