Pecado escrita por Rosecchi


Capítulo 3
O Preço de uma Moeda


Notas iniciais do capítulo

*Desvio das pedras e dos tijolos*
Tá bem! Tá bem! Fiz "promessa de político"? Sim e não, já que tô cumprindo (depois de 500 anos...)
Sei que você vai dizer que esperou o cometa Halley passar pra depois receber essa $&+#&... Mas eu juro pela fé da Santa Cecília que o próximo eu vou compensar! Mesmo que eu só poste depois da passagem do Hyakutake. (Astrônomos entenderam)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/731735/chapter/3

A mulher que tinha pego o dinheiro daquela jovem freira andou mais alguns metros até avistar um grupo de comerciantes que colocavam suas mercadorias em vagões das carroças que estavam paradas próximo a eles. Sabendo bem para onde iria aquela caravana, escondeu o dinheiro entre suas grossas vestes e facilmente entrou num dos vagões, se camuflando entre os comerciantes —  se bem que ela era, mas não tinha um comércio ambulante — e esperou o tempo necessário para os outros estarem prontos e partirem.

Não foi necessário esperar tanto, pois em menos de trinta minutos, todos se prepararam para saírem da cidade parisiense. Foi uma hora, apenas ouvindo o som dos trotes dos cavalos e algumas conversas aleatórias na sua e na carroça vizinha, a mulher olhava para o cenário noturno de outras cidades, passando por áreas ricas, onde sonhava em viver um dia, e áreas mais pobres e miseráveis, cujas ela agradecia por não estar na pele daqueles que viviam ali. Com esses pensamentos, a mulher acabou por pegar no sono e dormir; ainda tinha muito chão para passar e demoraria mais algumas horas, quem sabe até o amanhecer, até que chegassem no destino.

O céu estava num tom azulado claro, anunciando a alvorada, quando a caravana chegou no seu destino. A mulher, cansada, saiu e andou a pé mais alguns metros até chegar a uma rua estreita, com barro ao invés do chão de paralelepípedo. As casas daquela vizinhança eram simples, porém poucas tinham um ar mais nobre, com as paredes bem cuidadas e os telhados sem frestas e resistentes contra os rigorosos invernos; que, por sinal, já estava próximo. Sua casa ficava quase no fim da rua: as paredes brancas já estavam gastas, com os tijolos à mostra, devido ao tempo sem uma boa pintura; as portas da frente e dos fundos de madeira velha, porém resistente e conservada; o espaço no seu interior era grande o suficiente para abrigar cinco pessoas, com os cômodos bem separados. A mulher entrou e soltou um suspiro de alívio, antes de colocar o dinheiro numa gaveta do seu criado-mudo, ir para sua cama e enfim dormir.

Mais tarde, o Sol das nove horas raiava em meio às nuvens quando a mulher, sentada em frente à mesa, fez seu desjejum com pão de aveia e água. No silêncio, apenas com o som dos pássaros e das eventuais carroças que passavam na frente de sua casa, ela saiu com um vaso de metal e foi até um poço no fim da rua, pegando o suficiente da água dali, enchendo o vaso. Voltando para casa, despejou a água na tina, mais especificamente no quintal, antes de pegar uma pilha de roupas sujas e utilizar a água para lavá-las. No momento em que estava estendendo o lençol, ouviu sua vizinha chamando-a do outro lado da cerca de barro, que separava o terreno de ambas mulheres.

— Bom dia, Arlete! Estou indo ao centro da cidade em busca de alguns produtos para fazer o almoço de hoje. Deseja algo de lá?

— Ah, Edite. — A mulher parou o que estava fazendo e virou-se para responder a sua vizinha. — Agora que falou... Sim, vou precisar de lã. Pode conseguir para mim, por favor?  

— Com prazer! Apenas isso, estou certa?

— Exato! Não estou com muita coisa em falta atualmente. Espere um pouco... — Arlete praticamente abandonou a tarefa e foi para dentro de casa, pegando um pouco do dinheiro que tinha recebido e saiu para entregar à outra mulher. — Aqui está. Creio que seja o suficiente...

— Sim. Garanto que dê mais do que o quanto precisa! — Sorriu Edite, pegando o dinheiro entregue. Mas o sorriso dela foi sumindo em questão de segundos e então, olhando novamente para a vizinha, perguntou: — Escute, Arlete, você não tinha dito que tinha pouco dinheiro anteontem? Como conseguiu tudo isso apenas com a venda de uma boneca(3)? 

— Edite, não precisa de tanta desconfiança. Esqueceu que minha filha está a trabalho em Paris? Ela, mensalmente, me dá um pouco do que recebe.

— Ah, certo! E em que profissão ela atua, mesmo?

— Ajuda comunitária. — Respondeu rapidamente. — Recebe-se mais do que imagina! 

— Verdade? —Edite reagiu com empolgação. — Interessante... — Ela voltou a ficar séria, embora ainda com um sorriso, seu tom estava com pouca ou nenhuma emoção. — Bem, conversemos depois. Ainda tenho coisas a fazer além de ir à cidade... Até logo!

A mulher se despediu sorrindo abertamente e desapareceu ao atravessar a velha porta de carvalho. Arlete, por outro lado, voltou à pilha de roupas e continuou a limpar e a pendurar, uma por uma. Trabalho esse que demorou meia hora para terminar. Uma vez finalizado, ela se preocupou com os serviços de sua pequena horta, onde tinha legumes, frutas, umas ou outras plantas medicinais, como chá, e flores.

Arlete possuía os cabelos curtos, pretos e encaracolados, com um ou outro fio grisalho, que insistia em cair pelo seu rosto, que continha rugas e olheiras superficiais, difíceis de serem vistas de longe, apesar da pele clara, de bochechas levemente coradas. Embora o aspecto jovial, ela estava nos seus 38 anos, viúva e mãe de uma única filha, cuja esta foi enviada à Catedral, sendo, atualmente, freira de lá. Bateu uma certa preocupação ao lembrar dela. Mas cria que ela estava bem, uma vez que nada de mal poderia acontecer... A mãe esperava. 

Uma vez terminada sua colheita, Arlete fez seus serviços domésticos; varrendo a casa e limpando uns ou outros objetos. Coisa que sua filha também fazia em Paris, com suas duas, agora, amigas e sob a supervisão das Irmãs Adelaide e Rebeca. 

Em pouco tempo, as dezoito novas mulheres da Catedral, sem exceção, foram ficando mais à vontade com as funções que lhes foram dadas e em menos do primeiro mês desde que passaram de noviças para freiras definitivas, todas já obedeciam e seguiam firmemente cada regra que lhes foram estabelecidas. 

O trio de sacristãs cuidavam da organização da cozinha: enquanto Leah cuidava da comida que seria servida no almoço, as outras duas organizavam a grande mesa.

— Parece tensa, Irmã... — Disse Leah, assim que chegou com uma panela para ser posta na mesa, fitando a sua amiga, que tinha um semblante bastante assustado além de estar levemente trêmula. — O que houve?

— Tensa? — Respondeu com um leve tom de desespero. — Está vendo coisas, Irmã Leah. Só estou... Um pouco apreensiva com a temporada de festividades se aproximando. Garanto que vamos ter o trabalho mais puxado até lá...

— Não seja por isso! — Falou Irmã Luzia com um sorriso consolador e gentil. — Não é como se ficássemos nas ruas para limpar a sujeira depois. Além disso, ninguém poderia invadir a Igreja se é isso que a preocupa tanto.

— Sim... Acho que estou me precipitando demais...

— O que não é de hoje, certo? Sempre está se precipitando... — Leah perguntou e riu logo em seguida, contagiando Luzia e fazendo a mais jovem dar um meio sorriso.

— O que as três fazem paradas? — De repente, a voz de Rebeca calou as três jovens. A pose severa, com as mãos na cintura e um olhar de repreensão que intimidava completamente as moças. — Pensei ter lhes dado trabalhos para fazerem! Aqui é uma Igreja, então comportem-se enquanto vivem debaixo deste teto! — Após isso, a mulher relaxou os ombros, respirando fundo, se acalmando, antes de voltar a falar com as três freiras que estavam com as cabeças baixas, como se esperassem o pior. — Estão todas aqui há um mês. Devem entender as normas daqui, certo? Então compreendam que não permitiremos que esses, e outros atos semelhantes ao que vi agora, se repitam. Desta vez, deixarei passar. E contentem-se por isso não ser passado adiante. Agora, de volta às atividades.

Irmã Rebeca saiu da cozinha, deixando as três jovens sacristãs aliviadas e não demorando muito para retomarem as suas tarefas rotineiras. 

Horas mais tarde, depois da missa, as freiras voltaram a retomar as atividades. Leah e Luzia ficaram encarregadas de cuidarem da limpeza e arrumação dos pratos do almoço. E uma de suas supervisoras havia preparado uma tarefa para a outra sacristã.

— Irmã, — Falou Irmã Adelaide. — preciso que limpe as escadas e as portas da frente, sim?

— Mas... A essa hora? 

— Algum problema com isso, por acaso? 

— Não! Problema algum, Irmã. — A jovem logo respondeu.

— Então não tem motivos para não executar essa tarefa. Em caso de dúvidas, estarei limpando as escadarias.

A mais moça apenas anuiu e pegou os pertences necessários e foi para a fachada da igreja, começando a limpar as portas. O pouco movimento da rua, naquele cenário de tarde, lembrava sua infância, quando ela brincava com as outras crianças e sua mãe a olhava da janela. Seu pai trabalhava quase o dia todo e poucas vezes ela estava acordada para recebê-lo e quando estava... O homem veio a falecer quando a filha tinha por volta dos seus cinco anos então, pouco ou nada lembra dos momentos com ele; contudo, sua mãe favoreceu nas lembranças e sempre contava as brincadeiras e travessuras que a família aprontava junta. Depois que ficou viúva, Arlete e sua filha ficaram cada dia mais pobres, uma vez que o salário do marido era quem sustentava a família. Há dois anos, a menina foi levada pela mãe à Paris e ela começou com seus trabalhos de uma mísera fiel procurando abrigo, a uma noviça e, por fim, chegar ao cargo de freira. 

No meio da limpeza duma porta, esta abriu repentinamente, saindo de lá uma das freiras enfermeiras, que tropeçou num balde ali colocado e derrubando a água dentro dele pela escada.

— Tome cuidado onde coloca isso! — A freira em questão era Irmã Juliette, que falou de forma rude.

— Lamento muito, Irmã. Espero não tê-la machucado... — Falou a outra, culpada, tirando o balde dali.

— Eu estou bem. Tenho que ir agora. Caso não tenha terminado o que está fazendo até meu retorno, eu a ajudo com isso. Se me permitirem, é claro... — Mal a outra teve tempo de responder e Juliette já havia saído. Uma criança, de um dos orfanatos atribuídos pela Catedral, havia contraído sarampo e as outras ficavam com receio de pegar a doença também.

Na cozinha, Leah e Luzia separam as próprias atividades, com uma lavando a louça e a outra, limpando a sujeira da mesa e debaixo dela. Ambas executavam a tarefa silenciosamente, já que a Irmã Rebeca vagava frequentemente próximo onde as duas freiras estavam. E se não era ela quem estava por perto, também tinha Claude Frollo, que ainda mantinha um olhar desconfiado nas sacristãs. Porém, houve um momento de distração de ambos os lados e Luzia aproveitou isso para comentar o que guardava para si, sussurrando próximo de Leah, que lavava os pratos.

— Desconfio que Irmã Rebeca pense que estamos planejando algo...

— Que pensamento horrível, Irmã! — Exclamou Leah, também sussurrando. — Está certo que ela é autoritária. Mas ao ponto dela pensar tal coisa de nós... Creio que não.

— Só fique esperta, Irmã. A qualquer momento ela poderia nos acusar de algo que não fizemos. Somos pobres apesar de tudo e qualquer coisa irão descontar em nós.

Leah não quis acreditar na teoria da colega, mas que tinha razão, tinha: os trabalhos mais árduos e longos eram postos a elas. Mas não podiam hesitar. Era uma realidade a ser encarada e deviam agradecer por terem uma oportunidade que muitas outras pessoas trabalham para conseguir. Isso era um motivo bom... Não era?

Logo após essa breve conversa, Luzia se retirou da cozinha e voltou para a sala de jantar, onde continuou a limpar a mesa. Para sua sorte, Rebeca acabara de chegar no cômodo e de nada desconfiou. Ao menos a freira já tinha dado seu recado.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

(3) Bonecas de bibelô, era especiaria de Arlete e o negócio desta.

Como eu disse nas notas inciais, o próximo capítulo vai ser melhor que esse. Prometo que juro! *beijo várias vezes as pontas dos dedos indicadores*



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Pecado" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.