Lola nunca fora uma criança acostumada com mimos ou regalias. Ela sempre foi a garota alta invejosa no fundo da sala, vestindo roupas que eram passadas de sua irmã mais velha para ela, com remendos em linhas pretas e brancas. Lola nunca fora acostumada a ter algo que era somente seu, por isso quando ela cai de amores por alguém comprometido, sua consciência ri da ignorância em pensar que aquilo nunca aconteceria com a garota invejosa que ela era. A jovem de cabelos longos e loiros beija e arranca suspiros de alguém que usa uma aliança que não contém o seu nome dentro. Ela tira as roupas e faz sexo em um lugar pago por hora com alguém que nunca será dela. Com alguém que já ama outra pessoa.

Lola era só uma garota invejosa, que gostava de tomar o que era dos outros, e esconder em seus bolsos fundos quando criança. Não era de se admirar que ao completar seus vinte anos, a mulher de curvas expansivas fosse se tornar nada mais do que uma amante.

A outra mulher.

É um bom título para Lola.

É o máximo que ela já ganhou alguma vez na vida.

X

Ela nunca foi uma garota da manhã, ainda mais manhãs frias de Inverno. Mas aquela em questão a fez saltar da cama, vestir roupas confortáveis, e quentes, e se embrenhar em um carro que tinha muitos cavalos de potência, e vidros escuros. O homem ao lado dela apenas lhe sorri, e lhe diz que estará livre a maior parte da manhã. Lhe diz a mentira que usou para enganar uma mulher a qual Lola nunca perguntou o nome. Não por achar que não era importante, mas por achar que se ela fingisse por alguns minutos, o homem ao lado dela seria só dela.

É uma manhã fria de inverno, e os cabelos de Lola estavam gelados e enrolados nas pontas. Gregory – ou o homem ao volante – enrola uma delas em seu dedo, e lhe diz antes de beijar os lábios pintados de vermelho o quanto ela é bonita.

Está frio demais naquela manhã, e tudo que Lola consegue pensar é: “Eu queria um café quente.” e “Por favor, não me deixe.”

X

Lola podia ser muitas coisas, mas ela não era uma menina burra. Isso ela nunca foi. Talvez um pouco ingênua em suas atitudes, e na maneira de confiar sempre nas pessoas não importa o que os outros digam. Mas burra, Lola se orgulhava de nunca ter sido.

Por isso, quando Gregory desliza sobre a cama com ela, e sussurra que vai deixar sua mulher por um jovem garota de vinte anos, Lola sabe que é mentira, e que ela seria muito burra por acreditar naquilo.

Ela é a aventura que Gregory está tendo depois de tempos de marasmo, e depois que a adrenalina se dissipar no seu sangue, ele vai embora.

E Lola não é burra a ponto de pensar ao contrário.

X

Ela conhece a esposa em uma segunda-feira antes de um feriado prolongado. A mulher a frente dela tem os cabelos pretos cacheados longos, caindo em uma cascata perfeita sobre as suas costas. Os quadris são largos, e os seios volumosos. Ela se veste como Lola nem ao menos imaginou se vestir na vida.

Lola descobre que o nome dela é Valquíria, e que ela dá aulas de balé.

Lola chora no banheiro da festa em que está até a mascará em seus olhos borrar toda a sua bochecha.

“O que foi, menina?” Ela escuta a voz de Valquíria lhe perguntando enquanto ela está sentada no chão do banheiro gelado.

E tudo que Lola quer pedir é desculpas.

X

Ela nunca foi uma garota cristã. Mas naquele dia em que o sol resolve sair e agraciar por algumas horas as pessoas com o seu calor, Lola se pega dentro de uma igreja. Os joelhos espremidos no chão por causa do seu peso, e o seu coração em pedaços em suas mãos calejadas. Ela quer rezar para alguém em específico, mesmo sabendo que esse alguém não é nenhuma divindade, mesmo sabendo que esse alguém merece um pedido de desculpas, e não um pedido de ajudas de uma garota quebrada.

“Valquíria, me perdoe.” É tudo que seu peito quer falar, é tudo que ela consegue dizer seja em voz alta ou em sua mente.

Me perdoe.

Me perdoe.

Me perdoe.

X

Algumas mulheres nascem para amar errado, e vão contra os seus desejos. Algumas mulheres amam de maneira certa, e são felizes. Algumas mulheres estão quebradas. Algumas mulheres são estrelas perdidas em uma vasta galáxia cruel. Algumas mulheres usam anéis de diamante como bandeira de seu orgulho. E algumas mulheres são como Lola.

Lola é uma garota invejosa.

Ingênua.

Lola quer beijos violentos, e camisas azuis-escuras que custam caro demais. Lola quer bancos de couro de carros velozes. Lola quer manhãs de inverno preguiçosas.

Isso é tudo que Lola fez a vida toda.

Querer.

Desejar.

Mas Lola nunca possuía nada. Porque Lola não tinha nada para dar em troca.

X

Quando ela descobre que Valquíria será mãe, ela sabe também que é a hora de dar um adeus definitivo a Gregory, ela sabe que é hora de colocar os seus trilhos em funcionamento novamente. Ela sabe.

Lola sabe muitas coisas.

Mas Lola não consegue dizer não a ele. Lola então arrasta seus lábios vermelhos mais uma vez sobre os do homem, e jura amor eterno em sua mente há alguém que nunca vai ficar pra a noite, alguém que nunca vai segurar sua mão em público, alguém que ela apenas rouba instantes que deveriam ser doados para outra pessoa.

Lola pinta as unhas de vermelho naquele dia, e deita em sua cama em uma noite fria de Inverno.

Ela é a outra mulher.

E esse é o título que ela mais odeia.