estranho

LIZ, 34 ANOS.

—Olá, garoto - cumprimentou Liz, olhando para o estranho e estranho amigo de Julie como se ele fosse um alienígena.

E ele era.

E estava com a camisa do seu filho.

E estava na sua casa.

E era amigo da Julie - Liz ainda estava nesse tópico.

—Uhh – zombou Julie. Sua mãe, assim como ela, só utilizava "olá" quando estava desconfortável. Liz definitivamente não tinha gostado de Ashton.

—Cuidado – avisou Liz, apontando o dedo para a filha. – E solte Calum e vá arrumar a mesa.

—Por que eu que tenho que arrumar a mesa? – questionou Julie. Mas soltou Calum. (Calum agradeceu a Deus por isso.) – Por que Luke não vai...

—Lavas os pratos – decidiu Liz. – Ele vai lavar os pratos. Ou você quer lavar os pratos?

Em outra vida (uma vida que prometia espuma para tudo que é canto), sua filha poderia ter escolhido os pratos, mas agora não.

—Mesa. Eu quero a mesa – escolheu Julie, pegando a mão de Calum. – Vamos, Calum.

—Por que eu tenho que... - murmurou Calum, seguindo-a apesar das suas palavras.

Liz já estava vendo o quanto sua filha se aproveitaria da sua situação.

—Então... – disse, sentando-se ao lado de Ashton, que virou a cabeça com tudo em direção a ela. Liz o avaliou rapidamente. Cabelos loiros compridos (maior do que sua filha, não que fosse difícil), olhos castanhos e lábios que pareciam acostumados a sorrir. – Você é amigo de Luke? De onde vocês se conhecem? - questionou, embora soubesse que a resposta fosse não.

Como ela sabia que ele era amigo de Julie e não de Luke? Seu filho nunca traria ninguém para casa naquele dia, com Julie tendo acabado de sair do hospital e sendo o aniversário deles - era um dia importante, era um dia apenas para família.

E desde quando Julie tinha amigos? Liz não se lembrava de nem um Ashton na gigantesca lista de visitas que sua filha tinha todos dias quando estava no hospital. Gigantesca lista que só tinha garotos.

E o garoto desconhecido, que se sentava muito confortável no seu sofá, era desconhecido.

E estranho.

—Da escola – respondeu Luke. Liz não sabia quem estava mais surpresa, ela ou o garoto estranho. – Somos da mesma classe.

—É? – Liz acreditava totalmente nele, porque seu filho não estava mentindo, era pior: ele estava alterando a verdade, fazendo-a se encaixar no que queria sem mentir. (Andrew ficaria tão orgulhoso, pensou Liz, orgulhosa.) – Por que eu nunca te vi...

—Ele é novo – explicou Luke, apressadamente. – Começou a estudar lá esse ano...

—Hum... – murmurou Liz, não vendo nem um problema naquele garoto Ashton, nem um problema  realmente sério, não como o fato da sua filha ter cortado o cabelo sozinha daquele jeito. Inclinando-se sobre Ashton, Liz sussurrou: - Por que ela cortou o cabelo?

—Ela disse que estava com calor – respondeu seu filho, também sussurrando.

—Mas ela tem um elástico no pulso! – exclamou.

—Foi o que eu disse! – concordou o ga... Ashton, balançando a cabeça enfaticamente... até perceber que estava se intrometendo.

Liz o encarou, avaliando-o. Hum... Ela gostava dele.

—E é quem ele? – perguntou Liz, apontando para Ashton, como se ele não estivesse ouvindo a conversa, como se não soubesse quem "ele" era ele.

—Amigo da Julie da escola - confessou Luke.

—Mas você disse que ele começou esse ano – disse Liz, confusa – e Julie não foi para a escola ainda.

—Foi o que eu disse! – concordou Luke dessa vez. (Ashton esperou que Liz ignorasse-o como fez com ele, mas aparentemente ela apenas não gostava quando garotos molhados e desconhecidos diziam “foi o que eu disse”.) (Liz sorriu para si quando Ashton a olhou acusando-a de preferência. Ela definitivamente estava gostando dele.) – E, por mim, ela não estudaria esse ano.

—Sem chance – negou Liz, balançando a cabeça para dar mais ênfase. – Julie vai para a escola.

—Por quê? – perguntou Luke, embora já soubesse a resposta.

—Você sabe o porquê.

Luke suspirou, cansado, e Liz sentiu-se mal por seu filho estar assim, mas nada que uma boa noite de sono não resolvesse.

—É por isso que você não perguntou sobre o cabelo?

Liz sorriu tristemente para o seu filho, mas, antes que pudesse responder, Julie a chamou e ela endireitou-se rapidamente, quase como se Julie fosse a mãe e ela a filha que tinha aprontado, contudo Liz não sabia o que fazer.

E temia fazer algo errado.

Julie tinha perdido a pessoa mais importante da vida dela (sua filha tinha visto Andrew ser retirado dela na sua frente sem poder fazer nada para impedir) e depois tinha passado por tantas coisas e Liz... Liz não sabia como ajudá-la.

Se a psicóloga da sua filha dizia que Julie precisa de espaço para descobrir quem era (e se isso incluía um corte de cabelo horroroso e um novo amigo um pouco duvidoso) e se isso fosse a única coisa que Liz podia fazer para ajudá-la, ela o faria.
Deus sabe o quanto Liz queria que Julie voltasse a ser a mesma garota de antes e faria o que fosse necessário para sua filha ter o mesmo brilho de antes nos olhos. (Aquela garota na sua frente era quase uma estranha.)

(E, mesmo assim, Liz a amava.)