Mau dia escrita por Ava Lit


Capítulo 1
3º Ano. Dezembro de 1973.


Notas iniciais do capítulo

Sirius suspirou dramaticamente. "Eu...eu...acho que estou gostando da Montgomery."

(...)

"Olha só quem temos aqui..." James murmurou, entretido pelo último projeto dos Marotos (um mapa que mostrava todo o castelo de Hogwarts e seus residentes, ainda em andamento) "Rebecca Montgomery indo em direção da biblioteca."

Sirius ergueu os olhos de seu peão e para seu horror, o amigo sorria de um jeito travesso.

"Que tal se a gente der tchau pra ela, Sr. Aluado?"¹



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No auge de seus treze anos, Rebecca Montgomery tinha como convicção pessoal a ideia de que era impossível ter um mau dia na época do Natal. Fã incondicional das festividades de fim de ano, ela costumeiramente era a primeira em seu dormitório a acordar no dia em que a maior parte dos alunos pegaria o expresso de Hogwarts a caminho de casa, tamanha sua excitação.

Em 1973, no entanto, Rebecca estava prestes a descobrir que maus dias podiam acontecer em qualquer época.

Ao contrário dos anos anteriores, Becca foi a última a se levantar, apenas quarenta minutos antes das carruagens começarem a deixar o terreno da escola. O café da manhã já tinha sido perdido, ela sabia, bem como o ritual de se sentar à janela do quarto e admirar a espessa camada de neve cobrindo as dependências do castelo, mas aquilo era apenas uma chateação pequena. A garota só começou a se sentir realmente impaciente quando percebeu que todas as colegas de quarto tinham acordado mais ou menos na mesma hora em que ela, e que três delas ainda estavam na sua frente na fila para o banho.

Jamais teria tempo para lavar o cabelo volumoso, herança da família materna, e tentou adiantar o que pôde com ele seco. Não importava, no entanto, quanta força ela imprimisse na escova: os nós em seu cabelo pareciam se multiplicar e, quando ela finalmente conseguia desembaraçar uma mecha, esta estava com o triplo do volume anterior. Aquele era o tipo de embate para o qual Rebecca não tinha a menor habilidade ou paciência, e a inquietação crescia cada vez mais. Quando finalmente conseguiu se livrar dos nós, ela apenas invejava, com uma intensidade quase vergonhosa, os fios macios e sedosos das irmãs mais velhas.

Com a destreza de quem repete o mesmo ato todos os dias, a bruxinha trançou os fios longos do melhor jeito que conseguiu, apesar da pressa. Ela detestava tranças e todos os apelidos que o penteado lhe rendera naqueles anos de escola, mas era a única forma que sabia usar para deixar os cabelos comportados. E mesmo com todo o frizz e as pontas esquisitas, ia ter que bastar.

A cereja do decepcionante bolo em que aquela manhã se tornava viria vinte minutos depois de Rebecca acordar: esquecida em um canto, ao lado do seu criado mudo, estava uma pilha excessivamente grande de livros da biblioteca, cujo prazo de empréstimo se encerrava naquele dia. Não os devolver durante aquelas férias significaria não ter acesso ao acervo por pelo menos dois meses, como punição pelo atraso – e Becca nunca poderia correr aquele risco, não se quisesse continuar como uma das melhores alunas de sua turma.

Sem perceber que vestira sua blusa ao contrário, ela saiu do quarto abraçada aos livros, mal enxergando o caminho à sua frente, tal a altura da pilha que carregava. Embora sem mencionar uma única palavra, ela rezava para conseguir devolver os livros e chegar ao Hall de Entrada a tempo, sem, no entanto, acreditar que aquilo seria possível. Talvez a irmã sentisse sua falta e a esperasse para caminharem até a casa dos pais, em Hogsmead? Era tão pertinho... Ou talvez ela pudesse passar o Natal no castelo. Não podia ser tão ruim assim, embora não houvesse as canções entoadas pela mãe ou a gemada do pai ou a tradição da família de cair no sono em frente à lareira da sala... Céus, ia ser terrível ficar presa em Hogwarts.

A maior parte dos corredores estava vazia – os alunos de todas as casas já deveriam estar pelo Salão Principal àquela hora – e demorou muito pouco tempo para que ela se distraísse com os próprios pensamentos.

Sua mente estava em algum ponto entre rabanadas fresquinhas e chocolate quente quando James Potter e Remus Lupin viraram uma esquina correndo, rindo e olhando para trás. Os dois meninos não chegaram a esbarrar em Rebecca, mas passaram tão perto que foi impossível não se assustar. Enquanto os livros que ela carregava se espalhavam pelo chão, o som dos passos e risadas de Potter e Lupin morriam à distância que eles ganhavam.

— Meleca! – Não bastava estar com pressa, ela ainda precisava que os Marotos cruzassem seu caminho.

Sempre os marotos...

Com um suspiro, ela se abaixou para juntar os livros novamente, só levantando o olhar do chão quando um vulto, atravessando a mesma esquina por onde os meninos vieram, chamou sua atenção.

— Monty! – Sirius Black, um pouco mais agitado que os demais meninos de treze de anos e claramente ofegante, parou de breque ao ver a menina, os olhos arregalados em uma expressão que parecia ser susto. Becca desviou o olhar de forma desinteressada, e voltou a juntar os seus livros, espalhados no chão.

— Potter e o Lupin passaram naquela direção – ela usou o indicador para apontar o caminho por que os colegas seguiram, certa de que Black estava correndo atrás deles, e pouco disposta a render a conversa com o garoto.

Não valia a pena. Sabia que eles acabariam discutindo, e ela definitivamente não tinha tempo para aquilo.

— Ahn... Ok.

Ela sentiu o olhar de Sirius fixo em si enquanto ele a rodeava, para seguir o corredor, e foi capaz de contar os dois únicos passos dele antes que ele girasse nos próprios calcanhares e se agachasse perto dela, voluntariamente recolhendo parte dos livros.

Rebecca arregalou os olhos na direção do menino de cabelos negros, que apenas deu de ombros, sem interromper o trabalho.

— Achei que você precisasse de ajuda.

— Certo – Ela colocou o último livro em sua pilha, desconfiada, e se levantou abraçada a ela.

Sirius fez o mesmo, mas, em vez de colocar os volumes que recolhera sobre os dela, como ela esperava, ele se manteve abraçado a eles.

— Biblioteca?

Becca franziu as sobrancelhas, receosa. Receber gentilezas de Sirius Black era algo completamente inesperado. Algumas ofensas, um pouco de competitividade e constante pirraça eram termos comuns na relação dos dois colegas, mas, nunca, gentilezas. Que tipo de pegadinha ele podia ter armado?

— Você vai chegar mais rápido lá se estiver carregando menos peso – ele respondeu à pergunta silenciosa dela, encolhendo os ombros em uma serenidade quase forçada.

A lógica dele, entretanto, era irrefutável, e ela apenas concordou com um movimento de cabeça. A ajuda seria bem vinda.

A pouca distância entre eles e a biblioteca foi logo vencida, nenhum dos dois se preocupando em criar uma conversa, cada um deles perdido nos próprios pensamentos e ansiedades. Embora não precisasse, Sirius ficou ao lado de Rebecca enquanto a bibliotecária conferia os volumes um por um, procurando defeitos como se não soubesse que Rebecca Montgomery só não era mais metódica do que a própria professora McGonagall.

Depois de cumprida a obrigação, Rebecca se sentia mais leve, como se já pudesse sentir o cheiro cítrico e aconchegante das velas que sua mãe acendia durante aquela época. Estava finalmente livre para curtir o feriado sem culpa alguma.

Só então, invadida pela alegria, ela percebeu que ainda não tinha agradecido pela ajuda do menino que caminhava ao seu lado, com as mãos nos bolsos.

— Obrigada, Sirius! – Becca se aproximou em um movimento rápido, inclinando a cabeça para dar um beijo na bochecha dele.

— Hãn? – Sirius virou o rosto no mesmo minuto em que ela se aproximou.

E, em vez da bochecha, os lábios da menina encontraram os lábios dele.

Os dois se afastaram como se tivessem levado um choque. Rebecca arregalou os olhos, e tentou balbuciar alguma coisa entre um pedido de desculpas e uma exclamação de surpresa.

Ela tinha beijado Sirius Black.

Na boca.

As suas mãos pequenas começarem a suar e seu coração batia tão rápido que se confundiria com as músicas que os bruxos africanos usavam em suas festividades. Ao mesmo tempo em que não sentia suas pernas, queria sair correndo dali e não conseguia desviar o olhar dele, tudo ao mesmo tempo.

Foi quando ele deu um passo à frente, beijando-a novamente e fazendo com que Rebecca suprimisse uma exclamação de susto. Demorou um pouco até que ela entendesse que ele a estava beijando novamente, e só então as pálpebras se cerraram sobre os olhos castanhos.

Nenhum dos dois sabia exatamente o que fazer, então eles apenas ficaram ali pelo que pode ter sido um segundo, meio minuto ou duas horas, as mãos dele segurando-a pelos ombros, e as dela desajeitadamente apoiadas sobre o peito dele.

Quando finalmente se afastaram, diferente da primeira vez, foi envergonhada e lentamente. Becca sentia as bochechas arderem, certa de que estava corada em mais tons de vermelho do que poderia contar, e levantou os olhos, em uma tentativa de não o encarar.

Um meio sorriso apareceu em seu rosto no momento em que suas íris pousaram sobre um ramo de azevinho que flutuava diligentemente alguns centímetros acima da cabeça deles.

— Azevinho... – os dois murmuraram ao mesmo tempo, e riram, permeados da vergonha compartilhada por todo tipo de amantes inexperientes.

— REBECCA!

Provavelmente ambos ficariam mais alguns minutos por ali, perdidos entre as múltiplas possibilidades do que fazer, incertos de como agir; mas a voz que chamava a menina fez com que os dois se assustassem:

— Por Merlin, Morgana e Helga! Eu te procurei em todos os lugares!

Ayala, uma das irmãs mais velhas de Rebecca, andava apressada em direção a eles.

— As carruagens já vão sair, vocês dois vão se atrasar! – Ayala abraçou a irmã caçula – Tenho certeza de que a mamãe me faria voltar tudo andando só para te buscar! – em um ataque verborrágico típico dos Montgomery, a setimanista começou a puxar a caçula para o caminho correto.

Becca e Sirius trocaram um rápido olhar culpado.

— É melhor eu... James... tchau! – E, como se essas palavras fizessem algum sentindo, ele começou a correr pelo corredor, no sentido diametralmente oposto ao que o grupo deveria seguir para chegar ao Hall de Entrada.

— Sirius! – Rebecca queria dizer algo.

Eles tinham acabado de se beijar, seu primeiro beijo, parecia certo que eles dissessem algo... Ela só não sabia o quê. Abriu a boca algumas vezes, incapaz de conseguir formular uma única palavra ou vogal inteligível, até que falou a primeira coisa coerente que lhe ocorreu:

— Feliz Natal! - com um meio sorriso, uma nesga de cumplicidade, Becca abaixou o olhar e se virou para acompanhar a irmã, introspectiva e subitamente interessada no rejunte que unia as pedras do chão do castelo.

— Sirius não é aquele menino que vive te tirando do sério? – Ayala perguntou, minutos depois, quando as irmãs já estavam acomodadas frente a frente na carruagem, ignorando da melhor forma possível os colegas que completavam a lotação do transporte.

­- É sim, Ay – um aceno de cabeça reforçou a afirmativa.

— Até que ele está ficando bem bonitinho... – os olhos ávidos da mais velha perscrutaram as bochechas redondas da outra, uma sobrancelha erguida como um canastrão que diz conhecer um segredo sobre você, antes mesmo que você o saiba - Vocês estão namorando?

— CLARO QUE NÃO!! – A vivacidade da resposta de Rebecca chamou a atenção dos demais ocupantes do veículo, e, envergonhada, ela se pôs a fitar a paisagem através da janela.

A simples ideia de namorar Sirius Black era algo estranho. Ela ainda estava tentando se acostumar com o fato de que eles tinham se beijado! Se beijado!

Não que a irmã soubesse daquele detalhe. Ou que tinha sido bom. E por que ela sentia um calorzinho só de pensar naquilo?

No fim daquele dia, Rebecca Montgomery continuava a acreditar que era impossível ter um mau dia na época do Natal.


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Notas finais do capítulo

Espero que vocês tenham gostado!

Para quem leu minhas outras fics, a Becca não é do mesmo "universo" que a Tin, então não esperem coerências entre as histórias em que elas aparecerem, ok?

Rebecca Montgomery é outra OC advinda de um antigo RPG meu. Esse texto já tinha sido escrito há um tempo, como um apêndice ao jogo. Conta também o primeiro beijo de Sirius e, bem, é basicamente o pontapé inicial para as aventuras deles. Hoje me deu vontade de reler essa coisa fluffy e açucarada, acabei querendo reescrevê-la... E, bem, aí está.

Comentários são chocolate quente no inverno.


¹- Trecho do nosso RPG. Escrito pela Mary.



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