Queimada por Dentro escrita por Giovanna Biondi


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Esse é o começo de uma de um universos que eu já estou planejando há anos. E se você gostar da história (espero que goste), não se preocupe de ela ser abandonada por que isso não vai acontecer. Eu já tenho tudo pronto até o volume cinco ou seis, e ainda outras histórias no universo interligadas ou não.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/730326/chapter/1

Andava nas ruas escuras já tarde da noite, a chuva molhando meu capuz vermelho enquanto o vento soprava meu cabelo umedecido no meu rosto. As ruas estavam vazias, o que pra mim era maravilhoso. Nunca me dei muito bem com as pessoas, e não tenho a sorte de passar despercebida. Normalmente, elas se desviam o máximo que podem, tentando não deixar na cara, como se eu não fosse perceber. Acho que é o meu rosto. Uma menina já me disse que a minha expressão dá medo. Mas fazer o que? É a única que eu sempre tive. Não me lembro de ter um sorriso estampado no rosto. Também, não me lembro de ter tido motivo.

                As pessoas me acham seca, fria, dura, mal humorada, grossa, e isso do que eu já as ouvi cochichando. Provavelmente tem mais adjetivos que eu não citei. Mas queria ver elas passarem pelo que eu passo todo dia e continuarem como são. Mas não se engane, não quero que tenham pena de mim. Ás vezes até prefiro a ignorância. Isso me dá mais tempo pra resolver meus problemas em paz. Afinal, não quero alguém atrás de mim vinte e quatro horas por dia. Se nada me matou até hoje, isso sim iria.

                Estou voltando para casa. Não que a minha escola acabe assim tão tarde, mas vamos dizer que eu tinha... Uns problemas pra resolver. Enquanto ando pela rua, a chuva piora de minuto em minuto. Se eu não me apressar, vou acabar chegando encharcada em casa. E não quero nem ver o que isso vai me causar. Mas não estou tão longe, afinal. Meus pés pisam em poças, o que causa o único som na rua além do da chuva. Porém, enquanto corro, um som alto soa atrás de mim, e eu faço a coisa mais estúpida que poderia fazer: paro de correr e olho pra trás. Há alguns metros de mim, um homem está em pé apontando uma arma na direção da minha cabeça.

                -Se você mover um músculo, eu atiro.

                O homem usa uma calça jeans azul e uma camiseta cinza, o cabelo loiro molhado pela chuva. Um meio sorriso satisfeito está estampado em seu rosto, enquanto ele segura firme a arma prata na mão. E é isso que me preocupa. Não importa se for um assalto, ou um estupro, ou qualquer outra coisa. O fato de ele não estar usando nada para cobrir o rosto, significa que ele não pretende me deixar viva. E por ele estar segurando firme a arma, ele não vai guardar esforços se a questão for atirar em mim, o que me dá quase nada de tempo de tentar fugir.

                Me recuso a pensar na probabilidade do que me vem à mente.

                -O que você quer? –digo, em um tom duro que não demonstra medo ou desespero. Mas isso não parece afetá-lo.

                -Passa a bolsa.

                Lanço um olhar frio para ele.

                -Você é cego ou quê? Não vê que eu não tenho bolsa!?

                De repente seu sorriso se desfaz e seu olhar fica frio. Só ouço o barulho do tiro e o mundo ao meu redor parece ficar em câmera lenta. Aquela probabilidade que tentei esconder atinge minha mente e afeta meu coração drasticamente. A probabilidade de morrer. De morrer depois dessa vida de merda que eu levei. O desespero em meu coração se transforma em raiva. PRA QUE EU VIVI TODOS ESSES ANOS HORRÍVEIS APENAS PRA MORRER NO MEIO DA CALÇADA EM UMA NOITE CHUVOSA?!?! Eu me recuso a aceitar isso. Me recuso a levar essa ideia como uma possibilidade. Enquanto a raiva penetra no meu corpo, uma sensação de calor começa a dominar o meu interior. E essa sensação se espalha dentro de mim. Eu sinto meus braços queimando, mas não uma sensação dolorosa. Apenas... Quente. Enquanto a bala vem em minha direção, eu levando meus braços formando um “X” na minha frente, depois os abaixo novamente.

                E tudo fica em silêncio por um minuto. Mas aquele som penetra a minha mente. O som de água batendo em ferro quente. Ao olhar para baixo, vejo o monte de ferro derretido que um dia fora uma bala a alguns centímetros do meu pé. Mas aquele som não era o único. Meus braços e mãos brilhavam em uma mistura de amarelo, laranja e vermelho, enquanto chamas dançavam pelas minhas mãos, as gotas da chuva chiavam ao encostar-se ao fogo.

Eu não entendia o que estava acontecendo, mas estava tão confusa que não cheguei a ficar assustada. Apenas olhei para o ladrão, e vi nele uma expressão que não esperava ver a alguns segundos: medo e insegurança. Ele agarrou forte a arma e saiu correndo na chuva, os passos fazendo som na água espalhada pelo chão. Quando olhei novamente para as minhas mãos e braços, eles tinham voltado ao normal. E nenhuma marca sequer apareceu. Foi como se nada tivesse acontecido.

Abismada, minha mente voltou ao mundo real. Uma sensação fria me atingiu na nuca. A sensação de estar sendo observada. Olhei ao meu redor, desesperada. Do outro lado da rua, havia um homem me observando. Parecia ser mais velho que eu, mas não mais de dezenove anos. Seu cabelo preto liso ia até as orelhas e nuca. Usava um tipo de capa com mangas pretas, que cobria o resto da roupa que parecia também ser preta. Seus olhos azuis escuros me encaravam com deslumbre e surpresa. Então eu fiz a coisa mais lógica que podia fazer: Corri. Corri o mais rapidamente que minhas pernas conseguiam, tendo certeza que aquele homem estava atrás de mim. Virei esquinas escorregando e quase caindo na água, usando postes para me dar impulso. Em sete minutos, ou o que pareceu ser uma eternidade, eu estava de volta à porta da casa em que morava. Olhei para os lados desesperada, esperando ver aquele homem em algum lugar. Mas ele não estava em lugar algum. Então porque a sensação de estar sendo perseguida ainda me preenchia?

◦◦◦◦◦◦

Quando passei da porta do apartamento, já ouvi um grito, e a cabeça da minha mãe apareceu de trás da mesa.

—MIA!!! COMO VOCÊ TEM CORAGEM DE ENTRAR NA MINHA CASA QUE EU ACABEI DE LIMPAR NESSE ESTADO?!?

De repente essa preocupação voltou a minha mente. Merda, depois de tudo o que tinha acontecido, eu me esqueci completamente. Eu estava totalmente encharcada, como se tivesse acabado de pular em uma piscina. Ou talvez, até pior.

—Ah, isso? É...

Desviei a tempo de impedir que um vaso branco e azul que costumava ficar em cima da mesa atingisse minha cabeça por um centímetro. O vaso bateu com tudo na parede, e caiu aos pedaços no chão. Me virei com a agilidade que adquiri em situações como essa ao longo dos anos e corri para o meu quarto, então a pessoa que me pariu gritava:

—EU DEIXO VOCÊ MORAR NA MNHA CASA E VOCÊ AINDA SE ACHA NO DIREITO DE FAZER COISAS DESSE TIPO?! VOCÊ VAI VER SÓ...

Com um baque, fechei a porta do meu quarto e me sentei na cama rapidamente. Esperei olhando atentamente para a porta por alguns segundos, depois relaxei. Se ela quisesse continuar isso, tenho certeza que não hesitaria em abrir a porta do meu quarto. Felizmente, provavelmente ela estava muito ocupada apoiando a bunda em algum lugar pra vir até aqui.

Me lembrei do acontecido na rua e olhei para os meus braços. O meu suéter estava totalmente queimado nas mangas, mas minha pele estava incrivelmente intacta. Se não fosse pelo casaco, acharia que foi uma alucinação. Mas não sou burra a ponto de negar o que aconteceu sendo que tenho provas. O que me deixa confusa é: O que foi aquilo?!? Eu nunca tinha feito nada parecido antes, e apostaria minha perna esquerda que aquilo não é normal.

Por mais que as dúvidas preenchessem meus pensamentos, achei que a melhor coisa seria dormir. Estava cansada depois de tudo que havia presenciado, e mesmo se passasse a noite em claro pensando sobre o acontecido, tenho certeza que não acharia respostas. Aproveitando que não tinha acendido a luz do meu quarto, me deitei na cama e fechei os olhos. Não me importo com o fato de minhas roupas estarem encharcadas. Se eu for ficar doente, que seja. No momento só quero entrar no meu segundo pesadelo que chamo de sonhos.

Porém, quando estava quase pegando no sono, ouvi uma voz amedrontadora e feminina extremamente perto de mim.

“Finalmente. Eu despertei.”

Assustada e aterrorizada, sentei na cama rapidamente, com os olhos arregalados. Parecia que aquela voz estava bem ao meu lado, mas olhando em volta eu não via ninguém. Eu voltei a considerar a opção de ter ficado louca. Nunca gostei muito do escuro, por mais que tenha sido obrigada a me acostumar, mas nunca odiei tanto o escuro quanto naquele momento. Sentia que algo horrível sairia das sombras e me comeria viva, saboreando cada pedacinho do meu corpo. Porém, o tempo se passou e nada aconteceu. Os únicos barulhos eram o da chuva e da televisão ligada na sala; pelos gritos histéricos e choros, provavelmente era algum Reality Show estúpido. Então fiz a segunda idiotice da noite:

—Tem alguém aí? –Minha voz soou baixa, pois eu torcia que se tivesse realmente alguém, para que não tivesse me ouvido e não dissesse nada.

Não sei se meu desejo se realizou, ou se realmente não tinha nada ali, mas o silêncio prevaleceu. Ainda assustada e desconfiada, deitei minha cabeça no travesseiro e tentei dormir novamente. Apesar do terror ter me deixado vários minutos com os ouvidos preparados para qualquer som estranho, finalmente consegui pegar no sono. Mas posso jurar que, alguns instantes antes de viajar para o mundo dos sonhos, ouvi aquela voz aterrorizante rindo satisfeita.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Se você quer saber quando o próximo capítulo for postado, me siga no Instagram: hydra229.histórias. Lá eu vou avisar sobre postagens e dar qualquer aviso importante.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Queimada por Dentro" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.