I Hate You, I Love You escrita por Azrael Araújo


Capítulo 1
I Hate Love You




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Esfrego as mãos no rosto repetidas tentando afastar as lágrimas sem mais me importar com a maquiagem borrada, manchando a região abaixo dos meus olhos de preto. Ergo meu olhar para o espelho e não reconheço a garota que me encara de volta.

Patético, garota. Ela cospe, venenosa, e eu não posso deixar de concordar ao ver meu estado decadente. Já fazem meses.

Abro a tornei e tento lavar o rosto, limpando as lágrimas marcadas.

Isso não pode continuar, penso frustrada. Eu superei, eu a deixei para trás.

Suspiro e me encolho envergonhada enquanto uma moça sai de uma das cabines atrás de mim e segue para as torneiras, lavando as mãos. Ela me observa pelo canto do olho esquerdo e eu tento disfarçar minha humilhante situação fingindo que procuro algo em minha bolsa. Maldito banheiro, maldita boate. Tão logo ela atravessa a porta em direção às pistas de dança eu pesco um lenço de dentro da bolsa e começo a consertar o desastre em que se encontra o meu rosto.

Por que aqui, por que justamente hoje? De todos os dias, de todas as malditas boates nessa cidade... Ela tinha que escolher essa, justo essa noite?

Limpo a boca, retirando os vestígios de batom vermelho e começo a refazer a maquiagem — agora sem tanto ânimo.

Abaixo o olhar novamente quando ouço o barulho da porta de entrada do banheiro. Não queria mais nenhuma outra pessoa achando que eu era uma bêbada maluca, porém a pessoa que entra não parece seguir em direção as cabines. Pego o batom dentro da bolsa e encaro o espelho novamente.

E lá estava ela. Poucos passos atrás de mim.

Senti-la tão próxima foi como levar um soco.

Estava vestida como sempre naquela charmosa mistura entre o formal e o casual, as mãos enfiadas no bolso da calça escura, o cabelo loiro um pouco mais curto do que eu me lembrava, a pele morena ainda perfeita. Questionei-me um segundo sobre ela não estar com sua tão estimada jaqueta de estimação até me dar conta de onde estava — no meu apartamento, no fundo de uma caixa junto com outros pertences dela.

Desviei o olhar, mas ainda conseguia sentir seus olhos escuros fuzilando minhas costas.

Ergui novamente o batom que havia sido esquecido a meio caminho do meu rosto e retoquei-o, lentamente, me esforçando para não espiá-la pelo espelho.

Ouvi um suspiro baixo e senti sua movimentação enquanto ela se recostava do lado direito da pia, perto demais de mim.

— Então, não vai falar comigo? — ela indagou, e eu estremeci levemente. Não ouvia sua voz há meses.

— Não há nada para ser dito. — encarei o espelho firmemente tentando não transparecer o quanto estava nervosa. Guardei o batom vermelho e ergui as mãos em direção ao cabelo, desfazendo o coque e soltando os longos fios pretos.

— Não foi o que pareceu lá — apontou a porta que dava para as pistas de dança.

— Só fiquei surpresa em dar de cara com você. Sempre achei que esse lugar fosse bem frequentado. — comentei distraidamente.

Ela tentou conter um sorriso e virou de frente para mim. — Vamos, babygirl, não seja mal criada...

Sua mão tocou levemente o meu braço e eu praguejei enquanto a região ficava sensível, totalmente arrepiada. Um segundo depois, dei-lhe um pequeno tapa para afastá-la de mim.

— Não ouse me tocar. Não depois de tudo que aconteceu. — se um olhar matasse, ela estaria em pedaços agora.

Sua testa se franziu e todo o divertimento deixou o seu rosto.

— Tudo que aconteceu? O que, exatamente, aconteceu?

— Ora, vamos, meu bem. Você não é burra, tenho certeza que lembra o que me fez.

— O que você acha que eu fiz. — estávamos uma de frente para a outra agora, na mesma altura graças ao meu salto. Seus olho estavam tomados por uma fúria contida que com certeza, também estava nos meus.

— Não sou idiota! — vociferei — Pare de jogar comigo, pare de ser tão sádica!

Ela respirou fundo, fechando as mãos em punho. Afastou-se pesadamente e quando achei que iria embora, ela virou a chave da única porta do banheiro, trancando-nos lá dentro. Caminhou de volta até onde eu estava, rígida. Nesse momento me dei conta do quão próximas estávamos. Minhas mãos coçavam em desejo de tocá-la.

Queria bagunçar seu cabelo macio como sempre fazia depois do amor. Queria apertar seus braços fortes e senti-los em volta de mim, me aquecendo e protegendo como ela sempre prometeu que faria. Meses sem nos ver e o desejo se reacendia louco como na primeira vez.

Balancei a cabeça, respirando fundo. Chega dessa merda.

— Estou esperando. — ela pontuou, impaciente.

— O quê?

— Diga-me o que eu fiz com você. O que você acha que eu fiz com a gente. — sua voz falhou na última palavra. Desviei meus olhos dos seus.

— Por que está aqui? — exigi saber — Por que diabos quer continuar martelando nesse assunto?

Ela avançou um passo, mas não me afastei. Podia sentir sua respiração em meu rosto, mas continuei encarando seus sapatos caros e impecáveis.

— Estou aqui porque precisa tirar toda essa merda da sua cabeça.

Senti a fúria emergindo novamente. — Está dizendo que estou errada? Que você não tem culpa e que eu nos afastei?

Ergui meus olhos e ela apenas me encarava em silêncio, o queixo trincado.

— Vamos, me diga que estou errada. Diga-me que você não me traiu com uma vadia qualquer, que não se deitou comigo depois de ter fodido com uma qualquer. Negue todas as marcas que vi em seu corpo naquela noite, negue que estava tão bêbada que sequer conseguia pronunciar seu nome. Diga-me que enquanto eu chorava por você, você estava por aí enchendo a cara com uma puta de bar e fodendo ela no banheiro. Ou será que ela te levou para a casa dela? — gritei. A mulher loira a minha frente continuou em silêncio por vários segundos.

Minha respiração estava pesada e eu desejei uma bebida para aliviar a dor que sentia na garganta. Ou talvez fosse apenas o bolo entalado que sempre aparecia quando eu tocava nesse assunto.

Ouvi um soluço e achei estar chorando, mas ele não viera de mim.

Ela chorava baixinho agora, a cabeça abaixada, os braços inertes ao lado do corpo. Vê-la nesse estado meu destroçou. Senti meu coração se partindo novamente — algo já familiar nos últimos tempos. Senti as lágrimas correndo meus olhos novamente, destruindo a porcaria da maquiagem pela segunda vez naquela noite.

Sem me importar com as consequências, cruzei a pequena distancia que nos separava e joguei meus braços em volta dela, que não hesitou em me agarrar fortemente pela cintura. Meu lado racional me amaldiçoou. Eu não devia confortá-la, ela não merecia — eu é que havia sido destroçada por suas ações. Mas eu não podia evitar. Cada lágrima que tingia seu lindo rosto era como uma facada no meu peito. Sua dor era a minha dor e por mais que estivéssemos afastadas, por mais que eu tentasse odiá-la... Eu simplesmente não conseguia. Não conseguia evitar esse desejo de querer protege-la, de querer guardá-la em um potinho e escondê-la do mundo.

Poucos minutos se passaram até que eu me desse conta de que os soluços haviam parado. Ela fungou algumas vezes, mas nenhuma de nós fez menção de quebrar o contato. Nesse instante, me dei conta da nossa situação: estávamos abraçadas, tão próximas que eu podia sentir seu coração acelerado junto ao meu. Meu rosto estava entre seu cabelo e automaticamente enfiei a mão em seus fios claros, descendo pela sua nuca. Quando passei a arranhar levemente aquele local, senti o clima mudar. O peso foi dando lugar a outro tipo de tensão nos instantes em que seu corpo ficava tenso sob o meu e sua respiração ficava pesada no meu pescoço. Ela apertou as mãos em minha cintura, movendo-as em direção as minhas costas, pressionando firme. Eu podia sentir o calor que emanava dela e uma região abaixo do meu umbigo pulsou deliciosamente.

— Não sei se quero fazer isso... — minha tentativa em parecer resistente foi tão ridícula quanto minha respiração entrecortada. Ela sorriu, e devo dizer que isso inundou a minha calcinha.

— Babygirl — ela sussurrou presunçosa enquanto diminuía distância entre nós e selava os lábios aos meus.

Ora, dane-se. Era ridículo tentar resistir. Ela era como um ímã, me atraindo e me fazendo orbitar ao seu redor.

Beijei-a com ferocidade, arrancando um suspiro satisfeito enquanto sentia minha língua tocar a sua. Foi sensual, exatamente como eu me lembrava. Ela deu um passo para frente, depois outro e mais outro até que senti a pia pressionando meu quadril. Em menos de um segundo ela me agarrou pela cintura e me colocou sentada, abrindo minhas pernas em seguida e encaixando-se entre elas. Eu gostaria muito de dizer que não gemi vergonhosamente enquanto seus beijos desciam pelo pescoço e colo, e suas mãos habilidosas atiçavam minhas coxas. Ela sorriu quando lancei minha boca novamente à dela.

Quente. Quente. Quente.

Mais. Mais. Mais.

Eu mal conseguia raciocinar. Meus pensamentos eram incoerentes e eu só conseguia me concentrar no quanto gostaria de tirar-lhe a camisa e tocá-la, sentir sua pele quente contra a minha, nos movendo naquela perfeita sincronia que era só nossa.

Agradeci a música alta tocando lá fora por ser capaz de abafar o gemido alto que eu deixei escapar quando seus dedos grossos invadiram minha calcinha sem prévio aviso. Senti todo o meu corpo retesar e praguejei mentalmente. Não tão rápido.

Ela deu uma risadinha baixa, parando o que estava fazendo e eu abri os olhos encontrando os seus; nesse momento tive a certeza de que ela estava tão excitada quanto eu. Eu não era capaz de distinguir o que era pupila — completamente dilatas — e o que era sua íris. Me perdi naquela escuridão, como tantas outras vezes me deixando levar nas suas profundezas sem ter certeza se poderia voltar.

Então, senti um balde de águia fria ser jogado em mim.

Uma marca, quase imperceptível, pairava sob a pele em sua clavícula. Não era recente — não havia sido feita por mim — estava em um tom quase natural ao da pele, denunciando que havia sido feita há dias.

Todo o pequeno êxtase me deixou e a chutei para longe, arrancando sua mão da minha intimidade com violência. Ela me encarou confusa, pressionando forte o local onde meu salto a havia acertado. Pulei da pia furiosa e avancei sobre ela, socando seu peito rígido em diversos lugares. Podia sentir as lágrimas queimando novamente, mas me esforcei para detê-las.

— Desgraça — acertei seu ombro direito — Porque tudo isso? Porque todo esse show? — soquei a barriga com força fazendo-a dar um passo para trás — Você não cansa de brincar comigo? — gritei enquanto dava um último tapa em seu rosto. Podia ver a marca se formando na pele morena.

 Baby...

— Não se atreva — interrompi — Você perdeu o direito de me chamar assim. Por Deus! Eu não te reconheço!

— Ouça — ela segurou meus braços, impedindo que eu continuasse a me descabelar em fúria. — Eu amo você, entendeu? Amo você e só você.

Eu ri em descrença. — Me ama tanto que se deita com qualquer uma que te olhe por mais de cinco segundos. Responda-me, porque veio aqui? Pra mostrar que sua atual fode melhor do que eu? Ou será que é mais de uma?

Ela enrijeceu, soltando-me e abaixando a cabeça em seguida.

— Não se atreva, não se atreva a chorar! — eu não dava a mínima se parecia uma louca e histérica. Só queria gritar até toda aquela maldita dor ir embora.

— Olhe para mim — ela se posicionou a minha frente — Olhe no fundo dos meus olhos e me diga que não me ama. Diga que não sente absolutamente nada por mim e que o que estávamos fazendo segundos atrás não a deixaram tão louca quanto a mim. Me diga que todos os nossos momentos, todas as carícias, nossas noites de amor e loucura, nossos sonhos e confidências, nossas declarações... Diga-me que não valeram nada, diga que não passam de lembranças distantes. Me diga isso, apenas uma vez, e eu irei sair por aquela porta e juro que nunca mais vou olhar pra você.

Minha respiração estava pesada. Meu corpo parecia leve, como se não fosse meu. Minha mente estava distante, desejando que tudo fosse um pesadelo. Que eu acordasse e nada disso — os últimos nove meses — não passassem de um sonho ruim. Queria poder acordar ao seu lado e ter certeza de que todas as nossas promessas não haviam sido quebradas.

Mas a realidade batia à minha porta, e eu estava decidida a atendê-la.

Com a última gota de determinação que me restava, encarei pela última vez aquele par de olhos que tantas vezes foram meu porto seguro. As palavras saíram como lâminas, ferindo-me. — Eu sinto como se você tivesse me usado. Dói cada maldito segundo estar ao seu lado, mesmo que eu deseje isso mais do que qualquer coisa. Sinto sua falta a cada momento, desde a hora em que acordo na nossa cama vazia até o momento da noite em que costumávamos sentar na varanda e olhar as estrelas. Abandonei a maioria dos meus amigos por você, pra ficar com você, mesmo que eles me avisassem o tempo inteiro no que nossa relação iria resultar. Joguei fora dois malditos anos da minha vida ao lado de uma pessoa que não era sincera comigo.

“Se você me amasse, se me quisesse de verdade, não perderia tempo se enfiando embaixo das saias de outras. Eu me esforço todos os dias para não relembrar nossos momentos. As outras mulheres parecem não ter rosto, entende? Não consigo vê-las, não quando tudo que está aqui dentro pertence a você. Você não se importa, nunca se importou. Você sempre prometeu que não era como as outras, que não farias essas merdas comigo. E olhe só, você me destruiu. Quero desesperadamente esquecer você. Por mais que me esforce, não consigo colocar ninguém acima de você.”

Limpei uma última lágrima com as costas da mão e respirei fundo. — Eu te amo, mas te odeio na mesma intensidade.

Ela me encarou por um longo segundo, os olhos frios e inexpressíveis. Então se virou, destrancou a porta e foi embora.

Eu esperava que ela não quebrasse sua última promessa.


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Notas finais do capítulo

TT: @pittymeequaliza



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