Com carinho, Alex escrita por


Capítulo 1
Com carinho, Alex


Notas iniciais do capítulo

Espero sinceramente que gostem.



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O menino andava curvado pelos corredores. Embora muitos alunos ali houvessem “aceitado” ele, alguns ainda gostavam de enchê-lo com piadinhas bobas. Por isso, foi o mais rápido possível de uma sala á outra.

Entrou e correu para a carteira mais afastada, mas que não ficasse no fundo. Jogou a mala para o chão e ajeitou a toca sobre os cabelos cortados. A senhorita Lewis adentrou a sala e não se surpreendeu ao ver seu melhor aluno ali.

— Bom dia, senhor Campbell — Ela cumprimentou o menino, que sorriu de canto. Ele se levantou e estendeu uma mão para ela.

— Bom dia, senhorita Lewis. O que preparou para nós hoje? — Ele perguntou. Ela sorriu e apertou-lhe a mão.

— É um segredo. Mas sei que vai gostar, Alex. Sente-se, seus colegas estão entrando.

Alex se sentou e puxou seu caderno e seu livro de Inglês Avançado. Seus cabelos da cor de cobre cismavam em sair pelas bordas da toca. Sorriu ao ver sua amiga, Reb, apelido de Rebecca, entrar. Ela riu para ele e se sentou á seu lado. A professora se virou e acenou discretamente com a cabeça para a menina antes de se voltar para a turma inteira, que silenciava ao olhar da mulher.

— Bom dia. Hoje, vocês escreveram uma carta. — Ela começou. Alguns murmurinhos surgiram, mas nenhum era reclamação. Amavam as aulas de IA e principalmente as ideias malucas da professora. — Para alguém que já morreu. Sobre alguém que vocês admiram muito. Eu as recolherei no final do bimestre, portanto quem quiser escrever mais de uma sinta-se á vontade. — Ela encerrou. Se sentou e cruzou as pernas. Seu olhar baixou em Alex, que já estava com a cabeça baixa e os olhos fechados. Pensativo.

Um turbilhão passava na mente do garoto. Puxou as mangas para cima, abriu o caderno e, com a caneta, começou a escrever.

Santa Mônica, Califórnia.

Oi vovó...

Como a senhora está? Espero que bem.

Então vovó... Eu sinto que preciso me reapresentar para a senhora. Muita coisa mudou depois que você se foi. Então vamos lá:

Olá. É um prazer. Meu nome é Alex, tenho 16 anos e há um ano me assumi transexual.

É. Eu sempre fui direto, me perdoe. Você mesma falava, lembra? Você costumava falar “Meu Deus, Riley, como você é direta. Precisa se segurar mais, garota”.

Agora que me assumi, preciso continuar me segurando?

Enfim, não estou aqui pra isso... Estou aqui porque minha professora promoveu algo muito legal...

As exatas palavras dela foram “Uma carta para alguém que já morreu, sobre alguém que você admira”. E sabe de quem eu falarei, vovó?

Da menina mais corajosa que eu já conheci. Riley Campbell. Meu antigo eu.

Alex parou por um minuto para reler aquilo. Era tão intenso, tão... Ele não sabia explicar. Tantos anos vivendo escondido, tantos anos sem poder contar com ninguém, e de repente ele estava ali, sentando, e falando sobre a Riley. Respirou fundo e voltou a escrever.

Ela aguentou tanto por mim. Tanto mesmo. O bullying, as campanhas em que era obrigada a vestir o que não gostava... Até nossos pais ela teve que aguentar por mim, e principalmente o conservadorismo deles.

Queria que você estivesse lá no dia em que ela/eu decidimos assumir. Foi tudo muito... Esquisito.

Começou com uma conversar dos nossos pais sobre a comunidade LGBT+. E Riley comentou que era Trans. A casa silenciou no mesmo instante. Sua filha, vovó, apenas baixou a cabeça. Parecia envergonhada. Sabe o quanto foi difícil ver minha mãe abaixar a cabeça para quem eu era?

Mas Riley aguentou. Ela respirou fundo e encarou nosso pai. Uma hora precisaria fazer isso. Ele estava com raiva, muita raiva mesmo. E ele se ergueu.

Nesse momento, é o momento em que mais me orgulho sobre Riley. Porque qualquer outro teria se encolhido no lugar, tentando escapar da ira que emanava do deputado Campbell.

Mas ela não o fez. Embora estivéssemos tontos, querendo sim fugir, ela estufou o peito e esperou o tapa, que achava que iria levar.

Este não veio. A mesa de jantar recebeu um soco, mas ela não se importa – acredite, eu perguntei. Ela não me respondeu, então acho que está tudo bem-...

Alex parou mais um momento para soltar uma estrondosa gargalhada, que fez toda sua turma olhar para ele. Acenou com a cabeça e murmurou um pedido de desculpas, ainda com um sorriso nos lábios. Reb olhou para ele e leu a última linha por cima de seu ombro.

— É sério que você fez isso, babaca? — Ela perguntou. “Babaca” era seu apelido carinhoso, e apenas Rebecca tinha autorização de chama-lo assim.

— Se concentra na tua, idiota — Ele respondeu, e os dois riram baixinho. Eram os únicos que podiam se chamar assim.

Mas nosso pai, eu entendi depois, nunca bateria em nós (nem na Riley, e nem em mim, Alex). Ele ficou furioso, claro. Nossa mãe chorou. Compreensível.

Mas a gente conversou depois. Conversamos por muito tempo, e Riley respondia calmamente as perguntas. Até hoje eu me esforço em responder as perguntas deles. E, para minha felicidade, eles me aceitaram. Demorou quase uma semana, mas eles finalmente me aceitaram.

Agora todos me tratam como Alex.

Vovó. Posso não ser mais ela. Posso agora ter meu tão sonhado topetinho cor de cobre, ou não precisar mais usar vestidos (mamãe doou todos eles para a igreja, assim como minhas maquiagens e meus esmaltes que eu nunca usei), mas sei que, se não fosse por ter a coragem de quando eu ainda era Riley, eu nunca estaria aqui.

Essa carta tá uma confusão. Mas... Bem... O que não vira confusão perto de mim? Riley também era um imã de confusão. E uma menina extraordinária.

Não sei o que a professora fará com essa carta. Nem sei se eu a entregarei. Mas me deu uma enorme vontade de postá-la em meu blog. E gritar para o mundo inteiro ouvir:

SE AME DO JEITO QUE VOCÊ É.

Obrigada por sempre me ouvir, vovó. E não se esqueça jamais: não sou mais a Riley, mas uma parte de sua coragem ainda vive em mim.

Alex sorriu antes de terminar a carta. O sinal tocou. Todos se levantaram e saíram da sala, inclusive a Senhorita Lewis. Rebecca parou á seu lado, vendo as curvas azuis no papel branco. Sorriu para Alex, e lhe estendeu a mão.

— Vamos, Lex? — Chamou. Alex sorriu novamente.

— Só me deixe finalizar aqui — Ele pediu. Pegou a caneta azul, pulou uma linha e, no canto direito do papel, escreveu três palavras:

Com carinho,

Alex.


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Notas finais do capítulo

Alex, Riley, obrigada mesmo pela coragem de vocês. Foi um imenso prazer escrever essa singela one e contar uma parte pequena de sua história.



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